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Globalizao Econmica, Polticas Neoliberais e os Direitos Econmicos, Sociais e Culturais

Celso Lafer
I
Senhor Presidente, Doutor Marcio Sotelo Felippe, meus companheiros de mesa, minhas senhoras e meus senhores. O primeiro ponto que eu gostaria de abordar so os termos de referncia a partir dos quais estamos hoje discutindo os itens deste primeiro . Por isso, a primeira pergunta que cabe fazer o que globalizao?:
Se ns olharmos isto numa perspectiva histrica, pode-se dizer que se trata de uma tendncia de longo prazo iniciada no sculo XVI com a expanso do universo econmico europeu. Por outro lado, se quisermos olhar isto de uma maneira mais circunscrita, podemos dizer que o que caracteriza a globalizao nesta virada do milnio so os dados da inovao tecnolgica, que aceleram o tempo e encurtam o espao. Isto teve um impacto na economia, nas finanas, na segurana internacional, nos valores e na informao. Da uma diminuio do significado das fronteiras fronteiras essas que deixaram de ser fronteiras de separao tal como elas se configuraram a partir da criao do Estado nacional. Esta diminuio do significado das fronteiras, no entanto, no quer dizer a diminuio do significado do Estado e do seu papel. Isto porque claramente o destino e as expectativas das pessoas esto ligadas ao desempenho das comunidades polticas a que pertencem.

Neste sentido, a primeira observao que eu gostaria de fazer que se a grande crise, que foi a crise de 29, foi uma crise de mercados, a crise dos anos 90 uma crise do Estado. Conseqentemente, se os direitos econmicos, sociais e culturais so crditos do indivduo em relao coletividade, e se na construo dos direitos econmicos, sociais e culturais foi o Estado que assumiu normalmente a responsabilidade de saldar, em nome da coletividade, estes crditos do indivduo, a crise do Estado , por definio, um problema para a efetividade dos direitos econmicos, sociais e culturais.
A segunda observao que eu gostaria de fazer, ainda nesta reflexo sobre os termos de referncia, que os fatores tcnicos claramente no fazem a histria, mas modificam as condies a partir das quais os Homens a fazem. Por exemplo: a existncia das armas nucleares no gera a guerra, mas gera uma situao a partir da qual a guerra e a paz a a ser conjeturada. Nesta linha de raciocnio sobre o papel da ao humana na Histria, diria que a queda do Muro de Berlim e o fim da Unio Sovitica trouxeram novas caractersticas para o funcionamento do sistema internacional. H vrias leituras sobre qual o significado desta grande
mudana.

H uma leitura que todos provavelmente esto lembrados, que a leitura que faz Hobsbawm no seu livro A era dos extremos. Ele diz que o sculo XX um sculo curto. Este sculo curto se configura pelo desafio da Revoluo Russa, inicia-se a partir da I Guerra Mundial e se encerra com a queda do Muro de Berlim e a desagregao da Unio Sovitica. H uma leitura simetricamente oposta de Hobsbawm, que a leitura de Furet. Furet diz que o fio condutor do curto sculo XX a luta do liberalismo ocidental contra os regimes totalitrios. H uma terceira leitura, a de Carl Schmitt e de Nolte, que caracterizam o sculo XX como uma guerra civil mundial iniciada a partir de 1917, e que de um lado colocou o universalismo utpico democrtico de Wilson e de outro a revoluo mundial de Lnin. Estas leituras so as leituras a partir das quais Habermas trabalha as constelaes que se configuram nesta abertura do milnio.
Eu pessoalmente diria que, independentemente destas trs leituras, o que me parece caracterizar o sculo XX o de ser o sculo das relaes internacionais. As relaes internacionais transformaram o mundo do sculo XX de maneira muito mais expressiva do que ocorreu em sculos anteriores. As relaes internacionais aram a ser uma instituio
dominante no mundo e tm um papel em matria de Direitos Humanos, e este papel que eu vou tentar sucintamente explorar.
Antes, enfim, de fechar esta discusso sobre os termos de referncia, acho til fazer uma terceira observao: o fim da Guerra Fria, a queda do Muro de Berlim, a desagregao da Unio Sovitica, geraram uma exacerbao do que ns poderamos chamar de realismo poltico, ou seja, a idia de que o que importa para a ao poltica a ao estratgica. lidar com fatos do poder. Justamente tudo aquilo que o nosso querido Governador Montoro dizia que era uma viso pobre da realidade. E dizia que era uma viso pobre da realidade porque havia uma frase de Teillard de Chardin que ele costumava e tinha gosto de citar, e que norteava a sua ao tudo aquilo que se eleva permite a convergncia. E a convergncia, portanto, neste plano superior, o que eu vou tentar sucintamente explorar hoje neste .
