A
10 dezembro deste ano, a Declarao Universal
dos Direitos Humanos, assinada pelo Brasil,
completa 60 anos.
Segundo
a Anistia Internacional, ainda hoje em mais
de uma centena de pases se torturam prisioneiros.
Os EUA no apenas o fazem, como o presidente
Bush no se envergonha de defender em pblico
mtodos duros aplicados aos suspeitos de terrorismo.
No
Brasil, com freqncia a polcia transforma
uma blitz em chacina; presos pobres so seviciados
em delegacias; defensores dos direitos humanos
sofrem ameaas e ataques; e quem desrespeita
continua a gozar de impunidade.
Houve
avanos em nosso pas nos ltimos anos. O governo
criou a Secretaria Nacional de Direitos Humanos
e a tortura foi tipificada na lei como crime
hediondo (inafianvel). Mas perdura uma grande
distncia entre as estruturas constitucionais
de defesa dos direitos humanos e os persistentes
abusos, assim como a ausncia de garantias para
proteg-los em certas reas do pas, sobretudo
na regio Norte.
Vivemos,
hoje, sob o paradoxo de popularizar o tema dos
direitos humanos e, ao mesmo tempo, deparar-nos
com hediondas violaes desses mesmos direitos,
agora transmitidas ao vivo, via satlite, para
as nossas janelas eletrnicas. O que assusta
e preocupa o fato de, entre os violadores,
figurarem, com freqncia, instituies e autoridades
- governos, polcias, tropas destinadas a misses
pacificadoras etc. - cuja funo legal zelar
pela difuso, compreenso e efetivao dos direitos
humanos.
A
falta de um programa sistemtico de educao
em direitos humanos na maioria dos pases signatrios
da Declarao Universal favorece que se considere
violao a tortura, mas no a agresso ao meio
ambiente; o roubo, mas no a misria que atinge
milhares de pessoas; a censura, mas no a interveno
estrangeira em pases soberanos; o desrespeito
propriedade, mas no a sonegao do direito
de propriedade maioria da populao.
Na
Amrica Latina, o espectro do desrespeito aos
direitos humanos estende-se das selvas da Guatemala
ao altiplano do Peru; do bloqueio estadunidense
a Cuba s polticas econmicas neoliberais que
protegem o supervit primrio e ignoram o drama
de crianas de rua e os milhes de analfabetos.
Para
o Evangelho, toda vida sagrada. Jesus se colocou
no lugar dos que tm seus direitos violados,
ao dizer que teve fome, teve sede, que esteve
oprimido (Mateus 25, 31-46).
Um
programa de educao em direitos humanos deve
visar, em primeiro lugar, a qualificao dos
prprios agentes educadores, tanto instituies
- ONGs, Igrejas, governos, escolas, partidos
polticos, sindicatos, movimentos sociais etc.
- quanto pessoas.
Em
muitos pases, a lei consagra os direitos inalienveis
de todos, sem distino entre ricos e pobres,
confinada, porm, mera formalidade jurdica,
que no assegura a toda a populao uma vida
justa e digna. Pouco valem as Constituies
de nossos pases proclamarem que todos tm igual
direito vida se no so garantidos os meios
materiais que o tornem efetivo.
Os
direitos fundamentais no podem se restringir
aos direitos individuais enunciados pelas revolues
burguesas do sculo XVIII. A liberdade no consiste
no contratualismo individual que sacraliza o
direito de propriedade e permite ao proprietrio
a "livre iniciativa" de expandir seus lucros
ainda que custa da explorao alheia.
Num
mundo assolado pela misria de quase metade
de sua populao, o Estado no pode arvorar-se
em mero rbitro da sociedade, mas deve intervir
de modo a assegurar a todos direitos sociais,
econmicos e culturais. O reconhecimento de
um direito inerente ao ser humano no suficiente
para assegurar seu exerccio na vida daqueles
que ocupam uma posio subalterna na estrutura
social.
H
direitos de natureza social, econmica e cultural
- como ao trabalho, greve, sade, educao
gratuita, estabilidade no emprego, moradia
digna, ao lazer etc. - que dependem, para a
sua viabilizao, da ao poltica e istrativa
do Estado. Nesse sentido, o direito pessoal
e coletivo organizao e atuao polticas
torna-se, hoje, a condio de possibilidade
de um Estado verdadeiramente democrtico.