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Militantes Reprimidos no Rio Grande do Norte
Ivaldo Caetano Monteiro

Textos
CARTA ABERTA A PAULO LOPO SARAIVA

Natal, 23 de janeiro de 1992.

Paulo Lopo Saraiva:

De frias por aqui, como fao todos os anos, acabo de ler o seu artigo “A QUEDA DO MURO DE BERLIM E A FACULDADE DE DIREITO DA RIBEIRA (I), publicado na Tribuna do Norte de 04 de agosto de 1991, e no fiquei nem um pouco surpreso com o seu contedo. Apenas me assomou uma dvida: o seu artigo uma reao entrevista que dei para a srie de reportagens HISTRIAS DA RESISTNCIA AO REGIME DE 64, em que a seu respeito afirmei ter sido um direitista de pouca expresso ou por me ter referido a uma das suas atividades direitistas?

Se uma reao ao que afirmei sobre ter sido um direitista de pouca expresso, bom comear a deixar de se dar uma importncia que quela poca voc no tinha. at bem possvel que, para os ordenadores das suas tarefas, voc prestasse um servio expressivo, mas, para ns, os estudantes tanto da Faculdade de Direito quanto da Universidade Federal do Rio Grande do Norte, suas atividades no o conduziam desejada e no alcanada expresso. Para lhe ser franco, eu nem teria me lembrado de voc, se o reprter, em meio a uma longa narrativa dos acontecimentos daquela poca, no lhe tivesse feito uma referncia, at meio sem inteno.

Agora, se o seu artigo reao a ter eu citado uma das suas atividades colaboracionistas com a Reitoria, a a coisa fica mais complicada, pois eu no tenho como suprimir aquele perodo histrico apenas para satisfazer os seus pruridos madaleneanos.

Mesmo sabendo a razo do seu artigo, a sua comunistofobia no mereceria de mim a mnima ateno se nele eu no houvesse sido citado com o evidente propsito de inverter o valor de um acontecimento, honroso para qualquer pessoa, como foi para mim: o ter ocupado o cargo de Procurador Geral do Estado de Mato Grosso.

Talvez no lhe importe saber que no assumi esse cargo em qualquer governo, mas sim, em 1987, no governo do PMDB, aps derrotar eleitoralmente a oligarquia local, incrustada no Poder desde os tempos da ditadura militar. Mesmo pertencendo notoriamente ao PCB, fui convidado pelo governador e aceitei assumir to honroso cargo. Fui o primeiro Procurador Geral do Estado de Mato Grosso depois que a oligarquia matogrossense foi alijada democraticamente do Poder.

E isso no ocorreu porque eu advogasse contra bias-frias mas exatamente pelo contrrio, pelas minhas atividades profissionais e polticas em favor dos trabalhadores. Alis, eu o desafio a provar um nico caso que seja, em que eu tenha advogado contra bias-frias, no s na minha advocacia privada como no exerccio do cargo de Procurador do Estado, aonde cheguei atravs de concurso pblico de provas e ttulos.

Voc diz que fugi da luta no Rio Grande do Norte. No final de 1969, a quem, como eu que acabara de cumprir pena de um ano de priso imposta pelos seus colegas de caserna, no restavam outras alternativas que no fossem me afastar para bem longe de vocs ou cair na clandestinidade para que fosse assassinado pelos seus colegas de farda, como fizeram com tantos outros companheiros, inclusive daqui mesmo do nosso Estado. Naquela poca, s quem ficou tranqilo aqui foram os colaboradores do regime militar. Que o diga o companheiro Gileno Guanabara que, libertado aps cumprimento de um ano de priso, foi novamente recolhido s masmorras do 16 RI, de onde saiu trs meses depois, sem que nenhum processo fosse instaurado contra ele e sem que at hoje saiba o motivo de sua arbitrria priso.

Nesse clima, eu, filho de operrio, morador da inesquecvel Casa do Estudante, recm-sado da priso que vocs me haviam imposto, e, por convico poltica, no disposto a cair na clandestinidade, a ida para Mato Grosso foi uma imposio das circunstncias, um caminho difcil mas, ao mesmo tempo, uma esperanosa sada para que eu conclusse meu curso de direito, impedido que fui de faz-lo em 1969, quando no permitiram que fizesse as provas mesmo na priso.

