O
Reprter Policial e a sua
Imagem da Violncia e da Ao
Policial[1] s4p36
Thephilos
Rifiotis (Prof. Departamento de Antropologia/UFSC)
Lcia Lemos Dias (Mestre em Servio Social/CDH/UFPB)
Maria de Nazar Tavares Zenaide (Profa. Departamento de Servio
Social/CDH/UFPB)
Mnica Cristina de Carvalho (Graduada em Comunicao
Social/UFPB)
Ana Cristina Moura Ramos (Graduada em Comunicao Social/UFPB)
Tatiana Learth Junqueira (Graduada em Comunicao Social/UFPB)
1. APRESENTAO
A
presente pesquisa foi realizada com reprteres e editores da rea
policial dos jornais O Norte,
Correio da Paraba e Unio
da Estado da Paraba, no ano de 1997, como parte de um trabalho
mais amplo sobre a produo do discurso da imprensa escrita no
mbio da violncia.
Nesta
pesquisa foi utilizado como instrumento de coleta de dados a
entrevista semi-estruturada, realizada pelos profissionais da rea
de Comunicao Social que integram a equipe de pesquisa responsvel
pelo texto apresentado neste Congresso.
Como procedimento de anlise do material coletado,
utilizou-se os fundamentos da anlise do discurso com referencial
geral, buscando com esta aprender na fala dos jornalistas
entrevistados, o contedo e seus significados, referentes a sua
auto-imagem profissional, a violncia, a ao policial e as polticas
pblicas de segurana e justia.
Nesta
pesquisa foi utilizado como instrumento de coleta de dados a
entrevista semi-estruturada, realizada pelos profissionais da rea
de Comunicao Social que integram a equipe de pesquisa responsvel
pelo texto apresentado neste Congresso.
Como procedimento de anlise do material coletado,
utilizou-se os fundamentos da anlise do discurso com referencial
geral, buscando com esta aprender na fala dos jornalistas
entrevistados, o contedo e seus significados, referentes a sua
auto-imagem profissional, a violncia, a ao policial e as polticas
pblicas de segurana e justia.
Foram
entrevistados, trs editores e trs reprteres policiais, todos
do sexo masculino, faixa etria entre 30 e 50 anos. Com relao
a formao universitria,
apenas dois editores
tem nvel superior, os demais no completaram o terceiro grau.
Com relao ao tempo de servio no jornalismo, a maioria tem
cerca de 15 a 30 anos. Apenas um
tem menos de um ano.
Tomamos
como ponto de partida a imagem da violncia e da ao policial
da figura emblemtica nesta rea:
o reprter policial.
Trata-se de um personagem central, juntamente com os
editores, na produo e divulgao das matrias sobre violncia.
geralmente aceito que a mdia tem um papel destacado na
produo de uma cultura especfica sobre a violncia e a
segurana, associada a uma homogeneizao das suas mltiplas e
diferentes manifestaes (SOARES: 17, 1995).
Porm pouco se conhece dos agentes que produzem as notcias
veiculas pela mdia, sobretudo sobre os valores e juzos que
formam uma espcie de matriz em torno da qual criam a sua leitura
dos fatos que divulgam e analisam.
Entendemos que salvo raros trabalhos sobre a produo da
notcia sobre violncia (GOMEZ, 1996), pouco conhecemos tambm
sobre a outra ponta do deste processo qual seja a recepo, seja
ele leitor ou telespectador, pois no mais das vezes a ateno
dos pesquisadores volta-se para o texto produzido.
Destacamos,
finalmente, que atravs das pginas policiais que,
diariamente, os jornais divulgam e comentam fatos e prticas
sociais de violncia, contribuindo para a produo e reproduo
do chamado senso comum. Seguindo
a orientao terica de Umberto Eco relativa a noo de
cooperao textual (ECO, 1986), entendemos que o reprter
policial dialoga com o leitor imaginado por ele durante o processo
de escrita, estabelecendo uma interlocuo entre o profissional
e o pblico leitor. Atravs deste dilogo imaginado, produz-se um texto que ao
mesmo tempo prev e prov um leitor-modelo com o qual so
trocados valores e juzos.
