332z3i
1o.
Seminrio Nacional de Comunicao,
Cultura e Direitos Humanos 3i4g2y
Centro de Treinamento de
Ponta Negra, Natal RN
Nordeste do Brasil - 23 a 26 de junho de 1994 452g4q
RELATRIO DAS ATIVIDADES 692s3o
Elaborado por Samarone Lima de
Oliveira.
Agncia Ecumnica de Notcias (AGEN)
"Cultura eu dizer o que eu sou " (Frase de um popular,
colhida na Vila de Ponta Negra) 27426u
Motivados por um tema intrigante
"Comunicao, Cultura, Direitos Humanos e Resgate da Auto
Estima" integrantes de diversos movimentos e grupos da sociedade
civil se reuniram em Ponta Negra, de 23 a 26 de junho de 1994, para
participar do 1o. Seminrio Nacional de Comunicao, Cultura e
Direitos Humanos.
QUINTA FEIRA, 23 DE JUNHO ( 1o.
DIA) 1g3u41
O Seminrio comeou prdigo em
diversidade. De integrantes do movimento anarco punk,ao lder do Grupo
Habeas Corpus Potyguar (GHAP), que luta na questo dos homossexuais. De
pastor da igreja protestante, a poetas e atores. De um economista que
faz o resgate de objetos que parecem inteis, a um jovem de 16 anos, da
Cidade da Esperana, que comea a abrir os olhos e o horizonte.
Reunidos sob a umidade de alguns dias de chuva, entre as festividades do
So Joo e o jogo que a seleo brasileira fritou o alegre time de
Camares, aconteceram debates, trocas de experincias, alegrias,
chateaes, buscas, desencontros, e principalmente descobertas.
O primeiro dia (23 de junho) comeou com uma atividade. Todos os
participantes foram vila de Ponta Negra, onde entrevistaram moradores
sobre suas referncias de identidade. A pergunta bsica e chave foi:
"Com que e com quem o sr./a sra. mais se identifica e simpatiza
aqui na sua rua, no bairro, em Natal, no Brasil, no mundo". Depois
veio o arremate: "Porqu?".A vila foi invadida pelos
empolgados pesquisadores. No se tratava de uma entrevista formal e
isso facilitou as coisas. Duas entrevistas foram feitas em bares, mas
nem por isso deixaram de trazer resultados surpreendentes. Os
participantes retornaram ao Centro de Treinamento e escreveram suas
observaes. Aps a subida e descida de ruas meio enladeiradas,
chegou a hora esperada e merecida uma boa cama.
SEXTA FEIRA, 24 DE JUNHO (2o DIA) 1il5o
No dia 24 de junho (sexta feira), o
grupo acordou novinho em folha, e foi fcil trabalhar. Aps alguns
trabalhos de socializao, foram divididos grupos para organizar
snteses da experincia da noite anterior. Entre as principais
"sacadas", estavam:
1.A relao da identidade com quatro elementos Liberdade/Comunidade e
Dinheiro/trabalho. No final, uma frase dita por um popular.
"Cultura eu dizer o que eu sou".
2.A pergunta "com quem o sr/a sra. se identifica"traz em s
uma espcie de dificuldade, por ter um significado muito abrangente.
"O que o senhor est querendo dizer com isso?", perguntou o
seu Severino Antnio de Oliveira, 48 anos, pai de quatro filhos e dono
do "Bar do Bill". Os participantes arrancaram os cabelos para
tentar ver este conceito. Estaria mais para simpatia, para semelhana
no jeito de viver, ou num modelo? As respostas viriam a sair durante o
Seminrio...
A questo do quem trouxe um elemento interessante a identificao
primria com o local, em contraponto identificao primria com o
global. Os padres surgiram imediatamente. Exemplos?
Fernando Henrique Cardoso (representando a beleza)
Fernando Collor de Mello (representando a obstinao)
Marta e Hortncia (idem)
Tina Turner cantora (representando "um estilo prprio")
Vitor Fasano ator (representando um homem "encantador").
"O Lula tenta disfarar, mas
no me engana. Ele um cara grosso". - Severino de Oliveira, o
Bill
IDENTIFICAES 3l3a5b
Bar, cachaa, festa das Fregas
(quadrilha s com homens danando)
Boi de Reis. Lapinha, Pastoril, Congos (ainda existem na Vila)
Beto Carrero, Sula Miranda, Ayrton Senna Dona Zlia (da comunidade),
tia Filomena( pessoa muito sbia, era rendeira, cozinhava bem...), dona
Bispa (115 anos, lenda da vila, contadora de causos), Cmara
Cascudo(Preocupao de registrar/estudar/captar o Folclore), Ella
Fitzgerald, Fernanda Montenegro Peixe s para turista ("o pescador
ficou esperto, no conhece as pessoas do lugar") Os pescadores, as
rendeiras Honestidade, seriedade, liberdade, Ulysses Guimares Jesus
Cristo, religio, Poltica, Joo Faustino Dana, John Travolta,
Seleo brasileira Bebeto, Romrio (gatao) e Chico da Bola, Fazer o
que gosta Manoel Coringa, Wilma Maia, Garibaldi Alves, rico Hackradt,
Antnio Brito, Fidel Castro("igual a soldado anda direto num Jeep
58"), Aldo Tinoco,Itamar Franco, Lula, Aluzio Alves, Joo
Faustino etc.
