Centro da Mulher 8 de Maro
GNERO E DIREITOS HUMANOS DAS MULHERES
por Valkria Alencar de Sousa
Coordenadora Geral do Centro da Mulher 8 de Maro
Apresentao
s portas do terceiro milnio, quando o
mundo celebra o 50 aniversrio da Declarao universal dos Direitos Humanos, h que
se falar dos direitos humanos das mulheres como algo a ser includo nesta pauta, a ser
levado em conta. O enfoque a ser dado a ateno aos casos de abuso e de negao
destes direitos s mulheres em todos os aspectos da sociedade, em todo o mundo.
Em 10 de dezembro de 1948, os governos
reconheceram os direitos humanos sem qualquer tipo de distino, porm isto no foi
suficiente para a sociedade e todas as suas leis, culturas, dogmas e cdigos sociais
machistas. Mais recentemente, em Viena, em 1993, na Conferncia Mundial dos Direitos
Humanos, os governos ao redor do mundo reconheceram a violncia contra a mulher como uma
violao dos direitos humanos, se perpetrado na esfera pblica ou na privada.
Falar de direitos humanos das mulheres
falar de uma gama de violaes e situaes da condio feminina no mundo atual, seja
no ocidente ou no oriente, falar da violncia a que esto expostas em casa, na rua,
no trabalho. Implica olhar o fenmeno como uma consequncia lgica da ausncia de
direitos no plano econmico (trabalho igual x salrio desigual), poltico e social, sem
se esquecer de se reportar s privaes vividas no lar. Significa dizer que as
mulheres, alm de serem objeto de violaes pela sua condio de sexo feminino,
tambm so privadas dos direitos bsicos - o educao, sade, a uma
sexualidade e maternidade satisfatrias, a uma garantia no mercado de trabalho,
participao na poltica.
A fundamentao filosfica dos direitos
naturais, onde se encontra a origem dos direitos humanos, est pensada sob um vis
masculino. Desde a categoria aristotlica at os documentos dos organismos
internacionais neste sculo, sob uma mscara de neutralidade, se tem eliminado na
prtica as mulheres. Na diviso artificial criada entre o pblico e o privado, subjaz a
excluso das mulheres das convenes e declaraes sobre os Direitos Humanos. Esta
excluso difundida como algo enraizado na cultura de um povo, justificando-se muitas
vezes, at mesmo as violaes, as torturas, a mutilao de corpos femininos e at o
assassinato como uma "lei" da natureza ou de uma "divindade" que pune
o seu povo atravs das mulheres.
Tendo como princpios da sua ao a
defesa e a garantia dos direitos humanos das mulheres, o Centro da Mulher 8 de Maro
desenvolve sua ao institucional de cunho educativo de estratgias que tm como fim o
alcance pelas mulheres dos direitos humanos em toda a sua integralidade.
Centro da Mulher 8 de Maro: a que
ser que se destina?
O Centro da Mulher 8 de Maro
nasceu de uma ampla articulao de mulheres paraibanas e familiares de mulheres
vitimadas para lutar contra a violncia, a opresso e a impunidade em maio de 1990, perodo
marcado por vrias formas de violncia contra a mulher, inclusive assassinatos.
Pela sua filosofia de trabalho e de
aes a serem desenvolvidas, compreendeu-se desde a sua fundao que no se poderia
restringir esta entidade de ideais to amplos, da chamar-se Centro da Mulher e
por que no? fazer uma homenagem viva s mulheres, em especial data internacional do 8
de Maro, comemorado em todo lugar; significa dizer que as mulheres de todo o mundo
so homenageadas pela nossa entidade. Nenhuma mulher se sentir estrangeira em nosso
pas, em nossa casa!
O Centro da Mulher 8 de Maro est
sediado em Joo Pessoa, Paraiba, no nordeste do Brasil, uma das regies mais carentes do
pas, onde os ndices de mortalidade materna e infantil equivalem-se aos da frica e
ocupa o 3 lugar em relao violncia contra a mulher em todo o pas, segundo
dados da Rede Globo de Televiso, em 1994.
O Centro da Mulher 8 de Maro busca
fortalecer espaos de organizao poltica das mulheres na Paraiba, formando-as para
conquistar o seu papel histrico nas transformaes sociais, seja no pblico, seja no
privado, perado pelo vis de classe e de raa. Destina-se ainda ao intercmbio
entre mulheres e suas organizaes locais e de vrias partes do mundo, interagindo
atravs das nossas experincias, no desejo de construo de uma identidade feminista e
de uma conscincia crtica sobre os valores patriarcais e suas variadas e sutis formas
de opresso.
