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Aulas
de Tortura: os Presos-Cobaias
O estudante
Angelo Pezzuti da Silva, 23 anos, preso em Belo Horizonte e torturado
no Rio, narrou ao Conselho de Justia Militar de Juiz de Fora, em
1970:
(...);
que, na PE (Polcia do Exrcito) da GB, verificaram o interrogado e
seus companheiros que as torturas so uma instituio, vez que, o
interrogado foi o instrumento de demonstraes prticas desse
sistema, em uma aula de que participaram mais de 100 (cem) sargentos e
cujo professor era um Oficial da PE, chamado Tnt. Ayton que, nessa
sala, ao tempo em que se projetavam slides sobre tortura, mostrava-se
na prtica para a qual serviram o interrogado, MAURCIO PAIVA,
AFONSO CELSO, MURILO PINTO, P. PAULO BRETAS, e, outros presos que
estavam na PE-GB, de cobaias; (...)
A
denncia confirmada no mesmo Processo, por depoentes acima
citados, como o estudante, de 25 anos, Maurcio Vieira de Paiva:
(...)
que o mtodo de torturas foi institucionalizado em nosso Pas e, que
a prova deste fato no est na aplicao das torturas pura e
simplesmente, mas, no fato de se ministrarem aulas a este respeito,
sendo que, em uma delas o Interrogado e alguns dos seus companheiros,
serviram de cobaias, aula esta que se realizou na PE da GB, foi
ministrada para cem (100) militares das Foras Armadas, sendo seu
instrutor um ten. HAYTON, daquela UM.; que, concomitncia da projeo
dos slides sobre torturas elas eram demonstradas na prtica,
nos acusados, como o interrogado e seus companheiros, para toda a
platia; (...)
Na
mesma linha, depe Murilo Pinto da Silva, de 22 anos;
(...)
que, quando esteve na PE-GB, o interrogado e seus companheiros
serviram de cobaia a demonstraes prticas de torturas em aulas
ministradas a elementos das Foras Armadas; (...)
E
a denncia desse episdio foi reiterada, ainda uma vez, no
depoimento judicial do estudante Jlio Antonio Bittencourt de
Almeida, de 24 anos:
(...)
que durante o perodo em que o interrogado esteve na PE foi dado um
curso sobre tortura para cerca de oitenta a cem membros para o qual os
presos serviram de cobaias; Que os professores e a platia desse
curso eram de elementos das Foras Armadas; (...)
De
abuso cometido pelos interrogadores sobre o preso, a tortura no
Brasil ou, com o Regime Militar, condio de mtodo
cientfico, includo em currculos de formao de militares. O
ensino deste mtodo de arrancar confisses e informaes no era
meramente terico. Era prtico, com pessoas realmente torturadas,
servindo de cobaias neste macabro aprendizado. Sabe-se que um dos
primeiros a introduzir tal pragmatismo no Brasil, foi o policial
norte-americano Dan Mitrione, posteriormente transferido para Montevidu,
onde acabou sequestrado e morto. Quando instrutor em Belo Horizonte,
nos primeiros anos do Regime Militar, ele utilizou mendigos recolhidos
nas ruas para adestrar a polcia local. Seviciados em salas de aula,
aqueles pobres homens permitiam que os alunos aprendessem as vrias
modalidades de criar, no preso, a suprema contradio entre o corpo
e o esprito, atingindo-lhe os pontos vulnerveis.
A
estudante Dulce Chaves Pandolfi, 24 anos, foi obrigada tambm a
servir de cobaia no quartel da rua Baro de Mesquita, no Rio, de
acordo com petio anexada aos autos, em 1970:
(...)
Na Polcia do Exrcito, a supte. foi submetida a espancamento
inteiramente despida, bem como a choques eltricos e outros suplcios,
com o pau-de-arara. Depois de conduzida cela, onde foi
assistida por mdico, a supte. foi, aps algum tempo, novamente
seviciada com requintes de crueldade numa demonstrao de como
deveria ser feita a tortura; (...)
Em
seu depoimento na Justia Militar, Dulce reitera a denncia: ...
que no dia 14 de outubro foi retirada da cela e levada onde estavam
presentes mais de vinte oficiais e fizeram demonstrao de tortura
com a depoente; (...)
O
estudante Afonso Celso Lana Leite, 25 anos, preso em Minas e
transferido para o Rio, denunciou ao Conselho Militar que o interrogou,
em 1970, ter sido torturado em instrues ministradas a oficiais no
quartel da PE e na Vila Militar:
(...)
que, no dia 8 de outubro, na P.E. 1, posto de Segurana Nacional,
quando era ministrada uma aula, na presena de mais de cem pessoas
foram trazidos para aquela aula companheiros e, nesta ocasio,
aram filmes de fatos relacionados com torturas e em seguida era
confirmada com a presena do denunciado, sendo, naquela ocasio
tambm, torturados; ocasio esta coincidente com o seu depoimento;
que estas torturas, ou seja, as acima descritas, se repetiram na
Vila Militar. (.. )
J
o professor Jos Antnio Gonalves Duarte, 24 anos, preso em Belo
Horizonte, revelou em seu depoimento, prestado em 1970, ter sido
seviciado inclusive por um aluno do Colgio Militar:
(...)
que foi torturado e espancado pelo Encarregado do Inqurito Cap. Joo
Alcntara Comes, pelo Escrivo do mesmo Inqurito, Marcelo Arajo,
pelo cabo Dirceu e por um aluno do Colgio Militar cujo o nome o
interrogado no sabe e por um policial da Delegacia de Furtos e
Roubos, cujo nome Pereira; que causou estranheza ao interrogado um
aluno do Colgio Militar, a ttulo de prestar estgio no 1PM,
participar de uma coisa infame, como a infligncia de torturas a um
ser humano (...)
Os
torturadores no apenas se gabavam de sua sofisticada tecnologia da
dor, mas tambm alardeavam estar em condies de export-la ao
sistema repressivo de outros pases, conforme a carta-denncia do
engenheiro Haroldo Borges Rodrigues Lima, 37 anos, datada de 12 de
abril de 1977:
(...)
As torturas continuaram sistematicamente. E a essas se aliavam as ameaas
de me levarem a novas e mais duras sevcias, a mim descritas
minuciosamente. Diziam, com muito orgulho, que sobre o assunto j no
tinham nada a dever a qualquer organizao estrangeira. Ao contrrio,
informaram-me, j estavam exportando Know-how a respeito. (...)
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