Um caso interessante Um dos entrevistados fez questo de mostrar sua
mais absoluta indignao com o cantor Gilliard, que toca msicas
romnticas, e alcanou um relativo sucesso, at uns quatro anos
atrs. "O grande erro dele foi negar a sua origem de Natal RN,
mas disse na TV que era de Santos, V isso num programa do Silvio
Santos", revelou um dos entrevistados.
Este mesmo desgosto no acontece em relao a Carlos Alexandre, autor
da famosa "Feiticeira". Este batia nos peitos e dizia em todos
os lugares que era potiguar. "Este sim, um cara decente",
comentou o mesmo popular. "Tomei muito Ki Suco com Gilliard. Ele
subiu e esqueceu sua terra. No tem uma msica do Nordeste".
"Engol a 51 com eles e a
comearam a me contar a festa" (de uma participante do Seminrio)
Depois do famoso e apreciado intervalo para o cafezinho, os
participantes se dividiram em grupos para responder a pergunta:
"Quais os aspectos reflexos da cultura dominante e quais os
aspectos potencialmente resgatadores da auto estima popular? ". A
fonte de dados seria, novamente, das entrevistas feitas no primeiro dia
de atividades.
Elementos reflexos
da Cultura dominante w2vs
Entre as principais respostas sobre
os elementos reflexos da cultura dominante, surgiram:
competncia do marketing para vender uma idia. Exemplo: o Carnatal,
espcie de Carnaval com a estrutura semelhante a da Bahia, e numa
poca diferente do habitual. Um dos aspectos lembrados pelos
participantes, principalmente os de Natal, foi sobre o carter
excludente desta festa. Quem est num bloco, tudo bem.Quem no tem
bloco, se ferra.
"O bloco o bloco. O resto
pipoca". Frase muito dita em Natal, na poca do Carnatal
Supervalorizao
da Aparncia 442it
Outro elemento reflexo da cultura
dominante, levantado pelos participantes, foi "a preocupao
exagerada com a aparncia". Um exemplo que chamou a ateno foi
apresentado por Wallace, da Cidade da Esperana.
"Teve um amigo meu no ltimo Natal que ficou esperando um tnis
de presente at a ltima hora. De noite, todos os seus amigos saram
para uma festa, mas ele no. Preferiu ficar em casa do que sair sem o
sapato novo. Ficou sozinho em casa porque no ganhou o sapato".
"Aqui em Natal tem esse
negcio. As pessoas querem parecer com o pessoal do Rio de
Janeiro" (Xavier, participante do Seminrio).
"Aqui em Natal,os locais ditos
"alternativos", na verdade refletem a Cultura dominante"
(Vanti, do Movimento Anarco-Punk)
A reduo dos valores de
comunidade tambm foi apontado como um elemento reflexo da cultura
dominante, alm da massificao.Veja outros elementos destacados:
Poder/Dinheiro/Fama/Comportamento/Modelo/Aparncia/Individualismo
/Consumismo/Massificao/mdia.
Elementos
potencialmente resgatadores da auto estima 205ol
Entre os elementos resgatadores da
auto estima, surgiram tpicos como:
Prazer
Emoo
Realizao afetiva, profissional
"Se sentir construtor do seu prprio conhecimento"
Resgate da plenitude do indivduo
Cachaa
Vida social comunitria
Personalidades fortes e influentes da comunidade
Conscientizao
Amor terra natal
Educao libertadora e conscientizadora
O sonho e o desejo de mudar as coisas
A alegria e paixo de viver em comunidade
Redescobrir e reinventar a Utopia
BRASIL 3 X 0
CAMARES 4c435w
O Seminrio foi entrando no clima
de Copa do Mundo. Mesmo com a expectativa no ar (o jogo contra a
seleo de Camares comearia s 17h), os trabalhos prosseguiram.
Aps o almoo, cada participante se retirou para um local com uma
tarefa - Responder por escrito seguinte pergunta:
"No meu dia a dia, com que e com quem mais me identifico, tanto no
plano pessoal, quanto nos papis sociais que represento? Porqu?"
