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Tecido Social Correio Eletrnico da Rede Estadual de Direitos Humanos - RN N. 033 – 06/04/04 342g5

AS CARAVANAS DO OS PRIMEIROS FRUTOS

Macau, vence a democracia: o Delegado abre mo do peixe

As Caravanas de Direitos Humanos do Rio Grande do Norte, projeto do Centro de Direitos Humanos e Memria Popular (CDHMP) de Natal que est trazendo pela primeira vez mecanismos estaduais de proteo e promoo dos direitos do homem s populaes do interior do Estado, esto dando seus primeiros frutos.

Uma das principais reivindicaes da populao de Macau, cidade da Regio Salineira do RN que, nos ados dias 5 e 6 de maro, recebeu a primeira das oito Caravanas que esto sendo realizadas no Estado, foi atendida pelas autoridades locais de segurana pblica como conseqncia da ao conjunta da sociedade civil organizada local, da Caravana de Direitos Humanos e das matrias sobre a cidade publicadas em Tecido Social.

No dia 24 de maro, atravs de uma carta ao Superintendente da empresa Salinor, Luiz Gonzaga Borella, enviada com cpia para o ento Corregedor Geral da Defesa Social, Tertuliano Cabral, o Presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos, Roberto Monte, o Promotor de Justia de Macau, Pedro Lopes, e o Presidente da Associao de Pescadores e Pescadoras de Macau, Francisco Cludio da Costa, o Delegado da Polcia Civil de Macau, Incio Rodrgues, anunciou que a polcia civil da cidade renunciou de maneira irrevogvel pescaria especial em uma barraca cedida pela Salinor, atividade que mantinha graas a um convnio com a empresa.

Tal pescaria, h muitos anos questionada pela Associao de Pescadores e Pescadoras de Macau e que foi objeto da ltima audincia pblica realizada na cidade, em 15 de outubro do ano ado, permitita que as polcias militar e civil, alm de poderem pescar em reas das quais a empresa se diz proprietria -embora tal direito de posse nunca foi comprovado - usufruissem do melhor horrio, o noturno, e pudessem vender o peixe obtido para supostamente - melhorar os salrios dos soldados.

Graas ao mesmo convnio, os pescadores que, antes que a empresa se apossasse de cerca de 5.000 hectares de terras da Unio e guas pblicas, tiravam seu sustento da pesca nas reas ocupadas pela Salinor s tm direito pesca no horrio diurno (o pior, porque quando os peixes se escondem) e em reas estritamente delimitadas pela empresa.

Esta relao espria entre a polcia de Macau e a Salinor fazia com que a primeira agisse como servio de capangagem, de segurana particular dos interesses da empresa. De fato, a Salinor foi muitas vezes responsvel por espancamentos, torturas, maus tratos e at mortes de pescadores que procuravam sustento para eles e as suas famlias nas reas das quais a empresa de diz proprietria. Tais violaes (muitas vezes denunciadas pela Associao de Pescadores e Pescadoras de Macau), foram perpetradas por vigias da Salinor mas, na maioria dos casos em que os pescadores iam Delegacia para denunciar violncias sofridas por funcionrios da empresa, no eram atendidos (os policiais, geralmente, no recebiam as denncias e no faziam o Boletim de Ocorrncia) ou eram considerados culpados ao invs de vtimas, sofrendo prises arbitrrias e torturas. Alm do mais, diversos soldados da polcia militar denunciaram, em diversas ocasies, que o lucro da venda do peixe pescado na barraca da Salinor no ia para eles e suas famlias, mas ficava nos bolsos dos que vendiam a mercadoria.

Tal situao, denunciada vrias vezes por Tecido Social, foi o tema de um encontro temtico da Caravana de Direitos Humanos, durante o qual a Promotora de Direitos Humanos Moema de Andrade, representante do Ministrio Pblico Estadual, o ex Corregedor Geral da Defesa Social, Tertuliano Cabral, o Vice-Presidente do Conselho Estadual de Direitos Humanos, Valdenor Flix, e o Coordenador de Direitos Humanos da Secretaria de Justia, Fbio dos Santos, ouviram as denncias dos pescadores e se comprometeram a tomar diversas providncias, entre as quais a de levar urgentemente para Macau uma Delegacia Mvel da Corregedoria da Defesa Social para apurar as denncias e afastar do cargo os policiais envolvidos.

A Delegacia Mvel chegou cidade na semana seguinte e, aps ouvir primeiro depoimentos de pescadores e em seguida depoimentos de vigias da Salinor e policiais da cidade, tomou uma srie de providncias imediatas que tiveram o importante efeito psicolgico de reestabelecer um clima de confiana na Justia dentro da populao de Macau.

Poucos dias depois, a carta do Delegado ao Superintendente da Salinor confirmou que a cidade est sendo atravessada por uma brisa de mundana. Ela selou o fim de uma relao anti-democrtica entre a autoridade de segurana pblica da cidade e uma empresa particular, abrindo o caminho para que tambm as outras questes ligadas ao assunto (a da propriedade das terras da Salinor, a da destruio do meio-ambiente e a do direito dos pescadores de pescar) encontrem uma soluo em tempos breves.

Embora seja apenas o primeiro o de um processo com certeza rico de obstculos, a deciso do Delegado Incio Rodrgues representa uma vitria da democracia e uma esperana para os cidados de Macau. Alm disso, ela a demostrao de que as Caravanas de Direitos Humanos podem ser o incio de um longo mas concreto processo de transformao, dependendo da vontade das organizaes, instituies e pessoas envolvidas de levar adiante os compromissos assumidos.

Embora consideremos que tal deciso devia ser tomada deste que o Delegado da Polcia Civil assumiu o cargo em Macau, e reiterando as crticas sua obstinao em mant-la que este jornal fez nos meses ados, felicitamos Incio Rodrgues pela sua escolha a favor da cidadania, da transparncia e dos Direitos Humanos, lhe desejando um bom trabalho na defesa dos direitos da populao macauense.

Antonino Condorelli

Veja tambm:
- A carta atravs da qual o Delegado de Macau renuncia pescaria especial da Salinor

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