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Defesa dos Direitos Humanos: Sistemas Regionais (Ensaio do Dr. Hlio Bicudo publicado na REVISTA ESTUDOS AVANADOS, n 47, jan-abr.2003, publicao quadrimenstral do INSTITUTO DE ESTUDOS AVANADOS da USP.) 4p503q


1. DECLARAO UNIVERSAL DOS DIREITOS HUMANOS. O MARCO ZERO E OS PACTOS SUBSEQENTES
Os sistemas de promoo e proteo dos Direitos Humanos se foram instituindo medida que os Estados dos continentes europeu, americano e africano assumiam a relevncia dos direitos humanos, como fundamento para a construo e sobrevivncia de um Estado Democrtico.

o que se pode ler nas atas dos trabalhos que, na Europa, nas Amricas ou na frica, levaram elaborao das chamadas Cartas de Direitos Humanos. Depois, vieram as Convenes especificamente dirigidas proteo e defesa desses direitos, primeiro, mediante o funcionamento das instituies dos estados partes e, em seguida e subsidiariamente, falhando estas ou se tornando omissas, pelos sistemas regionais de defesa dos direitos humanos.

A Declarao Universal dos Direitos do Homem, de 10 de dezembro de 1948 – declarao de princpios em forma solene, estava destinada, desde a sua origem, a ser completada por outros textos. Assim se lhe seguiram, depois de difcil elaborao, os dois pactos relativos aos direitos do homem, adotados pela Assemblia Geral das Naes Unidas, em 16 de novembro de 1966. Posteriormente, tivemos o Pacto Internacional sobre direitos econmicos, sociais e culturais. O Pacto Internacional sobre direitos civis e polticos entrou em vigor em 23 de maro de 1976. O Protocolo Facultativo, que se lhe seguiu, foi adotado no mesmo dia e nessa mesma data entrou, igualmente, em vigor. O Pacto foi ainda completado por um segundo Protocolo Facultativo, de 15 de novembro de 1989, visando a abolir a pena de morte, o qual entrou em vigor em 11 de junho de 1991. O conjunto desses textos forma o que costumamos chamar de “carta internacional dos direitos do homem”. Ela pressupe uma unidade de inspirao e de contedo dos textos que, em realidade, no existiu.

Assim, os pactos de 1966 e dos anos seguintes traduzem outras preocupaes alm daquelas da Declarao Universal de 1948 e contm uma inflexo da ideologia dos direitos do homem em busca de maiores espaos. Resta recordar que a Assemblia Geral das Naes Unidas contava, naquele ano, com 58 membros. Em 1966, esse nmero subiu para 122. A ideologia majoritria no se pode, portanto, considerar a mesma.

Enquanto a Declarao Universal se esfora por conciliar concepes liberais e marxistas entre liberdades formais e reais, “esquecendo que se o nazismo ignorou as primeiras, em nome das segundas que o estalinismo suprimiu a todas”, os pactos consagraram um fenmeno de coletivizao dos direitos do homem. A Declarao Universal inteiramente voltada para a pessoa: os direitos humanos so, antes de tudo, os direitos do indivduo e a Declarao endereada aos indivduos e no aos Estados (“Todo o indivduo, ou toda a pessoa, tem direito...”). Os pactos so dirigidos aos Estados e no aos indivduos (“Os Estados se obrigam ...”) e a dimenso social do indivduo a pedra de toque a ser considerada. O homem no pode encontrar a realizao dos seus direitos seno no interior de uma sociedade livre de toda conteno externa ( colonizao) ou interna (opresso): o interesse do indivduo se confunde com aquele da sociedade onde vive.

A Comisso Interamericana de Direitos Humanos tem uma funo quase jurisdicional, pois ela que recebe as denncias de violaes que lhe so apresentadas pelas vtimas ou por quaisquer pessoas ou organizaes no-governamentais, contra atos violatrios de direitos fundamentais por parte dos estados ou que no tenham encontrado reconhecimento ou proteo por parte dos mesmos Estados. A Comisso Interamericana de Direitos Humanos processa essas denncias, procede ao seu exame e, depois de iti-las, faz recomendaes aos Estados e, ao final, decide se apresenta ou no o caso Corte. Assim, a Corte s a a decidir sobre os casos que lhe so apresentados pela Comisso ou por um Estado Parte.
A Comisso de Direitos Humanos da OEA , ao mesmo tempo, um rgo ou etapa “processual” no sistema de peties individuais estabelecido sob a Declarao e a Conveno Americanas e um rgo de “vocao geral” na regio americana, em matria de direitos humanos. Nesse sentido, ela uma mescla de Comit de direitos civis e polticos do Pacto Internacional de 1966 e de Comisso de Direitos Humanos da Naes Unidas. Sua riqueza vem justamente do carter parcialmente pblico e parcialmente judicial. A salvaguarda de sua imparcialidade e da correo de seu funcionamento o carter “supervisor” da Corte Interamericana.