As respostas comearam a ser lidas na mesma tarde. Ganharam destaque as
identificaes com o Movimento Nacional de Direitos Humanos, suas
lutas e buscas. "Me identifico com o grupo de militantes que eu
integro, com a luta pela emancipao humana, com o propsito de
construir hoje, a nvel do micro, a sociedade livre e fraterna que
almejo. Com um militante paulista que alm de ter muita garra e
embasamento terico, tem muita tica", disse um.
" algo que me impulsiona, e me faz sentir integrante de um grande
corpo coletivo, que tenta, a cada dia, modificar a estrutura da
sociedade, lhe imprimindo valores ticos e humanos", completou
outro. Poticos depoimentos deram a este momento do Seminrio um tom
aconchegante, carinhoso, prximo e afetuoso. Veja alguns trechos:
"Me identifico com todos aqueles que com um simples olhar risonho
apontam para os sonhos de um novo homem; uma nova era expressamente
humana".
"Me identifico com o meio artstico, sinto na arte a vida em
expresso, principalmente a dana, mas acho que uma identidade livre
aquela que alm de danar possa expressar o seu canto, a sua
voz".
"Sou uma pessoa emotiva e me identifico com pessoas emotivas, acho
interessante a maneira como as pessoas vibram ou pulsam diante das
situaes, porm acho interessante o que elas pensam, como elas vem
o mundo, no importa a lgica, e sim o movimento, a inteno".
"A arte deve ser vivida com expresso de liberdade, ela um
potencial de fortalecimento da identidade de cada ser, pois se o
indivduo tiver presente com todo ser no seu movimento, esse indivduo
livre".
"Para falar a verdade, as minhas identificaes centram se muito
mais num modelo diferenciado de sociedade da que estamos vivendo, modelo
tambm que no est fechado enquanto concepo, mas que na prtica
est implcito a questo democrtica, embasada num esquema
socialista e socializante".
" Me identifico com o trabalho social de diversas ONGs de Natal e
de Salvador".
"Me identifico com o pessoal do Centro de Direitos Humanos e
Memria Popular de Natal, porque falamos a mesma lngua, temos um
pique semelhante de trabalho e trilhamos em temas muito semelhantes. A
identificao que surge da convivncia tambm valiosa e
enriquecedora".
"Dentro do Movimento procuro jogar todas as minhas experincias e
acmulos polticos no resgate de uma nova discusso da Cultura como
agente interdisciplinar de vrias aes sociais. A cultura como
expresso, realizao e mola propulsora de mundanas. Esse um dos
meus grandes momentos nessa grande e saudvel articulao".
Mesmo com toda a harmonia do
momento, foi se instalando o clima do jogo entre Brasil e Camares. A
coordenao dos trabalhos fez uma pausa e todos os participantes foram
para um barzinho de Ponta Negra, assistir a vitria brasileira.
noite, depois da alegria com a vitria do Brasil e vrias doses de
"Malhada Vermelha", uma cachaa muito conhecida no Rio Grande
do Norte, os participantes voltaram a se reunir. Desta vez para um
debate aberto sobre Cultura, Identidade e Identificao, na
perspectiva de uma ao transformadora da realidade.
A dinmica inicial foi a unio do grupo para a repetio coletiva
dos respectivos nomes. Aps a dinmica, surgiu uma reflexo sobre o
nosso nome como elemento fundamental no resgate da identidade e da auto
estima. Roberto Monte, de Natal, lembrou o caso do militante poltico
Arno Preis, de Santa Catarina, morto em 15 de fevereiro de 1972. Os
agentes da represso levaram o corpo de Preis a um cemitrio de
Paraso do Tocantins e avisaram ao coveiro: "Enterra de qualquer
jeito. Isto um porco".
O coveiro, chamado Milton Gomes, pensou : "Isto no um porco.
Este um homem. Algum um dia vir procurar por ele". Junto ao
local de sepultamento do militante, colocou uma pequena pirmide de
concreto, sobre a qual fincou uma cruz de madeira. Quando algum fosse
em busca do corpo, Milton Gomes saberia onde foi enterrado.
Nos dias 11 e 12 de outubro, os restos mortais de Arno Preis foram
exumados. Este exemplo mostra a coisificao que o sistema tenta impor
s pessoas, para anular completamente suas identidades. Faz isto com os
que "ousam" o enfrentamento, mas tambm para reforar a
excluso. Depois da reflexo, o grupo seguiu para as discusses em
pauta.
Algumas frases resumem o clima dos debates, e tambm o pique dos que
estavam no Seminrio:
"A discusso chegou num momento oportuno. Nenhum movimento neste
Pas e no mundo vai ter consistncia se no souber suas limitaes
e suas buscas".