II
Neste sentido, penso que o grande evento matriz em matria de Direitos Humanos a Declarao Universal de 48. A Declarao Universal de 48 teve claramente um objetivo, que foi o de traar uma poltica do Direito. Esta poltica do Direito, no plano internacional, se traduziu no reconhecimento de que existem valores que pesam nas decises do poder, na prtica dos Estados, e no processo de criao de normas de Direito Internacional Pblico. A Declarao Universal, como um documento embasador de uma poltica do Direito, vem tanto enfrentando no plano interno e no plano internacional resistncias quanto contabilizando resultados. Isto resulta da interao entre fato, valor e norma que caracteriza o processo jurdico, como explicita o Professor Miguel Reale. Nesta anlise sobre os Direitos Humanos, e inclusive sobre os direitos econmicos, sociais e culturais, pode-se dizer que eles reconhecem valores.
Os valores, como pontua Miguel Reale, so um bem cultural. Como todo bem cultural, tem um e, uma base na realidade, mas tem
igualmente um significado que aponta para uma direo de dever ser. Ns ouvimos hoje nas frases que foram mencionadas a reflexo que o Governador Montoro fez sobre a cincia, que pode nos dizer o que mas no nos esclarece sobre aquilo que deve ser. E neste sentido fica claro que o Direito uma expresso do mundo da cultura, onde o valor tem um e na realidade mas tem um significado, uma direo que aponta para um caminho.
Os valores tambm tm vrias dimenses e a primeira delas a da gradao hierrquica, a da sua importncia, pois os valores tm peso distinto. Nosso Coordenador, Doutor Marcio Sotelo Felippe, justamente ao falar na sua introduo abertura deste Seminrio, insistiu neste tema da hierarquia dos valores e sublinhou a importncia dos direitos econmicos, sociais e culturais, dando a eles muito certeiramente uma dimenso de hierarquia. Da a noo de valores fundamentais.

Nesta discusso sobre os Direitos Humanos no plano interno e no plano internacional pode-se dizer que a histria um processo aberto, e neste processo aberto h situaes que ora favorecem a prevalncia dos Direitos Humanos ora oferecem resistncia sua afirmao. Nesta relao entre realizabilidade e inexauribilidade so os dados que importa mencionar. Todo valor, na medida em que um valor, tem um e na realidade por isso esse valor realizvel. Mas nenhum valor se esgota na realidade porque sempre possvel ter mais Direitos Humanos, mais entendimento, mais justia, da essa idia de uma vis diretiva que esta dimenso de inexauribilidade. E isto tudo coexiste numa dialtica de implicao e mtua polaridade. E no h dvida de que neste sentido o sculo XX representa a percepo de que os Direitos Humanos so um adquirido da civilizao, um adquirido que ora pode se adensar, ora pode se fragilizar.
Como sabem, a idia dos Direitos Humanos representa, como diz Bobbio, uma mudana da figura dentica originria, ou seja, do dever do sdito para o direito cidado. E esta agem do dever para o direito significa o reconhecimento da perspectiva ex parte populi da
perspectiva dos governados. Ela fruto de um conjunto de legados que se adensam; o legado da Grcia a liberdade de pensar como pluralidade de pensar; o legado de Roma o papel do Direito como um instrumento importante e autnomo da convivncia coletiva; o legado do Cristianismo que o reconhecimento da igualdade da natureza humana independentemente dos invlucros da cidadania, por isso a democracia crist a que o Governador Montoro se filiava tem nesta dimenso da igualdade de todo ser humano, tal como expressa pelo Cristianismo e por So Paulo, uma fonte inspiradora; a idia do liberalismo, que significa que o governo para o indivduo e no o indivduo para o governo, e o legado do socialismo, ou seja, esta exigncia da igualdade perante a vida, e a cultura concebida, como eu lhes dizia, como o direito de crdito de cada ser humano de participar do bem-estar social, daquilo que a espcie humana num processo coletivo vai acumulando no tempo. Toda idia dos Direitos Humanos uma idia de domesticar o poder, todos os tipos de poder o poder cultural, o poder econmico, o poder poltico, subordinando-o aos interesses da cidadania.
III
No plano internacional, a evoluo da temtica dos Direitos Humanos distinta daquela que ocorreu no plano interno. No plano interno, como sabem, h uma primeira gerao de direitos, que so os direitos civis e polticos, h uma segunda gerao que so os direitos econmicos, sociais e culturais e h direitos de titularidade coletiva.
