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Insurreio Comunista de 1935 em Natal e Rio Grande do Norte 1962

Revolucionrios Potiguares em Memrias do Crcere
Graciliano Ramos

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Miguel Bezerra Morais
Artista, 08 anos de priso 08

Alcides Washington Guerra Carlindo Revoredo Carlos Wan der Linden Domicio Fernandes Ephifnio Guilhermino Ezequiel Fonseca Filho Gasto Correia da Costa Joo Anastacio Bezerra Joo Francisco Gregrio Joo Alves Rocha Jos Macedo Lauro Corts Lago Leonila Felix Mario Ribeiro de Paiva Miguel Bezerra Morais Paulo Pinto Pereira Ramiro Magalhes Paiva Sebastio Felix Arago Vicente Ribeiro da Silva

“Algum cochichou-me, atraiu-me a um canto; ouvi o nome de Miguel Bezerra, um moo de casquete, moreno e magro, que se ps a falar com abundncia. No comeo no entendi o que ele dizia, recordo somente uma declarao repetida:

No somos comunistas.

Bem, eu os supunha vagabundos; surgiam-me dvidas agora.

Donde vm os senhores?

Tinham embarcado no Rio Grande do Norte. Mas no somos comunistas.

Perfeitamente.

Porque a insistncia? Entrei a conversar e logo duas surpresas me assaltaram Miguel parecia alegre, as minhas palavras soavam-me aos ouvidos como se fossem pronuncia das por outra pessoa. Doidice rir em semelhante inferno. Ou ento me sensibilizara em demasia, os horrores que estivera a desenvolver tinham existncia fictcia. Possivelmente o meu enjo e a raiva do capito Mata provinham da mudana repentina: se nos houvessem feito percorrer escalas, no nos abalaramos tanto. Lembro-me de ter afirmado isto mentalmente. De qualquer modo nos arranjaramos, chegaramos a um porto. Assim falava no interior e dizia coisas diferentes,: pausadas, maquinais; pareciam gravadas num disco de vitrola. Deviam ter significao, pois o dilogo se prolongou, mas no me seria possvel reproduzi-lo. A declarao inicial voltava com freqncia:

No somos comunistas.

Porque inocentar-se? A certeza de que estavam ali os revoltosos de Natal acirrou-me a curiosidade, embora no me arriscasse a pedir informaes ao desconhecido cauteloso.”

“Miguel Bezerra, o moo de casquete, exibia inquietao constante no rosto fino como um focinho de rato; “

“Afastava-me, acercava-me dos grupos, imiscua-me neles: esforava-me por decifrar certas particularidades de linguagem e em vo buscara reter as fisionomias, sempre renovadas. No havia jeito de casar s figuras incompletas os nomes que me chegavam aos ouvidos. Joo Anastcio. Bem. Esse conseguiu fixar-se. Anteriormente fundia-se com Miguel Bezerra, mas agora se distanciava, e no sei como baralhei pessoas to diversas. Julgo que me surgiram simultaneamente na atrapalhao da chegada, falaram as duas ao mesmo tempo, quando no. me era possvel estabelecer a distino: olhos vivos, modos inquietos, rosto fino como um focinho de rato; pele macerada, feies imveis de mmia cabocla. Tipos inconfundveis, caracteres diferentes. Miguel Bezerra tinha um modo escorregadio de negar, de justificar-se; o outro afirmava, lento e seguro, como se batesse em pregos: nunca vi homem to afirmativo.

Essas duas figuras me ficaram gravadas profundamente na lembrana, no por haverem exercido qualquer influncia na minha esquisita aventura, mas porque avultaram no rebanho indistinto, durante algumas horas. Depois se afastaram, se diluram: os hbitos de classe me aproximaram do sujeito gordo e louro que fumava cachimbo, sentado na rede, a sorrir, do rapaz estrbico, de culos. Importantes, um secretrio da Fazenda, outro secretrio do Interior, no governo revolucionrio de Natal. Propriamente no fora governo, fora doidice: nisto, embrulhados, concordavam todos. “

Fiquei a esper-lo, conversando com Joo Anastcio e Miguel, os dois ageiros que se haviam relacionado comigo. Os outros ainda estavam nebulosos e distantes.

“Sentado na valise, encostado ao muro, distraa-me seguindo os movimentos vagarosos e o capricho do homenzinho gordo, envolto na fumaa do cachimbo; as mais insignificantes pregas se desfaziam, alisava-se cada pea com rigor. Despojara-me voluntariamente, pela manh, de um objeto necessrio: aria a noite mal. Onde estaria o sem-vergonha carrancudo que me furtara cinco mil-ris e estivera uma semana a esconder-se? Talvez no nos tornssemos a ver. ramos ali quarenta desordeiros, quase todos espritas e catlicos, segundo os papis oficiais escritos tarde sobra do refugo humano acumulado no poro. Dispersavam-nos, rompiam-se camaradagens alinhavadas pressa; a inquietao de Miguel e a energia imvel de Joo Anastcio iriam morrer-me no esprito. Novas caras surgiriam, novos hbitos e no teramos tempo de fixar-nos.”

“Se Miguel e Joo Anastcio reaparecessem, seriam criaturas diferentes, procuraramos em vo qualquer coisa nas suas fisionomias apagadas. Instintivamente buscvamos associar-nos; a associao precria num momento se desmancharia. E vivamos a receber choques na alma. Relaes impostas, desfeitas, mentes diversas agrupando-se, repelindo-se; ajustamentos difceis, sbitas exploses de incompatibilidades. Nessa altura o excelente Macedo me fez um gesto, cochichou oferta generosa, imprevista: havia espao ali para dois corpos.

“Veio-me lembrana a opinio de Miguel Bezerra quando apareci a bordo: vendo a roupa de casimira e o chapu de palha, julgara-me instrumento da polcia. As esfregaes ao p da torneira haviam findado; a cortina improvisada baixara, ocultando o vaso imundo; as redes estavam dobradas e as figuras encostavam-se s paredes, sentavam-se em trouxas; zumbiam conversas. Nesse ponto chamaram-me do corredor. Aproximei-me, vi junto s vergas de ferro o tipo que me supa habituado priso. Sair.”

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