Rede
Lusfona de Direitos Humanos
Manifesto
da Rede Lusfona
de Direitos Humanos 542u56
Ns,
integrantes da Rede Estadual de Direitos
Humanos do Rio Grande do Norte (REDH-RN),
Estado da regio Nordeste do
Brasil, na esquina do continente sul-americano,
e da Comisso Nacional para
os Direitos Humanos e a Cidadania
(CNDHC) de Cabo Verde vimos manifestar
publicamente a nossa clara inteno
de trabalharmos juntos para criar
uma Rede de Direitos Humanos que abranja
todos os pases de lngua
portuguesa, iniciando com Cabo Verde
e o Brasil: uma “rede de redes”
orgnica e plural que tome forma
no ciberespao e a nvel
presencial atravs do compartilhamento
permanente de informaes
e experincias, a criao
de espaos (virtuais ou no)
de articulao e dilogo,
projetos e aes conjuntas
e qualquer outra forma possvel
de unio, tendo como eixos
norteadores a promoo
de todos os direitos da pessoa, a
Educao em Direitos
Humanos, a arte e a cultura e o resgate
da memria histrica
dos povos lusfonos.
Aps
a participao da Rede
Estadual de Direitos Humanos do Rio
Grande do Norte na I Conferncia
Internacional de Direitos Humanos
de Cabo Verde a convite da Comisso
Nacional para os Direitos Humanos
e a Cidadania e a vinda da prpria
Comisso a Natal, capital norte-riograndense,
no mbito de uma visita ao Brasil
para dialogar com instituies
e conhecer experincias locais
de Direitos Humanos, consideramos
amadurecidas as condies
para se criar a Rede Cabo Verde de
Direitos Humanos, nos moldes da Rede
Brasil na qual estamos trabalhando
h anos: uma grande central
multimdia de dados e informaes
sobre Direitos Humanos que atinja
toda Cabo Verde e os cabo-verdianos.
A verso beta da Rede Cabo
Verde de Direitos Humanos, que lanamos
no ar nos dias da visita da Comisso
ao Rio Grande do Norte, representa
o incio prtico deste
processo, embrio da futura
Rede Lusfona que pretendemos
construir juntos.
Muitos
so os elos que unem Cabo Verde
e o Nordeste do Brasil, as faces africana
e latino-americana de uma mesma realidade.
So elos naturais (as mesmas
paisagens, flora e fauna comuns),
histricos (a mesma opresso
colonial, a mesma miscigenao
tnica, lingstica
e cultural) e culturais (o mesmo idioma,
as mesmas razes), mas so
tambm profundos elos espirituais.
Um
deles se encarna na figura do educador
Paulo Freire, fundador de uma pedagogia
que parte das exigncias do
ser humano e tem como fim a libertao
do indivduo, a pedagogia do
oprimido que representa um ponto de
referncia tico e histrico
firme para o Rio Grande do Norte,
pois foi uma experincia que
comeou aqui, nos anos Sessenta,
e se materializou nas inesquecveis,
emocionantes 40 horas de Angicos,
um dos 167 municpios deste
Estado. Paulo Freire iniciou sua experincia
de educao popular
para a libertao das
massas neste pequeno municpio
do Serto potiguar e a prosseguiu
na frica, na terra de Amlcar
Cabral, nos deixando o relato desta
agem no seu livro Cartas da Guin-Bissau.
O iderio de Paulo Freire
um dos pontos de partida desta nossa
parceria, que inicialmente ter
um carter virtual, mas que
virar cada vez mais real,
palpvel pois h nela
elementos muito fortes de educao,
memria histrica, arte
e cultura e, principalmente, a viso
global de que vivemos em um mundo
em transformao e com
ele temos que nos confrontar.
Os
elos que unem Cabo Verde e o Brasil
am tambm por uma comum
histria de infmia.
Nossos pases esto
separados por um vasto Oceano, e neste
Oceano despontam ilhas simblicas
de tiranias, como a de Fernando de
Noronha, antigo presdio de
presos polticos de ditaduras
brasileiras, e Tarrafal, campo de
concentrao salazarista
e de patriotas africanos de triste
memria. Sem esquecer a Ilha
de Gor, entreposto
africano do vil comrcio de
escravos por onde aram vinte milhes
de cativos. preciso resgatar
este sentimento comum de indignao,
recuperar a memria das atrocidades
que juntos sofremos.
esse resgate um dos eixos da nossa
Rede Estadual de Direitos Humanos
que, alm de Paulo Freire,
bebe na fonte de Eduardo Galeano e
Darcy Ribeiro: a memria como
forma de devolver a vida
voz dos oprimidos; a viso
da nossa realidade como fruto desgarrado
de uma violao originria,
a idia das veias abertas;
o resgate das nossas razes
africanas, indgenas, ibricas
e de outras partes do mundo.