No plano internacional, a positivao dos Direitos Humanos se faz de forma distinta, e se faz de forma distinta porque no plano internacional ns tambm temos pelo menos trs leituras da realidade internacional. Uma leitura de que o mundo internacional o mundo de Maquiavel e de Hobbes, ou seja, a do realismo do poder onde o que organiza a percepo da realidade o risco da guerra e a possibilidade da paz, onde o tema dos Direitos Humanos aparece como algo apenas til ou prtico num deter-minado momento. H uma segunda leitura, a de Grocio: na vida
internacional existe conflito mas existe cooperao, e que possivel, atravs da Diplomacia e do Direito, trabalhar os Direitos Humanos como um item da sociabilidade da agenda internacional. E h, finalmente, uma viso kantiana que parte do pressuposto que existe uma razo abrangente da Humanidade, e que com base nesta razo abrangente da Humanidade possvel ir alm dos interesses dos Estados, pensando e realizando esta viso mais ampla. Da os temas globais, que no caso dos Direitos Humanos encontra depois da Declarao Universal de 1948 a sua grande expresso na Conferncia de Viena de 1993 sobre os Direitos Humanos. Eu diria que toda a realidade internacional tem componentes hobbesianos maquiavlicos, componentes grocianos e componentes kantianos. E o bom juzo o juzo que sabe discernir em cada uma destas configuraes o que prevalece.
A Declarao Universal, como eu lhes dizia, representou uma poltica do Direito. Ela foi o resultado de uma viso de que a experincia totalitria tinha sido uma ruptura indita em relao tradicional preocupao com o bom governo. E que era necessrio incluir o tema dos Direitos Humanos no plano internacional, pois a presena em larga escala dos refugiados, dos aptridas, dos deslocados no mundo viabilizaram a idia fora, que uma idia de Hannah Arendt, de que o direito a ter direitos s poderia comear a efetivar-se se prevalecer o direito de todo ser humano hospitalidade universal. Eu insisto que neste final de sculo, e no incio do milnio, esta noo de hospitalidade universal significa que as pessoas precisam estar vontade e em casa no mundo. E na medida em que os dados que ns conhecemos sobre a excluso social, sobre a marginalidade, so o que so, as pessoas no esto tendo direito hospitalidade universal, e que preciso levar adiante esta poltica do Direito traada pela Declarao Universal.
A Carta das Naes Unidas e o sistema da ONU foram operacio-nalizando esta poltica do Direito, atravs de uma positivao crescente dos Direitos Humanos no plano internacional. Nisto se inclui o Pacto de 1966 sobre os direitos econmicos, sociais e culturais. Enquanto
prevaleceu no mundo um sistema de polaridades definidas leste, oeste, norte, sul o que caracterizou a poltica dos Direitos Humanos no plano internacional foi a seletividade. Os Estados Unidos insistiram nos direitos de primeira gerao, que so os direitos civis e polticos, fruto da herana liberal; a Unio Sovitica interpretou os Direitos Humanos luz da importncia dos direitos econmicos, sociais e culturais, e na confrontao Norte/Sul os pases do terceiro mundo articularam direitos de titularidade coletiva, como o direito ao desenvolvimento, o direito paz, o direito ao patrimnio comum da Humanidade no caso dos fundos oce-nicos. Neste jogo, a impregnao kantiana da temtica dos Direitos Humanos teve suficiente fora para operar uma coexistncia pacfica no plano internacional destas vrias geraes de direitos permeadas pelo tema da seletividade.
A queda do muro de Berlim, como um evento matriz, fez com que no mundo de hoje confrontamo-nos com o jogo contraditrio de dois tipos de fora: as foras profundas da unificao e da globalizao, que so foras centrpetas, e as foras centrfugas da fragmentao, ou seja, de um lado a tendncia a globalizar o espao mundial, globalizar no apenas no plano econmico, mas no plano de segurana, no plano da informao, no plano dos valores, e de outro, ao mesmo tempo uma tendncia desintegradora destas foras e deste mpeto de globalizao.
Neste sentido, a Conferncia de Viena de 1993 representou uma extraordinria expresso do melhor de uma ilustrada lgica de globalizao. Ela deu sequncia Declarao Universal de 48, pelo consenso dos Estados, pela atuao da sociedade civil atravs da presena de organizaes no-governamentais e ela superou, no plano conceitual, a idia da seletividade, pois insistiu na universalidade, indivisibilidade e interdependncia de todos os Direitos Humanos, transcendendo assim por meio desta razo mais abrangente a razo mais circunscrita de uma viso seletiva. Endossou a democracia, como forma de governo mais favorvel para a tutela dos Direitos Humanos, e reconheceu o seu papel em matria de paz. Este consenso que se alcanou em Viena, afirmador da interdependncia dos Direitos Humanos no plano internacional, significou do ponto de vista da discusso j mencionada a percepo de que os Direitos Humanos so um adquirido axiolgico e, portanto, algo com o qual devemos poder afirmar a hierarquia no plano dos valores. Mas, eu diria para ir concluindo, que o que se alcanou em Viena foi um minimalismo tico, aquilo que um interessante filsofo do Direito que Michael Waltzer chama de uma moralidade rala thin morality, que requer uma obra dedicada de adensamento.
