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Manual de Denncia da Tortura
Camille Giffard
Como documentar e apresentar denncias de tortura
no mbito do sistema internacional para a proteo dos direitos humanos

PARTE I - QUESTES PRELIMINARES

1. INTRODUO

2. COMO UTILIZAR ESTE MANUAl

2.1. Exposio geral dos principais captulos
2.2. Terminologia
2.3. Questes essenciais de poltica

3. CONTEXTO

3.1. Introduo
3.2. O que se pode esperar conseguir com a apresentao de denncias de tortura?
3. O que tortura?
3.4. Como ocorre a tortura?
3.5. Em quais contextos possvel receber ou obter denncias de tortura?
3.6. possvel denunciar agentes no-governamentais?

PARTE II DOCUMENTAO DAS DENNCIAS

1. INTRODUO

2. PRINCPIOS BSICOS DA DOCUMENTAO

2.1. Por que so importantes esses princpios?
2.2. Em que consiste informao de boa qualidade?
2.3. O que pode se pode fazer para maximizar a exatido e a confiabilidade da informao?

3. ENTREVISTA COM A PESSOA QUE DENUNCIA TORTURAS

3.1. Introduo
3.2. Consideraes gerais
3.3. Como realizar a entrevista

4. INFORMAES QUE DEVEM SER REGISTRADAS

4.1. Informao modelo
4.2. Contextos especficos

5. PROVAS

5.1. Prova mdica
5.2. Declarao da pessoa que faz a denncia
5.3. Prova testemunhal
5.4. Outros tipos de provas

PARTE III - AES DIANTE DA INFORMAO COLETADA

1. INTRODUO S POSSVEIS LINHAS DE AO

2. O QUE SE DEVE SABER SOBRE OS MECANISMOS INTERNACIONAIS DE DENNCIA E COMO US-LOS

2.1. Que tipo de caractersticas gerais deve ter seu comunicado?
2.2. Apresentao de informao a um rgo de monitoramento: o que seu comunicado deve conter?
2.3. Apresentao de informao no contexto do procedimento de relatrio estatal
2.4. Apresentao de informao a um rgo de apurao de fatos

3. O QUE SE DEVE SABER SOBRE OS PROCEDIMENTOS INTERNACIONAIS DE RECLAMAO E COMO US-LOS

3.1. O que se pode procurar obter com os procedimentos de reclamao particular?
3.2. Quais tipos de reclamao os procedimentos de reclamao particular podem examinar?
3.3. Como funcionam os procedimentos de reclamao particular?
3.4. O que deve conter uma requisio a um procedimento de reclamao particular?
3.5. Dicas prticas para utilizao dos procedimentos de reclamao particular

4. MECANISMOS e PROCEDIMENTOS: NAES UNIDAS

4.1. Introduo ao sistema das Naes Unidas
4.2. Mecanismos de denncia no mbito do sistema das Naes Unidas
4.3. Procedimentos de reclamao no mbito do sistema das Naes Unidas

