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Militantes Reprimidos no Rio Grande do Norte
Mailde Pinto Ferreira Galvo
Livros e Publicaes

1964. Aconteceu em Abril
Mailde Pinto Galvo
Edies Clima 1994

1 de Abril

Alguns anos se aram desde os acontecimentos de 1964 no Rio Grande do Norte, mas as lembranas sobreviveram para transmitir o clima emocional daqueles dias. Talvez porque a emoo foi tanta, os fatos vo emergindo muito lentamente e lentamente vo compondo a histria da nossa luta e da nossa resistncia.

Na manh de 1 de abril, j deflagrada a crise poltica que implantou a ditadura militar no pas, recebi um telefonema do prefeito Djalma Maranho convidando-me a comparecer ao seu gabinete de trabalho na Prefeitura.

Os jornais do dia divulgaram a gravidade da crise. O “Dirio de Natal” noticiava a movimentao das tropas que se rebelaram no sul do pas para deporem o presidente Joo Goulart e dava conta da situao local, divulgando as seguintes manchetes e notcias:

IV EXRCITO DEFINIU-SE PELA DEMOCRACIA.

O Comandante do IV Exrcito, General Justino Alves Bastos, tambm tomou posio a favor do movimento revolucionrio iniciado ontem em Minas, a favor da democracia e pelo respeito da constituio.

Consta, a propsito, que dessa deciso, o general Justino Alves deu conta ao governador do Rio Grande do Norte, Sr. Aluzio Alves.

Idntica comunicao foi feita ao Quartel-General da guarnio federal, em Natal. Toda a tropa em Natal, est coesa e firme, obedecendo s ordens do general Justino Alves.

Desde a noite de ontem, esto em rigorosa prontido as tropas do exrcito, marinha e aeronutica aquarteladas em nossa capital...”

EXRCITO OCUPOU SINDICATOS E REDE FERROVIRIA FEDERAL. NO PERMITIR GREVES.”

Na mesma pgina estavam publicadas a nota oficial do prefeito Djalma Maranho e uma nota conjunta do Contra-Almirante Mrio Cavalcanti de Albuquerque, Comandante Naval de Natal e do Coronel Alberto Carlos de Mendona Lima, Comandante da Guarnio Militar de Natal.

A nota do prefeito, considerando a prefeitura o “quartel-general da legalidade e da resistncia” foi publicada nos seguintes termos:

NOTA OFICIAL DO GOVERNO MUNICIPAL DO NATAL.

O governo municipal do Natal, na hora grave e decisiva que o Brasil atravessa, torna pblico:

- A posio do prefeito Djalma Maranho de defesa da legalidade democrtica. A mesma posio assumida quando da posse do presidente Joo Goulart, transmitida atravs de pronunciamento oficial e de editorial da “Folha da Tarde”, jornal de que diretor.

- O prefeito Djalma Maranho junta a sua voz de todas as foras democrticas e populares do pas, na denncia aos governos de Minas Gerais, So Paulo, Guanabara e Rio Grande do Sul que, ontem pela madrugada, colocaram-se fora da lei, levados pelo desespero do reacionarismo contra as reformas de base, servindo de instrumentos e oferecendo suas falsas lideranas s foras do antipovo e da antinao.

- O prefeito Djalma Maranho, ao lado das foras populares e democrticas, conclama o povo para que se mantenha em permanente estado de alerta, nos seus sindicatos, diretrios, rgos de classe, sociedades de bairros, ruas e praas pblicas, na defesa intransigente da legalidade, que possibilitar a libertao do Povo e do Pas do imperialismo e do latifndio, a concretizao das reformas de base e a construo do amanh mais justo e mais feliz do Brasil.

- o prefeito Djalma Maranho, eleito pela vontade popular, cumpre a sua obrigao de dizer que a Prefeitura a casa do povo onde se instala, nesta hora, o QG da luta da legalidade e da resistncia.

- Finalmente, o prefeito Djalma Maranho reafirma o seu pronunciamento de 18 de setembro de 1961 que serviu de palavra de ordem para o Rio Grande do Norte: Esta a hora da opo – a legalidade Jango!

Prefeitura do Natal, 1-4-1964.

DJALMA MARANHO, Prefeito.

A nota dos comandantes militares denunciava uma preparao de greve geral por parte do prefeito e ameaava com o “emprego da fora e da violncia em defesa da ordem pblica, do atentado pessoa e propriedade privada.”

AO POVO DE NATAL.

Na qualidade de comandantes das guarnies Naval e Militar desta capital e deste Estado, e em observncia a instrues dos comandos superiores sediados em Recife-PE, sentimo-nos no dever de nos dirigir populao ordeira desta Cidade, com a finalidade principal de tranquilizar a famlia natalense, face aos acontecimentos que se desenrolam no sul do Pas.

Tendo em vista a ameaa do Senhor Prefeito desta capital, transmitida diretamente ao comandante da Guarnio Militar, de desencadear a greve geral em todo o Estado e, em particular, nesta capital, medidas preventivas e repressivas esto sendo adotadas pelas autoridades militares das Foras Armadas em Natal, em ntima ligao e entendimentos com o Senhor Governador do Estado, no sentido de impedir a todo custo, mesmo com o emprego violento da fora, caso necessrio, a perturbao da ordem pblica nesta capital e o atentado pessoa e propriedade privada.

Visam tambm estas medidas a, tanto quanto possvel, impedir ou pelo menos minorar, os efeitos da greve a ser desencadeada, sempre to prejudiciais populao civil, famlia local.

