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A Declarao
dos Direitos Humanos na Ps-Modernidade
J. A. Lindgren
Alves*
Sumrio:
Introduo.
A questo da universidade.
A globalizao e as novas configuraes
sociais.
A rejeio do iluminismo.
Conciliaes possveis.
Os direitos
humanos como valores transculturais.
1.
Introduo
No curso de seu
meio sculo de existncia, a Declarao Universal dos Direitos
Humanos, proclamada pelas Naes Unidas em 1948, cumpriu um
papel extraordinrio na histria da humanidade. Codificou as
esperanas de todos os oprimidos, fornecendo linguagem autorizada
semntica de suas reivindicaes. Proporcionou base
legislativa s lutas polticas pela liberdade e inspirou a
maioria das Constituies nacionais na positivao dos
direitos da cidadania. Modificou o sistema "westfaliano"
das relaes internacionais, que tinha como atores exclusivos os
Estados soberanos, conferindo pessoa fsica a qualidade de
sujeito do Direito alm das jurisdies domsticas. Lanou os
alicerces de uma nova e profusa disciplina jurdica, o Direito
Internacional dos Direitos Humanos, descartando o critrio da
reciprocidade em favor de obrigaes erga omnes.
Estabeleceu parmetros para a aferio da legitimidade de
qualquer governo, substituindo a eficcia da fora pela fora
da tica. Mobilizou conscincias e agncias, governamentais e no-governamentais,
para atuaes solidrias, esboando uma sociedade civil
transcultural como possvel embrio de uma verdadeira comunidade
internacional.
fato que nenhuma
dessas conquistas se verificou sem controvrsias e lutas. Nem
mesmo os Estados redatores da Declarao se dispam
seriamente a cumpri-la desde o primeiro momento, conforme
evidenciado nas resistncias outorga de natureza obrigatria
aos direitos nela definidos. Em contraste com os dois anos e meio
transcorridos para a negociao e proclamao da Declarao,
os dois principais tratados de direitos humanos o Pacto
Internacional sobre Direitos Civis e Polticos e o Pacto
Internacional sobre Direitos Econmicos, Sociais e Culturais ,
de carter compulsrio para os respectivos Estados-partes, tambm
negociados desde 1946, levaram vinte anos para ser aprovados na
ONU (em 1966) e trinta para entrar em vigor no mbito
internacional (em 1976, ano em que obtiveram o nmero de ratificaes
necessrias). At hoje no receberam a adeso de todos os pases.
Malgrado essas e
outras dificuldades, no deixa de ser curioso que a Declarao
de 1948, com configurao de manifesto, meramente recomendatrio
simples pea de soft law, na terminologia anglo-sax
tenha conseguido repercusso to generalizada quando era
politicamente vlido questionar sua universalidade. Mais
paradoxal , porm, a situao em que se encontra agora.
Formalmente
universalizados pela Conferncia de Viena de 1993, quando o fim
da competio estratgica bipolar parecia propiciar-lhes a
oportunidade de enorme fortalecimento, os direitos humanos se vem
atualmente ameaados por mltiplos fatores. Alguns sempre
existiram e, provavelmente, sempre existiro. Decorrentes de polticas
de poder, do arbtrio autoritrio, de preconceitos arraigados e
da explorao econmica, tais ameaas no so nem antigas,
nem modernas; so praticamente eternas, podendo variar na
intensidade e nas formas em que se manifestam. Outras, contudo, so
ou se apresentam como novas, caractersticas do perodo
em que vivemos, seno exclusivas da dcada presente,
profundamente sentidas desde o fim da Guerra Fria. Mais difceis
de combater do que as ameaas tradicionais, os novos fatores
contrrios aos direitos humanos, insidiosos e efetivos, acham-se
embutidos nos efeitos colaterais da globalizao econmica e no
antiuniversalismo ps-moderno do mundo contemporneo.
2. A
questo da universalidade
Herdeira do
Iluminismo, assim como a prpria ONU, a Declarao de 1948
explicita, no prembulo, sua doutrina. Esta se baseia no
reconhecimento da "dignidade inerente a todos os membros da
famlia humana e de seus direitos iguais e inalienveis"
como "fundamento da liberdade, da justia e da paz no
mundo". Para que os Estados, a ttulo individual e em
cooperao com as Naes Unidas, cumpram plenamente o
compromisso de promover o respeito universal aos direitos humanos
e liberdades fundamentais, assumido ao em a Carta de So
Francisco e recordado no prembulo da Declarao, "uma
compreenso comum desses direitos e liberdades" reputada
"da mais alta importncia".
Ao prembulo se
seguem trinta artigos. Nem todos so propriamente dispositivos. O
artigo 1, tambm doutrinrio, afirma: "Todas as pessoas
nascem livres e iguais em dignidade e direitos. So dotadas de
razo e conscincia e devem agir em relao umas s outras
com esprito de fraternidade". O artigo 2 comea por
entronizar axiologicamente o princpio da no-discriminao de
qualquer espcie (em funo de raa, cor, sexo, lngua,
religio, opinio poltica ou de outra natureza, origem
nacional ou social, riqueza ou qualquer outra condio),
acrescentando: "Toda pessoa tem capacidade para gozar os
direitos e liberdades estabelecidos nesta Declarao".
ando da afirmao linguagem imperativa, o mesmo artigo 2
determina adiante que "no ser feita qualquer distino
fundada na condio poltica, jurdica ou internacional do pas
ou territrio a que pertena uma pessoa, quer se trate de um
territrio independente, sob tutela, sem governo prprio, quer
sujeito a qualquer outra limitao de soberania". Essencial
a um documento destinado a todos os seres humanos, num perodo em
que dois-teros da humanidade ainda viviam em regime colonial,
foi essa determinao do segundo pargrafo do artigo 2 na
verdade, uma auto-restrio do Ocidente sobre sua atuao nas
colnias, tantas vezes brutal que permitiu Declarao de
1948 ser denominada Universal, e no apenas Internacional, como
seria de esperar.1
Os direitos
estabelecidos na Declarao, embora freqentemente violados, so
hoje em dia amplamente conhecidos: vida, liberdade,
segurana pessoal; de no ser torturado nem escravizado; de no
ser detido ou exilado arbitrariamente; igualdade jurdica e
proteo contra a discriminao; a julgamento justo; s
liberdades de pensamento, expresso, religio, locomoo e
reunio; participao na poltica e na vida cultural da
comunidade; educao, ao trabalho e ao repouso; a um nvel
adequado de vida, e a uma srie de outras necessidades naturais,
sentidas por todos e intudas como direitos prprios por
qualquer cidado consciente. Controvertido, na qualidade de
direito humano fundamental, o direito propriedade, "s ou
em sociedade com outros", registrado no artigo 17,
desagradava sobretudo aos pases socialistas, enquanto os
direitos econmicos e sociais no se adequavam ortodoxia
liberal capitalista. A igualdade de direitos entre homens e
mulheres, sobretudo no casamento (art. 16), assim como a proibio
de castigo cruel (art. 5) causavam, por sua vez, dificuldades a
pases muulmanos de legislao no-secular. Nenhum dos
dispositivos chegava, contudo, a ofender as tradies de
qualquer cultura ou sistema sociopoltico. Ainda assim a Declarao
dos Direitos Humanos foi submetida a voto, na Assemblia Geral da
ONU, em 10 de dezembro de 1948, e aprovada por quarenta e seis a
zero, mas com oito abstenes (frica do Sul, Arbia Saudita e
os pases do bloco socialista).
