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Quarta Declarao
da Selva Lacandona 6j4125
Ao povo do Mxico
Aos povos e governos do mundo
Irmos:
Hoje dizemos: aqui estamos. Somos a
dignidade rebelde, o corao esquecido da Ptria!
A flor da palavra no morrer.
Poder morrer o rosto oculto de quem hoje a nomeia, mas a palavra
que veio desde o fundo da histria e da terra j no poder
ser arrancada pela soberba do poder.
Ns nascemos da noite. Nela
vivemos. Nela morreremos. Porm, a luz ser manh para os
demais, para todos aqueles que hoje choram a noite, para quem o
dia negado, para quem a morte uma ddiva, para a dor e a
angstia. Para ns, a alegre rebeldia. Para ns o futuro
negado, a dignidade insurrecta. Para ns, nada.
Nossa luta para fazer-nos
escutar, e o mau governo grita soberba e tapa com canhes os seus
ouvidos.
Nossa luta contra a fome, e o
mau governo oferece balas e papel aos estmagos de nossos filhos.
Nossa luta por uma moradia
digna, e o mau governo destri nossa casa e nossa histria.
Nossa luta pelo saber, e o mau
governo reparte ignorncia e desprezo.
Nossa luta por terra, e o mau
governo oferece cemitrios.
Nossa luta por trabalho justo e
digno, e o mau governo compra e vende corpos e vergonha.
Nossa luta pela vida, e o mau
governo oferece a morte como futuro.
Nossa luta pelo respeito ao
nosso direito de governar e nos governarmos, e o mau governo impe
maioria a lei da minoria.
Nossa luta por liberdade para o
pensamento e o caminhar, e o mau governo impe crceres e tmulos.
Nossa luta por justia, e o mau
governo est cheio de criminosos e assassinos.
Nossa luta pela histria, e o
mau governo prope o esquecimento.
Nossa luta pela Ptria, e o mau
governo sonha com a bandeira e a lngua estrangeiras.
Nossa luta pela paz, e o mau
governo anuncia guerra e destruio.
Moradia, terra, trabalho, po, sade,
educao, independncia, democracia, liberdade, justi?????s???o???????a e paz.
Estas foram nossas bandeiras na madrugada de 1994. Estas foram as
nossas demandas na longa noite dos 500 anos. Estas so hoje
nossas exigncias.
Nosso sangue e nossas palavras
acenderam um pequeno fogo na montanha e o levamos rumo casa do
poder e do dinheiro. Irmos e irms de outras raas e outras lnguas,
de outra cor e mesmo corao, protegeram a nossa luz e dela
acenderam seus respectivos fogos.
O poderoso veio para nos apagar com
o seu sopro poderoso, mas nossa luz cresceu em outras luzes. O
rico sonha em apagar a primeira luz. intil, j existem
muitas luzes e todas so primeiras.
O soberbo quer apagar uma rebeldia
que sua ignorncia situa no amanhecer de 1994. Porm, a rebeldia
que hoje tem rosto moreno e lngua verdadeira no nasceu agora.
Antes falou com outras lnguas e em outras terras. A rebeldia
contra a injustia caminhou em muitas montanhas e muitas histrias.
Ela j falou em lngua nhuatl, paipai, kiliwa, ccapa,
cochimi, kumiai, yuma, seri, chontal, chimanteco, pame, chichimeca,
otom, mazahua, matlazinca, ocuilteco, zapoteco, solteco, chatino,
papabuco, mixteco, cuicateco, triqui, amuzgo, mazateco, chocho,
izcateco, huave, tlapaneco, totonaca, tepehua, popoluca, mixe,
zoque, huasteco, lacandn, maya, chol, tzeltal, tzotzil,
tojolabal, mame, teco, ixil, aguacateco, motocintleco,
chicomucelteco, kanjobal, jacalteco, quich, cakchiquel, ketchi,
pima, tepehun, tarahumara, mayo, yaqui, cahta, pata, cora,
huichol, purpecha e kikap. Falou e fala o espanhol. A reb?????s???o???????eldia
no coisa de lngua, coisa de dignidade e de seres
humanos.