2. IMAGENS
DA IDENTIDADE E PRTICA PROFISSIONAL DO REPRTER E EDITOR
POLICIAL
A
insero na profisso de jornalista da rea policial, via de
regra, se d, segundo os entrevistados, por acaso, no
sendo necessrio ser portador de Curso de Comunicao
Social
ou de Jornalismo para ingressar como profissional na rea.
Observou-se que a falta de formao especfica de alguns
jornalistas foi motivo de explicaes e justificativas durante
as entrevistas, constituindo-se um problema para eles.
Um dos entrevistados refere-se assim a esta questo:
Inicialmente
quando cheguei no jornal, vim procura de um trabalho, poderia
ser qualquer trabalho... eu vim, e de repente no jornal,
justamente, no setor policial tinha sido demitido dois funcionrios,
o editor policial e o reprter... fiz um teste, e sem ser formado
em jornalismo, com outros, at da Universidade, e, eu fiquei no
jornal.
A
atuao de reprter policial tida como uma espcie de
desafio para o ingresso do profissional de jornalismo.
Para alguns ela constitui uma espcie de ritual de iniciao,
como a agem de auxiliar
de reportagem para reprter
policial, ou como afirma um dos entrevistados:
Todo
reprter comeava pela rea policial.
Era o primeiro teste de fogo.
Embora
a rea policial se apresente nas falas como porta de entrada para
alguns profissionais que ingressaram na rea jornalstica,
alega-se que a permanncia na rea opcional, apesar de ser
muito discriminada entre os prprios jornalistas.
Parece haver uma espcie de identidade dos jornalistas da
rea policial que os diferencia das outras reas, destacando-se
a coragem para estar no lugar dos fatos, para denunciar atos
arbitrrios da polcia e da justia, conviver com a polcia,
ter uma rede prpria de informaes a caracterstica mais
salientada juntamente com a misso de informar.
As
fontes de informao so tidas como pessoais e intransferveis,
parece uma espcie de patrimnio acumulado pelos anos de experincia
e convvio. Trata-se
de uma rede de informantes dentro das polcias, no sistema justicirio,
no Instituto Mdico Legal, mas tambm nos hospitais.
uma atividade descrita pelos entrevistados como
dependente das relaes pessoais, pois afinal no h uma
pauta, apenas indicaes, a boa matria vem no
quente do dia, ou da noite, para ser divulgada no dia
seguinte.
Associa-se
a relevncia profissional do reprter policial, inclusive
ressaltando o seu destaque frente aos reprteres de outras reas,
a um crescimento da violncia no pas, atingindo um amplo
espectro de leitores, da classe A at Z, segundo um
dos entrevistados. Por
outro lado, ite-se que o enfoque jornalstico da matria
policial deve ser melhorada, inclusive a exemplo do que aconteceu
com os demais setores do jornalismo, a partir da insero de
novos profissionais que aram por um curso de nvel superior
da rea de comunicao, o que seria fonte da discriminao
entre os profissionais da imprensa, conforme assinalado abaixo:
"
todos os setores foram arejados, menos polcia.
Polcia continua com uma cobertura unilateral, muito porta
de cadeia, sem muito aprofundamento, sem se ver muito o outro lado
da questo, sem ver as razes da criminalidade.
Em alguns casos, registra-se que h um certo preconceito
sobre a matria policial, alegando-se que algumas pessoas de nvel
social mais elevado, preferem negar que so leitores de matrias
da rea policial.
O
mesmo entrevista continua o seu argumento assinalando um fato
muito significativo que marca a posio do reprter policial:
Nesse
sentido, constata-se que o estigma anti-social, que a
sociedade tem da profisso, deve-se a prtica de alguns
profissionais, que so considerados maus reprteres, uns toqueiros, como se diz. No
podem ver dez reais que eles mudam uma notcia, a verdadeira verso
da matria.