Neste
processo de resgate, temos muito a
compartilhar: a frica fincou
razes profundas no Brasil,
virou um elemento decisivo da identidade
do nosso povo e influenciou nossa
cultura, nossa percepo
de mundo, nossa maneira de falar e
at nosso jeito de transmitir
saberes, conhecimentos e tradies.
A oralidade, trao ancestral
da frica profunda,
a mais caracterstica forma
de preservao da cultura
popular em vrias regies
brasileiras. O resgate das nossas
identidades, das nossas histrias
a necessariamente pelo resgate
da oralidade, no Brasil como em Cabo
Verde e no resto da frica
Lusfona.
Todos
os elos que existem entre ns
mostram que a Rede Lusfona
de Direitos Humanos que pretendemos
construir a partir do nosso dilogo
inter-atlntico est
embasada na mesma raiz cultural, que
queremos respaldar e enriquecer com
elementos de interatividade e multimdia,
criando espaos virtuais de
articulao, debate
e troca de informaes.
Acreditamos
que a Rede j iniciou-se na
prtica com a parceria e cumplicidade
entre a Comisso Nacional para
os Direitos Humanos e a Cidadania
de Cabo Verde e a Rede Estadual de
Direitos Humanos do Rio Grande do
Norte, representando o Brasil. Mas
ela est aberta para acolher
organizaes da sociedade
civil, instituies,
redes e pessoas de todos os nossos
pases irmos que desejem
apostar nesta ousadia: Portugal, Angola,
Moambique, Guin-Bissau,
So Tom e Prncipe
e Timor Leste.
Ansiamos
a insero de todas
as foras vivas que buscam
o novo, com o mesmo esprito
daqueles que buscaram a liberdade
dos nossos povos, dos mais conhecidos
at aqueles milhares, milhes
de lutadoras e lutadores sociais annimos
que no dia a dia, como ns
hoje, foram a seiva mais pura da construo
deste novo que almejamos.
Estamos
abertos para fazer e discutir com
quem queira prticas de promoo,
proteo e garantia
dos Direitos e valorizao
dos Desejos Humanos, de resgate da
memria histrica dos
vencidos e humilhados, da arte e cultura
dos nossos povos.
Sonhamos
com uma Rede como a do Rio Grande
do Norte que, embora to nordestina
no seu nascedouro, apenas
a parte visvel de uma grande
Rede Nacional de Direitos Humanos
em gestao no Brasil:
uma rede que se configure como um
grande sistema de promoo,
proteo e garantia
de todos os direitos da pessoa humana,
de maneira indivisvel e universal,
juntando todas aquelas e todos aqueles
que lutam pelo Humanismo na sua forma
mais generosa, aquelas e aqueles que
tm a profunda convico
de que um outro mundo, continentes
compartilhando ideais no so
s possveis, mas imprescindveis
e necessrios no atual estgio
que atravessa a humanidade.
Uma
Rede Lusfona de Direitos Humanos
, antes de mais nada, um estado
de esprito, um ideal comum,
uma aspirao compartilhada.
Mas tambm uma realidade
em gestao que s
ir existir e crescer quando
aparecerem elos orgnicos, parcerias
permanentes como a que comeamos
com a Comisso Nacional para
os Direitos Humanos e a Cidadania
de Cabo Verde. Uma parceria que se
alimentar de aes
concretas como, no mais imediato,
a reformulao do jornal
digital da Rede Estadual de Direitos
Humanos do Rio Grande do Norte, Tecido
Social, com amplas pinceladas de Cabo
Verde, trazendo notcias da
nossa Rede em gestao.
Enfim,
queremos que nossa parceria seja o
primeiro o para materializar um
intercmbio entre o Brasil,
a frica Lusfona e
os outros pases de lngua
portuguesa em uma perspectiva “glocal”
re-pensando Paulo Freire, este grande
elo que existe entre todos ns,
para re-definir o global e o local
trabalhando prxis de micro-polticas,
mas resgatando o valor universal (hoje
mais do que nunca) da solidariedade
e do bem comum, universalizando a
prtica de compartilhar saberes
e experincias.
Queremos,
em definitivo, fazer valer o contedo
do manifesto do Ncleo de Direitos
Africanos Amlcar Cabral, brao
da Rede Estadual de Direitos Humanos
do Rio Grande do Norte para a frica
de lngua portuguesa:
“
nossa meta buscar - aonde estiver
- uma nova globalizao
humana, algo que seja feito com fios
de ternura e cnticos de emoo,
com olhos estupefatos e peito aberto
maior aventura: a de fazer
parte de um mutiro histrico
que busca integrar a parte mais sofrida
e mal-amada da humanidade (...).
Enquanto
o mundo dorme, fazendo ouvidos de
mercador, aos lamentos de coraes
despedaados, lanamos
nossas esperanas em forma
de chama, chama de vida, chama de
chamado, chama que no se extingue
pois brota do que h de mais
puro e sagrado em ns:
O
Desejo de Ser.
O
Desejo de Amar.
O
Desejo de Agir”
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