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Multiculturalismo e Direitos Humanos

Vera Maria Candau

Articular igualdade e diferena : uma exigncia do momento

Multiculturalismo na realidade latino-americana

A questo das polticas de ao afirmativa

Multiculturalismo, polticas de ao afirmativa e construo da democracia

Multiculturalismo e perspectiva intercultural

REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS

O atual contexto internacional, a nova configurao que se est afirmando com fora principalmente a partir de setembro deste ano, certamente no constitui um cenrio propcio afirmao de uma cultura dos direitos humanos. O documento final da recente Conferncia Regional sobre Educao em Direitos Humanos na Amrica Latina e Caribe, promovida pelo Alto Comissariado para os Direitos Humanos da ONU e pela UNESCO, realizada no Mxico de 28 de novembro ao primeiro do presente ms, afirma:

Esta Conferncia expressa sua preocupao porque no momento presente o exerccio dos Direitos Humanos pode ser subordinado a polticas de segurana nacional, assim como pelo fato de se ter produzido uma imobilidade em relao a apoiar agendas para avanar nos direitos humanos, concretamente as relativas s recomendaes da Conferncia de Durban.

Globalizao, polticas neoliberais, segurana global, estas so realidades que esto acentuando a excluso, em suas diferentes formas e manifestaes. No entanto, no afetam igualmente a todos os grupos sociais e culturais, nem a todos os pases e, dentro de cada pas, s diferentes regies e pessoas. So os considerados diferentes, aqueles que por suas caractersticas sociais e/ou tnicas, por serem portadores de necessidades especiais, por no se adequarem a uma sociedade cada vez mais marcada pela competitividade e pela lgica do mercado, os perdedores, os descartveis, que vm cada dia negado o seu direito a ter direitos ( Hanna Arendt).

Este o nosso momento. Nele temos de buscar, no meio de tenses, contradies e conflitos, caminhos de afirmao de uma cultura dos direitos humanos que penetre todas as prticas sociais e seja capaz de favorecer processos de democratizao, de articular a afirmao dos direitos fundamentais de cada pessoa e grupo scio-cultural, de modo especial os direitos sociais e econmicos, com o reconhecimento dos direitos diferena.

Articular igualdade e diferena : uma exigncia do momento 223n27

Esta uma questo fundamental no momento atual. Para alguns a construo da democracia tem que colocar a nfase nas questes relativas igualdade e, portanto, eliminar ou relativizar as diferenas. Existem tambm posies que defendem um multiculturalismo radical, com tal nfase na diferena, que a igualdade fica em um segundo plano.

No entanto, na minha opinio, o problema no afirmar um polo e negar o outro, mas sim termos uma viso dialtica da relao entre igualdade e diferena. Hoje em dia no se pode falar em igualdade sem incluir a questo da diversidade, nem se pode abordar a questo da diferena dissociada da afirmao da igualdade.

Uma frase do socilogo portugus Boaventura Souza Santos, sintetiza de maneira especialmente oportuna esta tenso: "temos direito a reivindicar a igualdade sempre que a diferena nos inferioriza e temos direito de reivindicar a diferena sempre que a igualdade nos descaracteriza."

Neste sentido, no se deve opor igualdade diferena. De fato, a igualdade no est oposta diferena e sim desigualdade Diferena no se ope igualdade e sim padronizao, produo em srie, a tudo o mesmo, mesmice.

O que estamos querendo trabalhar , ao mesmo tempo, negar a padronizao e lutar contra todas as formas de desigualdade presentes na nossa sociedade. Nem padronizao nem desigualdade. E sim, lutar pela igualdade e pelo reconhecimento das diferenas. A igualdade que queremos construir assume a promoo dos direitos bsicos de todas as pessoas. No entanto, esses tod@s no so padronizados, no so os mesmos. Tm que ter as suas diferenas reconhecidas como elemento de construo da igualdade.

Considero que essa temtica nos prximos anos vai suscitar uma grande discusso, um debate difcil, que desperta muitas paixes, mas que fundamental para se avanar na afirmao da democracia. Hoje em dia no se pode mais pensar numa igualdade que no incorpore o tema do reconhecimento das diferenas, o que supe lutar contra todas as formas de preconceito e discriminao.

