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Tecido Social Correio Eletrnico da Rede Estadual de Direitos Humanos - RN N. 091 – 30/09/04 6h2c59

LITERATURA E MEMRIA HISTRICA

As dunas vermelhas de Natal

Por Moacy Cirne*

Nei Leandro de Castro, nascido em 1940, muito provavelmente o maior escritor contemporneo do Rio Grande do Norte. Autor de pelo menos dois livros antolgicos de poesia (Era uma vez Eros, 1993, e Dirio ntimo da palavra, 2000) e dois romances primorosos (O dia das moscas, 1983, e As pelejas de Ojuara, 1986), alm de um premiado dicionrio de Guimares Rosa (Universo e vocabulrio do Grande Serto, 1970), sem contar com outros livros e contos inditos, Nei Leandro, embora pouco conhecido no Sul do pas, um nome modelar para se compreender a literatura brasileira da segunda metade do sculo ado. Um nome que, em pleno sculo XXI, continua produzindo com fulgor criativo.

Haja vista o seu mais novo romance: As Dunas Vermelhas [Natal: A.S. Editores, 2004, 232 p.]. Sua escrita, carregada de modernidade, contm todos os elementos que fazem do seu texto um convite aberto leitura prazerosa, seja pela tessitura romanesca, seja pela construo dos personagens, seja pelo humor envolvente em vrios momentos, seja pela prpria Histria que alimenta a narrativa. E no se trata de uma histria qualquer. Afinal, a rebelio comunista de Natal, em novembro de 1935, faz parte da saga poltica natalense do sculo XX, com seus muitos erros (apesar do idealismo que a gerou), a comear por um fato sintomtico: seus lderes mal conheciam as teorias do socialismo revolucionrio.

E o que dizer da Natal da poca? Com seus (aproximadamente) 36/38 mil habitantes, era uma cidade bastante provinciana. Mas o romance de Nei Leandro no se detm na Histria enquanto tal, mesmo quando essa mesma Histria um elemento significativo para a compreenso de seus meandros romanceados. O livro do autor potiguar, em sendo marcado pela contextualizao histrica, existe como um relato fluente, otimamente estruturado e muito bem articulado em suas funes romanescas, quase cinematogrficas atravs de captulos curtos que animam e movimentam a leitura. A ao se a antes, durante e depois do j citado levante de Natal em 1935, com suas elevadas taxas conteudsticas de poltica e humor, poltica e romance, poltica e mentiraiadas. No melhor estilo de Nei Leandro.

So muitos os personagens que formam a trama de As Dunas Vermelhas, alguns reais, outros imaginrios, outros pressentidos. So muitas as tenses dramticas que alimentam o livro, formando um mosaico narrativo que, extrapolando o que seria um romance histrico, abre-se para situaes temticas centradas em afetos, paixes, dvidas, questionamentos, traies. A rigor, na tessitura do enredo, no h concluses (ou, ao menos, no h concluses simples): o prprio destino de alguns personagens a pela imaginao do leitor. Decerto, muitos natalenses ligados geografia humana da cidade, podero descobrir fatos, pessoas e desdobramentos histricos que podero enriquecer o imaginrio construdo a partir do livro.

Mas a verdade que um romance bem elaborado no se constri fcil, assim como no se constri fcil a boa poesia. Exige rigor, exige dedicao, exige disciplina. A propsito, as palavras do romancista americano William Faulkner, em clebre entrevista concedida em 1956 a Paris Review, cabem perfeitamente aqui:

Um escritor precisa de trs coisas, experincia, observao e imaginao, sendo que duas dessas, s vezes at mesmo uma, podem suprir a falta das outras. Se bem que, no caso especfico de As Dunas Vermelhas, pode-se dizer que, alm da disciplina, Nei Leandro trabalhou com trs nveis de elaborao: experincia, pesquisa e imaginao. Sim, a pesquisa histrica terminou sendo da maior relevncia para o livro de Nei Leandro de Castro um livro que j nasceu com as marcas fundantes da grande Literatura.

*Moacy Cirne escritor e terico de histrias-em-quadrinhos

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