(Jnio, ator que trabalha com teatro de rua)
"A gente comea a ter noo
do quanto utilitarista ns ramos. necessrio uma mudana no tipo
de relao. Acho que a gente tem que mudar o lance das nossas
relaes no mnimo uma parceria. No mximo uma cumplicidade".
(Roberto Monte, Economista e Sec.Executivo do Centro de DH de Natal)
"A gente esqueceu realmente da
prtica que ns tnhamos"
(Isabel Peres)
"A gente tem que itir os
valores aculturados e tentar trabalh los. Acho que este o acerto
produzir o saber juntos".
(Xavier, militante do Grupo Habeas Corpus Potyguar GHAP, de
homossexuais).
"Quando a esquerda constata e
no age, est sendo cmplice. Esta discusso um reflexo do nosso
atraso".
(Ray Lima, ator,assessor da Prefeitura de Icapu e representante do
Unicef)
"Que diabo a nossa ao
militante? A comunicao uma grande coisa que a gente precisa
trabalhar"
(Aluzio, do Centro de Documentao, Pesquisa e Animao Cultural
CENARTE)
"A auto estima contempla
diversidades. Hoje em dia importante a auto estima do militante.No
a auto estima individual, mas coletiva "
(Mrio,do Centro de Direitos Humanos e Memria Popular)
"Os homens mudam quando tm
idias"
(Ray Lima)
" necessrio uma revoluo
social e uma revoluo pessoal"
(Vanti, do Movimento Anarco Punk)
"Ainda muito forte no
Movimento Nacional de Direitos Humanos achar que a questo da
Comunicao s a grande imprensa"
(Dermi Azevedo, jornalista da Agncia Ecumnica de Notcias)
"Um povo que perde a sua
cultura jamais ser um povo livre"
(De um dos participantes do Seminrio)
SBADO, 25 DE JUNHO
DE 1994 (3o DIA) 416s1l
"O homem moderno tem que ter um
olho no microscpio e outro no telescpio"
(Cmara Cascudo)
O dia mais cansativo de todo o
seminrio exigiu dos participantes uma dedicao quase de monge. Foi
a primeira vez que o sol abriu de verdade, despertou, para iluminar os
que se reuniam.
Logo depois do caf, foram divididos grupos para que os participantes
fizessem uma crtica e autocrtica de experincias na rea cultural.
Pergunta chave:
"Em que medida essas nossas experincias serviram ou tm servido
para que os sujeitos populares nelas envolvidas resgatem a sua auto
estima, como cidados, sua conscincia de classe, sua solidariedade e
dignidade? Em caso positivo ou negativo, causas.".
Entre os principais relatos, se
destacaram elementos como "a falta de continuidade, disperso,
dificuldades no dilogo, demora na avaliao.
Jos Xavier da Cmara, do GHAP, lamentou a dificuldade que o movimento
de homossexuais do Rio Grande do Norte encontra, para mostrar que
tambm so cidados. "A sociedade no nos enxerga desta forma.
No h ainda esta compreenso de que o movimento homossexual uma
coisa sria", observou. Para ele, que participou pela primeira vez
de um evento nacional do MNDH, "fazer cultura conviver. No
momento que voc est fazendo cultura, est vivendo".
Neste momento dos debates, j estava claro que vrios movimentos
culturais, especialmente da rea de teatro, sentem uma grande
identificao com as lutas do Movimento Nacional de Direitos Humanos,
e querem participar mais ativamente.
Depois de um breve intervalo, o Seminrio chegou ao momento de colocar
no papel uma proposta de poltica do MNDH, pensando nas interfaces
dessa poltica dentro e fora do Movimento. Dentro, com os programas
(Genero/Racismo/Discriminao;Polticas Pblicas;Justia e
Segurana Pblica, Organizao), e fora, no campo abrangente da
sociedade civil, com outras articulaes.
Reunidos em grupos, os participantes comearam a levantar pontos para
esta poltica. Entre as vrias propostas, surgiram:
Abrir o movimento para a
populao;
Partir das realidades locais (beber na fonte);
Aes aglutinadoras/multiplicadoras;
Rediscutir conceitos e comear a ouvir o povo;
Discutir com a sociedade, sem aquele negcio de "ir para o
povo";
Fazer um Mapeamento Cultural, para conhecer a realidade cultural do
povo;
Realizar a 1a Feira Nacional de Cultura Popular e Direitos Humanos (com
a participao dos quatro programas do MNDH);
Democratizar o conhecimento acumulado do MNDH;
Trabalhar com a possibilidade de Centros Populares de Cultura (C);
Criar Grupos de Estudo sobre Direitos Humanos, de forma
interdisciplinar;
Estimular a realizao de Seminrios Regionais sobre Cultura,
Comunicao e Direitos Humanos;
Trabalhar analticamente o contedo e a linguagem da TV. Novelas,
atravs de grupos de mulheres, na periferia ou onde haja interesse A
mesma proposta para o futebol atingindo jovens e adultos;
Trabalhar mais a tica do EU;
Promoo de encontros sistemticos com os grupos ados;
DESTRINCHANDO AS
PROPOSTAS q541q
Por consenso, o grupo definiu
trs grandes objetivos a serem trabalhados mais especificamente. O
Mapeamento Cultural, a 1a Feira Nacional de Cultura Popular e Direitos
Humanos, e os Centros Populares de Cultura.
