Projeto DHnet
Ponto de Cultura
Podcasts
Direitos Humanos
Desejos Humanos
Educao EDH
Cibercidadania
Memria Histrica
Arte e Cultura
Central de Denncias
Banco de Dados
MNDH Brasil
ONGs Direitos Humanos
ABC Militantes DH
Rede Mercosul
Rede Brasil DH
Redes Estaduais
Rede Estadual RN
Mundo Comisses
Brasil Nunca Mais
Brasil Comisses
Estados Comisses
Comits Verdade BR
Comit Verdade RN
Rede Lusfona
Rede Cabo Verde
Rede Guin-Bissau
Rede Moambique

Comentrio ao artigo 13 4g6m54

Ricardo Brisolla Balestreri

No dia 10 de dezembro de 1948, quando as Naes Unidas ofereceram ao planeta a Declarao Universal dos Direitos Humanos, imagino que seus signatrios intussem palidamente a importncia histrica que viria a ter aquele documento. No creio que estivessem plenamente conscientes de todo o alcance e qualidade do que estavam fazendo. Se assim foi, no importa. Por sendas s vezes misteriosas, uma espcie de inteligncia universal tecendo a trama evolutiva do destino humano.

Confesso que tampouco hoje, cinquenta anos ados, me parece suficientemente 9desvelada aos olhos da contemporaneidade a relevncia da Declarao.

Estamos demasiadamente envolvidos com nossas conquistas tecnolgicas, demasiadamente aturdidos por nossa vaidade cientfica para vermos outros avanos, talvez at mais significativos, especialmente os do campo tico e social.

A Declarao , contudo, a expresso revolucionria mais significativa engendrada nos milnios de histria humana: uma expresso de contedo moral.

Pela primeira vez um paradigma solidrio, fundado na igualdade de direitos, foi assumido, de forma praticamente consensual, pelo conjunto dos pases. Que magnfica transformao da cultura universal, at ento disposta a dar guarida oficial s aviltantes diferenas de tratamento, com base na suposio da naturalidade, da inerncia de disparidades relativas condio humana!

Reconhecer que todos somos iguais em direitos, sem, por isso, negar nossas diferenas individuais, representou um gigantesco o no processo civilizatrio, certamente o maior.

Se o mundo teve pernas para acompanhar esse o simblico, fruto de sculos de luta social, uma outra histria. Os relatrios de violaes de direitos, produzidos por organizaes como a Anistia Internacional, comprovam que estamos longe da utopia possvel proposta h cinquenta anos. Contudo, em muitos campos, os avanos no ficaram na mera retrica e podemos, sem qualquer ingenuidade, cidados do novo milnio, sentir-nos semeados de esperanas. Os paradoxos ainda encontrados so como dores de parto de uma nova civilizao, que vem surgindo, guiada pelo roteiro seguro da Declarao Universal dos Direitos Humanos.

Qualificar essa caminhada tem, contudo, dependncia direta de nosso zelo pelo cumprimento cada vez mais aperfeioado do que propem os trinta artigos. A funo utilitria mais importante de um mapa permitir-nos traar os rumos e corrigir os desvios.

Nessa linha, cabe-me, aqui, refletir sobre o Artigo 13:

  1. Todo homem tem direito liberdade de locomoo e residncia dentro das fronteiras de cada Estado.
  2. Todo homem tem direito de deixar qualquer pas, inclusive o prprio, e a este regressar.
Isto real, no mundo em que vivemos? Apenas em modesta parte.

Se acreditarmos nas cifras mais moderadas e comprovadas do ltimo Relatrio Mundial da Anistia Internacional, saberemos que em 87 pases existem presos de conscincia, gente que no cometeu qualquer delito mas que, pacificamente, o9usou pensar diferentemente do poder. Em 31 pases pessoas continuam desaparecendo. Em 55, praxe o exerccio de execues extrajudiciais. Em 117, comum o uso da tortura.

Temos estatsticas precisas sobre restries ao direito de ir e vir. No e nem preciso que saibamos que esses direitos, em grande parte do planeta, no so itidos. Basta julgar pelos dados acima. Eles nos fazem perceber que grande parte da humanidade seencontra esmagada sob o peso de ditaduras declaradas ou hipcritas. Ora, no h ditadura liberal quanto a direitos de locomoo.

Nesses lugares, os cidados so impedidos de morar onde desejam, em nome da planificao ou da segurana nacional, em alguns no podem frequentar as regies mesmo na cidade onde vivem reservadas s burocracias ou aos turistas, em praticamente todos no tm permisso para ir ao exterior, onde podem tentar o refgio ou a denncia.

A inter-relao entre as violaes dos direitos mais bsicos uma constante em todas as ditaduras de direita ou de esquerda. A restrio da locomoo estratgia obrigatria para impedir a fluidez de informaes, a formao de redes, a capacitao de apoios.

Contudo, at aqui, estamos falando do que duramente trivial: a restrio ou negao pura e simples dos chamados direitos de primeira gerao.

Quero ir alm e refletir um pouco sobre a interseo entre estes e os da Segunda gerao: os direitos sociais.

Como pensar em liberdade de locomoo, estabelecimento de residncia, ir ao exterior e voltar, em um mundo de um bilho de famlicos e centenas de milhes de semifamlicos?

diferente propor um direito e assegurar as condies para realiz-lo.