Multiculturalismo na realidade latino-americana 452d4q

No momento atual, a questo multicultural preocupa muitas sociedades. O debate multicultural intenso nos Estados Unidos e tambm na Europa. No entanto, na Amrica Latina a questo multicultural tem uma especificidade. Nosso continente um continente construdo com uma base multicultural muito forte, onde as relaes inter-tnicas tm sido uma constante atravs de toda sua histria, uma histria dolorosa e trgica principalmente no que diz respeito aos indgenas e aos afro-descendentes.

A nossa histria est marcada pela eliminao do outro ou por sua escravizao, que tambm uma forma de negao de sua alteridade. Esses outros que so eus na construo da identidade latino-americana. Neste sentido, o debate multicultural na Amrica Latina nos coloca diante dessa questo, desses sujeitos, sujeitos histricos que foram massacrados mas que souberam resistir e hoje continuam afirmando suas identidades fortemente nas nossas sociedades, mas numa situao de relaes de poder assimtricas, de subordinao e excluso ainda muito acentuadas.

importante assinalar como fato de especial importncia neste momento histrico que a UNESCO em sua ltima Conferncia Geral, realizada em Paris, nos meses de outubro e novembro deste ano, com a presena de 185 dos 188 pases membros, tenha aprovado por aclamao uma Declarao Universal sobre a Diversidade Cultural e que o Diretor Geral, Kochiro Matsuura, tenha declarado que esperava que esta declarao chegasse um dia a adquirir tanta fora quanto a Declarao Universal dos Direitos Humanos.

A questo das polticas de ao afirmativa

. As polticas de ao afirmativa suscitam uma grande polmica em todas as sociedades em que se propem medidas concretas para sua implementao Entre ns tambm esto provocando intensos debates. Este fato em si mesmo positivo, pois desvela inmeros aspectos ligados prpria construo histrica da nossa sociedade e sua forte hierarquizao, lgica de privilgios, autoritarismo, apadrinhamento e favor. So debates marcados pela emoo e a paixo, onde a indignao, a militncia e o conservadorismo se fazem especialmente presentes.

No entanto, para que no se transforme em um debate estril, necessrio, em primeiro lugar, que nos situemos diante do reconhecimento desses sujeitos histricos, que muitas vezes foram relegados e negados ao longo da nossa histria, do reconhecimento da sua contribuio para a construo dos pases latino-americanos, do Brasil, para configurar-nos culturalmente.

Este reconhecimento fundamental mas no basta. No suficiente um reconhecimento terico ou formal, expresso em declaraes meio retricas. Este reconhecimento tem que ser acompanhado de polticas de valorizao, de polticas de o a oportunidades, de polticas de o ao poder, que so fundamentais para que esses sujeitos histricos tenham uma cidadania plena na nossa sociedade.

neste horizonte que se situam as polticas de ao afirmativa, orientadas a favorecer determinados grupos que tiveram suas oportunidades de o a recursos e bens da sociedade negadas ou minimizadas ao longo da histria. ????t?? ???????????/span>o:p>

Um exemplo concreto a legislao recentemente aprovada no Rio de Janeiro, que est provocando uma grande polmica, que obriga as universidades pblicas estaduais a reservarem um porcentual de vagas para alunos oriundos das escolas pblicas. Esta medida vai, evidentemente, ampliar as possibilidades de alunos e alunas oriundos das classes populares, onde o nmero de afro-descendentes elevado, ingressarem no ensino superior, expandindo assim suas oportunidades educacionais.

As polticas de ao afirmativa esto o voltadas para, numa sociedade marcada pela desigualdade e fortes mecanismos de excluso, favorecer o o s mulheres, populao indgena, aos afro-descendentes ou outros grupos excludos ou objeto de discriminao na nossa sociedade, a direitos bsicos inerentes a todos os seres humanos.