Atravs de um exerccio de planejamento participativo, com base nestas
resolues, os participantes se uniram para traar um plano de
trabalho a curto, a mdio e a longo prazo para o MNDH, no campo da
poltica cultural.
Veja como ficou o esquema dos trs principais projetos:
1.MAPEAMENTO CULTURAL 3v344i
Esta a proposta a curto prazo.
O que ? O Mapeamento Cultural um processo de conhecimento da
realidade cultural do povo brasileiro, elaborado atravs de uma
pesquisa de campo. Sero contemplados os elementos de identidade,
identificao, aspectos reflexos da cultura dominante, e aspectos
potencialmente libertadores, visando uma transformao da sociedade.
Quando ser aplicado?
Este Mapeamento ser realizado de acordo com o seguinte cronograma:
Julho a agosto: Formao do grupo de entrevistadores
Setembro a outubro: Aplicao da pesquisa
Novembro e dezembro: Resultados, tabulao e interpretao
Onde? Ficou estabelecido que o
projeto ser realizado em Belo Horizonte/Grande Belo Horizonte e em
Natal/Grande Natal. So "reas Piloto" do Movimento
Nacional.
Objetivos gerais do Mapeamento
Cultural Conhecer a realidade e os valores das pessoas que vivem nas
regies escolhidas com vistas a um processo de transformao dessa
realidade atravs de um trabalho cultural.
Objetivos especficos
1. Dispor de um instrumento de trabalho alternativo para implementar uma
ao transformadora, tendo como eixo as culturas populares.
2.Concretizar, iniciar uma experincia concreta do MNDH no campo
cultural.
3.Treinar os militantes do MNDH nas tcnicas de pesquisa.
4. Introduzir nas atividades do MNDH um novo conceito de cultura, uma
nova viso da questo cultural Cultura no s folclore, no
s Belas Artes.
Quem participa?
Militantes das entidades filiadas ao MNDH nas reas piloto.
Diviso das responsabilidades
Coordenao: Solange Vieira de Faria (Comisso Pastoral de Direitos
Humanos de Belo Horizonte) e Aluzio Mathias (Centro de Documentao,
Pesquisa e Animao Cultural Cenarte).
Custos:
Material de expediente
agens de nibus
lanches
Cobertura destes custos:
Convnio com prefeituras
Trabalho voluntrio
Convnio com Universidades e outras instituies
2.CENTROS POPULARES DE CULTURA 2p2w3u
Proposta a mdio prazo. Neste processo, o MNDH entra como um forte
parceiro no estmulo, no apoio com o que tem acumulado de
experincias, para tornar concreta a proposta.No se trata de criar
novos espaos, mas aproveitar espaos que j existem, mas esto
desagregados.
"Pode funcionar muito como intrumento de aglutinao",
observou Roberto Monte, do CDHMP RN.
Alguns exemplos j foram apresentados no Seminrio, e podem ajudar na
compreenso desta nova proposta:
Exemplo 1:
Centro de Documentao Pesquisa e Animao Cultural (Cenarte)
Este Centro funciona na regio da Grande Natal, no outro lado do Rio
Poteng, onde existe uma grande quantidade de conjuntos habitacionais
(cerca de 1/3 da populao de Natal). O Centro j existe h vrios
anos, e o Secretrio Executivo, Aluzio Mathias, v a perspectiva de
torn lo um grande centro de articulao cultural "Projeto
C".
"A proposta do C que o MNDH est discutindo combina com uma
filosofia de trabalho que temos l na comunidade. Pretendemos implantar
esta proposta at o final deste ano", disse Aluzio. Para tornar
concreta a proposta, o Centro vai iniciar o mapeamento e pretende
realizar, na segunda quinzena de setembro, um Seminrio de Cultura e
Direitos Humanos, contemplando a regio onde j desenvolve as
atividades. "Vamos levar para discusso todas estas novas idias
e propostas que surgiram aqui no Seminrio", concluiu Aluzio.