So mulheres construindo uma identidade
prpria, uma cidadania poltica, novas relaes sociais de gnero, irmanadas num
mesmo desejo e sentimento s mulheres de todo o mundo: pelos direitos humanos das
mulheres!
Objetivos
Contribuir para o fortalecimento de uma
conscincia crtica nas mulheres para sua participao na vida privada e pblica
enquanto gnero;
Desenvolver aes educativas que visem
uma maior autonomia nos espaos sociais e uma participao efetiva da mulher na vida
pblica;
Lutar pela implantao das Polticas
Pblicas voltadas para a garantia da sade e dos direitos humanos e legais das mulheres;
Pblico-alvo:
Estrutura Organizacional:
O Centro dirigido por uma coordenao formada por 3 pessoas, incluindo-se a
coordenadora geral, uma assemblia geral anual formada pelas scias (mulheres de vrios
segmentos), um conselho consultivo (formado por 5 nomes de expresso do movimento
feminista ou social, local ou nacional), equipes de trabalho e um ncleo de apoio de
comunicao.
Apoio:
O Centro da Mulher 8 de Maro recebe apoio financeiro e institucional de algumas
instituies internacionais e nacionais:
ICCO -Organizao Intereclesistica
para a Cooperao para o Desenvolvimento
OXFAM -Associao para a Cooperao ao Desenvolvimento
Global Fund for Women
WDP -Womens World Day of Prayer
FNUAP-Fundo das Naes Unidas para Apoio Populao
UNICEF
CESE
Partners of the Americas
Parceria
O CM8M compreende a importncia de
uma ao coletiva de entidades e instituies na defesa dos direitos humanos dos
excludos, em especial as mulheres, da, buscar e efetivar parceria com vrias
organizaes da sociedade civil e instituies pblicas em eventos, campanhas e em
aes educativas.
Nossas parcerias:
Associao de Apoio Mulher Patoense-ASAMP.
Associao de Docentes da UFPB-ADUF/JP
Associao Santo Dias.
Associao de Mulheres do Rangel
(bairro).
Coletivo Feminino Santo Dias.
Coletivo Violeta Formiga.
Companheiros das Amricas.
Fundao Margarida Maria Alves.
Movimento de Mulheres Trabalhadoras
Rurais-MMT.
Movimento Promoo da Mulher.
Ncleo de Estudos da Mulher
Sertaneja-NEMS.
Rede de Combate Explorao Sexual
Infanto-Juvenil.
Sindicato dos Trabalhadores em Educao
da Paraiba-SINTEP.
Conselho Municipal dos Direitos da
Criana -JP.
Conselho Municipal dos Direitos da Mulher
- JP.
Conselho Municipal dos Direitos da Mulher
- CG.
Conselho Estadual dos Direitos do Homem e
do Cidado.
Conselho Regional de Psicologia
Curadoria de Defesa do Cidado.
Delegacia de Defesa da Mulher -(6
unidades).
Fundao de Desenvolvimento da Criana
e ao Adolescente-FUNDAC.
Juizado da Infncia e da Juventude.
Secretaria de Educao Municipal -JP.
Secretaria de Sade (municipal e
estadual).
Secretaria do Trabalho e da Promoo
Social-SETRAPS.
TELPA
UNIP
UFPB.
H que se destacar a parceria com as
Universidades, atravs de intercmbio de aes e dos estgios supervisionados, o que
s vem enriquecer a prtica de estagirios, futuros profissionais, na vivncia direta
com determinado segmento social. Os estagirios/as so das reas de Comunicao,
Educao e Psicologia; fazendo atendimento psicolgico e manuteno do banco de
dados; com a Pr-Reitoria de Assuntos Comunitrios-PRAC so desenvolvidas aes na
realizao de eventos de formao e treinamento assim como de aes educativas na
temtica da violncia.
Outra parceria em destaque com a
Delegacia Especializada da Mulher e a Curadoria de Defesa do Cidado - no levantamento
das estatsticas, acompanhamento de casos e treinamento de profissionais e no atendimento
jurdico.
Atuamos ainda em parcerias com parlamentares:
- Assessoria para proposituras de projetos de lei.
- Divulgao, articulao e mobilizao.
- Sesses especiais.
- Dossis e outros subsdios para a instalao de I's
Redes: (coordenaa/participao)
Rede de Combate Explorao Sexual
Infanto-juvenil.(local)
Rede Feminista Latinoamericana contra a
violncia domstica e sexual.
Rede Nacional de Sade da Mulher e
Direitos Reprodutivos.