Segundo Guimares(1999:180),

No podemos continuar a dispensar um tratamento formalmente igual aos que, de fato, so tratados como pertencentes a um estamento inferior. Polticas de ao afirmativa tm, antes de mais nada, um compromisso com o ideal de tratarmos todos como iguais. Por isso, e s por isso, preciso em certos momentos, em algumas esferas sociais privilegiadas, que aceitemos tratar como privilegiados, os desprivilegiados.

Nesta questo o papel da educao, assim como os meios de comunicao social, fundamental. Trabalhar a questo do imaginrio coletivo, das representaes das identidades sociais e culturais presentes na nossa sociedade um aspecto especialmente relevante.

Outra dimenso desta problemtica que vem adquirindo ultimamente maior ateno nesta debate, diz respeito no somente s condies de o de determinados grupos a direitos e recursos disponveis na sociedade, como tambm s polticas orientadas a favorecer a permanncia destas pessoas em contextos especficos em que tm de enfrentar muitas dificuldades. Nesta perspectiva, processos educacionais que visam o empoderamento destes grupos so de especial importncia.

Multiculturalismo, polticas de ao afirmativa e construo da democracia

Consideramos estas questes fundamentais para o desenvolvimento de processos de democratizao na nossa sociedade. Em geral, temos uma viso muito formal da democracia, onde a cidadania quase se manifesta exclusivamente atravs do exerccio dos direitos polticos, da cidadania formal.

Evidentemente estes so elementos fundamentais mas, hoje em dia, temos que ampliar o sentido da cidadania e incorporar a reflexo sobre a cidadania cultural, uma cidadania que desnaturalize o mito da democracia racial, ainda to presente no nosso imaginrio coletivo, reconhece as diferentes tradies culturais presentes numa determinada sociedade, capaz de valoriz - las e fazer com que estas diferentes tradies tenham espaos de manifestao e representao na sociedade como um todo. Nesse sentido, fundamental para uma democracia plena o reconhecimento da cidadania cultural.

Chau (1999:14-15) afirma que cidadania cultural significa,

antes de tudo, que a cultura deve ser pensada como um direito do cidado isto , algo de que as classes populares no podem ser nem se sentir excludas (como acontece na identificao popular entre cultura e instruo) e que a cultura no se reduz s belas-artes - como julga a classe dominante. (....)

A Cidadania Cultural define o direito cultura como:

- direito de produzir aes culturais, isto , de criar, ampliar, transformar smbolos, sem reduzir-se criao nas belas artes;

- direito de fruir os bens culturais, isto , recusa da excluso social e poltica;

- direito informao e comunicao, pois a marca de uma sociedade democrtica que os cidados no s tenham o direito de receber todas as informaes e de comunicar-se, mas tm principalmente o direito de produzir informaes e comunic-las. Portanto, a cidadania cultural pe em questo o monoplio da informao e da comunicao pelos mass media e o monoplio da produo e fruio das artes pela classe dominante;

- direito diferena, isto , a exprimir a cultura de formas diferenciadas e sem uma hierarquia entre essas formas.

Multiculturalismo e perspectiva intercultural 4cj4f

O multiculturalismo um dado da realidade. A sociedade multicultural. Pode haver vrias maneiras de se lidar com esse dado, uma das quais a interculturalidade. Esta acentua a relao entre os diferentes grupos sociais e culturais.

Na nossa sociedade os fenmenos de apartheid social e tambm de apartheid cultural, em forte interrelao, se vm multiplicando. Neste contexto, a perspectiva intercultural se contrape guetificao e quer botar a nfase nas relaes entre diferentes grupos sociais e culturais. Quer estabelecer pontes. No quer fechar as identidades culturais na afirmao das suas especificidades. Promove a interao entre pessoas e grupos pertencentes a diferentes universos culturais.

A perspectiva intercultural no ingnua. consciente de que nessas relaes existem no s diferenas, como tambm desigualdades, conflitos, assimetrias de poder. No entanto, parte do pressuposto de que, para se construir uma sociedade pluralista e democrtica, o dilogo com o outro, os confrontos entre os diferentes grupos sociais e culturais so fundamentais e nos enriquecem a todos, pessoal e coletivamente, na nossa humanidade, nas nossas identidades, nas nossas maneiras de ver o mundo, a nossa sociedade e a vida em sua totalidade.

