ENTREVISTA
NILMRIO MIRANDA
Sub-Secretrio Especial de Direitos Humanos da Presidncia
da Repblica
"O
Sistema vai contribuir para que a democracia brasileira
tenha uma dimenso no apenas civil e poltica, mas econmica,
social e cultural"
Por
Antonino Condorelli ([email protected])
Pergunta: Atualmente, a ao do Estado na garantia dos direitos
da pessoa fragmentada e de carter essencialmente socorrista.
O Sistema Nacional vai dar organicidade e carter estrutural
a esta ao?
Resposta: Ns temos um sistema de garantia dos direitos
criado no pas: no estamos propondo criar estruturas novas,
estamos querendo que funcionem as estruturas e as leis existentes.
Eu acredito que o Brasil um pas democrtico, temos uma
democracia avanada a partir da mobilizao que foi feita
em torno da Constituinte e depois, nestes 16 anos, com a
legislao que foi elaborada e que garantiu todos os direitos...
no papel.
O problema a efetivao destes direitos. Do ponto de
vista da garantia dos direitos, acabamos de prover sociedade
do Disque Direitos Humanos, ao qual todo o mundo pode ar
discando o nmero 100, para estimular as denncias de todas
as formas de violaes dos direitos fundamentais. E o que
estimular as denncias? estimular a pessoa a exercitar
os seus direitos. Isso vai nos obrigar a testar continuamente,
quotidianamente o sistema de garantia destes direitos: as
polcias, as Promotorias, o Ministrio Pblico Federal,
os Conselhos Tutelares, os Conselhos Estaduais e Municipais
de Direitos Humanos, as Comisses das Cmaras Legislativas
estaduais e municipais, enfim, toda a estrutura criada ao
longo destes 16 anos ps-Constituinte.
Do ponto de vista da promoo, o desafio relacionado
s polticas pblicas, que devem ser integradas: municpio,
Estado e Unio. A Constituio nos deu um indicativo: descentralizao
das polticas pblicas, desconcentrao do poder. assim
na educao fundamental, por exemplo: das 200.000 escolas
do pas, s trs so federais, todas as outras so estaduais
ou municipais. A Lei Orgnica da Assistncia Social descentralizou
a execuo da assistncia social, o Sistema nico de Sade
tambm um sistema descentralizado que reparte responsabilidade,
e da pra frente.
O rumo que o Brasil escolheu foi este: o povo vive nos
municpios e ali onde pode e deve participar, monitorar,
fiscalizar a concretizao das polticas pblicas. O ponto
mais grave, a meu ver, a violao dos direitos: ali
que reina a mais completa impunidade, a ponto das pessoas
sequer denunciarem as violaes que sofrem por no confiar
no Estado. Por isso, acho que o nosso primeiro desafio
fazer funcionar o sistema de garantia dos direitos.
P: Qual ser o papel da sociedade civil na implementao
do Sistema?
R: A sociedade civil ficou sozinha durante muito tempo na
luta pelos Direitos Humanos, a novidade agora que o Estado
est entrando nela. O desafio buscar fazer isso em cada
lugar: no municpio, no Estado e na Unio. Quero tambm
deixar claro que no se trata de criar uma camisa de fora
para ningum: o Sistema no mais uma burocracia, ele
uma rede. Portanto, ele descentralizado e concebido para
atuar em sinergia, colocando para dialogar os diversos temas
existentes.
Hoje temos um sistema da criana e do adolescente, um
sistema da mulher, um sistema anti-racista, um sistema de
educao, um sistema de sade, etc., alguns dele profundamente
democrticos, mas no dialogam entre si. Chegou a hora da
gente procurar um relacionamento disso tudo. Minha preocupao
com novas leis e novas instituies mnima: toda instituio,
obviamente, pode ser modificada, mas o mais importante
que elas sejam fortalecidas. Por exemplo, lgico que as
Ouvidorias de Polcias so fundamentais, mas em muitos Estados
elas esto reduzidas mais completa impotncia por falta
de recursos, de apoio institucional, porque as pessoas no
atendem s suas requisies de informao etc. Portanto,
claro que tem que haver Ouvidorias em todos os Estados,
mas o que ainda mais importante que elas tenham condies
de funcionar de verdade.
Os Conselhos Tutelares so fundamentais para identificar
crianas em situaes de violao, explorao e violncia,
mas milhares de cidades no tm Conselhos Tutelares ou tm
Conselhos s formais, sem estarem informatizados nem estarem
capacitados para cumprir suas misso. Uma instituio tem
que ser expandida, fortalecida e capacitada para cumprir
suas funes. Este um processo cujos resultados veremos
provavelmente s a mdio ou longo prazo, o que importa
que abrimos o caminho, que abrimos uma marcha em direo
efetivao dos direitos. No podemos itir uma democracia
meramente formal, com direitos reconhecidos s no papel.
Temos 55 milhes de brasileiros que vivem margem da
cidadania em todos os nveis: nossa misso inclu-los.
Milhes de brasileiros so analfabetos, milhes no tm
documentos civis ou documentos bsicos para poder entrar
na poltica de crdito, de habitao popular, poder registrar
suas propriedades, poder intitular um quilombo, etc. Estas
pessoas esto, com toda evidncia, fora da cidadania: s
votar, s ter liberdade de expresso no suficiente. Acho
que a democracia verdadeira tem uma dimenso civil, poltica,
econmica, social e cultural. O Sistema Nacional de Direitos
Humanos quer contribuir para isso.
Veja
tambm:
- CONTINUAM OS TRABALHOS
DA CONFERNCIA ENTRE ANIMADAS DISCUSSES
-
REUNIO DO FRUM DE CONSELHOS ESTADUAIS DE
DIREITOS HUMANOS
- PROPOSTAS DO RN - JUDICIRIO
- CARTA AO MINISTRO NILMRIO
MIRANDA