Adotada sem
consenso num foro ento composto de apenas 56 Estados, ocidentais
ou "ocidentalizados"2, a Declarao Universal
dos Direitos Humanos no foi, portanto, ao nascer,
"universal" sequer para os que participaram de sua gestao.
Mais razo tinham, nessas condies, os que dela no
participaram a grande maioria dos Estados hoje independentes
ao rotularem o documento como "produto do Ocidente".
No tendo tido voz
nas negociaes pertinentes, porque eram quase todos colnias
ocidentais, os pases afro-asiticos tinham razo, sim, em suas
objees Declarao de 1948, assim como, em menor grau, os
socialistas, que se abstiveram na votao (apesar de terem sido
os principais propugnadores dos direitos econmicos e sociais,
por ela estabelecidos). Todos, porm, deixaram de ter razo aos
poucos, na medida em que os direitos consagrados pelo documento
entraram gradativamente nas concincias de seus nacionais3,
auxiliando-os, inclusive, nas lutas pela descolonizao4.
Deixaram de ter razo, tambm, pelo constante recurso que a ela
sempre fizeram para a consecuo de seus prprios objetivos
internacionais, como na luta pela erradicao do apartheid
e em defesa da causa palestina. Perderam a consistncia, ainda,
na medida em que foram aderindo, seletiva mas voluntariamente, a
outros instrumentos internacionais nela baseados, como os dois
Pactos Internacionais e as grandes convenes de direitos
humanos5 nesses casos instrumentos jurdicos obrigatrios
(hard law), que exigem ratificao e prevem
monitoramento.
O o mais
significativo ainda que no "definitivo" no
caminho da universalizao formal da Declarao de 1948 foi
dado na Conferncia Mundial dos Direitos Humanos, realizada em
Viena, em junho de 1993. Maior conclave internacional jamais
reunido at ento para tratar da matria, congregando
representantes de todas as grandes culturas, religies e sistemas
sociopolticos, com delegaes de todos os pases (mais de
170) de um mundo j praticamente sem colnias, a Conferncia de
Viena adotou por consenso portanto, sem votao e sem
reservas seu documento final: a Declarao e Programa de Ao
de Viena. Este afirma, sem ambigidades, no artigo 1: "A
natureza universal desses direitos e liberdades no ite dvidas".
inegvel que o
consenso alcanado nessa conferncia mundial exigiu longas e difceis
negociaes, como normal em eventos congneres. No houve,
porm, propriamente, imposies de parte a parte vencedoras,
nem o documento se prope violar o mago de qualquer cultura.
Como assinala o artigo 5, depois de reafirmar a interdependncia
e indivisibilidade de todos os direitos humanos: "As
particularidades nacionais e regionais devem ser levadas em
considerao, assim como os diversos contextos histricos,
culturais e religiosos, mas dever dos Estados promover e
proteger todos os direitos humanos e liberdades fundamentais,
independentemente de seus sistemas polticos, econmicos e
culturais".
Se o artigo 5 da
Declarao de Viena pode soar insuficiente para militantes
maximalistas e incongruente para quem no participou das negociaes,
ele no o parece ser para a maioria dos Estados que antes
rejeitavam a Declarao de 1948. Com rarssimas excees, os
governantes afro-asiticos no tm mais recorrido ao argumento
da ocidentalidade dos direitos humanos,6 como tampouco o
fazem os governos socialistas de qualquer quadrante. Quando
pressionados por alegaes de violaes, tais governantes
procuram agora refut-las com argumentos outros e no pelo apego
a tradies culturais: justificam-nas pragmaticamente luz de
dificuldades internas, ou, mais construtivamente, reconhecem os
problemas existentes, descrevendo os esforos empreendidos para
resolv-los7.
No mais,
portanto, desde 1993, pela tica das doutrinas jurdicas, nem da
poltica em sentido estrito, que o conceito de direitos humanos
universais vem sendo desacreditado. A linguagem de tais direitos
hoje, ao contrrio, parte integrante e rotineira do discurso
internacional. As ameaas mais srias Declarao de 1948
encontram-se em outras esferas. E so potencialmente mais
nefastas, porque envoltas por iniciativas
"racionalistas" no campo econmico e argumentaes
filosficas "emancipatrias" bem-intencionadas.
3. A
globalizao e as novas configuraes sociais
Uma das contradies
evidentes de nossa poca consiste no vigor com que os direitos
humanos entraram no discurso contemporneo como contrapartida
natural da globalizao, enquanto a realidade se revela to
diferente. No necessrio ser "de esquerda" para
observar o quanto as tendncias econmicas e as inovaes
tecnolgicas tm custado em matria de instabilidade,
desemprego e excluso social. Inelutvel ou no, nos termos em
que est posta, e independentemente dos juzos de valor que se
lhe possa atribuir, a globalizao dos anos 90, centrada no
mercado, na informao e na tecnologia, conquanto atingindo
(quase) todos os pases, abarca diretamente pouco mais de um tero
da populao mundial. Os dois-teros restantes, em todos os
continentes, dela apenas sentem, quando tanto, os reflexos
negativos.
As caractersticas
da globalizao deste fim de sculo so bastante conhecidas,
assim como reconhecidos seus efeitos colaterais. A busca obsessiva
da eficincia faz aumentar continuamente o nmero dos que por
ela so marginalizados, inclusive nos pases desenvolvidos.8
Assim como a mecanizao da agricultura provocou o xodo rural,
inflando as cidades e suas periferias, a racionalizao atual da
produo empurra os pobres ainda mais para as margens da
economia, que no coincidem necessariamente com as periferias
urbanas. Com a informatizao crescente da indstria e dos
servios, o trabalho no-especializado torna-se suprfluo e o
desemprego, estrutural. A mo-de-obra barata, ainda imprescindvel
na produo, recrutada fora do espao nacional, pelas
filiais de grandes corporaes instaladas no exterior, ou na
acolhida politicamente relutante de estrangeiros
imigrados.9 Nas sociedades ricas ou emergentes, o desmonte
da previdncia pblica, alegadamente necessrio gesto
estatal eficaz, transforma a excluso em contrapartida aceitvel
da competitividade nacional. Nas sociedades pobres, a atrao de
investimentos externos fator de vida e morte. Os atrativos no
so, contudo, suficientes para garantir a permanncia de
capitais volteis, que podem sair de qualquer pas, do dia para
a noite, em funo de problemas observados em outras partes do
mundo. Como paliativo aos efeitos colaterais da globalizao,
transfere-se iniciativa privada e s organizaes da
sociedade civil a responsabilidade pela istrao do social.
Estas, no obstante, funcionam apenas na escala de seus meios e
de seu humanitarismo. Abandona-se, assim, a concepo dos
direitos econmico-sociais.
Enquanto para a
sociedade de classes, da "antiga" modernidade, o
proletariado precisava ser mantido com um mnimo de condies
de subsistncia (da o Welfare State), para a sociedade
eficientista, da globalizao ps-moderna, o pobre
responsabilizado e estigmatizado pela prpria pobreza. Longe de
produzir sentimentos de solidariedade, associado
ideologicamente ao que h de mais visivelmente negativo nas
esferas nacionais, em escala planetria: superpopulao,
epidemias, destruio ambiental, vcios, trfico de drogas,
explorao do trabalho infantil, fanatismo, terrorismo, violncia
urbana e criminalidade.10 As classes abastadas se isolam em
sistemas de segurana privada. A classe mdia (que hoje abarca
os operrios empregados), num contexto de insegurana
generalizada, cobra dos legisladores penas aumentadas para o
criminoso comum. Ou, sentindo os empregos e as fontes de remunerao
ameaadas, recorre a "bodes expiatrios" na intolerncia
contra o "diferente" nacional religioso, racial ou
tnico ou contra o imigrante estrangeiro (s vezes
simplesmente de outra regio do pas). Anulam-se, assim, os
direitos civis.