Apesar
dessa constatao, procura-se mostrar que a atividade de reprter
policial no deixa de ter a sua importncia e que h bons
e maus jornalistas. Encontramos
nas entrevistas uma recorrncia no que se refere a afirmao da
importncia do jornalista desta e sua equiparao com os de
outras reas tais como: coluna social, esporte, etc.
A relevncia dos reprteres da rea policial associa-se
coragem destes profissionais, que so responsveis pelo
detalhamento de informaes acerca de casos brbaros,
acrescentando-se que o leitor por mais interesse que tenha sobre
casos dessa natureza, tem medo de buscar informaes de
forma direta. Nas
entrevistas encontramos referncias a reprteres que foram
presos e mesmo baleados, mostrando a dificuldade de atuar nesta rea.
Vejamos a seguir:
(...)
o reprter policial tem a funo de colher detalhadamente um
fato, que para muita gente chocante e as pessoas querem saber,
mas no tem coragem nem de ir ver (...)
O
desafio posto para esse reprter bem maior do que para os
demais profissionais da comunicao, uma vez que lidam
permanentemente com duas categorias que esto permanentemente em
conflito: a polcia e os bandidos.
O criminoso e o policial seriam faces de uma mesma
moeda, uma espcie de parte maldita da sociedade, cuja
existncia seria negada por sua estreita ligao com o campo da
violncia.
No
que se refere ao perfil do reprter policial, constata-se que
assim como a verso jornalstica da ocorrncia de uma prtica
de violncia limitada ao policial, o reprter policial
retrata o seu perfil profissional como se este fosse semelhante ao
perfil de um agente de polcia. Essa constatao feita a partir da fala de jornalistas
que concebem a profisso de reprter policial, praticamente
como uma cpia de um policial, alis, informalmente, eles
mesmos referem-se s vezes sua rea com policial,
omitindo a palavra reprter ou rea. Entendemos que ele, em princpio, este tipo de jornalismo
poderia ser qualificado, por exemplo, com segurana e
segurana e justia, criminal, etc.
Analisando
o material coletado, pareceu-nos significativa a associao com
o termo policial, e que talvez ela fosse uma marca de
aproximao deste ramo do jornalismo com uma espcie de cultura
policial, sobretudo a atuao investigativa da Polcia Civil,
ou seja, a busca de informaes, as fontes, as redes, talvez
algo como uma lei do segredo no desenvolvimento da investigao.
Por outro lado, foram constantes as reclamaes de baixos
salrios nas polcias, a falta de equipamentos, de informatizao,
etc. Reclamos como
estes, meses aps a realizao da nossa pesquisa, foram feitos
pelos prprios agentes de segurana da Polcia Civil e da Polcia
Militar, que tornaram pblicos os reclamos e bandeiras defendidas
pelos reprteres entrevistados, atravs de manifestaes na
rua e greves em vrias partes do pas.
Portanto, acreditamos que a aproximao do reprter
policial a uma cultura policial mereceria um estudo mais especfico.
Concretamente,
a identidade profissional do reprter policial encontrada nas
entrevistas decorre da proximidade do espao fsico de atuao,
vejamos a seguir:
(...)porque
voc est numa delegacia, num presdio. Quer dizer, voc est
em locais onde quem geralmente est a polcia... o reprter
policial est junto de policiais em geral, civil, militar e
federal, onde tem crime o reprter est junto. Ento em funo
da proximidade, a gente sempre reprter policial.
A
denominao profissional reprter policial, alm de ser
justificada pela convivncia do reprter no espao fsico da
rea policial, tambm se justifica, por ser a prpria polcia
a fonte de informao para o profissional da rea:
porque ns convivemos dentro da polcia... veio esse nome porque
as fontes ns temos dentro da polcia, isso vem de muitos e
muitos tempos. Desde que voc l jornal, da dcada de 50, por
exemplo, voc j v: reprter policial. Eu nunca procurei
saber, mas eu acredito que seja por isso, pelos fatos acontecerem
dentro da polcia.
As
dificuldades relacionadas ao levantamento de informaes acerca
de casos de violncia, alega-se que so superadas, face as
relaes de amizade estabelecidas pelos profissionais da
rea com a polcia, e justia e at mesmo com os hospitais,
que tambm se constituem em fonte de informao.