Mas a minha ida para Mato Grosso no significou o abandono da luta poltica. Na minha vida profissional conquistei o respeito dos meus colegas, tendo sido eleito para o Conselho Secional da OAB, e no plano poltico propriamente dito, participei de todas as campanhas pela redemocratizao brasileira e ajudei a reorganizar o PCB naquele Estado, quando o partido ainda estava em situao ilegal, da mesma forma que o fiz aqui, na dcada de sessenta no movimento estudantil.

Em seu artigo voc diz que o seu reencontro com os comunistas causa d e comiserao. A menos que voc tenha fingido com absoluta perfeio, no foi isso que demonstrou quando nos reencontramos em Cuiab, no auditrio da OAB onde proferia palestra. Descobrindo-me entre os assistentes e antes mesmo que trocssemos qualquer palavra, voc me elogiou publicamente. Aps a palestra, fomos jantar eu, voc e vrios colegas de l; todos viram e ouviram o seu entusiasmo falando sobre mim.

Mas no foi s em Cuiab que voc se derramou em elogios para comigo. No dia primeiro de fevereiro do ano ado, aps a solenidade de posse do colega Odlio Botelho na Presidncia da Secional da OAB, fomos ao Calamar e l, na presena de vrios colegas daqui, voc repetiu os elogios, lamentando, inclusive, que a minha inteligncia estivesse servindo a outro Estado.

O que voc no percebeu no entanto, foi que, nem l em Cuiab nem aqui, eu lhe fiz qualquer elogio. No que eu no saiba elogiar. Mas que, no seu caso, o seu ado no me animava nem mesmo a uma retribuio; sua suposta mudana – de que me falara em Cuiab – precisava ser testada. Vejo que foi acertada a minha cautela.

Depois de se referir a mim, voc diz que h outras converses dignas de um comentrio poltico. Subentende-se que me converti. Gostaria de saber a que me converti. Na dcada de sessenta eu era comunista e ainda continuo sendo; jamais pertenci a partido que no fosse comunista. Ento que converso foi essa que se operou em mim e que s voc conseguiu captar? Ser porque integro o quadro de Procuradores do Estado de Mato Grosso? Se for isso, lastimvel constatar que o seu arcabouo mental continua o mesminho, moldado na doutrina de segurana nacional, segundo a qual comunista para viver na clandestinidade, sob permanente represso policial-militar, sem o elementar direito de exercer a cidadania, sem participar das relaes de trabalho, sem, enfim, poder ter uma vida digna, de pessoa livre.

Voc, nos idos de 1968, defendia o socialismo pluralista? Gostaria que me provasse essa sua afirmao com artigos publicados. Mas esses artigos devero datar de antes de 1969, porque da em diante voc ter falado sozinho, pois o movimento estudantil tinha sido contido fora e seus lderes estavam presos ou ameaados de ser presos. Todos sabemos, quela poca, o regime militar usou certos colaboradores a fim de atingir os desgnios de arrefecer os ideais estudantis. Serviu-se dos amigos dos militares. Claro que voc no era um amigo dos militares. Voc era um dos militares. Ou j se esqueceu de que era (ou ?) um sargento?

Realmente o mundo mudou muito e os comunistas tambm mudaram muito (e isso deveria ser entendido como uma virtude), mas quem me parece que no mudou nada foram alguns direitistas daquela poca. Basta ver os chaves empregados em seu artigo: “s itiam partido nico”, “eram tambm ditadores”, etc. So chaves to repetidos que, na cabea deles, nem parece carecer de comprovao. Por que voc no comprova essa sua afirmao com algum artigo, discurso ou entrevista de um comunista da Faculdade de Direito da Ribeira, defendendo o partido nico para o Brasil? E ramos ditadores, mesmo sem estarmos no Poder? Isso um contra-senso, um chavo apenas. Ditadores eram vocs que estavam no Poder, que oprimiram, prenderam, torturaram e at mataram.

evidente que nem s os comunistas somos democratas – jamais reivindicamos essa exclusividade – nem s ns lutamos pela Assemblia Nacional Constituinte, mas tambm no nenhum ato de herosmo quer-la quando ningum mais era contra, nem mesmo o poltico do PDS, a quem, na poca, voc servia em Braslia.

Observo que, ontem como hoje, seguimos caminhos diferentes, nossas vidas no confluem: primeiro, porque eu abomino comportamento como o seu; e, segundo, porque no vislumbro a esperana de que voc venha a transformar-se, de verdade, em um novo homem.

Cordialmente, subscrevo-me

Ivaldo Caetano Monteiro


Publicada, em Natal, RN, no Jornal Tribuna do Norte – Caderno de Domingo – de 02 de fevereiro de 1992.

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