De maneira geral, no preciso usar a fora bruta para conter os fluxos humanos. A fora da misria basta. Quem pode escolher o lugar da residncia? Quem tem uma residncia? Quem pode sair de sua provncia, de seu estado, de seu pas, para trabalhar ou fazer turismo? No preciso ir to sonhadoramente longe: quem pode garantir mensalmente o dinheiro do trem ou do nibus para chegar ao local de trabalho? Quem tem trabalho? Muitas outras perguntas poderiam enredar-se na malha terrvel dessas anteriores.

Diante disso, bem estranho, ainda que necessrio, propormos direitos to sofisticados. As limitaes impostas pela pobreza tornaram-se to banalizadas que alguns direitos fundamentais, dos quais no podemos deixar de falar, acabam parecendo-se com ridculas e lricas abstraes.

um equvoco, no entanto, pensar assim. Sob a pena de no conquistarmos nenhum tipo de liberdade, no podemos hierarquizar direitos, submet-los a uma ordem de propriedades ou cronologias. Todos os direitos precisam, em nvel pessoal e coletivo, se dialeticamente e horizontalmente alcanados, ou no alcanaremos nenhum. A submisso das liberdades espirituais, em sentido amplo, culturais, filosficas, organizacionais ao atingimento do bem-estar material reduz e coisifica o ser humano, constituindo-se uma forma de sociopaternalismo gerador de ividade e dependncia.

De igual maneira, no entanto, ignorar a inter-relao obrigatria entre direitos civis e polticos e direitos sociais restringir pobremente a compreenso do fenmeno a elementos mecnicos, declaratrios, legalistas, formais.

inevitvel constatarmos, por exemplo, que a maior parte da humanidade no tem assegurados os direitos de ir e vir pelo simples fato de que isso no pode fazer parte de suas mais bsicas aspiraes, uma vez que sequer tem direito de morar, de comer, de ter sade, de estudar, de trabalhar. Locomover-se uma impossibilidade, exceto quando em fuga de genocdios, guerras, secas, enchentes, maremotos, terremotos e outras catstrofes naturais ou provocadas. Assim mesmo, as fronteiras so fechadas, e essas levas de gente enxotadas at a morte.

Qual a sada? Continuar denunciando, pressionando os governos, indignando-se e incendiando positivamente o planeta com essa indignao, sem dvida. Mas no apenas isso. A indignao pode virar, como tem ocorrido muito comumente, uma desculpa para o imobilismo de conscincias tranquilizadas pela retrica. preciso mais do que isso: seguir e ensinar a seguir o mapa. Ter objetivos. Levar em conta o conjunto de elementos orientadores. No segmentar a leitura. Atuar em todas as frentes mediante a nica grande porta de entrada: a educao.

Os direitos humanos, inclusive os de livre locomoo, s podem ser assegurados pela gerao de uma cultura universal de cidadania. Essa cultura s ser possvel quando a humanidade souber que tem direitos e, ao mesmo tempo, souber as formas eficazes de luta para alcan-los e plenamente exerc-los.

No h maneira de chegar a isso que no e pela educao.

Como aspirar a sair, conhecer, visitar, escolher onde viver, sem saber que as maravilhas do planeta so um legado para todos e que legtimo desejar partilh-las, como cidados do mundo, superando as abstraes limitantes das fronteiras inventadas e dos direitos exclusivos e excludentes? S a educao permite o sonho e resgata o aporte para a utopia.

Temos uma grade curricular pronta para o uso, das melhores: a Declarao Universal dos Direitos Humanos.

Temos tambm os educadores para desafiar a construo do processo. Talvez nem todos, porm, se reconheam nessa condio. Eles no esto apenas nas salas de aula, como nos fazia crer o antigo paradigma. Esto, igualmente, nos consultrios mdicos, nas redaes dos jornais nas corporaes policiais, nas Igrejas, nos servios pblicos, nas televises, nos grmios estudantis, nas associaes de pais, nas entidades filantrpicas, nas associaes de moradores, nas ONGs, nas fundaes, nas empresas, nas promotorias pblicas, nas defensorias, na magistratura, nos escritrios de advocacia.

Multiplicar, iluminar e educar tarefa de todos ns. A Declarao Universal dos Direitos Humanos apenas um brilhante roteiro. A realidade ser o que dela se fizer.

Psicopedagogo clnico; Presidente da Seo Brasileira da Anistia Internacional; membro do Comit de Monitoramento do Centro de Recursos Educacionais (CRE), com base no Instituto Interamericano de Direitos Humanos e Consultor independente do Ncleo de Acompanhamento e Fiscalizao do Programa Nacional de Direitos Humanos/Ministrio da Justia.

Desde 1995 dhnet-br.informativomineiro.com Copyleft - Telefones: 055 84 3211.5428 e 9977.8702 WhatsApp
Skype:direitoshumanos Email: [email protected] Facebook: DHnetDh
Busca DHnet Google
Not
Loja DHnet
DHnet 18 anos - 1995-2013
Linha do Tempo
Sistemas Internacionais de Direitos Humanos
Sistema Nacional de Direitos Humanos
Sistemas Estaduais de Direitos Humanos
Sistemas Municipais de Direitos Humanos
Hist
MNDH
Militantes Brasileiros de Direitos Humanos
Projeto Brasil Nunca Mais
Direito a Mem
Banco de Dados  Base de Dados Direitos Humanos
Tecido Cultural Ponto de Cultura Rio Grande do Norte
1935 Multim