...
porque na Igreja voc no consegue uma reportagem policial, numa
Assemblia Legislativa voc no consegue uma reportagem
policial. Voc s consegue dentro da polcia, dentro dos
hospitais, IML, so as fontes que a pessoa tendo bom
entrosamento, fazendo boas amizades com esse povo, voc
consegue.
3. IMAGEM
DA VIOLNCIA
Os
editores e reprteres policiais, ao abordarem os fatores responsveis
pelo violncia, destacam como elementos impulsionadores desse fenmeno,
os problemas scio-econmicos, dentre os quais: a pobreza, a misria,
o desemprego, o abandono social, as drogas e o analfabetismo.
Eles reproduzem a recorrente associao entre crime e
pobreza, como uma verdade primordial, reafirmando o mito das
classes perigosas.
a partir desta verdade que se cria uma espcie de matriz
narrativa capaz de gerar diferentes textos sobre os fatos
registrados e comentados pelo jornalista, onde os dados concretos
devem apenas ocupar posies previamente configuradas na matriz.
Nas
entrevistas realizadas encontramos as seguintes referncias
explicativas da violncia:
A
misria leva as pessoas ao desespero, colocar uma faca na cintura
ou uma arma, ou ento a assaltar um vigilante para pegar a arma
dele e praticar assalto, para levar comida para o filho e
mulher.
A
violncia urbana ligada ao analfabetismo, a falta de emprego e
o uso da droga. Quanto mais a polcia combate mais aparece.
A
cada dia aumenta mais a onda de furtos e roubos com a falta de
empregos. 90% das ocorrncias policiais causada pelo
desemprego.
a violncia comea com a criana abandonada, fora da sala de
aula (...) as crianas
vo crescendo e agente ver nas ruas elas
praticando a violncia
Os
reprteres, ao persistirem nas suas falas, a relao entre,
pobreza, favela e violncia, eles delimitam como espao da violncia,
o local de moradia da pobreza, reproduzindo esteritipos e
preconceitos. Multiplicam assim a imagem de que pobreza sinnimo de
violncia e que o espao da pobreza o espao do mal,
fazendo assim uma leitura homogeneizante, generalizadora e
naturalizante das experincias sociais concretas:
A
tendncia de um jovem que nasce num morro carioca dominado por
assaltantes ser assaltante porque os heris desses meninos so
todos assaltantes.
Conforme
essa fala, nascer no morro, conviver com criminosos, viver
abandonado nas ruas qualificam todo e qualquer pobre como
criminosos. O que implica na reproduo e atualizao diria de um
preconceito como verdade pelos agentes dos meios de comunicao.
Essa
relao direta entre pobreza e violncia, expressa na fala dos
reprteres policiais, produz uma imagem por demais limitada
acerca do fenmeno, impossibilitando assim, formas diferentes de
pensar, interpretar e explicar o complexo conjunto de fenmenos
designado pelo termo violncia.
Alas, registramos tambm que os entrevistados valem-se
destes esteritipos para marcar a exteriodade da violncia,
associando-a preferencial, seno exclusivamente, com as situaes
de pobreza:
(...)
o que causa estranheza um fato como de Braslia, quatro jovens
de classe mdia, bem informados, tocar fogo num cidado que
estava dormindo; se voc nasce num meio bom, a tendncia
de que vai ser bom. Se voc nasce num meio mal a tendncia
ser mal. Porque quem
nasce na misria, cresce na misria, os heris dele so todos
criminosos.
Na
realidade, encontramos tambm no nosso material referncias a
conscincia de que a
relao entre violncia, ou melhor, crime, e a pobreza,
apenas um pressuposto. No entanto, quando um jornalista afirmou: priso de
pobre, eu no boto, s de rico, ele mesmo em seguida decreta
uma lei do interesse da notcia:
virar notcia depende da posio social.
Em outras palavras, o crime que no estaria associado a
pobreza uma boa notcia, porque causa espcie,
confirmando pela negativa a relao entendida como essencial:
pobreza-crime.
