Insurreio
Comunista de 1935
em
Natal e Rio Grande do Norte 1962
1935
Setenta anos depois
Isaura Amlia Rosado Maia
e Lalio Ferreira de Melo (Organizadores)
Nosso
Projeto |
Mapa Natal 1935 | Mapa
RN 1935 | ABC
Insurreio | ABC
dos Indiciados | Personagens
1935 | Jornal
A Liberdade | Livros
| Textos
e Reflexes | Bibliografia
| Linha
do Tempo 1935 | Imagens
1935 | Audios
1935 | Vdeos
1935 | ABC
Pesquisadores | Equipe
de Produo
Apontamentos
sobre a revolta de 1935
Luiz Gonzaga Cortez Gomes
O meu trabalho de pesquisa sobre os acontecimentos
polticos ocorridos no Rio Grande do Norte,
na dcada de 1930, envolvendo integralistas
e comunistas, foi puramente jornalstico,
sem obedecer a nenhuma metodologia cientfica.
Foi a primeira iniciativa de pesquisar aqueles
episdios independentemente de linhas ideolgicas.
O resultado das pesquisas, com entrevistas diretas,
consultas a jornais, livros, revistas, arquivos
pessoais, etc. foi publicado em edies
do semanrio O Poti, em 1985, numa srie
de 20 reportagens intitulada “O comunismo
e as lutas polticas do RN, na dcada
de 1930”. Antes, em 1984, no mesmo jornal,
tnhamos publicado reportagens sobre “A
Pequena histria do integralismo no RN”,
tambm enfocando os mais importantes episdios
da luta poltica, envolvendo os comunistas
e integralistas, os seguidores do Partido Comunista,
de um lado, e os adeptos da ideologia nacionalista
da Ao Integralista Brasileira,
criada pelo escritor Plnio Salgado.
Eu
considero que as mais importantes revelaes
foram as descobertas de adulteraes
no texto do relatrio oficial sobre a insurreio
comunista em Natal, elaborado pelo delegado Enock
Garcia e concludo em 18 de abril de 1936,
que no registrou nenhum heri da
Polcia Militar e as revelaes
de Sizenando Filgueira, o homem que matou um doente
mental na lama do Pao da Ptria.
O doente mental era conhecido por “Doidinho”,
natural de Sacramento, Ipanguass (RN),
que perambulava pelas ruas de Natal e comia as
sobras do rancho do quartel da PM, na Salgadeira,
onde hoje est a Casa do Estudante, bem
perto do mangue do Rio Potengi. Ele no
era soldado, mas um pobre coitado, desequilibrado
mental que foi usado na noite do dia 23 de novembro
de 1935 para carregar baldes de gua para
“refrescar” a metralhadora da polcia
que esquentava muito durante os disparos.
Manoel
Rodrigues de Melo, que foi um dos lderes
integralistas do RN e que esteve em Natal durante
os quatro dias de domnio comunista, sem
mudar a sua rotina de trabalho, disse-me que foi
a polcia que criou, anos depois, “o
heri” Luiz Gonzaga. Essa afirmao
foi publicada em O Poti, em 1985, sem nenhum desmentido.
O
que Sizenando disse? Disse “eu matei o falso
soldado Luiz Gonzaga durante a revoluo
de 1935”, numa entrevista gravada, em sua
residncia no bairro de Lagoa Seca. Ele
participou do ataque ao quartel da Polcia
Militar, no dia 23, e da priso dos oficiais
e praas da PM, na tarde de 24, domingo,
que tentavam fugir pelo Pio Potengi e foram alcanados
no mangue. Disse Sizenando Filgueira (j
falecido):
“Ele
no era heri nem militar na poca.
Ele era apenas um dbil mental, menor
de idade, e deram um fuzil a ele para acompanhar
os que iam fugindo do quartel. Depois que fiz
a priso do major Luiz Jlio,
comandante da PM, e de um coronel do Exrcito,
eu olhei para a direita e vi quando ele estava
fazendo pontaria para atirar. Antes que ele
atirasse, eu atirei. S dei um tiro e
ele caiu. Ele estava atrs de uma moita,
no mangue, fazendo pontaria, vi que era para
mim a uns 80 metros e atirei no peito, ele deu
um pulo e caiu para um lado e pra outro. Mandei
busclo e botei o corpo ao lado dos prisioneiros,
do major Luiz Jlio e do coronel Pinto
Soares, comandante do 21 BC. Eram 27 prisioneiros”.