O Estado, antes
portador de mensagens idealmente igualitrias e emancipatrias,
no socialismo e no liberalismo, alm de garantidor confivel da
convivncia social, torna-se, ps-modernamente, simples gestor
da competitividade econmica, interna e internacional. Sem
sentido de progresso humano, a poltica, desacreditada porque
ineficaz, a a ser vista com maus olhos, pois abriga "em
sua natureza" distores deliberadas ou involuntrias,
assim como a possibilidade de corrupo. A indiferena popular
resultante leva ao absentesmo eleitoral, quando legalmente factvel,11
ou compreensvel falta de entusiasmo, em sistemas de voto
obrigatrio. Perdem o valor, dessa forma, os direitos polticos,
arduamente conquistado nas lutas da modernidade.
Desprovido de
capacidade unificadora, tanto em decorrncia de abusos na
instrumentalizao de "metanarrativas", quanto pela
conscincia contempornea da "capilaridade do poder",12
o Estado nacional, como locus moderno da realizao
social, perde gradativamente at mesmo a funo identitria. O
indivduo, muitas vezes discriminado dentro do territrio
nacional pela parcialidade da implementao dos direitos humanos
e liberdades fundamentais, vai buscar outros tipos de
"comunidade" preferenciais como ncoras de autoproteo
ou, como se diz atualmente, para sua prpria autoconstruo.
Sem deixar de considerar-se nacional do pas de nascena, o
negro dos Estados Unidos sobretudo african american, o
ndio native american, os homossexuais so gays and
lesbians (alguns se identificam como membros de uma queer
nation, diferenciada da "nao" heterossexual),
todos, justificadamente, assertivos e reivindicatrios.13
A identificao primria e "guetizada" tambm ocorre
pela ascendncia hereditria cultural, como indiano, paquistans
ou rabe nas sociedades europias e norte-americana, como
meridional na Itlia do Norte, como muulmano no mundo cristo,
como tibetano na China.
claro que tais
identificaes so positivas e plenamente condizentes com a
antidiscriminao prevista na Declarao Universal dos
Direitos Humanos. O problema se apresenta quando se transformam em
fundamentalismos. Esses, uma vez exacerbados, levam limpeza tnica
da Bsnia, ao genocdio de Ruanda, brutalidade dos "islamistas"14
argelinos, ao arcasmo desvairado e antifeminino dos talibs do
Afeganisto. Podem, inclusive, "legitimar", em sentido
contrrio, o radicalismo "WASP" nos Estados Unidos, o
anti-arabismo da direita sa, o separatismo da Lega
Lombarda, a xenofobia europia, o ultranacionalismo fascistide,
o isolacionismo reacionrio, o antifeminismo masculino hoje
em dia bastante controlado em quase todo o Ocidente , o
anti-homossexualismo virulento, ainda presente em quase todo o
planeta.
Grande parte das
lutas identitrias se deve, sem dvida, na origem, ao princpio
basilar da no-discriminao, e muitas das novas reivindicaes
comunitrias ainda se fundamentam an Declarao Universal de
1948.15 Talvez por essa razo, nenhum dos grandes tericos
da ps-modernidade se tenha proposto negar a importncia do
documento, embora seja faclimo "desconstruir" seu
texto.16 inegvel, porm, que a prpria noo de ps-modernidade,
em qualquer sentido que se lhe d, tende a enfraquecer seus
objetivos.
4. A
rejeio do iluminismo
Menos popularizada
no Brasil do que a da "globalizao", mas amplamente
difundida nas sociedades economicamente avanadas, a noo de
uma "ps-modernidade", complexa e utilizada para os
fins mais dspares, outra que parece haver-se implantado
solidamente na poca contempornea. Desenvolvida em discusses
acadmicas e pouco verbalizada no quotidiano da cidadania, a ps-modernidade
, no obstante, detectvel em prticas polticas e
reivindicaes atuais.
Enquanto na
modernidade os embates sociais se desenrolavam em nome da
comunidade nacional, da afirmao do "Homem" genrico
e universal ou no contexto das lutas de classe, na ps-modernidade
as batalhas da cidadania so, muitas vezes, empreendidas em nome
de uma comunidade de identificao menor do que o Estado
nacional e diferente da classe social.17 Os Governos, por
sua vez, de todos os quadrantes, assemelham-se a es
de empresas, preocupados, sobretudo, ou apenas, com a eficincia
da gesto econmica objetivo aparentemente impossvel
enquanto perdurar a inexistncia de controle supranacional para
as flutuaes do capital especulativo (de montante superior ao
PIB de maioria esmagadora dos pases).
Tal como o Poder
"capilar" na interpretao de Foucault, a ps-modernidade
algo que no se auto-anuncia, nem se personifica, e de que
ningum propriamente se investe: ambos simplesmente se exercem,
de maneira assumida ou sub-reptcia. Para entend-la, na acepo
aqui utilizada, basta compar-la, em linhas muito gerais,
modernidade, que ela se prope superar.
Impulsionada pelo
Iluminismo europeu, que atingiu seu pice no pensamento de Kant,
a modernidade clssica se propunha racional, secular, democrtica
e universalista. A Razo era atributo da natureza humana. Ela
emanciparia o Homem da subjugao poltica e social a que ele
se auto-submetia pelo desconhecimento da Verdade.18 As
sociedades, na medida em que rejeitassem seu substrato religioso,
derrubariam o absolutismo desptico e alcanariam, com o
Direito, o progresso e a liberdade. O Homem era, pois sujeito da
Histria. E os direitos humanos, conforme definidos por Locke
para a Revoluo Americana e com aportes de Rousseau
para a Revoluo sa eram, e so ainda, instrumentos
importantssimos para a consecuo da liberdade, da igualdade e
da fraternidade, herdados do "Sculo das Luzes".
As qualificaes
dessa trajetria humanista fulgurante comearam cedo, dentro do
prprio Iluminismo, com Hegel, Herder e muitos outros pensadores.
Para Marx, no sculo ado (e grande parte do sculo
presente), o Homem fazia sua Histria, mas no em circunstncias
por ele prprio escolhidas.19 Marx foi o primeiro a
recorrer claramente noo de estrutura econmica
como fator limitativo da liberdade humana (a ser conquistada pela
Revoluo). F-lo, porm, dentro da lgica do racionalismo
universalista no caso, materialista de que foi herdeiro
assumido e propulsor. J Nietzche, pela tica da cultura, com
recurso genealogia da moral e a anlises epistemolgicas
diversas, abriu o caminho para o ps-modernismo filosfico,
desmontando, de maneira assistemtica mas firme, o racionalismo
iluminista e a tica (alegadamente mesquinha e ilusria) que
este disseminava.
Enquanto tais
desenvolvimentos de longo curso ocorriam mais sensivelmente no
pensamento social, Freud, na agem do Sculo XIX para o atual,
demonstrou, com o estudo do inconsciente, que o Homem no era uno
nem autnomo, modificando substantivamente a compreenso da
personalidade individual. Saussure, por sua vez, ao estudar a lingstica,
identificou as relaes de signos e estruturas de linguagem que
condicionam o conhecimento. Lanavam-se, assim, as bases para a
"desconstruo do sujeito".