Por trabalhar nos matam, por viver
nos matam. No h lugar para ns no mundo do poder. Por lutar
nos mataro, mas ns construiremos um mundo onde tenha lugar
para todos e todos possam viver sem morte na palavra. Querem nos
tirar a terra, para que o nosso o no possa andar. Querem nos
tirar a histria, para que a nossa palavra morra no esquecimento.
No nos querem ndios. Nos querem mortos.
Para os poderosos, o nosso silncio
era uma beno. Calando morramos, sem palavra no existamos.
Lutamos para falar contra o esquecimento, contra a morte, pela memria
e pela vida. Lutamos pelo medo de morrer a morte do esquecimento.
Falando em seu corao ndio, a
Ptria continua digna e com memria.
Irmos:
No dia 1 de janeiro de 1995,
depois de romper o cerco militar com o qual o mau governo
pretendia nos render e condenar ao esquecimento, convocamos as
diferentes foras polticas e cidados a construir uma ampla
frente de oposio que unisse as vontades democrticas contra o
sistema de partido de Estado: o Movimento para a Libertao
Nacional. Ainda que de incio este esforo de unidade
oposicionista encontrasse no poucos problemas, ele se manteve
vivo no pensamento dos homens e mulheres que no se conformam em
ver sua Ptria entregue s decises do poder e do dinheiro
estrangeiros. Depois de trilhar um caminho cheio de dificuldades,
?????s???o??????? incompreenses e retrocessos, a frente ampla de oposio est
por concretizar seus primeiros planos de acordos e ao
conjunta. O longo processo de amadurecimento deste esforo de
organizao dever alcanar sua plenitude no ano que comea.
Ns os zapatistas, saudamos o nascimento do Movimento para a
Libertao Nacional e desejamos que entre os que tomam parte
dele exista sempre o af da unidade e o respeito s diferenas.
Iniciado o dilogo com o supremo
governo, o EZLN se viu trado no seu compromisso de buscar uma
soluo poltica para a guerra iniciada em 1994. Fingindo
disposio para o dilogo, o mau governo optou covardemente
pela soluo militar e, com argumentos torpes e estpidos,
desatou uma grande perseguio poltica e militar que tinha
como objetivo supremo o assassinato da direo do EZLN. As foras
armadas rebeldes do EZLN resistiram com serenidade ao golpe de
dezenas de milhares de soldados que, contando com assessoria
estrangeira e toda a moderna maquinaria de morte que possuem,
pretendeu sufocar o grito de dignidade que saa das montanhas do
sudeste mexicano. Uma retirada ordenada permitiu s foras
zapatistas conservar seu poder militar, sua autoridade moral, sua
fora poltica e a razo histrica, que a sua arma
principal contra o crime vestido de governo. As grandes mobilizaes
da sociedade civil nacional e internacional pararam a ofensiva
traidora e obrigaram o governo a insistir na via do dilogo e da
negociao. Dezenas de civis inocentes foram aprisionados pelo
mau governo e ainda permanecem presos, na qualidade de refns dos
terroristas que nos governam. ?????s???o???????As foras federais no tiveram vitria
militar maior que a destruio de uma biblioteca, de um salo
para eventos culturais, uma pista de baile e o saque dos poucos
pertences dos indgenas da Selva Lacandona. A tentativa de
realizar um assassinato foi coberta pela mentira governamental,
com a mscara da "recuperao da soberania nacional".
Esquecendo o Artigo 39 da Constituio
que jurou cumprir no dia 1 de dezembro de 1994,o supremo governo
reduziu o Exrcito Federal Mexicano categoria de exrcito de
ocupao, atribuindo-lhe a tarefa de salvaguardar o crime
organizado que se veste de governo.
Entretanto, a verdadeira perda da
soberania nacional concretizava-se nos pactos secretos e pblicos
do gabinete econmico com os donos do dinheiro e os governos
estrangeiros. Hoje, enquanto dezenas de milhares de soldados
federais agridem e fustigam um povo armado de fuzis de madeira e
palavra digna, os altos governantes acabam de vender a riqueza da
grande nao mexicana e de destruir o pouco que ainda se mantm
de p.