Quais so as dificuldades para este adensamento? Do ponto de vista do tema que ns estamos hoje tratando, eu diria que h uma clareza que os direitos econmicos, sociais e culturais integram esta noo de um patrimnio e de um adquirido civilizatrio, porm a sua dificuldade se coloca no plano da realizabilidade, e se coloca no plano da realizabilidade porque, como eu disse na abertura da minha exposio, se a crise de 29 foi uma crise de mercados, a crise dos anos 90 uma crise do Estado. E esta crise do Estado, deste ponto de vista, se coloca no plano de quem que vai saldar estes crditos que os indivduos tm em relao coletividade. Um crdito para o qual preciso ter recursos e para os quais um Estado fragilizado, inclusive na sua capacidade de promover bem-estar social, se coloca com clareza.
IV
Para concluir, eu faria uma ltima observao, lembrando um pouco a discusso que ocorreu agora em Florena sobre o reformismo progressista, governana progressista ou terceira via. As observaes que faria so sinteticamente as seguintes: como eu lhes dizia, o fim da Guerra Fria contribuiu para o realismo poltico e para pouco espao na agenda para uma viso voltada para princpios diretivos, para valores. muito interessante que as personalidades que esto procurando construir uma nova identidade internacional para a esquerda tenham sentido a necessidade de ir alm da ao estratgica e do saber tcnico, para uma reflexo sobre valores e princpios diretivos. Cada um dos que estavam l presentes
trouxeram o resultado da experincia histrica de seus respectivos pases; se, por exemplo, Jospin trazia a experincia da tradio socialista sa ou Schroeder da tradio alem, Blair trazia a do Partido Trabalhista, e Clinton a experincia do New Deal e daquilo que foi a ao de Roosevelt para responder crise dos mercados de 1929. E eu creio que se o grande tema da esquerda , como diz Bobbio, o tema da igualdade, o grande desafio que se coloca para uma identidade internacional de esquerda no plano mundial o que fazer com a desigualdade em escala planetria. E foi isto que o Brasil, pelas palavras do Presidente Fernando Henrique Cardoso, colocou, com muita propriedade, neste tipo de discusso, que tambm uma expresso dos dilemas da realizabilidade dos direitos econmicos, sociais e culturais no mundo neste final do sculo XX.
Muito obrigado.


Paulo Srgio Pinheiro
Algum com muita propriedade lembrou e ns tambm deveramos registrar a luta de um importante militante de Direitos Humanos, que acabou de falecer, que o Padre Chico, da Pastoral Carcerria, que durante longussimos tempos teve a coragem de lutar pelos direitos civis dos condenados nas Penitencirias de So Paulo. A minha tarefa vai ser enormemente facilitada porque o Ministro Celso Lafer, com a clareza que lhe peculiar, definiu os termos de referncia das questes que nos foram colocadas. Ento, confortavelmente, eu s vou ressaltar dentro da questo da globalizao dos direitos econmicos, sociais e culturais alguns aspectos, a saber justamente o que ele acaba de combinar e ns nem havamos combinado o problema da pobreza e da desigualdade em nvel planetrio, as caractersticas principais da globalizao que poderiam ter contribudo para este resultado, a esperana aberta por um novo paradigma de anlise e, muito brevemente, eu vou retomar as transformaes que no final deste sculo nos permitem alguma esperana no sistema internacional de proteo dos Direitos Humanos. Eu vou tentar, como ele fez, me manter dentro dos 15 ou 20 minutos. Ns estamos vivendo num mundo cada vez mais complexo, em comparao no apenas com os simplismos da Guerra Fria somamos isto, mas em relao, como Celso Lafer disse, globalizao do final do sculo XIX. As distines entre privado e pblico parecem ter ido pelos ares entre setores privados e pblicos, e mesmo entre guerras civis internacionais, como se v na regio oriental da frica, por exemplo, no conflito entre o Paquisto e a ndia ou na guerra do Kosovo; estas distines so extremamente problemticas e precrias. Esta complexidade implica, obrigatoriamente, que a globalizao traz no seu bojo avanos e retrocessos, e que ela no pode necessariamente nem ser diabolizada nem ser simplesmente exaltada. Eu tento fazer alguns apontamentos que podem servir para o debate. O primeiro a falta de regras claras agravando uma sensao geral de vulnerabilidade. O ento embaixador Celso Lafer presidiu por um ano o Conselho da Organizao Mundial do Comrcio OMC, e ns sabemos os progressos imensos em termos de regulamentao do comrcio que foram realizados, hoje coroada com a eminente entrada da China. No