No preciso
fazer inventrio das contribuies dos diversos tericos
influentes estruturalistas, modernos e ps-modernos para
se chegar a um entendimento elementar da noo de ps-modernidade
que hoje se faz presente nas prticas sociais. Nem tampouco
relacionar todas as formas histricas de instrumentalizao e
manipulao distorcidas da racionalidade iluminista,
particularmente em nosso sculo, para se compreender seu
questionamento. Vale a pena, sim, recordar que Jean-Franois
Lyotard, em 1979, deu ao termo "ps-modernidade" sua
aplicao mais corrente, ao diagnosticar o fim das Grandes
Narrativas da Razo, da Emancipao e do Progresso humanos
como meios necessrios de legitimao do conhecimento,
ando este a ter objetivos meramente "performticos",
dentro de uma realidade sistmica.20 Por menos agradvel
que o seja, a observao das caractersticas atuais da
globalizao tende a confirmar esse diagnstico.
Uma vez aceito o
entendimento, hoje em dia generalizado, de que o homem e a mulher,
em sua realidade mental e corprea, so seres construdos
dentro da cultura ou, no dizer de Foucault, da episteme
em que vivem, no tendo uma natureza universal, e de que o
conhecimento inelutavelmente determinado pelas estruturas (econmicas,
sociais, culturais e lingsticas), nenhuma das quais comum a
todos os indivduos, a verdade se relativiza. A Razo do
Iluminismo , assim, substituda, no mximo, por "razes"
especficas. O poder, sendo mais do que o atributo da poltica e
tendo uma microfsica que o distribui em prticas disciplinares
rotineiras, no e no pode ser exercido com finalidade
emancipatria. Sem Grandes Narrativas, explicativas ou justificatrias,
a Histria tambm deixa de existir como totalidade, com sentido
de progresso, sendo substituda por "histrias"
localizadas.
O ser humano "desconstrudo"
pela psicanlise, pela lingstica e pela etnologia as trs
"contracincias" apontadas por Foucault , pelos
diferentes jogos de linguagem e "micronarrativas" simultneas
identificados por Lyotard , pelos "textos" em que
se insere, dentro de uma intertextualidade sem fim na
interpretao de Derrida no pode ipso facto ser
sujeito. Para se autoconstituir como indivduo, necessita
recorrer a identidades vrias. A identificao vai privilegiar
a "comunidade", real ou imaginria, imposta ou
selecionada, como espao de realizao. Este no corresponde
ao Estado nacional, outra herana ideolgica do Iluminismo, com
seu poder/saber disciplinador, nem s classes sociais do
marxismo, modificadas na composio ou seduzidas pelo
capitalismo "de consumo". Mas se, por um lado, a
comunidade nacional atualmente inconsistente, a classe social
um elemento fluido e as comunidades transnacionais especficas
simplesmente embrionrias, por outro lado uma comunidade
internacional abrangente, alm de utpica, estaria em contradio
com os particularismos de cada um. O local se sobrepe, assim, ao
geral, e os interesses se particularizam.
Na ps-modernidade,
o eterno a a ser contingente; o universal, ilusrio e a metafsica,
uma inveno sem sentido. Esboroa-se, portanto, a idia de
fundamentos para a poltica, o Direito e a tica. Tudo a a
ser relativo, localizado e efmero. nessa situao que se
desenvolvem ou se esmaecem os confrontos poltico-sociais,
tendo por pano-de-fundo uma tecnologia "performtica",
um conhecimento elusivo e uma globalizao excludente.
Como justificar,
nessas condies, a atualidade da Declarao Universal dos
Direitos Humanos, erigida sobre fundamentos iluministas, racionais
e humanistas, num somatrio (desequilibrado) de insumos das
correntes liberal e socialista da modernidade? Como defender a idia
de "direitos iguais e inalienveis como fundamento da
liberdade e da paz no mundo"? Como insistir da afirmao de
que "todas as pessoas so dotadas de razo e conscincia e
devem agir em relao umas s outras em esprito de
fraternidade"? Como universalizar tais direitos, construdos
historicamente na tradio ocidental, sem conferir-lhes feies
imperialistas? Tais perguntas, atualssimas, no comportam
respostas fceis. J ocasionaram inmeros estudos, nenhum dos
quais definitivo.21 O que se procurar em seguida fazer
um breve esboo, superficial e apenas ilustrativo, das conciliaes
tentadas, para sugerir um curso de ao mais intuitivo do que
"cientfico", mais pragmtico do que
"fundamentado". E, por isso mesmo, talvez, rotulvel at
de "ps-moderno".
5.
Conciliaes possveis
Nos dias de hoje,
embora a maior parte das rejeies categricas Declarao
Universal dos Direitos Humanos ainda parta de lderes polticos
nacionais em contradio com o texto da Declarao de
Viena por eles prprios subscrita em 1993 com o claro
objetivo de justificar violaes deliberadas em aes
governamentais, o anti-universalismo vigente no pensamento social
contemporneo tambm pe, muitas vezes, em questo, a validade
desse documento. E o faz com objetivos alegadamente emancipatrios,
ciente ou inconciente de que o particularismo "de
esquerda" acaba fortalecendo a brutalidade antidemocrtica
da direita mais reacionria. Radicalizaes desse tipo de
atitude supostamente libertria podem ser vistos seja entre etnlogos
ocidentais demasiado apaixonados pelas culturas no-europias
estudadas,22 seja entre ativistas sociais "de
base" que rejeitam o Estado nacional pelos malefcios
provocados junto a populaes "colonizadas" em nome da
cidadania moderna,23 seja entre militantes maximalistas de
movimentos identitrios que, na busca de aperfeioamentos legtimos
para a Declarao de 1948, naturalmente imperfeita,
involuntariamente abrem o caminho para sua destruio.24
Mais prudentes e
mais construtivas tm sido as variadas tentativas de
compatibilizao entre o particularismo das culturas diversas e
o que h de efetivamente universal na idia dos direitos
fundamentais. Essa tarefa intelectual complexa, na medida em
que a prpria noo de direitos, assim como a de indivduo,
oriunda do Ocidente. As culturas no-ocidentais, como sabido,
sempre acentuaram os deveres, privilegiando o coletivo sobre o
pessoal, fosse em prol da "harmonia" social, fosse em
defesa da ordem e da autoridade, religiosa ou secular, no
importando sua arbitrariedade ou o grau de sofrimento exigido na
vida de cada um.
As tentativas de
conciliao entre os direitos humanos e as tradies "pr-modernas"
tm sido desenvolvida h tempos, por pensadores de todos os
continentes, propondo-se solues variadas: assimilao dos
direitos individuais aos ensinamentos cristos sobre a dignidade
e a fraternidade humanas; interpretao atualizada e reforma da sharia
islmica; incorporao dos direitos humanos no dharma da
tradio hindu; adoo de uma "hermenutica diatpica",
que, atravs do auto-reconhecimento da incompletude de toda e
qualquer cultura, preencha reciprocamente as lacunas encontradas
em cada uma com complementos alheios (proposta por Boaventura de
Sousa Santos25); ao intercultural comunicativa em busca
de consensos ticos (conforme a teoria de Habermas) e uma
infinidade de outras idias centradas no multiculturalismo.