Iniciado h pouco tempo o dilogo
ao qual havia sido obrigada pela sociedade civil nacional e
internacional, a delegao parlamentar teve oportunidade de
mostrar claramente suas verdadeiras intenes na negociao de
paz. Os novos conquistadores dos indgenas, que encabeam a
equipe negociadora do governo, se distinguem por uma atitude
prepotente, soberba, racista e humilhadora, que levou ao fracasso
vrias reunies do Dilogo de San Andrs. Apostando no cansao
e no desgast?????s???o???????e dos zapatistas, a delegao governamental ps
todo o seu empenho em conseguir a ruptura do dilogo, confiante
de que desta forma teria argumentos para recorrer fora e,
assim, conseguir alcanar o que lhe era impossvel pela razo.
Vendo que o governo recusava um
enfoque srio do conflito nacional representado pela guerra, o
EZLN tomou uma iniciativa de paz que destravaria o dilogo e a
negociao. Convocando a sociedade civil a um dilogo nacional
e internacional em busca de uma nova paz, o EZLN realizou a
Consulta pela Paz e a Democracia, para ouvir o pensamento nacional
e internacional sobre suas demandas e seu futuro.
Com a participao
entusiasmada dos membros da Conveno Democrtica
Nacional, de milhares de cidados sem organizao
porm com desejos democrticos, a mobilizao
dos comits de solidariedade internacionais e
os grupos de jovens, e a irrepreensvel ajuda
dos irmos e irms da Aliana Cvica Nacional,
durante os meses de agosto e setembro de 1995
levou-se a cabo um exerccio cidado que no tem
precedentes na histria mundial: uma sociedade
civil e pacfica dialogando com um grupo armado
e clandestino. Foram realizados mais de um milho
e trezentos mil dilogos para tornar verdadeiro
este encontro de vontades democrticas. Como resultado
da consulta, a legitimidade das demandas zapatistas
foi ratificada, deu-se um novo impulso ampla
frente opositora que encontrava-se estancada e
expressou-se claramente o desejo de ver os zapatistas
participando da vida poltica do pas. A grande
participao da sociedade civil internacional
chamou a ateno sobre a necessidade de construir
os espaos de encontro entre as vontades de mudana
democrtica que existem nos diferentes pases.
O EZLN levou a srio os resultados deste dilogo
nacional e internacional e iniciou os trabalhos
polticos e organizativos para caminhar de acordo
com estes sinais.
Trs novas iniciativas foram lanadas
pelos zapatistas, como resposta ao xito da Consulta pela Paz e
pela Democracia. Uma iniciativa de mbito internacional:
convocamos um encontro intercontinental contra o neoliberalismo.
Duas iniciativas so de carter nacional: a formao de comits
civis de dilogo, como base para a discusso dos principais
problemas nacionais e embrio de uma nova fora poltica no
partidria; e a construo de novos Aguascalientes, como
lugares de encontro entre a sociedade civil e o zapatismo.
Trs meses depois destas trs
iniciativas, est por concretizar-se a convocatria para o
encontro intercontinental pela humanidade e contra o
neoliberalismo. Mais de 200 comits civis de dilogo se formaram
em toda a Repblica Mexicana e, no dia de hoje, inauguramos 5
novos Aguascalientes: um na comunidade de La Garrucha,
outro em Oventik, um em Morelia, outro em La Realidad e o ltimo
e primeiro, no corao de todos os homens e mulheres honestos
que existem no mundo.
Em meio a ameaas
e penrias, as comunidades indgenas zapatistas
e a sociedade civil lograram levantar estes centros
de resistncia civil e pacfica onde ser resguardada
a cultura mexicana e mundial.
O Novo Dilogo Nacional
experimentou sua primeira prova por ocasio da mesa do Dilogo
de San Andrs. Enquanto o governo descobria a sua ignorncia a
respeito dos primeiros habitantes destas terras, os assessores e
convidados do EZLN deram incio a um dilogo to rico e novo
que logo transbordou a estreita mesa de San Andrs e se colocou
em seu verdadeiro lugar: a nao. Os indgenas mexicanos, os
que sempre foram obrigados a escutar, a obedecer, a aceitar, a
resignar-se, tomaram a palavra e falaram a sabedoria que caminha
em seus os. A imagem do ndio ignorante, pusilnime e ridculo,
a imagem que o poder havia decretado para consumo nacional, fez-se
em pedaos, e o orgulho e a dignidade indgenas voltaram histria,
para assumir o lugar que lhe cabe: o de cidados completos e
cabais.
