Histria
dos Direitos Humanos no Brasil
Encontros
Nacionais do MNDH
Movimento
Nacional de Direitos Humanos 6k5h5u
1982
| 1983
| 1984
| 1986
| 1988
| 1990
| 1992
| 1994
| 1996
1998
| 2000
| 2002
| 2004
| 2006
| 2008
| 2010
| 2112
1983
II
Encontro Nacional de Direitos Humanos do
MNDH
1983, Taboo da Serra-SP
III
— DOCUMENTO FINAL DO II ENCONTRO DE
DHs
INTRODUO
Irmos
e irms
Companheiros
e companheiras
Ns,
militantes de cerca de 60 entidades, entre
as quais Comisses de Justia
e Paz, Centros de Defesa dos Direitos Humanos,
representantes de outros organismos da Igreja
e da Sociedade civil juntamente com membros
da Igreja Metodista, todos vindos de 17
Estados a Federao, nos reunimos
em Taboo da Serra, em So
Paulo, dos dias 25 a 2~ de janeiro, para
celebrarmos o II Encontro Ecumnico
de Comisses e Grupos de Direitos
Humanos do Brasil.
Os
trs dias e meio que amos juntos
foram marcados por um espirito de calorosa
fraternidade, de troca de experincias,
de estudo, de debates srios e de
busca de pistas de ao comum.
Deixamo-nos iluminar pela Palavra do Deus
dos pobres e oprimidos de cujos direitos
Ele o primeiro Defensor.
Agora,
em sinal de comunho com todos vocs
e com os que se comprometem na defesa e
promoo dos direitos
humanos especialmente dos direitos dos empobrecidos
do nosso povo lhes enviamos essa carta.
Nela constatamos as violaes
que nossos irmos e irms
sofrem, analisamos como nossas entidades
enfrentam a violncia e estabelecemos
algumas pistas de ao que
visam fortalecer a promoo
da vida, supremo dom do Criador.
CONSTATAES
E VIOLAES DOS DIREITOS HUMANOS
NO BRASIL
1.
Terra
Em
nossos debates, conclumos que a
situao do uso e posse da
terra no Brasil, tanto na cidade quanto
no campo, cada vez mais desfavorvel
aos trabalhadores.
Durante
o ano de 1982, constatamos formas as mais
diversas de violncia contra os trabalhadores,
tendo por motivo bsico a questo
da terra:
Na
cidade, pioram as condies
dos favelados, seja no tocante
moradia, seja quanto aos demais direitos
bsicos ligados vida (alimentao,
saneamento bsico, sade,
trabalho, educao, transportes
coletivos, lazer, participao
social e poltica). Expandem-se os
loteamentos clandestinos em nossas cidades,
inclusive com a conivncia dos
poderes pblicos. E os pobres tambm
so, com frequncia, vitimas
de despejos em benefcio da propriedade
privada.
A
recesso econmica tem levado
tambm ao rebaixamento, cada vez
maior, das condies de vida
das classes mdias de tal forma que
constatamos um grande avano
na proletarizao dessa camada
social.
O
Sistema Financeiro da Habitao
por sua vez tem contribudo para
agravar essas condies,
no conseguindo reduzir o deficit
de moradia e fugindo de sua finalidade
social bsica que a de permitir
ao povo o o casa prpria.
Por
outra parte, multiplicam-se em todo o pais
as situaes de extremo sofrimento
dos desabrigados, vitimas de secas
ou enchentes, cujos efeitos so
agravados pela incompetncia dos poderes
pblicos e pela corrupo,
alm do uso das verbas pblicas
em funo dos interesses do
governo e de seus aliados.
No
campo, a estrutura do uso e posse da terra
tem favorecido, cada vez mais, o latifndio
e a grande empresa rural observando-se o
avano das multinacionais, associadas
ou no, aos interesses dos poderes
pblicos e privados em detrimento
dos posseiros. meeiros, parceiros. arrendatrios
e pequenos proprietrios. A terra
tornou-se objeto de especulao,
sendo comprada (mediante qualquer expediente)
para se transformar em reserva de valor.
Em outras palavras, como j assinalou
a Conferncia Nacional dos Bispos
do Brasil, a terra de especulao
toma o lugar da terra do trabalho.
Uma
permanente represso de foras
policiais e de capangas dos latifundirios
tem atingido os trabalhadores rurais brasileiros
e suas lideranas alm
dos cristos e pessoas de boa vontade
que, com eles, trabalham por uma sociedade
mais justa.
importante
assinalar que, em nossas reflexes
e debates, reafirmamos nosso repdio
Lei de Segurana Nacional
e a todas as leis inquas e igualmente
atentatrias aos direitos humanos,
vigentes em nosso pas, como por
exemplo a Lei Anti-Greve, a CLT, os artigos
155 (permite a decretao
do estado de sitio) e 158 (permite a decretao
do estado de emergncia) da Constituio.