A aceitao do
multiculturalismo, como contrapartida rejeio do humanismo
universalista, , alis, seno o "fundamento", o
objetivo essencial do pensamento ps-moderno. Este, como se sabe,
deve-se em grande parte autocrtica da cultura ocidental feita
por alguns de seus filhos mais lcidos, conhecidos como ps-estruturalistas,
todos impulsionados, em princpio, por aquilo que Foucault
identificava como sua prpria "impacincia pela
liberdade".26 O problema com esse processo de
auto-esclarecimento crtico, em continuidade com a ilustrao
emancipatria dos Sculos XVIII e XIX, que o af denunciador
das distores do racionalismo ocidental terminou por
desacreditar o Iluminismo como um todo, os fundamentos igualitrios
do humanismo universalista, assim como o sentido de progresso que
inspirava as lutas polticas e sociais da Idade Moderna, no
Ocidente como no Oriente, no Norte como no Sul.27
Cientes do desafio
que suas anlises "superadoras" do Iluminismo clssico
representam para a prtica poltica e intuitivamente conscientes
da fora liberadora da luta pelos direitos humanos, os ps-estruturalistas
conseqentes, "pais" quase sempre relutantes da ps-modernidade
terica, esforam-se por demonstrar, com maior ou menor vigor, o
carter no-niilista de suas interpretaes. Procuram apontar
sadas para as camisas de fora por eles identificadas nas
metanarrativas do Iluminismo e para os imes a que levam suas
crticas arrasadoras. Tentam, assim, conciliar o fim do
universalismo, por eles incriminado, com a idia de justia, a
irredutibilidade particularista das estruturas de conscincia com
a noo de direitos humanos, a capilaridade do poder/saber com a
luta pela identidade autnoma, a aceitao do contingente como
meio para a obteno de progresso, a substituio das Grandes
Narrativas por microdiscursos capazes de levar liberdade autntica.
Para Derrida, por exemplo, "inventor" da desconstruo
dos textos iluministas (e da afirmao de que tudo
"texto"), "nada parece menos obsoleto do que o
ideal clssico emancipatrio" (sic).28 A
justia, "se alguma coisa desse tipo existe, fora e alm do
direito, no desconstrutvel". O Direito, sim, pode e
deve ser desconstrudo, pois "a desconstruo a justia"29.
A Justia no porm uma categoria universal, e sim uma
construo das diversas culturas. Na mesma direo, Lyotard
afirma a importncia das micronarrativas, no lugar do "metadiscurso"
universalizante da Justia, como nica maneira de se evitar a
imposio "terrorista" de um jogo de linguagem majoritrio
sobre a voz das minorias oprimidas.30 O fundamental
sempre respeitar "o outro", e "a comunidade nele
presente como capacidade e promessa".31 Mais
diretamente incidentes sobre a noo de Justia, alm de mais
eficazes na realidade social, as anlises de Foucault, movidas
por sua nsia liberatria, sobre a capilaridade do poder com sua
microfsica disciplinar e sobre o carter repressivo do Direito
e do Estado modernos oferecem, sem dvida, respaldos importantes
para a constituio das novas "comunidades" infra e
transnacionais antes referidas, assim como para a afirmao de
direitos identitrios ou do "direito diferena"
como contrapartida assertiva s discriminaes sofridas.
Outros tericos
autodeclarados ps-modernos tm, no obstante, entendimento
distinto de toda essa evoluo. Conforme explicita Terry
Eagleton (sem com isso necessariamente concordar), a prpria
expresso "direitos humanos" causa embarao duplo, com
cada uma das duas palavras, ambas pertencentes a um horizonte
superado de "humanismo metafsico, estrategicamente utilizvel,
mas ontologicamente sem fundamento".32 Talvez um pouco
por isso, por concordar com a crtica de Derrida ao logocentrismo
masculino ou "falogocentrismo" do Iluminismo
ocidental, o americanssimo Richard Rorty prope pragmaticamente
uma abordagem por ele denominada "feminina", afetiva e no-racionalista,
educao para os direitos humanos. Segundo Rorty, na medida
em que nenhuma pessoa imune aos ensinamentos kantianos se
reconhece apenas como ser humano, de valor igual ao do diferente,
e sim como integrante de um grupo melhor do que os outros, ao invs
de se apelar para fundamentos humanistas na persuaso contra as
discriminaes, mais til apelar-se para os sentimentos
individuais: devo tratar bem o estrangeiro, no por ser ele
moralmente igual a mim, mas porque ele ou ela est longe de sua
gente, porque sua me est sofrendo ou porque pode um dia vir a
tornar-se meu genro ou minha nora.33
Dessas tentativas
tericas assim como de outras congneres difcil
extrair justificativas concretas para a atualidade da Declarao
Universal dos Direitos Humanos. O pragmatismo de Rorty pode ser
eficaz em certas situaes especficas, mas aniquila a noo
de direitos. Se o pragmatismo importante para que os direitos
humanos deixem de ser somente uma utopia, outras possibilidades
igualmente pragmticas existem. E vm, h muito, sendo
tentadas, com resultados visveis.
6.
Os direitos humanos como valores transculturais
Muito antes da
emergncia das teorias ps-estruturalistas e ps-modernas, a
doutrina jusnaturalista, com a postulao de "direitos
naturais", j havia perdido sua antiga preeminncia. Os
direitos, todos, no Direito Interno e no Direito Internacional, so
reconhecidos, h dcadas, como conquistas histricas, que
extrapolam fundamentaes metafsicas, religiosas ou seculares,
e se adaptam s necessidades dos tempos. Por isso, e somente no
sentido de uma progresso temporal no-valorativa, possvel
falar-se nas diferentes geraes de direitos humanos, em que os
direitos econmicos e sociais, de segunda gerao, consagrados
na doutrina jurdica posteriormente aos direitos "lockeanos",
mas devidamente includos na Declarao Universal dos Direitos
Humanos, igualam-se em importncia aos direitos civis e polticos,
de primeira gerao.34 Sem perder de vista essa conhecida
evoluo doutrinria do Direito e tendo-se em conta as
transformaes histricas ocorridas no mundo desde 1948, o fato
de que a Declarao proclamada como Universal pelas Naes
Unidas tenha resistido inclume, por meio sculo, com adeso
crescente at agora, algo a ser seriamente considerado.
Como j assinalava
Bobbio em 1964: "O problema fundamental em relao aos
direitos do homem, hoje, no tanto o de justific-los, mas o
de proteg-los. Trata-se de um problema no-filosfico, mas poltico".35
No h dvida de que Bobbio tinha razo ao fazer tal afirmao.
Afinal, so os polticos que decidem, motu proprio ou sob
presso, promover ou no o respeito pelos direitos
humanos. O problema que se colocou com a modernidade que os
argumentos dos filsofos, longe de justificar os direitos
fundamentais consagrados na Declarao, podem representar, nas mos
de lderes polticos e religiosos a eles contrrios,
instrumentos legitimantes para sua rejeio. Se os direitos so
uma inveno intransfervel da cultura ocidental, ela prpria
injusta e apenas dissimuladamente libertria, como se pode
coerentemente impedir os talibs de enclausurarem as mulheres
afegs? Como exigir dos aiatols iranianos que aceitem a
comunidade bahai, proscrita em sua Constituio? Como
exigir a revogao da fatwa de execuo contra o
escritor Salman Rushdie, se uma fatwa religiosa irrevogvel
por definio?36 Como promover a liberdade de crena e
de expresso se a sharia islmica fundamentalista prev,
at mesmo, a crucificao de apstatas? Como condenar a
represso aos dissidentes chineses e norte-coreanos, quando o
confucionismo, muito mais do que qualquer tipo de
"socialismo", impe como valor crucial a obedincia
autoridade? A resposta no necessita ser metafsica, nem
necessariamente "imperialista". Ela pode ser histrica
e condizente com o Direito Internacional.
A persistncia da
Declarao Universal ao longo de cinqenta anos comprova de per
si que, independentemente de suas origens, os valores positivos de
uma cultura podem, sim, ser transferidos de boa-f, sem violao
dos cnones essenciais de cada civilizao (os valores
negativos, como "as histrias" demonstram, so
assimilados com enorme facilidade). A maioria esmagadora dos pases
que acederam independncia aps a proclamao da Declarao
Universal dos Direitos Humanos no teve dificuldades para aceitar
seus dispositivos, incorporando-os, inclusive, na legislao domstica.