podemos dizer o mesmo quanto estabilidade dos sistema financeiro. Eu vou me permitir ler aqui um trecho, peo que prestem bem ateno, e vou revelar no fim quem o autor deste trecho; s se algum leu este texto pode adivinhar, mas creio que ningum vai saber. O que est na agenda hoje a necessidade de alcanar a igualdade de condies, com base em regras verdadeiramente equilibradas, que permitam a todos os pases aproveitar e desenvolver as suas vantagens comparativas. Uma boa ordem internacional deve incluir mecanismos para assegurar que a mobilidade do capital sirva, primor-dialmente, ao objetivo que lhe d sentido e justificao moral: favorecer o crescimento econmico mundial propiciando aplicaes eficientes aos excedentes de poupana disponveis em nvel global. Os problemas enfrentados desde a crise asitica mostraram o impacto que a instabilidade do sistema financeiro internacional pode ter sobre as sociedades. Desacelerou-se o desenvolvimento econmico em nvel mundial a um custo social alto, e h um efeito sobre a confiana dos diversos atores no fun-cionamento dos mecanismos internacionais. O sistema internacional deve oferecer mecanismos para solucionar problemas do relacionamento comercial e financeiro entre os Estados. O sistema internacional deve tambm, o que muito importante, a adequada relao entre a lgica do mercado internacional e as necessidades sociais internas de cada Pas. Este texto poderia ser atribudo a qualquer fora do espectro poltico brasileiro, acho que um grande consenso em relao a esta posio, e trata-se justamente da conferncia do Presidente Fernando Henrique Cardoso na reunio sobre governabilidade progressista que Celso Lafer se referia em Florena. Isto uma manifestao de enorme consenso no Sul e de grande delicadeza e moderao no debate internacional. O que me espantou foi a reao pela televiso eu no estava l do Presidente Clinton, que com uma cara que eu no via to amarrada desde a tentativa de sua deposio pelo Congresso americano no processo de impeachment, em que se permitiu citar como lio para o Brasil o exemplo de Uganda e do Chile como pases que fizeram a lio de casa. O Norte pensa que o problema est dentro de cada casa e eles no tm nada a ver com esse problema da desigualdade no sistema internacional. E outro, o primeiro Ministro Blair, que calcula cada gesto que ele faz tem um focus group para decidir gesticulava tanto e estava absolutamente surpreso com esta proposta extremamente moderada do Presidente Fernando Henrique Cardoso. Essa anedota irresponsvel que eu conto em termos de mostrar a resistncia do Norte a qualquer tentativa de disciplinar a instabilidade do sistema financeiro internacional. O primeiro Ministro Leonel Jospan, certamente, e o primeiro Ministro de Portugal certamente se situam, apesar de estarem no Norte, num espectro diferenciado do Presidente Clinton e do primeiro Ministro Blair. O emprego e o trabalho parecem ameaados, largos contigentes das classes trabalhadoras e agora das classes mdias so dramaticamente reduzidos, houve um desgaste do direito do bem estar social e dos direitos dos sindicatos, h uma ameaadora desestabilizao dos empregados e dos desempregados. Novos pobres foram gerados pela competio tecnolgica, foram agravados desequilbrios sociais, que esto na raiz do aumento da violncia e da vitimizao tanto no Norte como no Sul, e que certamente no podem ser resolvidos pelo mercado. H no mundo econmico um contingente de pobres invisveis, que no tm o a nenhuma poltica compensatria, parcelas vastssimas de pobres e miserveis que no tm o a nenhum direito. H espantosas desigualdades que se reproduzem por geraes e geraes dando pleno sentido noo de violncia estrutural criada por John Galton, uma violncia que seria engendrada estruturalmente pelas instituies do Estado e pelo setor privado. Cada vez fica mais claro, como lembrava o Programa das Naes Unidas para o Desenvolvimento PINUD recentemente, que a pobreza uma violao dos Direitos Humanos, que pobreza e desigualdade minam os Direitos Humanos, aumentam a precariedade do o de todas as sociedades ao direitos que so alvo deste Seminrio. Eu simplesmente talvez chova no molhado, mas acho que importante lembrar a situao peculiar do Brasil nesta situao. Eu tambm coloco simplesmente alguns casos que, quem sabe, podero ser retomados nas discusses desses dias. O Brasil no uma pas pobre, ns estamos entre as 10 maiores economias industriais do mundo, somos a oitava ou a nona dependendo do ano, de 1998 ou 1997. Mas ns temos um dos maiores graus de desigualdade do mundo. Somos o nico pas