Exemplo 2:
O Centro de Defesa e Ao Popular de Parnamirim (CDAP) tem ligaes
com a Associao Cultural Emas que fica no distrito de Emas,
Parnamirim. As duas entidades pretendem comear um processo de
discusso sobre esta proposta. Mesmo que no adotem o nome Centro
Popular de Cultura, as questes envolvendo Direitos Humanos,
Comunicao, resgate da auto estima e Cultura sero contempladas nas
suas atividades locais. Tambm participaro do Mapeamento Cultural.
Exemplo 3:
TV Alerta Comunitria, que funciona na comunidade da Cidade da
Esperana um bairro de Natal, h mais de dois anos. Sua concepo
tem elementos semelhantes aos que foram apresentados e discutidos no
Seminrio Nacional.A proposta de alguns integrantes da TV Comunitria
levar a discusso para a Cidade da Esperana, na busca de um grau
mais estruturado de organizao. Estas trs entidades fazem parte do
Comit em Defesa da Vida, que existe em Natal desde 1989. O Comit
uma articulao de diversas entidades que lutam pelos Direitos
Humanos, e tem como eixo principal a luta contra a violncia e a defesa
da vida.
As propostas aprovadas pelo Seminrio Nacional do MNDH sero
incorporadas s discusses do Comit em Defesa da Vida.
3.1 A FEIRA NACIONAL DE CULTURA
POPULAR E DIREITOS HUMANOS 43372w
O objetivo geral desta Feira
Nacional dismistificar o conceito de Direitos Humanos na viso de
artistas e produtores culturais, tirando uma falsa imagem que ainda se
tem de DH.
De forma especfica, a Feira vai tentar incrementar a relao entre o
MNDH e os diversos segmentos culturais da sociedade.
A proposta inicial de que a Feira seja realizada em setembro de 1996,
e foi pr indicada a cidade de Salvador, para sediar. Na proposta do
Seminrio, a Feira vai ser assunto de todos os seminrios regionais de
Comunicao, Cultura e Direitos Humanos. So estes seminrios que
vo dar o "tom" e alguns detalhamentos sobre a Feira. A data
estabelecida, bem como o local, esto abertos para alteraes.
Alguns temas sero discutidos previamente nos seminrios regionais. Os
participantes definiram, por consenso, os seguintes tpicos:
Direitos Humanos e Massificao
Direitos Humanos e Arte Popular
Direitos Humanos e Classe Dominante
Direitos Humanos e Cidadania
Direitos Humanos e Comunicao
Direitos Humanos e Biotica
Direitos Humanos e Cultura Poltica
Direitos Humanos e Discriminao
A Feira ser para artistas,
produtores culturais, ONGs, entidades governamentais nacionais e
internacionais, empresrios, pblico em geral. A previso de que
dure uma semana.
Custos:
Haver custos (e grandes) com transporte, material de divulgao,
infra estrutura, alimentao, hospedagem, equipe de apoio, produo
etc. Estes custos seriam cobertos por vrias entidades, empresas.
Possveis parceiros: Banco do Brasil, Antarctica, Petrobrs, Caixa
Econmica Federal, ABVP, meios de comunicao etc.
UMA NOITE DE
ARREBENTAR OS CORAES c735b
" preciso criar anticorpos de
conscincia crtica"
(de um dos participantes do Seminrio)
A programao noturna do
Seminrio foi intensa, potica e dinmica. Na primeira parte, Dermi
Azevedo deu uma palestra sobre Info Comunicao. Ele mostrou que, ao
contrrio do que muitos estudiosos apregoavam, o final de sculo est
sendo marcado por uma concentrao cada vez maior das informaes.A
aldeia global vai se tornando cada vez mais uma utopia.
Divididos em Info Ricos e Info Pobres, os pases ricos levam uma
vantagem alarmante em relao aos pobres. Veja alguns dados:
90% da rede mundial de
telecomunicao est em 15% do mundo. Enquanto isso, 10% da economia
mundial j est girando em torno da informao e Comunicao.
"O mais grave que, destes 10%, dois teros j est sob
controle de grandes corporaes", informou Dermi.
65% da populao mundial no tem o aos livros.
H, no mundo, 840 milhes de analfabetos (65% so mulheres)
Nos Estados Unidos, 20 empresas controlam os maiores veculos de
comunicao.
Dermi tambm ressaltou a criao da Agncia Latino Americana e
Caribenha de Comunicao (ALC), e lembrou que um dos grandes desafios
neste final de sculo tentar evitar esta concentrao das
informaes. "Um dado positivo o crescimento da organizao
da sociedade civil em torno da informao", explicou.No caso
brasileiro, mais de 150 ONGs esto ligadas pela Alternex. "Neste
final de sculo, a gente precisa se integrar nestas redes",
observou.