No o fizeram por imposio imperialista. Fizeram-no porque
reconheciam a importncia da Declarao Universal na luta
anticolonialista. Fizeram-no porque queriam alcanar no somente
a autonomia poltica, mas tambm a modernidade. A observncia
efetiva dos direitos humanos nas polticas e prticas desses e
de todos os demais Estados uma outra questo.
A justa valorizao
do dharma hindusta por Gandhi no impediu seus
seguidores de adotarem na ndia independente o sistema democrtico,
de abolirem legalmente as castas e de estimularem o conceito dos
direitos humanos. Com exceo da Arbia Saudita, praticamente
todos os pases muulmanos adotaram, no ado recente, sem
maiores problemas, cdigos penais e civis no-estritamente
vinculados sharia corpo doutrinrio de regras
oriundo de interpretaes cornicas dos primeiros sculos do
Isl, mas no procedente de Maom. A reinstaurao obsessiva
da sharia "sagrada" como cdigo legal com a
inferiorizao jurdica da mulher e os castigos corporais contrrios,
em princpio, ao artigo 5 da Declarao fenmeno
recente, estimulado pela revoluo iraniana de 1979 e acelerado
na dcada presente com o fortalecimento dos movimentos
fundamentalistas. Mas estes no so exclusividade das culturas
muulmanas. Podem ser detectados, nas esferas religiosas e
profanas, em praticamente todo o mundo, inclusive nas sociedades
ocidentais desenvolvidas. Mas do que um acidente de percurso, uma
regresso incidental pr-modernidade arcaica, eles
representam uma compensao ideolgica "ps-moderna"
para o fim dos metadiscursos seculares e para o fundamentalismo
econmico do culto do mercado.
Ademais de
inspirar, ainda, a maioria das legislaes domsticas e as
lutas reivindicatrias de todos os oprimidos, a Declarao
Universal dos Direitos Humanos serve de base a um expressivo corpus
de tratados e mecanismos internacionais a que os Estados aderem
volitivamente. Na medida em que se impe por opo voluntria
das diferentes culturas, nada tem ela de efetivamente
"imperialista". Como observa o Embaixador Gilberto Sabia,
que coordenou as negociaes da Conferncia Mundial sobre
Direitos Humanos de 1993: "O consenso obtido em Viena, em
toda a sua fragilidade, torna possvel esperar a superao das
resistncias e a afirmao da realizabilidade dos direitos
humanos".37
Enquanto os
direitos humanos se apresentam hoje, aps a Conferncia de
Viena, "universalizados" pelo consenso de todos os
Estados, eles se afiguram ainda mais como valores transculturais
atualssimos ao se observar o procedimento, nacional e
internacional, das ONGs a eles dedicadas. com base na Declarao
Universal de 1948 e nos tratados e declaraes por ela
propiciados que todas essas organizaes privadas das mais
diversas origens fenmeno tambm planetrio do mundo
contemporneo procuram promover seus objetivos pblicos, na
rea dos direitos individuais dentro de cada Estado, ou na defesa
dos direitos coletivos de grupos especficos.
Se, conforme ensina
Foucault, o Direito foi inventado como uma forma de legitimao
do poder estatal na "Idade Clssica", deixariam os
direitos humanos de ser uma afirmao do indivduo contra esse
mesmo poder? Talvez sim, talvez no, dentro do contexto da Revoluo
sa, em sua fase napolenica. Mas no numa poca como a
nossa, em que tais direitos so reconhecidos internacionalmente e
se tornam veis de cobranas internas e interestatais,
limitando significativamente o arbtrio do poder constitudo.
Mas ainda, com as interpretaes a eles conferidas pelas Declaraes
de Viena de 1993 e de Beijing de 1995, deixariam de ser dirigidos
apenas contra o Estado. Ao proteger mais claramente os direitos da
mulher, das crianas, dos indgenas e das minorias oprimidas
dentro das sociedades nacionais, os direitos humanos tornaram-se
tambm instrumentos contra a "capilaridade do poder",
exercido por agentes no-estatais. E cabe no somente ao Estado,
mas sociedade como um todo, a obrigao de evitar a violao
difusa desses direitos especficos.
Se, conforme
Derrida, a Justia uma referncia indefinida para a aplicao
do Direito e uma aporia que se impe mas no pode ser legalmente
prescrita na forma de direitos e deveres,38 a Declarao
de 1948, com seu formato de manifesto, pode, ao menos, oferecer
algum tipo de baliza. Afinal, nela se banham, atualmente, em maior
ou menor grau, praticamente todas as civilizaes. Da mesma
forma, tendo em conta as preocupaes de Lyotard, a Declarao
pode ser vista, desde sua "universalizao" pela
Conferncia de Viena e pelo recurso que a ela fazem as minorias
"sem voz", como um instrumento aceitvel de convergncia
de todas as micronarrativas e jogos de linguagem.
At mesmo,
portanto, para os ps-estruturalistas convictos ou ps-modernos
exigentes, a Declarao Universal dos Direitos Humanos abre
caminhos inestimveis. Na mesma medida em que o ps-estruturalismo
se prope emancipatrio, o multiculturalismo que ele
justificadamente endossa no pode ser indiferente s opresses
de culturas extra-ocidentais. Nem pode a ps-modernidade, como
continuao ou superao do racionalismo humanista, tornar-se
fundamentalista, aceitando como inelutveis as crueldades
aberrantes de qualquer comunidade, ou do integrismo eficientista
do mercado globalizado.
A cinqentenria
Declarao Universal dos Direitos Humanos no uma frmula mgica,
nem um declogo sacrossanto. Seu prembulo e seu artigo 1 soam
hoje, em dvida, demasiado metafsicos. Segundo os ensinamentos
dominantes no pensamento contemporneo, as pessoas no nascem
"livres e iguais" em nenhuma parte do planeta, nem compem
propriamente uma "famlia humana". A realidade
demonstra tambm que os direitos nela entronizados no so
consistentemente respeitados em nenhuma comunidade, nacional ou
eletiva, real ou imaginria. Mas o Direito , afinal, um
discurso normativo que apenas aspira a conformar a realidade. Dada
a fora persuasiva e liberatria que ela tem demonstrado, ao
longo de cinco dcadas, para indivduos e coletividades, a
Declarao de 1948 precisa ser mantida como est. Rediscuti-la
seria abrir uma caixa de Pandora, em momento propcio para todos
os demnios.
Sem manipulaes
esdrxulas, a Declarao dos Direitos Humanos precisa, sim, ser
fortalecida, como o foi nas grandes conferncias desta dcada,
de Viena (sobre direitos humanos), Cairo (sobre populao),
Copenhague (sobre desenvolvimento social), Beijing (sobre a
mulher) e Istambul (sobre assentamentos humanos),39 naquilo
que ela procura ser: um mnimo denominador comum para um universo
cultural variado, um parmetro bem preciso para o comportamento
de todos, um critrio de progresso para as contigncias
desiguais de um modo reconhecidamente injusto, um instrumento para
a consecuo dos demais objetivos societrios sem que estes
desconsiderem a dimenso humana.
Apesar de seu tamanho limitado, A
Declarao Universal dos Direitos Humanos , ainda, e deve
permanecer, uma Grande Narrativa. Na condio ps-moderna deste
final de milnio, ela parece ser a nica que resta.
_________
*Jos
Augusto Lindgren Alves diplomata, Cnsul Geral do Brasil em So
Francisco, Estados Unidos, ex-Diretor Geral do Departamento de
Direitos Humanos e Temas Sociais do Ministrio das Relaes
Exteriores.