do mundo em que a razo entre a renda dos 20% mais ricos e dos 20% mais pobres mais de 30 vezes, precisamente 32,1. Em outros termos, os 10% mais ricos so detentores de 50% da renda, enquanto que os 50% mais pobres se apro-priam de menos de 10% da renda. O Brasil um pas de renda mdia, cuja a renda per capita alis dobrou entre 1970 e o final da dcada dos 90, mas tem largos contigentes vivendo na pobreza, em conseqncia da desigualdade. Trata-se do terceiro pas entre os pases uma expresso cara a Celso Lafer, de Incio de S entre os pases baleia, que tm mais pobres do mundo em termos absolutos, superado apenas pela ndia e pela China. Outra caracterstica da desigualdade no Brasil que se trata de um fenmeno que continua de forma persistente h mais de 20 anos. Com base no PINAD a Pesquisa Nacional de Amostra por Domiclio o ndice GINI, que uma das medidas, gira em torno de 0,6, sendo apenas ultraado com ndice pior pela Serra Leone. O problema no conjuntural, mas decididamente estrutural. Essa persistncia prosseguiu praticamente inabalada durante todo aquele perodo histrico de 20 anos, tanto na agem do perodo autoritrio para a democracia, da alta inflao para a moeda estvel, do crescimento para a recesso, sem que os nveis de desigualdade fossem alterados. Mas precisamente somente em dois momentos desses 20 anos houve uma alterao: durante o Plano Cruzado, bastante curta, e durante o Plano Real, mais acentuada. Entretanto, aps essas duas incidncias, a desigualdade retomou os nveis habituais do perodo. Apesar do crescimento extraordinrio da economia brasileira ter beneficiado todos os estratos da populao, elevando a renda mdia de todos os dcimos da populao, a desigualdade permaneceu praticamente inalterada. A desigualdade de renda entre os diversos estratos da populao sobretudo determinada por disparidades regionais que eu no vou detalhar. A estabilidade econmica essencial para reduzir a pobreza e no d para ficarmos nos engalfinhando a este respeito, mas com o crescimento, como ficou demonstrado nos anos 70, quando houve altssimas taxas de crescimento, a desigualdade no foi afetada porque o crescimento no suficiente para reduzir a pobreza em prazo curto. mais fcil reduzir a pobreza diminuindo a desigualdade. Se reduzirmos mesmo ligeiramente a desigualdade, poderemos obter timos resultados, mesmo num crescimento zero, como a situao atual da economia brasileira; possvel diminuir a pobreza, e quem diz no um rgo da oposio, mas o IPEA. No Brasil, alm de tudo isso, necessrio igualmente investigar a pluralidade de causas da pobreza, como por exemplo os fatores de ordem demogrfica e populacional que explicam de alguma forma as disparidades de renda. Mas os fatores que melhor explicam a desigualdade se situam na combinao entre a qualidade do trabalhador e a economia. O Brasil est na situao pior entre todos os pases industrializados em termos das condies do trabalhador, especialmente em educao. Continua alarmante a populao de adultos analfabetos funcionais, isto , pessoas com menos de quatro anos de estudo. A escolaridade da populao de 10 anos ou mais era em 1998 de apenas 5,4 sries completas, considerada insuficiente para fazer frente s crescentes exigncias do sistema produtivo. O Brasil est quase chegando a assegurar a escola fundamental para todas as crianas, entretanto a educao superior continua invel para 90% da populao, reservada apenas para os 10% da populao onde se situam os grupos mais favorecidos. O gasto pblico com as universidades uma rea onde os mais pobres no so absolutamente contemplados. Enfim, h uma assustadora discriminao racial na educao; enquanto a probalidade de uma criana preta o termo que o Censo usa de entrar na segunda fase do ensino fundamental 15 pontos percentual menor que uma criana branca, a probalidade do estudante preto que entrou no segundo grau de chegar ao ensino superior 25 pontos percentuais menor que um estudante branco, segundo dados do relatrio PINUD/IPEA do governo brasileiro. Depois dessa digresso ptria, eu queria retomar um terceiro conceito tambm caro a Celso Lafer que ajuda a explica a situao da globalizao, que a temtica da identidade. A globalizao faz erodir a autoridade do Estado, altera o conceito de soberania e de nacionalidade e aumenta a importncia da identidade. Era muito fcil as naes se identificarem no campo socialista e no campo capitalista eu j lembrei as guerras onde isso aparece de forma mais evidente. Quanto mais global, quanto mais globalizado o mundo, mais vital se torna a busca da identidade. Eu adoro esse paradoxo. O