Tecido
Social
Correio Eletrnico da Rede Estadual de Direitos Humanos
- RN
N.
029 – 18/03/04 3l1rt
OLHAR
SOBRE A CIDADE
Carnaubais:
um feudo no sculo XXI
Por
Antonino Condorelli
O municpio de Carnaubais, na regio do Vale do Au, sofre em
pleno sculo XXI os vexames de um regime feudal no qual o prefeito,
Luiz Gonzaga Cavalcante Dantas do PSB, conhecido como Luizinho,
faz o papel de Senhor, os Secretrios municipais o de bares,
os 10 vereadores da Cmara Municipal o de cortesos bajuladores
e a populao o de servos sem direitos, muitos pagos em bens
como na Idade Mdia.
O grande ditador de Carnaubais
A Comisso da Cidadania, nica organizao
da sociedade civil que tenta conscientizar populao do municpio
sobre a necessidade de transparncia na gesto pblica, denuncia
os mecanismos ilcitos atravs dos quais o prefeito de Carnaubais
e seus parentes, como uma famlia mafiosa, ocuparam todos os
espaos de poder pblico da cidade, construram em poucos anos
uma riqueza despropositada e implantaram um monoplio comercial
no municpio.
A Comisso tem cinco
representaes contra o Executivo local, sobre as quais os promotores
da Comarca ainda no emitiram sequer um parecer. Algumas questionam
licitaes municipais claramente fraudadas, realizadas entre
2001 e 2003. Atravs de uma delas, que apresenta graves irregularidades,
o irmo do prefeito, Paulo Cavalcante, que Secretrio de Educao
do municpio, obteve licena para vender a merenda escolar para
a Secretaria de Educao, ou seja, para ele mesmo. Os contratos
para pavimentar e asfaltar ruas e para transportes e imveis
de uso pblico tambm apresentam evidentes irregularidades e
foram concedidos a familiares do prefeito.
A relao dos contratos de cargos
comissionados do municpio, anexa pela Comisso da Cidadania
a uma das representaes, mostra de maneira gritante como grande
parte do Poder Executivo de Carnaubais foi literalmente ocupada
pela famlia de Luiz Gonzaga Cavalcante: 20 cargos comissionados
- Secretarias como a de Ao Social (da esposa do prefeito),
a de Educao (do irmo Paulo) e a de Finanas (de um primo),
Coordenadorias como a de Tributos (de uma cunhada), alm da
chefe de gabinete, fornecedores, contratados para o transporte
escolar, etc. so de familiares de primeiro grau de Luizinho.
Segundo Flvio Felipe de Souza, membro
da Comisso da Cidadania, existem tambm evidncias clarssimas
da compra de vereadores por parte do Executivo. Por exemplo,
vereadores que eram oposio e de repente aram a apoiar
o prefeito, poucos dias depois apareceram com um ou dois carros,
obtidos com contratos da Prefeitura assinados por laranjas.
De 10 vereadores que compem a Cmara Municipal de Carnaubais,
sete so governistas e trs no concorrem eleitoralmente com
o prefeito mas, na Cmara, votam os projetos do Executivo para
manter regalias pessoais. Isso faz com que, na hora de discutir
e aprovar as polticas pblicas municipais, o Executivo de Carnaubais
tenha 10 representantes e a sociedade nenhum.
Mas o monoplio da famlia Cavalcante no se limita aos poderes
pblicos. O prefeito utilizou seu mandato para contruir um monoplio
comercial que varreu a maioria dos pequenos comrcios de Carnaubais
e deixou em srias dificuldades de sobrevivncia os restantes.
A origem deste imprio comercial se remonta eleio
para Governador de 1990, quando Luiz Gonzaga Cavalcante fez
uma negociao com Lavoisier Maia para votar nele no segundo
turno (no primeiro, tinha votado em Salomo Gurgel, candidato
da Frente Popular Potiguar) em troca da garantia de negcios.
Graas a este acordo, pde contruir uma escola particular e
o prefeito da poca cedeu sete professores para ensinar nela,
pagos pelo municpio.
A partir dai, foi aperfeioando seus mtodos at chegar
ao poder e resolver usar o dinheiro pblico para seu enriquecimento
particular. As empresas da famlia de Luizinho tm garantia
de prestarem servios pblicos, o que faz com que as outras
da cidade e da regio tenham oportunidades muito reduzidas de
sobreviverem em Carnaubais.