1.Conforme
proposio de Ren Cassim (v. M. Glen Johnson, Writing the
Universal Declaration of Human Rights, In: The Universal
Declaration of Human Rights: 45th anniversary 1948-1993,
UNESCO, 1994, p. 67-68). A Declarao de 1948 o nico
instrumento de direitos humanos que se autoproclama
"universal"; todos os demais so intitulados
"internacionais".
2. O Movimento dos
No-Alinhados no existia; a China presente era a Repblica
insular de Chang Kai-chek; o Lbano era governado por cristos;
a ndia acabava de tornar-se independente e a Amrica Latina no
tinha ainda qualquer posio terceiro-mundista (a prpria noo
de "Terceiro Mundo" no existia).
3. Para se
aquilatar, ainda que de maneira imprecisa, o grau de absoro da
noo de direitos humanos pelas populaes no-ocidentais
basta observar a quantidade de ONGs afro-asiticas que atualmente
acompanhavam as deliberaes da Comisso dos Direitos Humanos
das Naes Unidas, sua atuao nos foros paralelos das grandes
conferncias internacionais e as denncias de violaes em pases
prprios ou alheios encaminhadas por elas, regularmente, ao
Secretariado da Alta Comissria para os Direitos Humanos, em
Genebra.
4. O direito dos
povos autodeterminao, com que se abrem os dois Pactos
Internacionais de Direitos Humanos, foi o primeiro "direito
de terceira gerao" acolhido no Direito Internacional.
Isso se explica porque a autodeterminao da respectiva
comunidade era, e ainda , reputada essencial vigncia
efetiva dos demais direitos.
5.No caso da
Conveno Internacional sobre a Eliminao de Todas as Formas
de Discriminao Racial, os pases afro-asiticos, foram, de
fato, os iniciadores. Nas demais, o grau de adeso varivel,
embora tenham participado da elaborao de todas,
entusiasticamente ou a contragosto. A Conveno sobre os
Direitos da Criana, de 1989, a nica que j obteve ratificao
praticamente universal: faltam apenas as da Somlia, pas
esfacelado por guerras intestinas, e dos Estados Unidos.
6.A exceo
mais insistente do Primeiro Ministro da Malsia Mahathir
Mohamad, que em 1997 ainda propunha a elaborao de uma nova
Declarao.
7.Um exemplo
notvel desse tipo de atuao construtiva tem sido o das
campanhas hoje realizadas por pases africanos para a erradicao
da prtica "cultural" da clitoridectomia. O exemplo
tanto mais significativo quando se leva em conta que
personalidades histricas da estrutura de um Jomo Kenyata e
outros heris da luta anticolonial incluam tal tradio no
ativo cultural de sua gente assim como o fazem ainda hoje ims
"integristas" do mundo muulmano.
8.Os prprios
Estados Unidos, em fase de expanso econmica e desemprego
decrescente, ostentam hoje um nmero de mendigos incomum nas dcadas
adas, alm de uma populao carcerria de mais de um milho
e meio (a maior do mundo).
9.Na verdade,
no apenas a indstria tradicional que se extraterritorializa
em busca de mo-de-obra barata. A da informtica tambm o faz,
quando isso lhe vantajoso, seja exportando fbricas de hardware,
seja importando quadros especializados ou especializveis. A
maior batalha do Vale do Silcio californiano com o Congresso
norte-americano tem sido para aumentar a quota de imigrao de
especialistas, particularmente indianos, capazes de suprir suas
necessidades a custos baixos.
10.Os esteretipos
so recorrentes. A superpopulao sempre asitica ou
latino-americana. A origem da AIDS tinha que ser africana. O
garimpeiro brasileiro mais daninho ao meio-ambiente do que as
indstrias e o consumo dos pases superindustrializados. O negro
e o asitico fumam, bebem e se drogam mais do que o branco. A
responsabilidade pelo narcotrfico a produo do Terceiro
Mundo, no a demanda universal. Os pais de famlias miserveis
que pem os filhos para trabalhar ou se prostituir fazem-no,
provavelmente, porque so malvados. O fanatismo religioso
particularidade de povos primitivos, fora da civilizao
judaico-crist, pois os integrismos protestantes, catlico e
israelita so, com certeza, sadios. O terrorismo fenmeno
quase sempre muulmano, enquanto a Ku-Klux-Klan, as
"milcias" norte-americanas e o neonazismo europeu so
tolerados e legais. O Rio de Janeiro, com sua populao
favelada, , naturalmente, a cidade mais violenta do mundo.
A criminalidade
comum realmente no tem esteretipos de localizao
privilegiada. Mas tanto nas sociedades ricas, como nas emergentes,
vista de forma reducionista como "coisa de pobres",
desconsiderando-se como irrelevante o fato de serem eles tambm
as vtimas mais numerosas. Desconsideram-se, tambm, como menos
ameaadores os crimes "de colarinho branco", no
obstante o raio incomparavelmente maior de seu alcance.
11.Nas eleies
primrias estaduais para o Senado dos Estados Unidos, em setembro
de 1998, apenas 17% do eleitorado do Estado de Nova York
compareceram s urnas; 20% de Minnesota e 30% do estado de
Washington, segundo dados publicados no San Francisco Examiner,
edio de 17.9.1998, em matria intitulada Primaries find
U.S. voters no more apathetic than usual ("no menos apticos"
apesar dos escndalos amorosos envolvendo o Presidente da Repblica).
12.Os dois
temas sero retomados adiante. Por ora basta atentar para os
absurdos praticados pelos Estados nacionais em nome da
metanarrativa do progresso (os exemplos paroxsticos foram o
nazismo e o stalinismo), assim como para a aceitao negligente
ou conivente pelas autoridades estatais das discriminaes
e agresses internas, inclusive contra a mulher.
13.Esse fenmeno
apenas incipiente no Brasil, cuja sociedade nacional,
felizmente, ainda funciona como verdadeiro melting pot,
apesar das aberraes histricas no-resolvidas em matria de
distribuio de renda e da persistncia de preconceitos vrios,
mais ou menos velados.
14.No
confundir com os islamitas, sinnimo vernacular de muulmano. Os
islamistas, com o segundo s, na terminologia corrente, so os
fundamentalistas islmicos que se propem conquistar o poder poltico,
pela fora ou em eleies.
15.
significativo, por exemplo, o esforo bem sucedido do
movimento internacional de mulheres para que as Conferncias de
Viena e de Beijing reconhecessem os direitos especficos da
mulher como parte integrante dos direitos humanos (art. 18 da
Declarao de Viena e art. 14 da Declarao de Beijing).
16.No
preciso ter, alis, a sofisticao de um Derrida para faz-lo.
Este, por sinal, embora j tenha at esboado uma "desconstruo",
confusa mas positiva, da Declarao de Independncia dos
Estados Unidos (Jacques Derrida, Desclarations of independence,
trad. Tom Keenan & Tom Pepper, New Political Science,
Nova York: Columbia University, Summer 1986), parece haver optado
por deixar a Declarao Universal de 1948 em paz. Ter tido
sobejas razes para isso.
17.Conforme j
assinalado na nota 13 supra, este no ainda, nem precisa ser
no futuro, o caso do Brasil. No improvvel, porm, que tal
venha a ocorrer tambm na sociedade brasileira, seja por evoluo
autnoma, seja pela contaminao que os fenmenos do Primeiro
Mundo costumam provocar em praticamente todo o planeta.
