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Direito busca paz mundial com paz social 2t5641

SILVIO BRESSAN

A mudana permanente, a discusso filosfica e as relaes internacionais foram as principais marcas do direito no sculo 20. Esta a avaliao do professor Celso Lafer, titular do Departamento de Filosofia e Teoria Geral do Direito da Universidade de So Paulo. O direito no tem mais aquela funo de qualificar uma conduta como justa ou injusta, avalia Lafer. Hoje o direito transformou-se num instrumento de gesto da sociedade, analisa. Essa mudana constante, numa sociedade de massas e num mundo globalizado, gerou um debate filosfico e colocou o direito internacional
no primeiro plano.

Ex-ministro das Relaes Exteriores (1992), ex-embaixador do Brasil junto s Naes Unidas e Organizao Mundial do Comrcio (OMC) em Genebra (1995-1998), ex-presidente do rgo de Soluo de Controvrsias da OMC (1997) e ex-ministro do Desenvolvimento (1999), Lafer um dos maiores especialistas do Pas em Direito Internacional. Para ele, o direito no tem mais aquela dimenso de imutabilidade e universalidade. Como instrumento de gesto, a nova funo do
direito de comandar: proibir ou permitir, estimular ou desestimular, explica Lafer. Exemplo dessa mudana so as medidas provisrias, utilizadas pelo governo para operar a gesto da sociedade atravs do direito.

Sdito Outra rea importante destacada por Lafer a dos direitos humanos. Citando o pensador italiano Norberto Bobbio, ele chama a ateno para a mudana da figura do dever do sdito para o direito do cidado. A idia de Bobbio, que ele explora iravelmente bem, que vivemos uma era dos direitos, diz o professor Lafer. Esse processo, lembra ele, a pelos direitos individuais, garantias de liberdades, alm dos direitos civis e polticos.

Como direitos de segunda gerao, Lafer destaca os direitos econmicos, sociais e culturais. So crditos que o indivduo tem com relao sociedade, descreve. Por fim, existem os direitos de titularidade coletiva. No plano internacional, entre outros, temos o direito paz e ao patrimnio comum, cita o ex-embaixador.

Seja como for, esses direitos am pelo Estado. Na sua avaliao, foi o Estado que, durante o sculo 20, assumiu o compromisso de saldar os crditos de direito em nome da coletividade. Todo esse processo de mudana tem como caracterstica a idia de que s direito o que direito positivo, acentua. aquele direito que se entende como posto ou
reconhecido pelo Estado. Da, acrescenta, o maior grau de complexidade e de discusso filosfica do direito neste sculo.

Crash Como exemplo da mudana do direito, ele cita o crash da Bolsa de Nova York, em 1929, que abalou a economia americana naquela poca. A crise de 29 foi uma crise de mercado e a crise que vivemos nos anos 90 uma crise de Estado, compara Lafer. Como estamos vivendo o direito positivo, no momento em que voc tem uma crise de Estado, h uma crise do papel do direito poltico. Em outras palavras, a crise do Estado seria a crise da viabilidade dos direitos econmicos, sociais e culturais.

Para complicar ainda mais esse processo, Lafer observa que vivemos em um mundo globalizado. E uma das caractersticas da globalizao o encurtamento do espao e a acelerao do tempo, o que diminui as fronteiras e internaliza o mundo como um todo para todos os pases, anota. Tudo o que acontece no mundo afeta a todos.

Antes de ser globalizada, entretanto, a sociedade atual uma sociedade de massas, o que tambm traz outros complicadores para o direito. As instituies jurdicas no se equiparam para lidar com a sociedade de massas, analisa Lafer. Todo o sistema jurdico, que havia sido pensado como negociao entre as partes, agora tem dificuldades em lidar com uma sociedade diferente.

Com todos esses obstculos, Lafer diz que a filosofia do direito precisou desenvolver quatro grandes campos de discusso: a metodologia jurdica, a organizao do universo jurdico, o impacto das normas na realidade e as relaes entre a justia da norma e a legitimidade do poder que coloca essas normas.

O primeiro ponto como eu conheo essa realidade em mudana permanente, explica o professor da USP. O segundo como eu organizo esse universo jurdico a partir do ngulo interno, examinando a relao das normas e a coerncia do seu ordenamento.

Alm disso, continua Lafer, preciso verificar se as normas funcionam ou no dentro da realidade atual. O direito no pode ser s uma jurisprudncia de conceito, mas uma jurisprudncia de interesse, adverte o ex-ministro. No Brasil, a criao da Justia do Trabalho, do juizado de pequenas causas, da arbitragem e do direito alternativo so linhas que respondem essa preocupao com a efetividade do direito, exemplifica. Por ltimo, ressalta ele, trata-se de estudar as relaes entre a justia
da norma e a legitimidade do poder. a confluncia entre a filosofia do direito e a filosofia poltica, resume o especialista.

To em evidncia quanto a discusso filosfica est a internacionalizao do direito. Na opinio de Lafer, a tcnica no faz a histria, mas muda as condies a partir dos quais os homens criam e operam a histria. Ento, o desenvolvimento de tecnologias da informtica e da comunicao acabou alterando a realidade em que o direito opera. Como exemplo, ele cita a tese da transferncia eletrnica de fundos. Quando essa tese foi escrita, era uma novidade observa. Hoje uma coisa corriqueira, que faz desaparecer o papel como instrumento de prova ou como documento, com todos os problemas de segurana que resultam disso.