Ao
considerarmos como principal instrumento
de sustentao do regime brasileiro
de governo, o qual em oportunidades incontveis
demonstrou ser contrrio aos mais
legtimos interesses e aspiraes
do nosso sofrido povo, exigimos a revogao
imediata da Lei de Segurana Nacional.
Entendemos
que a revogao desta lei,
como das demais acima apontadas, deva ar
pelo Congresso Nacional. Assim, conclamamos
os representantes do povo brasileiro,
no Poder Legislativo, a se comprometerem
nesse sentido.
Acreditamos
que, dessa forma, unidos, percorreremos
o caminho da construo de
uma sociedade livre e justa, de acordo
com o plano de Deus.
3.
Desemprego e subemprego
Agrava-se
a situao do desemprego e
do subemprego, no campo e na cidade,
em todas as regies do pais. As maiores
vitimas so os trabalhadores.
sobre os quais recai o peso da recesso
econmica (que no
um fenmeno casual mas conseqncia
de fatores estruturais ligados ao sistema
capitalista).
A
atitude do governo diante do problema do
desemprego se orienta para garantir os interesses
dos detentores do capital em prejuzo
dos trabalhadores. mais e mais explorados,
como se evidenciou na recente mudana
da lei salarial.
4.
Violncia policial
Constatamos
que no Brasil, crescem as arbitrariedades
da Polcia e tm como alvo
privilegiado os pobres (especialmente os
negros). Bairros populares e favelas
so considerados, por principio,
reas suspeitas, sofrendo constantes
investidas da Polcia. Nas prises.
a tortura permanece como a forma principal
de interrogatrio. tendo ocasionado
freqentes mortes. Cadveres
so encontrados nas periferias das
cidades e do campo, sendo sabido que tais
assassinatos em sua grande maioria, so
realizados por policiais. A pena de morte
no existe na lei, mas j
se tornou uma prtica quase legal,
j que os assassinos raramente
so identificados.
O
que mais chama a ateno
a impunidade dos atos criminosos cometidos
por policiais.
5.
Presos polticos
Constatamos
a existncia de uma represso
poltica seletiva e a continuidade
da aplicao da Lei de Segurana
Nacional contra lideranas sindicais
e populares. A anistia continua restrita:
centenas de militares e funcionrios
pblicos federais ainda no
tiveram garantidos os seus direitos de reintegrao
ao trabalho. Os casos dos desaparecidos
polticos brasileiros ainda es to
por esclarecer e ainda h exilados.
No ltimo ano, a represso
seletiva tem atingido particularmente jornalistas,
como o caso de editores indiciados
com base na Lei de Segurana Nacional,
e de jornalistas presos no Paran
e Rio de Janeiro.
6.
Padres ses e posseiros
Refletimos,
tambm, durante este Encontro, sobre
a situao dos padres Aristides
Camio e Francisco Gouriou e dos treze
posseiros do Araguaia, condenados (ao final
de um processo escandalosamente cheio
de erros e manipulaes) pela
sua luta em favor da justia e dos
direitos dos pobres.
Com
eles, est encarcerada toda a Igreja
de Jesus Cristo no Brasil. Entendemos que
o caso dos padres e posseiros do Araguaia
utilizado, pelo governo, como exemplo
do que pode ocorrer com todos os que
lutam pela justia na regio
amaznica e em todo o pas.
7.
ndios
Os
povos indgenas do Brasil continuam
sofrendo os efeitos de uma poltica
expansionista do grande capital, sendo considerados
no como seres humanos livres e dignos,
mas como obstculos a serem
removidos, custe o que custar. Em funo
dos faranicos projetos oficiais,
as terras indgenas so loteadas
e foras repressivas so
utilizadas para intimid-los. A FUNAI
(Fundao Nacional do ndio),
o GETAT (Grupo Executivo de Terras
do Araguaia e Tocantins) e outros rgos
continuam a cumprir seu papel de agncias
avanadas da integrao
que nada mais que a preparao
do clima para o posterior esmagamento dos
povos indgenas.
8.
Discriminao da mulher e
do menor
Verificamos
durante este Encontro, que, apesar de toda
a evoluo na luta pela valorizao
da mulher nestes ltimos anos no
Brasil, ela continua a ser discriminada
pela sociedade em geral, particularmente
no trabalho, na prostituio
e na publicidade e tambm na estrutura
eclesistica.
Por
outra parte verificamos a intensa explorao
a que so submetidos os menores,
precocemente colocados no mercado de
trabalho e vitimados por todo tipo de violncia.
9.