Rede de Educao Popular entre Mulheres.
Rede Nacional de Direitos Humanos em
HIV/AIDS.
Movimento Nacional de Direitos Humanos.
Ao Educativa: Gnero e Direitos Humanos
Programa: Violncia contra a Mulher e Cidadania
Os papis sociais diferenciados peram
todo o universo de homens e mulheres- na famlia, na escola, no trabalho, na sociedade.
O discurso social seletivo, coibitivo e
punitivo: homem pode x mulher no pode ou coisa de homem x coisa de mulher, incluindo-se
neste universo os sentimentos e as emoes. Portanto, os papis sociais reforam e
impem os papis sexuais, reforando o sentimento de posse e de poder nas relaes de
gnero e a violncia de gnero fruto dessa viso de mundo masculina, mas tambm
feminina. Partindo desse pressuposto, compreendemos o papel da violncia contra as
mulheres num contexto de poder; o ato violento na maioria das vezes, muito mais uma
expresso de poder que de fora.
o programa-chave da organizao,
expandindo-se em vrias direes ou sub-temticas e consiste em:
Banco de Dados
Arquivo com estatsticas da violncia
contra a mulher na Paraiba e os crimes contra os direitos humanos das mulheres, de 90 a
98, com coleta dos dados dirios em 4 jornais da grande imprensa no estado. Estes dados
so analisados, transpostos para formulrios e depois, informatizados; tambm tm a
funo social de "alimentar" a imprensa a cada 3 meses e rgos interessados
na temtica, assim como possibilitar estudos por partes de estudantes, pesquisadores e
instituies de ensino.
O banco de dados contempla as
sub-temticas da violncia como prostituio infantil, violncia e explorao
sexual de crianas, abuso sexual na famlia, assdio, sexo-turismo e qualquer outro
crime de ordem sexual na famlia ou fora dela. Atravs deste banco de dados tem sido
possvel, a formulao e a articulao para a implantao de polticas pblicas
na rea de atendimento e segurana.
Constam do banco de dados:
- -Dossis sobre prostituio infantil na Paraiba (93, 95
e 97 ).
- Dossis sobre homicdios de mulheres no espao
domstico (80 a 98).
- Dossi de alguns crimes sobre os quais fazemos estudos e
acompanhamento.
- Material educativo.
- Material fotogrfico.
- Uma exposio itinerante sobre a temtica.
- Relatrios.
- Estatsticas
- Publicaes
Nos meses de janeiro a setembro (98), 285
pessoas (estudantes de escolas pblicas, de universidades e pesquisadores ) visitaram o
banco de dados em busca de informaes.
Atendimento a Mulheres em Situao de
Violncia
O Centro recebe mulheres em situao
de violncia procura de apoio, de orientao e de acompanhamento a outros rgos.
Em 1997, registramos uma demanda de
aproximadamente 178 mulheres (ou familiares) em busca dos nossos servios. Destas, mais
de 80% trouxeram denncias sobre violncia domstica e o restante sobre assdio sexual
e a mau atendimento em servios de sade. At setembro de 1998, foram registrados 92
atendimentos.
Atendimento Psicolgico
Atravs de convnio firmado com os
Institutos Paraibanos de Educao, inauguramos este ano o servio especializado em
atendimento psicolgico a mulheres em situao de violncia, a mulheres vtimas de
discriminao por ser portadora do vrus HIV e de assdio sexual (ou seus familiares).
Dispomos de sala para este fim especfico e o atendimento nos turnos manh e tarde por 3
psiclogas e 1 psiclogo.
Atendimento Jurdico
Por no dispormos de advogado para o
atendimento jurdico, firmamos convnio com a Curadoria de Defesa do
Cidado/Ministrio Pblico que atravs do nosso encaminhamento recebe as mulheres para
orientao e acompanhamento jurdico.
Linha Direta para a Cidadania: 241-8001
Atendimento via telefone
(disk-denncia ou hotline) para informao e orientao em casos de emergncia para
mulheres e crianas vitimadas pela violncia e pelo abuso sexual. O atendimento
limitado, pois se d das 8 s 18 horas, de 2 a 6 feira, por falta de recursos
humanos e de infra-estrutura.
Este programa de linha direta resultado
de parceria com a organizao Companheiros das Amricas e a TELPA.
Treinamento de Multiplicadoras e de
Profissionais para Atendimento
Como e terico de formao e
treinamento e sensibilizao de pessoas que trabalham ou atuam junto a mulheres ( e
meninas) em situao de violncia ou na prostituio infantil, o Centro da Mulher 8
de Maro desenvolve um programa com este fim.