Independentemente
dos resultados da primeira negociao dos Acordos
em San Andrs, o dilogo iniciado pelas distintas
etnias e seus representantes seguir adiante,
agora no Frum Nacional Indgena, e ter o ritmo
e o alcance que os prprios indgenas venham a
escolher e decidir. No cenrio poltico nacional,
o redescobrimento da criminalidade salinista voltou
a sacudir o sistema de partido de Estado. Os defensores
das contra-reformas salinistas sofrem de amnsia
e agora so os mais entusiasta perseguidores daqueles
sob cuja sombra enriqueceram. O Partido de Ao
Nacional, o mais fiel aliado de Carlos Salinas
de Gortari, comeou a mostrar as suas possibilidades
de substituir o Partido Revolucionrio Institucional
no topo do poder poltico e a ensinar sua vocao
repressiva, intolerante e reacionria. Aqueles
que vem com esperana o ascenso deste partido
esquecem que a substituio de uma ditadura no
significa necessariamente democracia, e aplaudem
a nova inquisio que, com mscara democrtica,
haver de sancionar com golpes os ltimos estertores
de um pas que foi assombro mundial e hoje referncia
de crnicas policiais e escndalos. A represso
e a impunidade foram constantes no exerccio deste
governo; os massacres de indgenas em Guerrero,
Oaxaca e Huasteca ratificam a poltica frente
aos indgenas; o autoritarismo da UNAM em relao
ao movimento dos CCH demonstra a rota de corrupo
que vai da academia poltica; a deteno de
dirigentes do El Barzn uma mostra a mais da
traio como mtodo de dilogo; as bestialidades
do regente Espinosa ensaiam o fascismo callejero
na Cidade do Mxico; as reformas na Lei de
Seguro Social reiteram a democratizao da misria
e o apoio privatizao dos bancos assegura a
vocao de unidade entre poder e dinheiro; os
crimes polticos so insolveis porque cometidos
por quem diz persegu-los; a crise econmica torna
mais escandalosa a corrupo nas esferas governamentais.
Governo e crime, hoje so sinnimos e equivalentes.
Enquanto a verdadeira oposio
afana-se em encontrar o centro em uma nao moribunda, amplas
camadas da populao reforam seu ceticismo perante os partidos
polticos e buscam, sem encontrar, uma oposio que tenha uma
nova prtica poltica, uma organizao poltica de novo tipo.
A herica e digna
resistncia das comunidades indgenas zapatistas
iluminou como uma estrela o ano de 1995 e escreveu
uma formosa lio na histria mexicana. Em Tepoztln,
Sutaur-100, El Barzn, para mencionar alguns lugares
e movimentos, a resistncia popular encontrou
dignos representantes.
Em resumo, o ano de 1995 se
caracterizou pela definio de dois projetos de nao
completamente distintos e contraditrios.
De um lado, o projeto de pas do
Poder. Um projeto que implica a destruio total da nao
mexicana; a negao de sua histria; a entrega da sua
soberania; a traio e o crime como valores supremos; a
hipocrisia e o engano como mtodo de governo; a desestabilizao
e a insegurana como programa nacional, a represso e a intolerncia
como projeto de desenvolvimento. Este plano encontra no PRI a sua
cara criminosa e no PAN a sua mscara democrtica. Do outro
lado, o projeto de transio para a democracia; no uma transio
pactuada com o Poder que simule uma mudana para que tudo
continue como est, e sim uma transio para a democracia como
projeto de reconstruo do pas; a defesa da soberania
nacional; a justia e a esperana como anseios; a verdade e o
mandar obedecendo como diretrizes; a estabilidade e a segurana
provenientes da democracia e da liberdade; a dilogo, a tolerncia
e a incluso como nova forma de fazer poltica.
Este projeto est
pra ser construdo e ser obra, no de uma fora
poltica hegemnica ou da genialidade de um indivduo,
mas de um amplo movimento opositor que recolha
os sentimentos da nao. Estamos no meio de uma
grande guerra que sacudiu o Mxico neste final
de sculo. A guerra entre os que pretendem a perpetuao
de um regime social, cultural e poltico que eqivale
ao delito de traio Ptria, e os que lutam
por uma transformao democrtica, livre e justa.