A
violncia enquanto objeto de produo de notcia,
ressaltada pelos agentes da comunicao, como o fator de maior
audincia e comercializao nos jornais. Em nome do lucro se
justifica prticas sensacionalistas, como pode se observar nos
discursos abaixo destacados:
a
violncia representa 35 a 50% da importncia do jornal, pois as
pessoas se interessam e vo comprar;
tem
que ser um tipo de violncia que seja alguma coisa fora do normal
que choque a sociedade, que atinja a sociedade, que seja
incomum.
quando
aparece uma chacina, um assalto com morte o pessoal se preocupa e
o jornal tem sada;
A
boa notcia na prtica um valor mercadolgico. Pelo material coletado, diramos que os jornalistas entendem
que indispensvel para a sua atividade que ele no se limite
exclusivamente ao carter informativo, uma vez que o fato
transformado em notcia deve causar alarme e muitas vezes temor.
Este situao representa ao mesmo tempo um compromisso
com a empresa qual pertence o jornal, mas sobretudo com o
leitor que, segundo os jornalistas, tem a sua ateno despertada
por um certo tipo de matria, digamos, mais sensacionalista.
Portanto,
havendo interesse meramente comercial na veiculao da matria
sobre a violncia, questiona-se a qualidade do contedo da matria
e a falta de interesse de qualificao dos profissionais por
parte da empresa.O que no deixa de confirmar, atravs do
depoimento de jornalistas, a existncia de regras do mercado da
informao sobre a violncia, que ainda no esto
suficientemente estudadas.
4. IMAGEM
DA PRTICA POLICIAL
Os
reprteres e editores policiais apresentam avaliaes
diferenciadas sobre a ao policial.
No geral, pode-se afirmar que houve proporcionalidade entre
opinies crticas e opinies legitimadoras da prtica
policial. Porm,
cabe destacar que as crticas sobre a violncia policial, ou
melhor, o abuso da fora no exerccio da ao policial
aparecem justificados do seguinte modo:
O
ladro no confessa o roubo, o furto, sem apanhar.
Ele tem que sofrer um pouquinho de presso uns bolos,
porque eles no confessam. O ladro profissional ele chega e
j diz logo para no levar bolos.
A
nossa polcia no est preparada para conseguir uma confisso
com calma, com dilogo. Mesmo nos EUA com uma polcia altamente
preparada voc v casos de violncia e fabricao de
testemunhas.
O
que se confirmaria, segundo o mesmo entrevistado pelo fato que o
ladro profissional confessar logo, para no apanhar,
enquanto que os p-de-chinelo acaba apanhando.
Alm do mais ele nos esclarece que falta preparo para
conseguir uma confisso com calma, com dilogo, ou
como afirma um outro: o
policial bate porque fica no meio da violncia. Essa espcie de contgio com a criminalidade e a prtica
da tortura juntamente com os procedimento judicirios da polcia
mantm entre si uma certa familiaridade conforme procuramos
mostrar a seguir.
Assim,
entendemos que o reprter policial identifica a prpria
ambiguidade da ao da polcia juduciria que necessita da
confisso como elemento de prova para compor o inqurito, o que
abre espao para a prtica da tortura que contrria a lei.
Em outros termos, a busca de provas que comprovem a culpa e
portanto permitam a condenao legal so produzidas ilegalmente
atravs da tortura (LIMA, 1995).
Entendemos portanto que a mesma palavra de crtica dos
jornalistas entrevistados leva a considerar razes que esto no
mbito do sistema judicirio e sua base inquisitorial e
sobretudo na sempre decantada falta de meios e de
treinamento.
Os
baixos salrios e a m formao dos policiais seriam os
fatores que contribuiriam para a produo de aes de violncia
em contraposio as aes de defesa do cidado, conforme
observa-se nos seguintes trechso das entrevistas:
O
policial mal formado, ele sai quase que mais para enfrentar a
sociedade, e no para defend-la;
Ele
come mal, dorme mal, cria mal os filhos, ele sofre com tudo isso.
O conjunto de todos essas coisas termina refletindo na ao
policial.