Novas relaes tecnolgicas afetando as relaes humanas, a
indstria da solido que uma das mais lucrativas em todo o mundo,
hoje, a "misria sexual", e vrios outros assuntos foram
discutidos pelos participantes.
"H tambm as pessoas que
esto exiladas da espiritualidade"
(Reflexo de Jos Xavier da Cmara Neto).
Mesmo com a discusso
"incendiando" as pessoas, e com as abordagens chegando aos
caminhos polticos e religiosos do mundo atual, a coordenao dos
trabalhos teve que encerrar as atividades no auditrio do Centro de
Treinamento. Todos se dirigiram para um pequeno espao nos alojamentos,
onde Ray Lima, assessor da prefeitura de Icapu (CE), integrante do
Movimento Escambo e representante cultural da Unicef, apresentou sua
experincia com crianas e adolescentes na cidade de Jandus, no Rio
Grande do Norte, entre 1989 e 1992.
Os participantes do Seminrio se tornaram "meninos",
participando de algumas atividades que Ray elaborou. Um trenzinho
circulou pelos corredores do alojamento, com todos juntos cantando. Uma
festa.
Mas nem tudo foi festa no trabalho de Ray. "Estava no perodo de
misria absoluta. Nos primeiros exerccios, algumas crianas tinham
tonteiras, chegaram a desmaiar. Ento ns parvamos tudo e
discutamos a fome", conta Ray, que chegou a ser confundido com
"um pistoleiro que tinha ido matar o prefeito" e at com
macumbeiro. "Eu me sentia como se estivesse na Nicargua, em Cuba.
Num campo de lutas frtil e perigoso",disse.
Com o tempo, o trabalho foi crescendo, ganhando espao e adeses,
ganhando a motivao necessria para mudar as realidades. Comeou um
trabalho de reanimao da memria da comunidade, comos velhos
contando estrias do ado. O Conselho Municipal de Cultura foi
finalmente criado. Valores locais, como o do contador de piadas, o
recitador de versos, receberam a devida ateno.
Toda a palestra de Ray foi ilustrada por slides.Depois, foi apresentado
o vdeo "Estrela Nordestina", produzido pelo CDHMP, sobre o
trabalho de Ray em Jandus, pleno serto Nordestino.
"O que estilhaa o amor?"
(Ray Lima)
As atividades "formais"do
Seminrio terminaram a, mas o grupo resolveu sair para a comunidade
de Ponta Negra, para o "Bar do Buraco". Acabou sendo uma
grande festa, com direito a violo, gente aprendendo a danar forr
etc.
No final da noite, em um restaurante, Rai Lima interpretou o poema
"O que estilhaa o amor", enquanto um msico fazia o
acompanhamento, no saxofone. Emoo pura, fecunda. Viagem na alma, nos
sentimentos, no que existe de melhor no ser humano, que justamente
esta capacidade de sentir e se expressar.
O retorno , de madrugada, foi lmpido e feliz. J no ramos os
mesmos. Militantes dos Direitos Humanos, gente, paz. A madrugada fria
deslizava em Ponta Negra, e coraes enfeitados de luz respiravam
outros sonhos...
EST CHEGANDO A
HORA... 101w6o
"Precisamos conhecer o
Movimento Nacional de Direitos Humanos. Mas no queremos ser um meio.
Queremos tambm ser".
(Jnio Santos - Movimento Escambo de Teatro de Rua)
Na ltima manh do encontro,
quando j se sentia no ar aquele gostinho de despedida alguns tinham
que viajar tarde , o grupo discutiu e aprovou algumas propostas (no
contexto das polticas pblicas e em interface com a poltica de
comunicao), para os candidatos presidncia da Repblica, os
governos estaduais, ao Congresso Nacional, nas eleies gerais deste
ano.
As principais foram:
1. Implementao da Lei de
Informao Democrtica, com uma democratizao efetiva e uma
regionalizao dos Meios de Comunicao
2.Estmulo s aes culturais baseadas na valorizao das
expresses locais
3.Articulao das leis de Incentivo Cultura (atividades) em todas
as cidades brasileiras
4.Valorizao das cincias que enfatizam as Humanidades, notadamente
a disciplina Direitos Humanos, com sua implantao nas escolas em
todas as esferas de ensino.
5.Estimular o intercmbio cultural com outros pases do Mundo, e em
particular com os da Amrica Latina e terceiro mundo
6.Incrementar uma poltica de animao e difuso da memria popular
7.Criar um Fundo Nacional de Emergncia para a Cultura, at a
definio de um percentual regulamentado por Lei
8.Descentralizar as aes atravs da municipalizao dessas
aes, considerando as diversidades culturais de cada regio
9. Estimular e apoiar a realizao do Mapeamento Cultural dos
municpios
Sugestes para o 2o Seminrio Nacional 592j45
Os participantes destacaram as
seguintes sugestes para o prximo Seminrio Nacional, que ser
realizado em Belo Horizonte, na ltima semana de agosto deste ano.