Discriminao racial
Constatamos,
igualmente, a continuidade da discriminao
racial contra os negros, expressa nas dificuldades
de o ao trabalho, no tratamento
a eles dispensado pelos meios de comunicao,
no tato de serem tambm considerados,
em principio, como suspeitos nas investigaes
policiais em que so da mesma maneira
as maiores vitimas.
10.
Meios de comunicao
Em
termos de direitos humanos, as violaes
tambm ocorrem ao nvel dos
meios de comunicao
de massa, tanto na divulgao
sensacionalista dos casos policiais
que envolvem gente do povo, quanto na promoo
da violncia policial. Determinados
jornais e programas de televiso
estimulam esse tipo de arbtrio.
Do mesmo modo, a chamada grande imprensa
muitas vezes se omite na defesa e promoo
dos direitos humanos no tanto pelo
desinteresse dos que neles trabalham mas
principalmente por causa dos interesses
econmicos a que estes meios esto
ligados.
11.
Perseguio Igreja
Refletimos
sobre a perseguio
igreja no Brasil, representada pela
campanha de difamao contra
bispos, padres e agentes pastorais pelo
episdio da falsificao
do jornal O So Paulo
e de cartilhas polticas alm
de documentos eclesisticos,
e do recente sequestro do Pe. Antnio
Haddad em Belo Horizonte.
A
Igreja que se compromete com os direitos
humanos j tem seus mrtires
e sente na carne a bem-aventurana
das perseguies.
12.
Violncia em El Salvador, Guatemala
e Honduras
Constatamos
os inquos nveis de violao
dos direitos humanos, especialmente da gente
pobre de El Salvador, Guatemala e Honduras,
pelas mesmas foras que tambm
atuam em nosso pais, quer dizer, os donos
do capital e os grandes latifundirios
que usam da Polcia e das Foras
Armadas, como seu brao estendido.
Nos
dias em que estivemos reunidos, vimos um
documentrio sobre El Salvador e
nos debates fez-se presente a sofrida
sorte dos irmos daquele pas.
13.
Resistindo s violaes
dos Direitos Humanos
Apesar
de todo este quadro em que as foras
da morte ainda prevalecem, a resistncia
do povo no foi quebrada. Ela se
revelou nas mais diferentes formas
de denncia e de exigncia
de uma sociedade digna e humana.
Um
exemplo disso o surgimento em todas
as regies do pas de comisses
e centros de defesa e promoo
de direitos humanos com a participao
de trabalhadores do campo e da cidade.
Muitas
vezes a violncia de determinados
casos exigiu uma reao imediata
de nossas entidades sem deixar espao
para um trabalho mais conscientizador
junto aos atingidos. Tais prticas,
aparentemente assistencalistas,
no representam a metodologia mais
permanente por ns intencionada
e utilizada.
Esta
metodologia visa favorecer a organizao
do povo por ele prprio, mediante
um levantamento da situao
a partir do conhecimento da realidade em
que ele vive, atravs de comisses
de bairros, de reivindicaes
por ele feitas e de fundao
de grupos populares de defesa e promoo
dos seus direitos.
Muitas
de nossas entidades tm contado com
o apoio da Igreja local, outras tiveram
que caminhar sozinhas diante da omisso
de alguns bispos, padres e pastores. A grande
maioria tem buscado articular-se com outros
movimentos populares como sindicatos,
associao de bairros, entidades
representativas da sociedade civil e da
Igreja.
Algumas
carncias so tambm
muito evidentes em nossa caminhada: insuficiente
assessoria jurdica, pequeno nmero
de militantes, precariedade de meios
materiais e financeiros e pouca disponibilidade
de tempo dos membros participantes.
evidente, nestas entidades, a conscincia
quanto aos riscos do compromisso com as
lutas dos oprimidos. Esse risco se traduz
em ameaas, perseguies,
perda do emprego e prises. E tambm
na incompreenso por parte de quem
no percebe o carter libertador
do Evangelho.
No
final deste II Encontro apesar de todas
as dificuldades verificadas, as comisses
e grupos de direitos humanos esto
convencidos de que seu trabalho faz avanar
a luta por unia sociedade mais justa
e mais humana para todos.
14.
Pistas de ao: resistindo
e avanando
Refletimos
sobre o agravamento da crise econmico-poltica
brasileira, constatando que os custos da
atual recesso (que constituem no
uma causa mas o efeito de estruturas socio-econmicas
injustas, prprias do capitalismo),
recaem principalmente sobre as classes trabalhadoras.
O
elevado ndice de desemprego imposto
pelo Governo, as recentes mudanas
na lei salarial e os grandes investimentos
na produo de armas em detrimento
da economia popular, so exemplos
muito claros neste sentido.
Por
outra parte, analisamos — com perplexidade
— a retomada da represso poltica
seletiva contra pessoas e instituies
democrticas sob inspirao
da Lei de Segurana Nacional e repelimos
a hiptese de ocorrer neste ano o
recrudescimento desta escalada repressiva.