Em nome das Foras Armadas sediadas em Natal, dirigimos veemente apelo a todos os moradores da cidade no sentido de que cooperem nessa misso, mantendo-se em calma e em ordem, evitando as aglomeraes, permanecendo tanto quanto possvel em suas residncias, confiantes na ao preventiva e, se necessrio repressiva dos soldados, marinheiros e aviadores, que tm a honra e o prazer de conviver nesta cidade com to hospitaleira e ordeira populao.

Advertimos ao povo em geral, mais em particular s classes operrias e aos estudantes, que ficam terminantemente proibidas, por motivos bvios, proibio que ser assegurada pela fora se necessrio, as aglomeraes em logradouros pblicos, as eatas sob qualquer pretexto, os comcios, sempre visando manuteno da ordem Pblica.

Natal, RN, 1 de abril de 1964.

Contra Almirante MRIO CAVALCANTI DE ALBUQUERQUE Cmt Naval de Natal

ALBERTO CARLOS DE MENDONA LIMA – CORONEL Cmt da Guarnio Militar de Natal

As duas notas apresentavam o confronto desigual entre os militares e o prefeito Djalma Maranho que, numa atitude muito audaciosa para aquele momento, usou o direito de fazer publicar sua definio poltica em defesa das instituies democrticas, no momento exato em que era implantada a ditadura e retirados os direitos civis de todos os brasileiros, principalmente dos discordantes do golpe militar.

Com a oficializao da prefeitura como “quartel-general da legalidade”, ironicamente composto por alguns auxiliares, duas ou trs lideranas estudantis e sindicais munidos de um rdio porttil a pilha, Djalma provavelmente antecipou a interveno na prefeitura, priso e deposio do cargo para o qual fora eleito.

Diante do noticirio da imprensa e do movimento dos militares pela cidade, o nosso espanto era enorme e enorme era o medo de estar assistindo ao fim da democracia e da paz nacional. No chegamos a perceber, no entanto, a extenso do perigo que cercava os assessores do prefeito Djalma Maranho.

Naquela manh de 1 de abril, a Prefeitura de Natal encontrava-se quase deserta. A divulgao do “quartel-general da legalidade” no atraiu ningum alm do comum, na rotina diria da movimentao poltica do prefeito, que atendia normalmente, em seu gabinete de trabalho, as audincias solicitadas. Ali no se falava em preparao de greve nem havia sinal de organizao para qualquer resistncia.

O ambiente na antessala do gabinete do prefeito era de quase normalidade. Comentava-se a crise nos limites da preocupao comum a qualquer cidado.

Apresentei-me ao prefeito mais ou menos s nove horas. Na ocasio, despedia-se do professor Luiz Maranho Filho. Estavam srios e compreensivelmente emocionados. Luiz, que j fora vtima de outras prises em anteriores perseguies aos militares comunistas, acabava de informar que se recolheria ao stio de um amigo enquanto durasse a crise poltica e a movimentao de tropas pelas ruas.

Jipes e caminhes do Exrcito j eram vistos transportando militares armados com metralhadoras e fuzis para os pontos da cidade considerados por eles como estratgicos.

Era o incio da exagerada exibio de fora e de poder de uma ditadura que durou vinte anos.

Ali no gabinete do prefeito aconteceu, provavelmente, a ltima conversa pessoal dos dois irmos em liberdade. Luiz voltou ainda Prefeitura, mas no ficaram a ss. Encontrar-se-iam, depois, a bordo do avio que os transportou para o confinamento de Fernando de Noronha.

Quando Luiz se retirou, Djalma permaneceu em silncio por algum tempo. Tentei conversar sobre a crise, mas ele se mantinha reticente, como quem escolhe palavras. Comentou, apenas, que a situao nacional era grave e imprevisvel. Permaneceu em silncio e compreendi que precisava de companhia, mas dispensava o dilogo. amos alguns minutos recolhidos aos prprios pensamentos quando um funcionrio anunciou outras pessoas que chegavam e solicitavam ser recebidas.

Djalma recomendou-me que permanecesse na prefeitura; havia um telegrama para ser transmitido ele precisava que eu assumisse a responsabilidade de conseguir na sede do ento Departamento de Correios e Telgrafos.

Foram poucas as pessoas que chegaram, apenas assessores, estudantes e poucos polticos que, ansiosos por notcias da crise, buscavam esperanas e apoio. Para todos, Djalma representava, naquele momento, a nica liderana democrtica do Estado.

Ningum conseguia compreender que estavam todos irremediavelmente ss.

O expediente da prefeitura continuava em todos os setores de trabalho, apesar da inquietao visvel em cada funcionrio.

Nas ocasies em que a equipe se reunia, a comunicao era alegre e afetuosa. Naquela manh ainda pudemos sentir o prazer de estar juntos com alguns companheiros, sem percebermos que seria pela ltima vez.

Djalma recebia a todos com a expresso grave natural para aquele momento, mas em nenhum instante deixou de demonstrar a firmeza de seus princpios e convices. Estavam naturalmente preocupado e tenso, mas ainda transmitia a confiana e a coragem inerentes sua personalidade. Certamente pressentia os riscos que o cercavam; sem democracia no haveria futuro poltico. Manteve, at quanto possvel, sua atitude de resistncia.

amos aquele primeiro dia de abril entre os locais de trabalho e o gabinete do prefeito. A vida da cidade continuava dentro da possvel normalidade, com a populao mal informada e, aparentemente, indiferente.

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