Na
entrevista, Sizenando contou que esteve preso
durante 10 meses na Ilha Grande, no Rio de Janeiro.
Muitos anos depois de sua soltura, Sizenando contou
a sua participao na revolta de
1935 ao tambm falecido desembargador Joo
Maria Furtado, autor do livro Vertentes:
“Ele
me disse que no daria em nada, pois
tudo aconteceu no meio de uma revoluo
e atirei em legtima defesa. Se eu no
tivesse atirado, talvez estivesse morto hoje.
Quando o livro saiu, o coronel Bento Medeiros
mandou me chamar para conversar sobre isso.
Confirmei tudo. Ele perguntou se eu no
estava enganado e eu disse que no. Matei
no foi por matar, no. Fiz pra
me defender. Ele estava com pontaria pra mim
e eu atirei. O coronel Bento disse que aquilo
foi coisa de uma revoluo mesmo,
se fosse crime matar em revoluo,
eu pegaria priso perptua. ‘Voc
em So Paulo era conhecido como doido’,
disse Bento, se referindo a minha participao
impetuosa na revoluo de 1932,
em So Paulo, onde o major Zenbio
gostava muito de mim. O culpado de tudo isso,
dessa histria do heri Luiz Gonzaga,
o doutor Joo Medeiros Filho.
Todos os anos fazem essas comemoraes
para refrescar a memria contra o comunismo.
Nada verdade sobre essa estria
de Luiz Gonzaga, que nunca foi heri
de nada”.
As
adulteraes no relatrio
policial sobre a revolta comunista ajudaram a
desmascarar o suposto heri maluco. A minha
fonte sobre o caso foi o falecido representante
comercial e comunista Poty Aurlio Ferreira
que, na calada defronte ao Caf
So Luiz, na Cidade Alta, me mostrou um
exemplar do livro Meu depoimento, de autoria do
advogado Joo Medeiros Filho, de 1937,
editado pela Imprensa Oficial do Estado, no qual
o relatrio est inserido. Nesse
livro, esto transcritos, nas pginas
107 e 112, trechos do “Relatrio
do Delegado de Ordem Social (sobre a insurreio)
– Departamento de Segurana Pblica
– Delegacia de Ordem Social e Investigaes”,
datado de 18 de abril de 1936. Os dois documentos,
o relatrio e o livro, no registram
o tal “soldado” Luiz Gonzaga.
Mas
no livro 82 horas de subverso, impresso
no Centro Grfico do Senado Federal, em
1980, de autoria de Joo Medeiros Filho,
chefe de polcia do RN em 1935, o relatrio
do delegado de Ordem Social Enock Garcia foi novamente
enxertado nas pginas 91 a 101. Mas o enxerto
sofreu uma adulterao.
no trecho “As Victimas” (pgina
111 da 1 edio de Meu depoimento),
na pgina 100 do livro 82 horas de subverso.
A adulterao enxertada no relatrio
est na segunda linha do interttulo
“As Victimas”: “Soldado Luiz
Gonzaga, do Batalho Policial”. Observem
que a segunda linha do citado trecho comea
com “Entre os mortos, contam-se os seguintes:
Octaclio Werneck, assassinado barbaramente
porta de sua residncia a tiros
de fuzil pelo comunista Epiphanio Guilhermino
de Oliveira”. Por que a adulterao?
Tambm
publicamos matrias sobre o tiroteio ocorrido
na Serra do Doutor, no municpio de Santa,
hoje pertencente a Campo Redondo, onde os revoltosos
foram barrados pelos sertanejos aliciados pelos
“coronis”, fazendeiros, agricultores,
integralistas chefiados pelo padre Walfredo Gurgel,
vigrio de Acari, na Regio Serid.