Para os Estados que no aceitaram a clusula de jurisdio obrigatria da Corte Interamericana, a Comisso o rgo nico de soluo de litgios do sistema e deriva sua competncia da carta da OEA e do estatuto da Comisso, alm da Conveno Americana (para os estados que a ratificaram). Ela concentra, em um nico rgo, a investigao dos fatos, a apreciao dos argumentos jurdicos e a imposio de sanes.

Assim, fundamental para a vitalidade do sistema interamericano de Direitos Humanos, como a Comisso de Direitos Humanos asseverou na Assemblia Geral da OEA, que teve lugar na Guatemala, no ms de junho de 1999, e reiterou, ante a mesma Assemblia, realizada em Windsor (Canad), em junho de 2000, o cumprimento pelos Estados partes das sentenas da Corte e recomendaes da Comisso Interamericana de Direitos Humanos. Os rgos polticos da Organizao devem cumprir com o objetivo central de assegurar o cumprimento das decises dos rgos de proteo. O fortalecimento do sistema no depende, pois, unicamente e nem se esgota no funcionamento dos rgos de superviso.

Em ltima instncia, sua efetividade est vinculada ao que os rgos polticos estejam dispostos a empreender ante quantos ignoram suas obrigaes internacionais. Os Estados e os rgos apontados constituem-se na garantia coletiva do cumprimento das normas de direitos humanos. ados, ainda, poucos dias da Assemblia de Windsor, em resposta a colocaes feitas pela Comisso Interamericana de Direitos Humanos perante o Comit de Direitos Polticos e Sociais da OEA, o representante dos Estados Unidos assinalou a convenincia de estabelecer-se um rgo encarregado de acompanhar o cumprimento das decises e das recomendaes da Comisso Interamericana de Direitos Humanos.

C. O SISTEMA AFRICANO

Vejamos, em seguida, o sistema africano de proteo dos direitos humanos. A Carta Africana sobre Direitos Humanos e dos Povos foi adotada pela Assemblia dos representantes da Organizao da Unidade Africana (OUA), em 27 de junho de 1981, em Nairobi, Qunia, tendo em vista a deciso 115 (inciso XVI) da Assemblia dos representantes, adotada em sesso ordinria, que teve lugar em Monrvia, de 17 a 20 de julho de 1979. A iniciativa visava preparar um um draft preliminar para a elaborao de uma Carta Africana sobre os direitos do homem e dos povos, estabelecendo instrumentos para a luta contra o colonialismo e o racismo.

A Carta constitui um aporte importante ao desenvolvimento do direito regional africano e cobre uma lacuna essencial em matria de direitos humanos. Ela entrou em vigor, somente, em 21 de outubro de 1996 com o objetivo de priorizar os direitos dos povos. Tais direitos so concebidos como um direito independncia e no como um direito secesso, ao qual a prtica da Unio Africana totalmente contrria, em nome do princpio da intangibilidade das fronteiras da integridade territorial. As disposies da Carta relativas ao direito dos povos so tambm a expresso, a mais clara, da tendncia moderna coletivizao dos direitos do homem. Sob esse aspecto, a Carta apresenta a singularidade de fazer coabitar conceitos aparentemente antagnicos: indivduo e povo, direitos individuais e direitos coletivos, direitos da chamada “terceira gerao” (direitos sociais, econmicos e culturais) e direitos clssicos (civis e polticos). A Carta Africana criou, em seu artigo 30, uma Comisso africana do homem e dos povos. Trata-se de um rgo tcnico independente, composto por 14 membros escolhidos por suas qualidades pessoais, encarregado da promoo e da proteo dos direitos do homem. Para esse efeito, a Comisso pode ser solicitada pelas faltas de um Estado s disposies convencionais, provocada por outro Estado ou por particulares.

No plano regional, a Carta Africana dos Direitos do Homem e dos Povos pe em prtica um procedimento sumrio e comunicaes estatais que permitem a um Estado parte a denncia de violaes da carta cometidas por outro Estado parte.
O regimento interno da Comisso, adotado em 13 de fevereiro de 1988, distingue dois tipos de comunicao individual: a apresentada por um indivduo que se pretende vtima de uma violao de um dos direitos enunciados pela Carta e aquela apresentada por um indivduo da “Organizao da Unidade Africana”, alegando uma situao de violao grave ou massiva dos direitos do homem e dos povos. Esse sistema de comunicao no tem realmente por objeto remediar violaes individuais dos direitos do homem. A carta (art. 55) estabelece, nesse caso, que a denncia constar de uma lista de comunicaes similares, que transmitida aos membros da Comisso, que indicaro quais deles devero ser considerados. Ademais, a carta no prev o tratamento individual de peties issveis.