A guerra zapatista s uma parte desta grande
guerra, que a luta entre a memria que aspira
ao futuro e o esquecimento com vocao estrangeira.
Hoje, uma nova sociedade plural,
tolerante, includente, democrtica, justa e livre s possvel,
em uma nova Ptria. Ela no ser construda pelo poder. Hoje o
poder s o agente de venda dos escombros de um pas destrudo
pelos verdadeiros subversivos e desestabilizadores: os
governantes.
Quanto aos projetos independentes
da oposio, temos uma carncia que hoje torna-se mais
decisiva: nos opomos a um projeto de pas que implica a sua
destruio, porm carecemos de uma proposta de nova nao,
uma proposta de reconstruo. Parte dela, e no o todo e nem
sua vanguarda, tem sido e o EZLN no esforo pela transio
para a democracia. Apesar das perseguies e ameaas, superando
os enganos e as mentiras, o EZLN, legtimo e coerente, segue
adiante em sua luta pela democracia, liberdade e justia para
todos os mexicanos.
Hoje, a luta pela democracia no Mxico
uma luta pela libertao nacional.
Hoje, com o corao
de Emiliano Zapata e tendo escutado a voz de todos
os nossos irmos, chamamos o povo do Mxico a
participar de uma nova etapa da luta pela libertao
nacional e da construo de uma nova Ptria, por
meio desta ... Quarta Declarao da Selva Lacandona,
na qual conclamamos todos os homens e mulheres
honestos a participar da nova fora poltica nacional
que nasce: a Frente Zapatista de Libertao Nacional,
organizao civil e pacfica, independente e democrtica,
mexicana e nacional, que luta pela democracia,
liberdade e justia do Mxico. A Frente Zapatista
de Libertao Nacional nasce hoje e convidamos
a participar dela os operrios da Repblica, os
trabalhadores do campo e da cidade, os indgenas,
os colonos, os professores e estudantes, as mulheres
mexicanas, os jovens de todo o pas, os artistas
e intelectuais honestos, os religiosos coerentes,
todos os cidados mexicanos que no querem o poder
e sim a democracia, a liberdade e a justia para
ns e nossos filhos.
Convidamos a sociedade civil
nacional, os sem partido, o movimento social e cidado, todos os
mexicanos, a construir uma nova fora poltica. Uma nova fora
poltica que seja nacional. Uma nova fora poltica com base no
EZLN.
Uma nova fora poltica que seja
parte de um grande movimento opositor, o Movimento para a Libertao
Nacional, como lugar de ao poltica cidad, para onde
confluam outras foras polticas da oposio independente,
espao de encontro de vontades e coordenador de aes voluntrias.
Uma fora poltica
cujos integrantes no desempenhem, nem aspirem
desempenhar, cargos de eleio popular ou postos
governamentais em quaisquer de seus nveis. Uma
fora poltica que no aspire tomada do poder.
Uma fora que no seja um partido poltico.
Uma fora poltica que possa
organizar as demandas e propostas dos cidados para que quem
mande, mande obedecendo. Uma fora poltica que possa organizar
os problemas coletivos, mesmo sem a interveno dos partidos polticos
e do governo. No necessitamos pedir permisso para ser livres.
A funo do governo prerrogativa da sociedade e seu
direito exercer esta funo. Uma fora poltica que lute
contra a concentrao da riqueza em poucas mos e contra a
centralizao do poder. Uma fora poltica cujos integrantes
tenham como nico privilgio a satisfao do dever cumprido.
Uma fora poltica com organizao
local, estadual e regional, que cresa a partir da base, de sua
sustentao social. Uma fora poltica nascida dos comits
civis de dilogo.
Uma fora poltica que se chama
Frente porque trata de incorporar esforos polticos no partidrios,
porque possui muitos nveis de participao e muitas formas de
luta.
Uma fora poltica que se chama
Zapatista porque nasce com a esperana e o corao indgena
que, junto ao EZLN, voltaram a descer das montanhas mexicanas.
Uma fora poltica que se chama
de Libertao Nacional, porque sua luta pela liberdade de
todos os mexicanos e em todo o pas.