quarto conceito, tambm paradoxal, seria diante de tudo isso, de todos esses conceitos que eu venho levantando, o aprofundamento da responsabilidade. A noo de soberania se torna irrelevante. Por exemplo, Celso Lafer j lembrou para as grandes violaes dos Direitos Humanos e do Direito Humanitrio. No extraordinrio que ns chegamos ao final do sculo com os Tribunais Internacionais da ex-Iugoslvia e do Ruanda, o Tribunal Penal Internacional que afinal est criado, ainda que no ratificado pelos pases e, por ltimo, mas no menor, a maravilhosa deteno, mesmo que seja numa gaiola dourada, numa casa de 40 quartos e oito empregados, perto de Londres, do General Pinochet. Com essa responsabilidade aumentou a necessidade da acountability, palavra que no existe em portugus, da responsabilizao dos governantes, da luta contra a corrupo, por exemplo. Aumentou a criminalidade internacional organizada, mas as redes de informao instantnea, a visibilidade da televiso via satlite ou a cabo, a sofisticao das comunicaes melhorou a investigao da lavagem de dinheiro, do contrabando de armas e do narcotrfico. A globalizao no torna o estado impotente foram palavras do Primeiro Ministro Leonel Jospan em Florena. Paradoxalmente, o deslizamento para o Estado mnimo, que parece implicar a globalizao, demonstrou ser essencial o velho papel do estado como defensor partis, pensado por Marclio de Pdua no seu livro Defensor Minor. Hoje diramos, apesar dos governos serem grandes perpetradores dos Direitos Humanos, o Estado no final deste longo processo aberto pela Declarao dos Direitos Humanos tem um papel primordial como defensor e promotor dos Direitos Humanos. Um papel crtico tambm se as sociedades quiserem enfrentar o problema da pobreza e da desigualdade social. E o ltimo ponto que eu vou me permitir dar alguns apontamentos que, diante deste quadro um pouco desolador, a comunidade internacional, as Naes Unidas, conseguiram escrever no centro das preocupaes da comunidade internacional o tema do desenvolvimento humano. Ns chegamos ao mundo globalizado, mas sob a dominncia do conceito e do valor do desenvolvimento humano. Desenvolvimento e democratizao se confundem, na condio de dar um sentido largo palavra democratizao, alm da simples instaurao do estado de direito, das instituies e da governabilidade democrtica. A democratizao o aprofundamento jamais acabado da democracia no cotidiano. aquela linda frase de Plutarco em que a viagem da poltica no tem jamais o seu porto final. Ela requer o exerccio da cidadania em vista da efetivao universal de todos os Direitos Humanos, como o nosso Procurador Geral lembrou na sua interveno: direitos individuais polticos e civis, direitos econmicos, sociais e culturais, enfim, direitos coletivos ao meio ambiente, cidade, infncia e ao desenvolvimento. Essa evoluo fundada na luta pelos Direitos Humanos, com progressos e retrocessos, se constitui na verdade em duas faces de um mesmo processo. O primeiro a agem das liberdades negativas para a expanso das liberdades positivas, ou seja, das liberdades negativas, as liberdades de no ser alvo de determinadas violaes, s liberdades positivas, as liberdades para exercer direitos na sua plenitude. Para empregar aqui uma expresso criada pelo Prmio Nobel de Economia de 1998, tambm um sinal enorme de alegria que a economia humana seja garladoada no final do sculo, atri-buindo democracia fundada sobre as liberdades negativas um valor fundamental, como alis Celso Lafer lembrou e foi reconhecido universalmente pelo programa da declarao da Conferncia Mundial de Direitos Humanos de Viena em 1993. Em segundo lugar, a complexidade crescente das novas dimenses do conceito de desenvolvimento econmico que ou a ser considerado como econmico, social e cultural, sustentvel, num meio ambiente adequado, para sublinhar a necessidade de centrar o desenvolvimento sobre todos os Homens e para todos os Homens, como dizia o economista Franois Perrot. Com efeito, a noo de desenvolvimento considerada ao mesmo tempo como norma e como processo histrico em relao realizao desta norma se enriqueceu no curso desse meio sculo marcado por avanos conceituais, e entretanto, um balano bem mais mitigado por tudo que conseguiu ser realizado. De qualquer maneira, ns chegamos ao final do sculo sabendo que a idia simplista do crescimento econmico, como eu apontava na primeira parte desta fala, no capaz sozinha de assegurar o desenvolvimento. Ela tem que ser abandonada essa noo de crescimento por um conceito mais complexo, expresso por adies sucessivas a essas dimenses, para