Nos termos de seu artigo 58, a Comisso como o acordo da Assemblia dos Chefes de Estado e da direo da Organizao da Unio Africana, poder promover estudos aprofundados, em decorrncia de comunicaes relativas a situaes reveladoras da existncia de violaes graves ou massivas dos direitos do homem e dos povos. De outro lado, a Comisso poder afirmar essa vocao de rgo protetor dos direitos individuais, semelhana da evoluo constatada na Comisso Interamericana de Direitos Humanos. O mecanismo, entretanto, fortemente restritivo. Assim, as recomendaes da Comisso no podem ser dirigidas diretamente aos Estados concernentes, mas devem ser feitas ao rgo supremo da Organizao da Unio Africana, que decide da oportunidade de publicar as recomendaes da Comisso (art. 59, 3). O rgo intergovernamental da Organizao da Unio Africana joga, portanto, o papel de intermedirio obrigatrio e protetor da soberania estatal: a eficcia do sistema parece, assim, bastante duvidosa.

O protocolo adotado em Ovagadongou, em 09 de junho de 1998, j em vigor, trata da criao de uma Corte Africana dos Direitos do Homem e dos Povos, cuja interveno pode ser solicitada pelos indivduos e pelas organizaes no- governamentais, sob a reserva da aceitao prvia de sua competncia pelo Estado parte. A deciso da corte revestida da autoridade de coisa julgada definitiva (artigo 30, do Protocolo sobre a criao de um Tribunal Africano dos Direitos do Homem e dos Povos); o acompanhamento de sua execuo confiada ao Comit de Ministros da Organizao da Unio Africana (artigo 29, n. 2, do mesmo Protocolo).

3. TRS SISTEMAS E UM OBJETIVO COMUM
Como se v, os trs sistemas tm um objetivo comum – a proteo e defesa dos Direitos Humanos – que alcanado segundo as peculiaridades de cada um. No se trata aqui, de concluirmos qual seja o melhor, mas de encontrarmos em todos eles a maior eficincia segundo o mandato que lhes determinado.

A plena jurisdicionalizao do sistema ser a soluo?
Se o objetivo, buscado pelo Conselho da Europa, est encontrando dificuldades, dada a avalanche de solicitaes que acorrem Corte Europia, no nosso hemisfrio, o sistema se ressente da imprescindvel universalizao e de um mecanismo que imponha, aos Estados partes, o cumprimento das decises da Corte e das recomendaes da Comisso Interamericana de Direitos Humanos.

Por outra parte, o sistema africano, implantado faz pouco tempo, ter sua eficincia comprovada no correr dos prximos anos.
Mas o que me parece fundamental que, a par da universalizao dos sistemas – o que ainda no aconteceu no caso das Amricas e do Caribe – aperfeioando-se, com a experincia j acumulada as prticas na apurao das violaes e responsabilizao dos Estados e do cumprimento obrigatrio das decises e recomendaes dos rgos, guardando sempre o princpio de que o primeiro combate pela implementao dos Direitos Humanos deve ocorrer nos Estados partes, mediante sua prpria atuao, segundo os princpios que conformam o Estado de Direito Democrtico, tenha-se em considerao que os sistemas assinalados so subsidirios e s atuam quando os Estados negam esses direitos fundamentais, que qualificam a cidadania de nossas mulheres, homens e crianas.

4. TPI – SOB A ESPADA DE DMOCLES
Para completar o exame sucinto ora feito, dos sistemas regionais de defesa e proteo dos Direitos Humanos, valeria, ainda, meno ao Tribunal Penal Internacional. Ele foi criado pelo Estatuto de Roma, em julho de 1998, e entrou em vigor no dia 1 de julho deste ano.

O Tribunal em questo, com competncia para julgar pessoas pelos crimes mais graves de transcendncia internacional, tem carter complementar das jurisdies penais nacionais.

Ele vem depois das experincias dos Tribunais de Nuremberg e de Tquio, adequadamente denominados tribunais dos vencedores e mais prosaicamente dos Tribunais institudos para julgar os crimes praticados em Ruanda e nos territrios da antiga Iugoslvia.

Trata-se, sem dvida, de um relevante marco no progresso do estabelecimento de uma justia mundial. Nada menos do que 76 pases o subscreveram e ratificaram e se empenham, agora, na sua instalao.
O Brasil j ratificou o Estatuto e depositou o instrumento de ratificao na Secretaria das Naes Unidas.
O Tribunal Penal Internacional encerra promessa de um mundo no qual os responsveis por genocdio, crimes de guerra e crimes contra a humanidade no mais restaro impunes. Seus autores sero submetidos Corte Internacional, nos casos em que os Estados-Partes no conseguiram ou no se dispem a submet-los Justia.
Cumpre assinalar, entretanto, que os Estados Unidos da Amrica, por deciso de 6 de maio ado, anunciaram oficialmente que no pretendem ratificar o estatuto da Corte Penal Internacional e se consideram desobrigados de todos os nus decorrentes de sua anterior adeso.

A esse respeito, a Unio Europia observou que esse ato unilateral poder ter conseqncias lastimveis sobre a concluso multilateral dos tratados e, de uma maneira geral, sobre o princpio da preeminncia do direito nas relaes internacionais.
Com esta considerao, de relevante oportunidade, a comunidade internacional tem a esperana de, num futuro prximo, segundo dilogo a ser aberto com os Estados Unidos, encontrar o caminho para abrigar a cooperao americana na inteira aplicao da justia, alcanando a abrangncia do Estatuto de Roma

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