Ao
referendar a violncia policial praticada no processo de instaurao
do inqurito policial, a fala dos jornalistas revelam como a violncia
vem se constituindo num dispositivo, socialmente legitimado,
utilizado pela polcia para a extrao de dados acusatrios.
As
falas que tendem a legitimar a ao policial, quando abordam a
violncia na prtica policial, adjetivam a ao da polcia
como pacata ou transfere a existncia desta prtica para um
tempo remoto, ou para outros lugares distantes, a exemplo:
A
polcia aqui ainda uma polcia calma.s vezes sai denncias
mas uma vez na
vida. Agora l pro sul, aqui para Recife, voce ver todo
dia.
A
polcia tinha uma maneira agressiva de trabalhar, hoje temos as
academias que formam o policial. Os comandantes se preocupam em
mostrar que estamos num tempo diferente.
A
polcia t fazendo o possvel.
A de nossa cidade [Joo Pessoa] ainda uma das mais
pacatas com todas as dificuldades, uma das melhores do
Brasil(...) a polcia
da Paraba, tanto a militar quanto a civil uma polcia
pacata. Ainda uma polcia que d tapa e soco aquele negcio.Comparando
com o Recife, Rio Grande do Norte, So Paulo e Rio , ainda uma
polcia calma.
Os
reprteres policiais entrevistados ao serem perguntados sobre o
papel social das polcias tais como: prevenir o crime,
controlar a violncia e garantir a segurana,
delimitam sua ao para O estado, para o campo da ordem e do
controle social:
O
papel da Polcia Militar o policiamento ostensivo e a preveno
do crime. A Polcia Civil instaura inqurito policial e
encaminha o processo justia.
A Polcia Federal competem os assuntos do governo
federal .
A
polcia serve para coibir a violncia e na medida do possvel
acabar com a violncia.
Por
outro lado, quando enfatizam que o papel social das polcias na
defesa do cidado, redirecionam a ao policial para o homem,
sujeito de direitos e para a sociedade, ento a aparecem crticas
s instituies:
A
polcia um rgo que no est preparado para a segurana
da populao(...) a polcia deveria ser preparada sem precisar
bater, espancar, essas coisa
O
papel da polcia oferecer segurana ao cidado que tem seus
direitos garantidos na Constituio, mas que infelizmente no so
cumpridos(...) no tem condies de canto nenhum viver sem a
polcia.Agora voce tem que que ter uma polcia
preparada.Infelizmente as pessoas sabem da m qualidade dos
policiais
Quando
perguntados sobre a imagem social da polcia, os jornalistas
revelam uma imagem negativa, de crticas desconfiana e descrdito. Como agentes de defesa do cidado, a polcia est mal
posicionada, socialmente a sua imagem seria, segundo os
entrevistados, aproximada com a de bandido.
A
imagem da polcia est muito desgastada perante a opinio Pblica
A
sociedade jamais convida a polcia para participar de uma
festa;
A
sociedade reclama sem saber porque eles fizeram aquilo. Para no
morrerem tiveram que matar. preciso estar no lugar da polcia
A
sociedade v a polcia como um batedor, como um matador, como um
assaltante.
As
pessoas acreditam na polcia desacreditando.
Vo procurar a polcia com medo e receio, porque as
pessoas infelizmente sabem da m qualificao dos policiais.
Eu acho que a imagem da polcia bastante desgastada
perante a opinio pblica.
Quanto
ao papel do reprter policial, os mesmos apontam duas direes:
uma ao em parceria com o Estado, no sentido da investigao
e descoberta de crimes e da divulgao de ao do poder pblico,
e outra ao, articulada sociedade, voltada para o controle
social e a vigilncia das aes arbitrrias por parte dos
agentes de segurana do Estado.