Alguns
autores tm publicado livros mostrando Dinarte
Mariz como o nico responsvel pela
arregimentao dos homens para a
resistncia na Serra do Doutor, o que no
verdade. mais uma mentira sobre
os acontecimentos de novembro de 1935. Publicamos
em O Poti matrias com Jos Pacheco,
Bianor Medeiros, Manoel Lcio Filho, Serfico
Batista, entre outros, abordando aquele episdio,
e todos disseram que Dinarte Mariz esteve na Serra
do Doutor, aps o trmino da luta,
que ele no participou do movimento de
armas nas mos, pois ele tinha ido
Paraba pedir ajuda ao governador Argemiro
Figueiredo. Mas essa ajuda chegou quando os revoltosos
tinham sido derrotados na subida da Serra do Doutor,
na emboscada feita pelos integralistas, chefiados
por Walfredo Gurgel, que jogaram bombas nos caminhes
do Exrcito, bombas estas que foram fabricadas
por fogueteiros de Carnaba dos Dantas.
Por sinal, os irmos Lcio, Joel,
Manoel e Felinto, este o famoso msico
e compositor, todos integralistas, jogaram muitas
bombas.
Mataram
muitos revoltosos que foram levados para a delegacia
de polcia de Currais Novos, onde desapareceram
ou foram mortos por policiais. Dinarte Mariz ou
um telegrama no dia 28 de novembro de 1935 para
o governador Rafael Fernandes dizendo que tinha
acabado de chegar na Serra do Doutor e que os
revoltosos foram derrotados e 28 prisioneiros
foram para Currais Novos.
Enock
Garcia, que estava no Serid durante a
insurreio, em entrevista gravada
no dia 5 de maio de 1983, para o programa Memria
Viva, da TV Universitria de Natal, portanto
dois anos antes da publicao das
nossas reportagens em O Poti, disse que Dinarte
Mariz no lutou na Serra do Doutor nem
arregimentou prefeitos para lutarem contra os
comumistas. O arquivo da TV U deveria reprisar
a entrevista completa com Enock Garcia. Na entrevista,
Enock Garcia diz: “Todo mundo queria que
Dinarte tivesse tomado parte na Serra do Doutor.
Ele no tomou parte na Serra do Doutor,
como eu no tomei, como Humberto Gama no
tomou [...]”. Infelizmente, eu no
publiquei a entrevista com Enock Garcia na srie
de reportagens “O comunismo e as lutas polticas
do RN na dcada de 1930” porque s
vim tomar conhecimento anos depois, aps
Carlos Lyra ter publicado a sua coletnea
sobre as entrevistas que fez no programa Memria
Viva.
Ainda
sobre 1935, quero lembrar que a Igreja Catlica
no foi conivente com os comunistas, apesar
dos rebeldes terem usado a torre da catedral da
praa Andr de Albuquerque, onde
instalaram uma metralhadora, para atirar contra
o quartel da Polcia Militar. Jos
Pretextato (comunista antigo) disse-me que o cabo
Valverde (do Exrcito, que atirou contra
o quartel), Luiz Incio Maranho
Filho (comunista desaparecido desde 1974) e Aluzio
Alves (que estava de frias do Colgio
Militar de Fortaleza), tentaram ajudar os revoltosos,
carregando gua para refrigerar a metralhadora
colocada na torre da igreja, mas foram dispensados
pelos sediciosos que advertiram que aquilo no
era coisa para meninos. Pretextato hoje nega que
disse aquilo e eu nunca procurei Aluzio
Alves para falar sobre aquele episdio.
Luiz
Gonzaga Cortez Gomes
Jornalista e pesquisador.
Autor do livro A Revolta Comunista de 1935 em
Natal
^
Subir
Nosso
Projeto |
Mapa Natal 1935 | Mapa
RN 1935 | ABC
Insurreio | ABC
dos Indiciados | Personagens
1935 | Jornal
A Liberdade | Livros
| Textos
e Reflexes | Bibliografia
| Linha
do Tempo 1935 | Imagens
1935 | Audios
1935 | Vdeos
1935 | ABC
Pesquisadores | Equipe
de Produo |