Realizamos atividades de formao e
capacitao voltado para a preveno e o trato com as vtimas, preparando mulheres
(profissionais, estagirias e voluntrias) para responderem didaticamente a esta
problemtica.
Estas atividades tm tido um enorme
sucesso e se multiplicam cada vez mais, tanto como atividades do Centro como em assessoria
a outras entidades e rgos pblicos interessados na temtica.
Isto muito importante pois fortalece a
ao das pessoas no sentido do conhecimento, da metodologia e de um fazer coletivo no
atendimento a mulheres vitimadas pela violncia domstica ou sexual.
Coletivo Violeta Formiga
um grupo de estudos e pesquisa sobre a
temtica da violncia de gnero, formado por pessoas e outras entidades, sob a
coordenao do Centro, com o objetivo de implementar aes nesta rea, funciona como
um reforo e uma expanso do programa.
Centro de Documentao e Memria Beth Lobo
Biblioteca - conta aproximadamente
com 800 ttulos e considerada a maior da cidade (e do estado) sobre a temtica de
gnero aberta ao pblico. Formada basicamente de doaes de militantes e
simpatizantes, referncia para estudantes universitrios e secundaristas,
jornalistas, pesquisadores e militantes dos movimentos sociais.
No ano de 1997, a biblioteca teve uma
mdia mensal de 60 visitantes(1) interessados nos mais diversos temas sob a perspectiva
de gnero.
Constam da biblioteca:
- livros
- revistas
- teses e monografias (doaes e trabalhos em parceria)
- jornais de vrias entidades (locais, nacionais e
internacionais)
- material educativos
- cartazes
- documentos
- textos tericos
- biografias
- outras publicaes
Videoteca
Nosso acervo de 70 vdeos l, abordando
a temtica de gnero, mercado de trabalho, sade da mulher, AIDS, violncia de
gnero, metodologia, raa, entre outros. bastante utilizada por educadores populares
e professores de 1 e 2 graus para animao de atividades. Em 1997, serviu para a
animao de 235 atividades escolares e populares, incluindo-se cursos de formao.
Rede de Combate Explorao Sexual
Infanto-juvenil-REDEXI
A violncia sexual contra a criana e a
adolescente decorrente do abuso e da explorao na Paraba levou vrias entidades a
uma ao coletiva no combate a este crime. Criou-se ento a REDEXI que tem participado
em debates, seminrios, fruns, etc., contribuindo para a efetivao de campanhas
educativas e de sensibilizao sobre o problema, que leve a sociedade e todos os
segmentos a verem a "menina" como uma pessoa que foi abusada e prostituda e
no como uma prostituta.
A desateno das autoridades competentes
a esta problemtica tem favorecido o crescimento das redes de explorao sexual no
Brasil e um fator determinante na dificuldade de desmantelamento destas redes (cafetes,
cafetinas e usurios) o envolvimento de pessoas de destaque na sociedade.
O Centro da Mulher 8 de Maro integra e
sedia a Rede de Combate Explorao Sexual Infanto-Juvenil-REDEXI, e junto com as
demais entidades governamentais e no governamentais, mobiliza a populao e alerta as
autoridades para a importncia de se combater este problema.
A REDEXI articula junto ao poder pblico
a efetivao das polticas sociais numa tentativa de fazer valer a Declarao
Universal dos Direitos Humanos e o Estatuto da Criana e do Adolescente, para que sejam
respeitados e aplicados de acordo com cada caso perante o agressor e a agredida.
A situao de misria (fome,
analfabetismo, desestrutura familiar, etc.) por que am as famlias pobres
brasileiras, especialmente as do Nordeste, aliada cultura do machismo, contribui para a
expanso deste crime que a a se tornar muitas vezes imprescindvel para a
sobrevivncia familiar, "um mercado de trabalho" sexual, que ocasiona uma renda
atravs da venda do corpo de meninas e jovens, conduzindo-as depreciao moral,
tica, fsica e psicolgica, dificultando sua integrao sociedade e ao seu
ncleo familiar, imbudo do.
Neste contexto, a REDEXI entende que, para
que haja uma ao mais completa e consistente no combate prostituio infantil,
fundamental a implantao de programas produtivos que proporcionem mais empregos para as
famlias carentes e que se tenha um projeto de valorizao da vida da infncia e da
adolescncia no pas.
(1)Cada visitante
cadastrado atravs de uma Ficha de Visitante onde constam dados pessoais, profissionais e
o interesse sobre os temas. |