O que se traduz nas seguintes agens das entrevistas:
atravs da denncia que em seguida vem a correo, a punio
e a apurao;
falar
o que a polcia est fazendo para solucionar e colocar os
responsveis na priso se forem julgados e condenados;
divulgar
as notcias sem distores;
A imprensa tem a liberdade de informar, se aconteceu o fato,
porque a imprensa se no divulgar, as pessoas no sabem. um
direito que ela tem de divulgar (...) costume das pessoas
quererem saber o que aconteceu.
denunciar
os atos arbitrrios que fazem a polcia e a justia, uma vigilncia
constante em defesa da sociedade(...) o reprter policial como
um promotor de justia, olhando os defeitos , os erros que
existem dentro da polcia e da justia
Assim,
o reprter policial seria uma espcie de detetive auxiliar, e um
vigilante da da ao policial para a sociedade.
O que configura mais uma vez a misso salientada
pelos entrevistados para caracterizar o seu trabalho jornalstico.
5.
CONSIDERAES GERAIS
O trabalho
sobre imagem social realizado com jornalistas da rea policial,
possibilitou levantar
alguns elementos de percepo desses agentes da notcia, acerca
de sua prtica profissional, assim como da violncia e da prtica
policial, dentre as quais destaca-se:
A prtica de
reprter policial, exige uma aproximao
direta do jornalista com fatos e pessoas em situao de
violncia, bem como a prtica dos agentes da rea de segurana
pblica. Esta aproximao produz uma relao de identidade
entre os reprteres e a prtica policial. Essa constatao,
foi observada a partir do cdigo lingustico utilizado pelos reprteres
, de perfil profissional, do significado do papel social de sua prtica
profissional. O que coloca o problema do compartilhamento de
valores e juzos entre estes dois segmentos sociais;
O reprter
policial apresenta a pgina policial ou a pgina que trata de
temas da rea de segurana , como desafio para o profissional de
comunicao. Esse desafio posto, face a necessidade
de aproximao direta prticas de violncia;
A sociedade
segundo os reprteres, estigmatizam a pgina policial. Para
eles, por exemplo, os segmentos mais favorecidos economicamente no
item ler socialmente as pginas policiais. Porm, afirmam que
uma pgina obrigatria para qualquer leitor,
independentemente de sua classe social;
Amizade segundo
os reprteres, um recurso
indispensvel para a obteno de dados para produo de matria
policial. Enquanto eles item ser possvel a obteno de
informao junto a polcia e seus rgos, o mesmo no
acontece junto a entidades da sociedade, exemplo igreja e assemblia
legislativa, etc.
Apesar dos reprteres
apresentarem razes
sociais para existncia
da violncia, hegemonicamente verifica-se
que na concepo deles sobre violncia, predomina a
associao direta entre pobreza e violncia. Para eles, espao
de pobreza espao de violncia.Esse espao chega a ser visto
de forma generalizada, como espao do mal.Com essa leitura,
revela-se a inexistncia de uma viso mais abrangente das prticas
de violncia;
Violncia para
a mdia segundo os reprteres policiais, constitui uma
mercadoria valiosa para empresas na rea da comunicao. A violncia
quanto mais anormal e alarmante for, maior seu efeito econmico.Esse
dado revela de certo modo, como a cultura da viol6encia vem sendo
explorada pelos meios de comunicao muito mais para provocar a
curiosidade do que informar e ou ampliar a concepo da
sociedade sobre o problema;
Identificado
com os policiais, o reprter policial tende de forma mais ampla
legitimar a ao da polcia frente a funo de segurana,
apesar de levantar alguns pontos crticos deste, entre os quais
despreparo para o processo investigativo e para a defesa da
sociedade;
Os reprteres
policiais ite a falta de legitimidade e descrdito da
sociedade em relao e a polcia.Segundo eles, a polcia no
est preparada para defender o cidado, embora este devesse ser
seu perfil ideal;
Os reprteres
policiais concebem a ao preventiva e ostensiva em defesa da
ordem, como a ao prepoderante da prtica policial.Por outro
lado, a ao em defesa do cidado aparece apenas no plano da
inteno o que deveria ser.Essa lwitura segundo eles,
comprovada pela imagem negativa da sociedade frente a polcia.
6. BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
2f1x
ADORNO,
Srgio. A Violncia na Sociedade Brasileira - Um
incloncuso em uma democracia no consolidada in: Sociedade
e Estado Vol X No. 2, Julho- dezembro 1995
BARDIN,
Laurence. Anlise de Contedo. SP, Livraria Matins Fontes
1977
BATISTA,Nilo.
Regras do mercado da informao sobre violnciain: Mdia
e Violncia Urbana. Rio de Janeiro, FAPERJ, 1994.
BICUDO,Hlio.
O Brasil Cruel e sem Maquiagem. SP
Ed Moderna 1994
DIAS,Lcia
Lemos et all. Cidadania e Imprensa na Paraba. Cadernos do CEDDHC
No. 2 Joo Pessoa .PB 1996.
ECO,Umberto.
Lector in Fabula. A Cooperao interpretativa nos textos
narrativos SP Ed
Perspectiva 1986
GMEZ,Herman.
Las notcias policiales em relatn e la legitimatin de
practicas y discursos institucionales.La production de las notcias
e la configuration de discursos hegemnicos.Trabalho
apresentado no
Encontro Tendncias atuais no estudo da Violncia,organizado
pelo Laboratrio de Estudos das Violncias /LEVIS,1996. Florianpolis,1996(Disponvel
na Internet: www.cfh.ufsc.br/ncleos-de-pesquisa/raiva/raiva.html)
JODELET,Denise.
Representao Social: Fenmenos, Conceitos e Teoria. Rio de
Janeiro FGV,1989.
LIMA,Roberto
Kant. A Polcia da Cidade
do Rio de Janeiro: seus dilemas e paradoxos. RJ,
Editora Forense, 1995
RIFIOTIS,T.
Entre dois amores. Apontamentos sobre um dilema tico no
estudo da viol6enciaFlorianpolis. 1996. ( www. Clh. Ufsc.br/ ncleos- de-pesquisa/ raiva/ raiva html).
_______.
Violncia e Cultura no Projeto de Ren Girard. XX Reunio Anual
da ANPOCS. Caxanb 1996 - mimeo.
_______.
Nos campos da Violncia. Diferena e positividade in: PEREIRA,C.A
M et all. Linguagens da Violncia . Rio de Janeiro 1997
(prelo)
SOARES,Luiz
Eduardo. Criminalidade e Violncia. Rio de Janeiro So Paulo e
Perspectivas Internacionais in: Comunicao e Poltica V No. 2 dezembro/94 - maro/95
Nova
Srie
SODR,Muniz.
seduo dos fatos Violentos Discursos sediosos: crime,
direito, sociedade (1) 207-214, Jan/junho 1996
VAN
DUK, Teun. A la ciencia del texto. Barcelona, Paidos,1996.
ZALUAR,Alba.
Memrial da Violncia
Campinas. Instituto de Filosofia e Cincias Humanas UNICAMP ,1994
ECO,
Umberto. Lector in fabula. A Cooperao
interpretativa nos textos narrativos.
So Paulo, Editora Perspectiva, 1986.
Van
DIJK, Teun. A. La
ciencia del texto. Barcelona,
Paidos, 1996.
BATISTA,
Nilo. Regras do
mercado da informao sobre violncia.
IN: MDIA E
VIOLNCIA URBANA. Rio
de Janeiro, Faperj, 1994, 99-106.
LIMA,
Roberto Kant. A Polcia da cidade do Rio de Janeiro:
seus dilemas e paradoxos. Rio de Janeiro, Editora
Forense, 1995.
SODR,
Muniz. A seduo
dos fatos violentos. Discursos sediosos: crime,
direito, sociedade (1):207-214, jan./jun. 1996.
GMEZ,
Hernan. Las
noticias policiales en relatin a la legitimatin de practicas y
discursos institucionales. La
productin de las notcias y la configuration de discursos
hegemnicos. (Trabalho
apresentado no Encontro Tendncias atuais no estudo da violncia,
organizado pelo Laboratrio de Estudos das Violncias/LEVIS,
1996). Florianpolis, 1996. (Disponvel na Internet: www.cfh.ufsc.br/nucleos-de-pesquisa/raiva/raiva.html)
|