Esta uma questo difcil. Em geral temos muita dificuldade de lidar com as diferenas. A sociedade est informada por viso cultural hegemnica de carter monocultural. Especialmente a educao est muito marcada por esse carter monocultural. O outro nos ameaa, confronta e nos situamos em relao a ele de modo hierarquizado, como superiores ou inferiores. Muitas vezes no respeitamos outro, ele negado, destrudo, eliminado, algumas vezes fisicamente e outras no imaginrio coletivo, no mbito simblico.

A interculturalidade aposta na relao entre grupos sociais e tnicos. No elude os conflitos. Enfrenta a conflitividade inerente a essas relaes. Favorece os processos de negociao cultural, a construo de identidades de fronteira, hbridas, plurais e dinmicas, nas diferentes dimenses da dinmica social.

A perspectiva intercultural quer promover uma educao para o reconhecimento do outro, para o dilogo entre os diferentes grupos sociais e culturais. Uma educao para a negociao cultural. Uma educao capaz de favorecer a construo de um projeto comum, onde as diferenas sejam dialeticamente integradas e sejam parte desse patrimnio comum. A perspectiva intercultural est orientada construo de uma sociedade democrtica, plural, humana, que articule polticas de igualdade com polticas de identidade.

Direitos Humanos e multiculturalismo nos colocam no horizonte da afirmao da dignidade humana num mundo que parece no ter mais esta convico como referncia radical. Neste sentido, trata-se de afirmar uma perspectiva alternativa e contra-hegemnica de construo social e poltica.

Terminamos com uma palavras do sub-comandante Marcos (2001), poticas e militantes, especialmente estimulantes para as nossas buscas cotidianas, pessoais e coletivas:

A Dignidade exige que sejamos ns mesmos.

Mas a Dignidade no somente que sejamos ns mesmos.

Para que haja Dignidade necessrio o outro.

E o outro s outro na relao conosco.

A Dignidade ento um olhar.

Um olhar a ns mesmos que tambm se dirige ao outro olhando-se e olhando-nos.

A Dignidade ento reconhecimento e respeito.

Reconhecimento do que somos e respeito a isto que somos, sim, mas tambm reconhecimento do que o outro e respeito ao que ele .

A Dignidade ento ponte e olhar e reconhecimento e respeito.

Ento a Dignidade o amanh .

Mas o amanh no pode ser se no para todos, para os que somos ns e para os que so outros.

A Dignidade ento uma casa que nos inclui e inclui o outro.

A Dignidade ento uma casa de um s andar, onde ns e o outro temos nosso prprio lugar, isto e no outra coisa a vida, e a prpria casa.

Ento a Dignidade deveria ser o mundo, um mundo que tenha lugar para muitos mundos.

A Dignidade ento ainda no .

Ento a Dignidade est por ser.

A Dignidade ento lutar para que a Dignidade seja finalmente o mundo.

Um mundo onde haja lugar para todos os mundos.

Ento a Dignidade e est por construir.

um caminho a percorrer.

A Dignidade o amanh ..

Este nos parece ser o grande desafio do momento atual da humanidade. Um mundo onde parece que s uns tm lugar. A Dignidade um caminho a percorrer. A Dignidade o amanh.

REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS 2uci

CHAU, M. Cidadania Cultural, Novamerica, n.82, junho, 1999

GUIMARES, A . S. A . Racismo e Anti-racismo no Brasil S. Paulo, Edit. 34, 1999

MARCOS (sub-comandante) La Marcha del color de la tierra. (comunicados, cartas y mensajes del Ejrcito Zapatista de la Liberacin Nacional del 2000 al 2 de abril del 2001) Mxico, rizoma, 2001

ONU / UNESCO Declaracin de Mxico sobre Educacin en Derechos Humanos en Amrica Latina y el Caribe, Ciudad de Mxico, diciembre 2001

UNESCO Universal Declaration on Cultural Diversity Paris, 2 de novembro de 2001

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