18.Da a mxima
kantiana: "Sapere aude! Tem coragem de te servires de
teu prprio entendimento!" (Agapito Maestre, ed. e trad., Qu
es ilustracin?, Madri: Tecnos, 1988, p. 17).
19.A frase, clebre,
do texto "O Dezoito Brumrio de Louis Bonaparte"
(David Mclellan, ed, Karl Marx, Selected Writing, Nova
York: Oxford University Press, 1977, p. 300).
20.Jean-Franois
Lyotard, La condition postmoderne: rapport sur le savoir,
Paris: Les Editions de Minuit, 1979, p. 7-11. A expresso
empregada por Lyotard "metadiscurso",
generalizadamente interpretada como as "grandes
narrativas" totalizantes.
21.Coletneas
significativas podem ser encontradas, por exemplo, em dois volumes
de palestras e estudos organizados pela Anistia Internacional e
publicados em Nova York pela Basic Books, em 1993: (a) Barbara
Johnson, ed, Freedom and interpretation: the Oxford Amnesty
Lectures 1992; (b) Stephen Shute & Susan Hartley, ed, On
Human Rights: the Oxford Amnesty Lectures 1993.
22.Na
Subcomisso das Naes Unidas para a Preveno da Discriminao
e Proteo s Minorias, em 1996, quando da considerao do
anteprojeto de Declarao sobre os Direitos dos Povos Indgenas
a ser encaminhado Comisso dos Direitos Humanos, chamei a ateno
dos colegas redatores do texto para a falta de ateno para com
os direitos das mulheres indgenas, freqentemente massacradas
ou maltratadas pelas tradies tribais. Minha observao,
provocada por chamamento que me fizeram indgenas
centro-americanas presentes reunio, caiu em ouvidos moucos.
De um colega latino-americano escutei a afirmao de que as
culturas autctones tm que ser preservadas em sua
integralidade, inclusive quando praticam o infanticdio. Esse
mesmo "perito" da Subcomisso no hesitava, porm, em
patrocinar resolues condenando pases muulmanos pela
discriminao contra as mulheres, o Ir pela perseguio aos
bahais, a Arglia pelas brutalidades do Governo e dos
fundamentalistas ou a Turquia por excessos no combate insurgncia
curda.
23. o caso,
entre outros, de Gustavo Esteva e Madhu Suri Prakash (????t???R????i>Grassroots
post-modernism: remaking the soil of cultures/i>, Londres e Nova
York: Zed Books, 1998), que rejeitam o Estado nacional como um
todo e os direitos humanos como "cavalo de Tria da
recolonizao", em defesa de culturas tradicionais do
Terceiro Mundo, como nica esperana contra o "Projeto
Global" de dominao do mundo pelo Ocidente capitalista. Em
seu af anti-imperialista, criticam at mesmo os direitos econmicos
e sociais (no que se identificam s posturas do liberalismo
ocidental mais radical) e justificam, quando tradio autctone,
a prtica da tortura.
24.O caderno Mais!
da Folha de So Paulo trouxe, na edio de 23.8.1998,
matria de Marcos Nobre, sob o ttulo "Mulheres revem
direitos da humanidade", na qual se reproduz entrevista com a
militante italiana Gabriella Bonachi, assim como trechos de
anteprojeto "ps-moderno" de uma nova Declarao
Universal dos Direitos Humanos. O texto muito bem redigido e
foi apresentado Comisso dos Direitos Humanos das Naes
Unidas como uma contribuio s comemoraes do cinqentenrio
da Declarao Universal (Documento E/CN. 4/1998/3). Temo, porm,
que possa ser confundido com uma proposta de reforma da Declarao
de 1948. Ou manipulado pelos defensores dos chamados "valores
asiticos" como "mais uma evidncia" de que a
Declarao Universal precisa ser refeita. Depois da verdadeira
"batalha" havida na Conferncia de Beijing, em 1995,
para o reconhecimento dos direitos das mulheres como parte
integrante dos direitos humanos universais, nesta poca de
fundamentalismos exacerbados, qualquer renegociao da Declarao
de 1948 pode representar o fim da base legal do Direito
Internacional dos Direitos Humanos e da luta planetria pelos
direitos fundamentais de todos os seres humanos, e das mulheres em
particular.
25.Uma concepo
multicultural de direitos humanos. Lua Nova, So Paulo,
CEDEC, n. 39,
p. 115-122, 1997.
26.Michel
Foucault, What is Enlightenment? Trad. Catherine Porter. In: Paul
Rabinow, ed. The Foucault Reader. New York: Pantheon Books,
1984. p. 50.
27.Da o rtulo
de neoconservadores que os ps-estruturalistas receberam de
Habermas, a rejeio de suas idias pela esquerda tradicional,
tambm sem dvida, o entusiasmo com que elas foram acolhidas nos
meios acadmicos defensores do status quo. O que no
invalida, por outro lado, a contribuio que trouxeram s lutas
identitrias contemporneas das minorias oprimidas e a uma
compreenso desmistificada da prpria modernidade.
28.Jacques
Derrida, Force de loi: le fondement mystique de lautorit. In:
Deconstrucion and the possibility of justice, Cardozo
Law Review, v. 11, n. 5-6, jul./ago. 1990. p. 972.
29.Id., ibid.,
p. 944.
30.Para uma
anlise pormenorizada dos possveis efeitos do pensamento de
Derrida, Lyotard, Foucault, Nietzche e Rorty na aplicao do
Direito. (v. Douglas E. Litowitz, Postmodern Philosophy &
Law, University Press of Kansas, 1997).
31.Jean-Franois
Lyotard, The Others Rights, trad. Chris Miller & Robert
Smith, On human rights: the Oxford Amnesty Lectures 1993
(v. nota 21 supra).
32.Deconstruction
and human rights. In: Freedom and interpretation: the Oxford
Amnesty Lectures 1992 (v. nota 21 supra), p. 122.
33.Human
rights, rationality and sentimentality. In: On human rights:
the Oxford Amnesty Lectures 1993 (v. nota 21 supra), p.
111-134.
34.Os
direitos de terceira gerao, ou direitos de solidariedade (como
o direito autodeterminao e o direito ao desenvolvimento),
podem ser encarados como complementao explicativa do campo de
aplicao das duas primeiras, j que no alteram em nada a
substncia dos direitos civis, polticos, econmicos, sociais e
culturais.
35.Norberto
Bobbio, A era dos direitos, trad. Carlos Nelson Coutinho,
Rio de Janeiro: Campus, 1992,
p. 24. A verso
original do ensaio "Sobre o fundamento dos direitos
humanos" foi apresentada em simpsio italiano realizado em
1964. A terminologia (seja italiana em geral, seja de Bobbio em
particular, ou de seu tradutor para o portugus) "direitos
do homem" acha-se defasada em relao expresso hoje em
dia consagrada nos documentos da ONU (human rights, derechos
humanos), com exceo dos "droits de l`homme"
ainda mantidos nas verses em francs.
36.O aceno ao
Ocidente feito pelo Presidente Khatami sobre a matria em
setembro de 1998, por ocasio de abertura da Assemblia Geral da
ONU, e que levou ao restabelecimento de relaes entre a Gr-Bretanha
e o Ir, dizia apenas que o Governo no iria execut-la. No
houve revogao da sentena "sagrada" de morte,
determinada por aiatol falecido, irrevogvel e vel de
execuo por qualquer fiel, como logo esclareceram os doutores
da ortodoxia xiita.
37.Gilberto
Sabia, O Brasil e o sistema internacional dos direitos humanos.
In: Textos do Brasil, Edio Especial, v. 2, n. 6, Braslia,
Palcio Itamaraty, maio/agosto, 1998.
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