1.Que a metodologia contemple
tambm o perfil da identidade e identificao dos participantes
2.Que o tema "Comunicao/Tecnologia/Hegemonia"seja
reeditado
3.Que a agenda do Seminrio assegure atividades de animao, onde os
participantes fiquem vontade e ao mesmo tempo reproduzam em s uma
parte do evento.
4.Incluir dois momentos para dois temas fundamentais Teoria Crtica da
Comunicao e Teoria Crtica da Cultura
5.No deixar que as pessoas fiquem excludas das atividades, a no
ser que queiram faz lo. Valorizar a questo da afetividade. 6. No
colocar gente demais. Seguir uma mdia semelhante de Natal (25
pessoas, includos os assessores e equipes de apoio)
7. Que todos os participantes participem das atividades at o fim, para
no prejudicar a dinmica
8. Que cada entidade cubra as despesas de seus participantes
9. Que a coordenao seja mais descentralizada
10.Que a poesia, o teatro, a biodana, a msica, sejam incorporados
programao
11.Retirar nossas mscaras,escudos, aprendendo a ouvir os demais, no
definindo de pronto os conceitos, mas sim procurando, acreditando, e
colaborando para que eles sejam coletivos e no de imposies
12.Que participem mais setores ligados cultura
13.Mais atividades corporais e ldicas. Teoria do "Corpo
Fala"
14.Que seja aberto espao para formao
15.Que haja espao para a discusso sobre os movimentos juvens
autnomos.
16.Dar uma ateno especial aos subsdios concretos tipo:
Constituio atualizada, textos, programas dos partidos polticos
etc.
17.Deixar a noite livre para atividades culturais expresses
espontneas
18.Incluso de oficinas
19.Se possvel, alguma atividade na rua com o povo, tipo oficina,
trabalho teatral etc
AVALIANDO TUDO 4k1t5f
"Para evitar a
"reiada" cultural, a gente oferece a outra interface"
(Aluzio Mathias)
A avaliao do Seminrio foi uma
constatao. A articulao do MNDH com os diversos segmentos
culturais, artsticos, de comunicao da sociedade, deve seguir uma
viso mais aberta e ldica. No Seminrio, constatou se que pela
alegria, pelo prazer, pela seduo, possvel ampliar os
horizontes, aproximar as pessoas, reavaliar posturas e
"detonar" comportamentos que reproduzem prticas da classe
dominante.
Os aspectos mais positivos foram os que se referiram valorizao da
auto estima, da identidade, de um processo interior modificador de
padres, de comportamentos.
As experincias trocadas, mesmo as que surgiram durante a
programao, foram consideradas "o grande tempero" do
Seminrio. A incluso do jogo da seleo nas atividades, a sada
para conversar com a comunidade de Ponta Negra, a sesso de slides
sobre Jandus, fez com que houvesse um contato permanente de todos os
participantes com a populao ao redor, e uma interao acima das
expectativas.
Mesmo com algumas crticas a uma centralizao da coordenao, os
participantes concluram que houve um avano na forma de se trabalhar,
a nvel nacional, a participao dos vrios segmentos que se
propem a discutir Comunicao, Cultura e Direitos Humanos.
O contedo foi considerado rico, faltando apenas mais subsdios. Para
sanar esta dificuldade, foram elaboradas vrias sugestes para o 2o
Seminrio Nacional.
Houve um avano significativo na compreenso de que Cultura algo
muito mais abrangente que folclore, artesanato etc. Representa tambm
comportamentos, atitudes, formas de viver, pensar e agir.
O Seminrio, na avaliao dos participantes, abriu um novo caminho
para o MNDH. Caminho bastante frtil e com parceiros que vem as
nossas lutas como algo extremamente necessrio. Percebeu se, porm,
que o prprio MNDH ainda desconhecido para muitas entidades, para
muitos atores. Uma das expresses muito utilizadas pelos participantes
foi " jogo", para dizer que estavam concordando com alguma
idia ou proposta de atividade. A incluso do jogo ldico nas
discusses, nos trabalhos, na programao, ficou como uma alternativa
a ser explorada.
A proposta foi aceita e est no ar. Como disse o sueco Leonardo
Larsson,da UBV Cooperao tcnica, "Ett Spel" ou seja,
jogo!
Natal(RN), na sede do Centro de
Direitos Humanos e Memria Popular, com a vista para o entardecer do
Potengi, Nordeste do Brasil. |