Em
termos de conjuntura ps-eleitoral,
entendemos que a vitria das
oposies em alguns estados
brasileiros abre perspectivas para um maior
respeito aos direitos bsicos ligados
vida, o que ser garantido
atravs de nossa organizao
e nossas lutas.
Com
vistas a consolidar nosso trabalho e com
o objetivo de reforar a frente de
resistncia contra as violaes
aos direitos humanos, concordamos em
levar prtica as seguintes
pistas de ao:
A.
Preliminar
Acreditamos
nas possibilidades de organizao
e resistncia popular. O povo como
agente de sua histria.
B.
Linhas gerais
1.
Articulao das Entidades
a partir de trs eixos:
1.
Trabalho
Luta
organizada em todos os nveis por
melhores salrios, contra o
desemprego.
/o:p>
2.
Terra
Luta
organizada em todos os nveis por
terra para morar e trabalhar, para todos.
Formao de uma T
urbana articulada com a T existente.
3.
Represso
Luta
organizada em todos os nveis contra
todo tipo de represso. Campanha
nacional contra a violncia policial
(com destaque discriminao
racial) em concordncia com a CF/83.
Reforo do movimento das mes
das vitimas da policia (ROTA, etc.).
II.
Fortalecimento, multiplicao
e manuteno dos movimentos
populares:
1.
intercmbio regional e nacional das
entidades;
2.
promover a articulao entre
movimentos populares;
3.
politizao das lutas populares.
Procurar estratgias para sensibilizar
e comprometer a Igreja Institucional.
C.
Metodologia
I.
Informao (sobre conjuntura
e superestrutura) as entidades am
as informaes s bases,
em linguagem popular.
II.
Educao e mobilizao
para a ao: para que as bases
assumam o processo educativo.
III.
Apoio/ao junto aos movimentos
populares: ampliando a unio
e a capacidade de resistncia
e organizao dos trabalhadores.
D.
Eventos
I.
III Encontro Nacional — 1984 —
Vitria.
II.
Encontro das Entidades do Nordeste sobre
o grave problema da seca.
III.
Eventos nas regies, objetivando
a consolidao e ampliao
das Regionais.
Servir
vida — este dom supremo de
Deus
—
continuar sendo a grande motivao
de nossa luta. Escolhe a vida e vivers,
nos diz a Palavra da Revelao.
E a vida humana somente quando
vivida em solidariedade e em comunho
como irmos e irms numa mesma
terra comum. com todos, especialmente com
os empobrecidos,
Taboo
da Serra, So Paulo, 29 de janeiro
de 1983.
IV
— RELATRIOS REGIONAIS
ATIVIDADES
REALIZADAS EM 1982
CENTRO
DE DEFESA DOS DIREITOS HUMANOS
Rio
Branco — ACRE
METAS
ESTABELECIDAS PARA 1982:
—
Apoio aos sindicatos.
—
Continuidade no trabalho de representantes
de bairros.
—
Assessoria a grupos ou entidades do interior.
1.
Atividades realizadas
a)
Atendimento no planto a 620 casos,
sendo os principais problemas:
—
Questes trabalhistas.
—
Problemas de Terra.
—
Problemas familiares.
b)
Acompanhamentos:
—
Tringulo Novo; Cidade Nova; Terminal
da Cadeia Velha; Campo Esperana;
Comisso de Direitos Humanos
do Quinari (Reunies); Associao
Empregadas Domsticas; Orientao
para a criao da Associao
dos Trabalhadores da Construo
Civil de Boca do Acre.
2.
Treinamentos dos Direitos Humanos
—
31 de julho a 1 de agosto —
Direitos Individuais — Movimentos
populares e partidos polticos.
—
19/setembro O Poder no Brasil e Eleies.
—
11-12/dezembro/82 — Participao
no curso de anlise da realidade
(1 ano).
3.
Assessoria Jurdica
—
Posseiros de Xapuri, soltura de pessoas
que se encontravam presas h vrios
meses sem processo (Brasilia).
—
Processo do Chico Mendes.
4.
Divulgao e outras lutas
Viglia
em favor dos presos do Araguaia.
Participao
na concentrao dos trabalhadores
no 1 de maio.
Participao
no comit de apoio aos professores
em greve — abril/82.
Caminhada
— Primeiro ano da morte de Joo
Eduardo.
Denncia,
a nvel nacional, do caso de Pedro
Marques (atentado)
Solidariedade
aos jornalistas da Gazeta
(LSN).
Solidariedade
— Greve de professores e garis. Rio
Branco, 29 de novembro de 1982.
^
Subir
1982
| 1983
| 1984
| 1986
| 1988
| 1990
| 1992
| 1994
| 1996
1998
| 2000
| 2002
| 2004
| 2006
| 2008
| 2010
| 2112 |