Feudal At chegar a esse estgio, o professor lembra que o direito comercial surgiu nas cidades europias, criando instrumentos como a letra de cmbio ou a nota promissria para lidar com a mobilidade. Esses instrumentos tambm possibilitavam fazer uma coisa diferente do direito civil, que estava ligado, enfim, a uma estrutura feudal da terra. O direito
comercial uma expresso desse novo processo, que j um incio de globalizao, anota Lafer. Por isso, o ex-embaixador considera este o sculo das relaes internacionais. o sculo onde aquilo que acontece no mundo afeta a vida dos povos e dos pases muitos mais do que afetou nos sculos anteriores.

Apesar disso, o jurista adverte que a globalizao no resolve todos os problemas que o direito coloca. Por mais que o mundo se internalize na vida dos pases, os Estados e as naes permanecem como instncias indispensveis de intermediao, externa e interna, pondera Lafer. Isso assim porque o destino e a vida das pessoas continuam intimamente ligados ao desempenho dos pases em que vivem.

Da mesma forma, o professor alerta que a crise do Estado que faz as normas no pode transformar o mercado em legislador dele prprio. No existe mercado no vazio, diz Lafer. O mercado sempre algo que construdo e requer o estado de direito, observa. Da o desafio de voc criar normas de mtua colaborao no plano internacional. Para ele, h
uma defasagem muito grande entre as exigncias de gesto do mundo e da sociedade e as normas correspondentes.

E como resolver todos esses dilemas da filosofia e da globalizao que o direito moderno coloca? O caminho, no entender do ex-ministro, comea pelo pensamento de Bobbio, que faz uma relao entre a filosofia do direito e a filosofia poltica. No d para lidar com esses desafios sem enfrentar o problema do poder e da sociedade democrtica, traduz
Lafer. Bobbio tem muita clareza de que o tema das relaes internacionais, com valores mais homogneos, condio de
viabilizao da democracia e dos direitos humanos no plano interno.

Em resumo, explica o ex-ministro, a idia do pensador italiano de que para se lidar com o mundo na sua complexidade no basta apenas a democracia interna. preciso a afirmao dos direitos humanos como uma era dos direitos, que como voc assegura um mnimo de estabilidade para o indivduo no seu dia-a-dia, detalha. S assim voc
reafirma a dignidade, a no instrumentalizao do cidado.

Outro dos pressupostos de Bobbio de que a democracia, assim como o direito, no pode ser definida apenas pelo seu contedo. Bobbio diz que voc define o direito de acordo com a maneira pela qual ele criado, cita Lafer. Do mesmo modo, ele d da democracia uma definio voltada para os procedimentos mediante os quais voc chega a decises
coletivas.

Um exemplo tpico, segundo o ex-embaixador, a regra da maioria descrita pelo pensador italiano. Bobbio diz que melhor contar cabeas do que cortar cabeas, ressalta Lafer. o princpio da legalidade, onde a existncia de regras uma contribuio a convivncia coletiva. Nessa linha de raciocnio, Bobbio diz que o nico salto qualitativo o da agem do reino da violncia para o da no violncia. neste reino que o direito se torna um instrumento positivo, que aprimora a qualidade da convivncia coletiva, interpreta Lafer.

Na viso do professor da USP, a idia de que a forma republicana contribui para a paz internacional, de que h uma vinculao entre democracia, direitos humanos e paz. Paz para Bobbio no apenas ausncia de guerra, mas uma paz positiva, destaca Lafer. o que o autor italiano chama de pacifismo de meios, que atua sobre os meios da guerra, seja por meio do desarmamento, do controle dos armamentos ou do estmulo soluo pacfica de controvrsias.

Em um plano um pouco superior, Bobbio tambm trata do pacifismo institucional, que provocou a criao de organizaes internacionais responsveis pela istrao da interdependncia. Em uma terceira dimenso, ele trata do pacifismo de fins, onde se coloca uma tarefa de educar as pessoas para uma melhor convivncia coletiva, explica Lafer.

Todo esse processo de mudana, na avaliao do professor da USP, tem um balano positivo ao fim do sculo 20. Os direitos civis e polticos adquiriram uma grande abrangncia, considera Lafer. Mas isso no se encerra, um processo constante que vai sempre depender da qualidade do Judicirio e da polcia, da educao, da cidadania e de sua compreenso, anota o ex-ministro.

Labirinto O fundamental, diz Lafer, refletir sobre as trs metforas de Bobbio: a da mosca na garrafa, a do peixe na rede e a do labirinto. A primeira de que estamos como uma mosca dentro da garrafa. Existe uma sada, mas no sabemos. O papel da razo mostrar que existe um caminho. A segunda de que fomos colhidos como os peixes na rede do pescador. Nos debatemos, mas o fim inexorvel, no h nada a fazer.

E a terceira imagem, preferida por Lafer, a de que vivemos no labirinto da convivncia coletiva. A experincia nos mostra que certos caminhos so bloqueados e no nos levam a lugar nenhum. A tarefa da razo identificar quais so esses caminhos bloqueados e buscar uma sada.

Acho que Bobbio nos indica quais os caminhos bloqueados, comenta Lafer. No nem a certeza de que a razo vai nos tirar da garrafa nem o niilismo de quem no tem esperana como o peixe na rede, prossegue. Mas a idia de que nos cabe mostrar a razo e, ao mesmo tempo, lidar com a paixo, emoo e preconceito, que tambm fazem parte da natureza humana.


O Estado de S. Paulo

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