significar, sem nenhuma dvida, que o desenvolvimento tem por objetivo o desabrochar pleno dos homens e das mulheres menos do que a multiplicao dos bens. O desenvolvimento pode tambm ser analisado como um processo de aprendizado social e como uma liberao, no duplo sentido da liberao da dificuldade material e da supresso de todos os entraves impedindo a realizao do bem-estar, j que hoje ns lembramos todos os pensadores catlicos caros a Franco Montoro; o Padre Jos Fleber, que teve tanta influncia no planejamento urbano aqui em So Paulo, definia desenvolvimento como a civilizao do ser na diviso equnime do ter. No basta escrever os Direitos do Homem num documento, o que alis foi uma etapa importante na realizao das aspiraes de lutas pela formalizao dos Direitos. Depois dessa inscrio comeou uma luta para que esses Direitos se tornassem efetivamente apropriados para os mais diversos grupos sociais. No final do sculo, o social e o ecolgico aparecem como preocupaes maiores diante dos desastres provocados pela hegemonia incontrolada do econmico e a primazia da lgica do mercado sobre a lgica das necessidades. Ns estamos construindo uma histria do desenvolvimento e efetivao dos Direitos Humanos que permitir melhor compreender em que condies o crescimento econmico se acompanha de um autntico desenvolvimento, como acabamos de definir, e quando, ao contrrio, ele conduz a um desenvolvimento ligado ao desrespeito dos Direitos Humanos. Antes de terminar, eu gostaria de dizer que todo esse processo to cheio de esperanas se deve necessariamente a uma participao cada vez maior daquilo que Alfred Estepan chamava celebridades das transies, os movimentos, as organizaes da sociedade civil. Com efeito, a promoo dos Direitos Humanos se tornou um domnio por excelncia das organizaes no-governamentais, das associaes de cidados, da ao do terceiro setor, das cooperativas e das agncias de socorro mtuo, de ao solidria. Enfim, ns chegamos no final deste sculo, depois das organizaes de sociedade civil terem conseguido atuar durante as ltimas dcadas entre a necessria mobilizao da vergonha dos Estados perpetradores dos Direitos Humanos e o poder de causar embaraos aos Estados perpetradores, para uma localizao, e este o ltimo paradoxo que eu vou apontar nessa noite, da realizao de um sistema de Estados, que o sistema internacional e regional de proteo aos Direitos Humanos, tanto na esfera das Naes Unidas como na esfera da Organizao dos Estados Americanos, que a Professora Flvia Piovesan to bem analisou no seu livro. Esse espao dos Estados abre um espao extraordinrio para a interveno dos povos, para a interveno das organizaes da sociedade civil. Eu acho que essa foi a mgica desse longo percurso entre a Declarao Universal dos Direitos Humanos e a Conferncia de Viena. Se hoje h um espao dos Estados para a proteo dos Direitos Humanos, como o caso da Comisso dos Direitos Humanos das Naes Unidas, formadas por Estados, nunca as organizaes da sociedade civil foram atores to importantes e to decisivos na realizao desses Direitos. Tendo dito isso eu s queria registrar essas oportunidades a gente s tem uma vez e depois no sabe se vai ter outra nesta caminhada, a participao de um Estado Brasileiro, de um Estado perpetrador de Direitos Humanos, para um Estado que tem a poltica de Direitos Humanos como princpio fundamental no horizonte criado por Franco Montoro, que teve o seu momento de reflexo bsico quando Celso Lafer era Ministro das Relaes Exteriores. No foi o Governo Civil que colocou o Brasil na realizao da poltica afirmativa dos Direitos Humanos, foi a partir da presena de Celso Lafer no Ministrio das Relaes Exteriores. Outros atores conhecidos tambm participaram dessa luta no Congresso, por exemplo pela ratificao plena dos instrumentos bsicos de proteo dos Direitos Humanos desde a Conveno Americana at a ltima jia da Coroa que foi o reconhecimento da competncia da Corte Interamericana dos Direitos Humanos. O Senador Eduardo Suplicy, o Senador Fernando Henrique Cardoso, o Senador Severo Gomes e o Deputado Hlio Bicudo foram aliados, militantes do Ministro Celso Lafer nesse completar da insero plena do Brasil na legalidade dos Direitos Humanos. Eu nestes ltimos quatro anos tambm pude testemunhar a atuao de Celso Lafer como Embaixador na Comisso de Direitos Humanos, e podemos ns todos e a comunidade internacional testemunhar a imensa translao que o Brasil, que o Estado Brasileiro, aram ter no debate internacional dos Direitos Humanos. Muito obrigado.

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