Alm disso, existe uma prtica difusa na istrao
municipal de atrasar o pagamento dos salrios dos funcionrios
da Prefeitura e obrigar estes ltimos a receber em forma de
vales convertveis s nos comrcios da famlia Cavalcante. Ou
seja, o dinheiro pblico destinado ao pagamento dos funcionrios
utilizado para favorecer os interesses comerciais do prefeito
e sua famlia, enquanto exatamente como acontecia nos feudos
medievais os servos do Senhor do municpio s recebem em
comida e outros bens. O prefeito controla os recursos pblicos
de forma desonesta e violenta a legislao trabalhista, resume
Flvio de Souza, da Comisso da Cidadania.
Para o padro de Carnaubais, uma riqueza
como a acumulada pelo prefeito nos anos de mandato no tem a
mnima condio de ter sido realizada de maneira legal. Eis
uma lista de alguns comrcios e empresas controladas pela famlia
de Luizinho: Varanda Center, NL Contrues, Variedade Cavalcante,
Mini Preo Cavalcante, Mini Box Cavalcante, Super Box Cavalcante
I e II, Panificadora Cavalcante, Madereira Santa Terezinha,
Drogaria Lorena, Cunha Construes, Lotrica Felicidade, Acqua
Astral, M&R Modas, Zumotos, Papelarte e CELC.
J comparado com Augusto Pinochet em um cordel da Comisso
da Cidadania, Luizinho domina Carnaubais como um pequeno pai
(apelido com que Stalin gostava de se fazer chamar), que detm
um controle quase completo do poder econmico e poltico e de
todos os espaos de discusso pblica da cidade.
As representaes da Comisso perante
o Ministrio Pblico representam uma tentativa da sociedade
local de obter transparncia e justia, mas como acontece
amide os promotores da Comarca sequer se manifestaram ao
respeito delas. Com a Caravana de Direitos Humanos, a Rede Estadual
de Direitos Humanos RN pretende fazer chegar estas denncias
diretamente ao Ministrio Pblico estadual.
Iluminao pblica: furto do prefeito populao
A Comisso da Cidadania vai fazer outra representao perante
o Ministrio Pblico contra a Prefeitura, pois ela est praticando
assalto contra a populao cobrando um servio que no presta,
como afirma Flvio de Souza. O ativista se refere Taxa de
Iluminao Pblica (TIP): a Prefeitura cobra este servio de
2,16 a 2,60 reais mensais por cidado, mas no o fornece em
toda a zona rural e parte da cidade. Estamos cansados de pagar
para ficar no escuro, diz Flvio. E acrecenta: Nosso objetivo
que o MP faa uma recomendao pblica para que o Poder Executivo
de Carnaubais preste o servio e devolva os meses que cobrou
sem fornec-lo.
Umbuzeiros: comunidade discriminada
Um grupo de agricultores da comunidade de Umbuzeiros, na zona rural do municpio
de Carnaubais, sofre graves discriminaes por parte do poder pblico
porque se recusa a vender seus votos para o prefeito. De fato,
a Prefeitura fornece um trator para os agricultores realizarem
o corte de terra, com o leo financiado pela Petrobras (que
tem atividade de extrao no municpio, apesar deste no ver
nem a sombra dos benefcios do petrleo que possui). Porm,
os agricultores de Umbuzeiros que se recusam a votar no prefeito
no recebem o trator, tendo direito apenas ao corte de terra.
A isso assoma-se a ausncia de polticas
pblicas para a zona rural, que fez com que a comunidade sofresse
graves privaes em conseqncia do atraso do inverno que aconteceu
nos ltimos anos. A
nica coisa que os agricultores da zona rural de Carnaubais
tm a f em So Jos, diz Flvio de Souza, porque o Poder
Pblico no tem nehuma poltica pblica para a agricultura familiar,
que inclua uma estratgia de segurana alimentar.
gua contaminada
A populao de Carnaubais sofre outra grave violao dos seus direitos: a
contaminao da gua que chega nas casas do municpio. Como
informou a Tecido Social Levani Avelino de Souza, professor
e membro da Comisso da Cidadania, ela vem dos rios Piranhas
e Panon, altamente contaminados. No hospital pblico de Santa
Luzia, a gua usada sem nenhum tratamento. Toda famlia de
Carnaubais consome gua contaminada, afirma o professor. E
ningum faz nada. Mais o que esperar de um poder pblico que
usa o dinheiro da populao para promover seus interesses particulares?
Veja
tambm:
- A terceira Caravana de
Direitos Humanos chega na sexta a Carnaubais
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