Uma fora poltica
com um programa de luta de 13 pontos, os da Primeira
Declarao da Selva Lacandona, enriquecidos
ao longo de dois anos de insurgncia. Uma fora
poltica que lute contra o sistema de Partido
de Estado. Uma fora poltica que lute pela democracia
no apenas na hora das eleies. Uma fora poltica
que lute por uma nova constituinte e uma nova
Constituio.
Chamamos a todos os homens e
mulheres do Mxico, aos indgenas e aos no indgenas, a todas
as raas que formam a nao; aos que concordam em lutar por
moradia, terra, trabalho, po, sade, educao, informao,
cultura, independncia, democracia, justia, liberdade e paz;
aos que entendem que o sistema de Partido de Estado o principal
obstculo para o trnsito democracia no Mxico; aos que
sabem que democracia no quer dizer alternncia de poder e sim
governo do povo, para o povo e pelo povo; aos que esto de acordo
com que se faa uma nova Constituio que incorpore as
principais demandas dos mexicanos e garanta o cumprimento do
Artigo 39, mediante plebiscito e referendum; aos que no aspiram
ou pretendem exercer cargos pblicos ou postos de eleio
popular; aos que tm o corao, a vontade e o pensamento do
lado esquerdo do peito; aos que querem deixar de ser espectadores
e esto dispostos a no ter remunerao e privilgio algum a
no ser o de participar da reconstruo nacional; aos que
querem construir algo novo e bom, para formar a Frente Zapatista
de Libertao Nacional.
Aqueles cidados
sem partido, aquelas organizaes sociais e polticas,
aqueles comits civis de dilogo, movimentos e
grupos que subscrevem esta Quarta Declarao
da Selva Lacandona comprometem-se a participar
do dilogo para formular a estrutura orgnica,
o plano de ao e a declarao de princpios da
Frente Zapatista de Libertao Nacional.
Com a unidade organizada dos
zapatistas civis, a luta iniciada em 1 de janeiro de 1994 entrar
em uma nova etapa. O EZLN no desaparece, porm seu esforo
mais importante seguir pela luta poltica. Em seu tempo e condies,
o EZLN participar diretamente da Frente Zapatista de Libertao
Nacional.
Hoje, 1 de janeiro de 1996, o Exrcito
Zapatista de Libertao Nacional assina esta Quarta Declarao
da Selva Lacandona. Convidamos o povo do Mxico para que faa
o mesmo.
Irmos:
Muitas palavras caminham pelo
mundo. Muitos mundos se fazem. Muitos mundos nos fazem. H
palavras e mundos que so verdades e verdadeiros. Ns somos
feitos por palavras verdadeiras.
No mundo do poderoso no cabem
mais que os grandes e seus servidores. No mundo que ns queremos
cabem todos.
O mundo que queremos um onde
caibam muitos mundos. A Ptria que queremos construir uma onde
caibam todos os povos e suas lnguas; que todos os os a
caminhem, que todos a riam, que todos a faam amanhecer.
Falamos a unidade
inclusive quando calamos. Baixinho e debaixo da
chuva, falamos as palavras que encontram a unidade
que nos abraa na histria e faz rejeitar o esquecimento
que nos enfrenta e destri.
Nossa palavra, nosso canto e nosso
grito para que os mortos j no morram mais. Para que vivam,
lutamos; para que vivam, cantamos.
Vive a palavra. Vive o J Basta!
Vive a noite que se faz manh. Vive o nosso digno caminhar junto
a todos aqueles que choram. Para destruir os planos de morte do
poderoso, lutamos. Para um novo tempo de vida, lutamos.
A flor da palavra no morre, ainda
que em silncio caminhem nossos os. Em silncio se semeia a
palavra. Para que floresa a gritos, se cala. A palavra se faz
soldado, para no morrer de esquecimento. Para viver, se morre a
palavra, semeada para sempre no ventre do mundo. Nascendo e
vivendo morremos. Sempre viveremos.
No nos renderemos. Zapata vive e,
apesar de tudo, a luta continua.
Das montanhas do
sudeste mexicano, Comit
Clandestino Revolucionrio Indgena - Comando Geral do Exercito
Zapatista de Libertao Nacional
1 de janeiro de
1996
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