5. MECANISMOS E PROCEDIMENTOS: ESFERA REGIONAL

5.1. O Sistema Europeu
5.2. O Sistema Interamericano
5.3. O Sistema Africano
5.4. Outras regies

6. TABELAS DE AVALIAO COMPARATIVA DOS PROCEDIMENTOS INTERNACIONAIS

7. ONDE SE PODE BUSCAR MAIS AJUDA?

7.1. Por que seria desejvel buscar mais ajuda?

7.2. Algumas fontes especficas de ajuda

APNDICES

APNDICE I - LISTA DE INSTRUMENTOS RELEVANTES

APNDICE II DADOS PARA CONTATO E OBTENO DE MAIORES INFORMAES

APNDICE III FORMULRIOS DE SOLICITAO PADRO

APNDICE IV DIAGRAMAS DO CORPO

ABREVIATURAS SELECIONADAS

ACNUR: Alto Comissariado das Naes Unidas para Refugiados
CADH: Conveno Americana de Direitos Humanos
CADHP: Carta Africana de Direitos Humanos e dos Povos
CCT: Comit Contra a Tortura
CDC: Comit dos Direitos da Criana
CEDH: Conveno Europia de Direitos Humanos
CEDM: Comit para a Eliminao da Discriminao contra a Mulher
CEDR: Comit para a Eliminao da Discriminao Racial
CEPTC: Comit Europeu para a Preveno da Tortura
CIADH: Comisso Interamericana de Direitos Humanos
CICV: Comit Internacional da Cruz Vermelha
CNADH: Comisso Africana de Direitos Humanos e dos Povos
CNUCT: Conveno das Naes Unidas Contra a Tortura
CNUDC: Conveno das Naes Unidas sobre os Direitos da Criana
CNUDH: Comisso das Naes Unidas sobre Direitos Humanos
CNUEDM: Conveno das Naes Unidas sobre a Eliminao da Discriminao Contra a Mulher
CNUEDR: Conveno das Naes Unidas sobre a Eliminao da Discriminao Racial
CoADHP: Comisso Africana de Direitos Humanos e dos Povos
T: Comit Europeu para a Preveno da Tortura
DICA: Direito Internacional de Conflito Armado
EACDH: Escritrio do Alto Comissariado da ONU para Direitos Humanos
OEA: Organizao de Estados Americanos
ONG: Organizao No-governamental
ONU: Organizao das Naes Unidas
OSCE Organizao para a Segurana e a Cooperao na Europa
OUA: Organizao da Unidade Africana
PD: Pessoas Deslocadas
PID: Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Polticos
REP: Relator Especial sobre Prises e Condies de Deteno na frica
RET: Relator Especial das Naes Unidas sobre Tortura
TEDH: Tribunal Europeu de Direitos Humanos
TIADH Tribunal Interamericano de Direitos Humanos
TPI: Tribunal Penal Internacional


NDICE DE TABELAS

TABELAS COMPARATIVAS:

Tabela 1: Resumo de Mecanismos Internacionais Por Origem e Funo
Tabela 33: Avaliao Comparativa I - CCT, CDH e CEDR (Geral)
Tabela 34: Avaliao Comparativa II - CDC, CEDM, RE-CDH e 1503 (Geral)
Tabela 35: Avaliao Comparativa III - T, CIADH e TIADH (Geral)
Tabela 36: Avaliao comparativa IV - CNADH e REP (Geral)
Tabela 37: Avaliao Comparativa IV - CCT, CDH e CEDR (Procedimento de Reclamao Particular)
Tabela 38: Avaliao Comparativa V - TEDH, CIADH, TIADH e CoADHP (Procedimento de Reclamao Particular)
INTERNATIONAL MECHANISMS - BASIC FACTS:
Table 5: Basic Facts: UN Commission on Human Rights
Table 6: Basic Facts: UN Sub-Commission on the Promotion and Protection of Human Rights
Table 8: Basic Facts: 1503 Procedure
Table 10: Basic Facts: UN Special Rapporteur on Torture
Table 12: Basic Facts: Committee Against Torture
Table 13: Basic Facts: Human Rights Committee
Table 14: Basic Facts: Committee on the Rights of the Child
Table 15: Basic Facts : Committee on the Elimination of Discrimination against Women
Table 16: Basic Facts: Committee on the Elimination of Racial Discrimination
Table 21: Basic Facts: European Committee for the Prevention of Torture
Table 22: Basic Facts: European Court of Human Rights
Table 25: Basic Facts: Inter-American Court of Human Rights
Table 26: Basic Facts: Inter-American Commission on Human Rights
Table 29: Basic Facts: African Commission on Human and Peoples Rights
Table 30: Basic Facts: Special Rapporteur on Prisons and Conditions of Detention in Africa

INDIVIDUAL COMPLAINT PROCEDURES - PRACTICALITIES OF USE:

Table 18: Practicalities of Using Individual Complaint Procedure: CAT
Table 19: Practicalities of Using Individual Complaint Procedure: Optional Protocol to the ICR
Table 20: Practicalities of Using Individual Complaint Procedure: CERD
Table 24: Practicalities of Using Individual Complaint Procedure: ECHR
Table 28: Practicalities of Using Individual Complaint Procedure: Inter-American System
Table 32: Practicalities of Using Individual Complaint Procedure: ACHPR

PROCEDURES - BASIC CHRONOLOGY:

Table 7: Basic Chronology: 1503 Procedure
Table 17: Basic Chronology of Individual Complaint Procedure: CAT
Table 23: Basic Chronology of Individual Complaint Procedure: ECHR
Table 27: Basic Chronology of Individual Complaint Procedure: Inter-American
System
Table 31: Basic Chronology of Individual Complaint Procedure: ACHPR
MISCELLANEOUS OTHER TABLES:


Table 2: Suitability of Types of Mechanisms to Possible Objectives
Table 3: Checklist For Submitting General Information To A Reporting Mechanism
Table 4: Checklist For Submitting An Individual Allegation To A Reporting Mechanism
Table 9: Relevant Thematic Procedures of the UN Commission on Human Rights
Table 11: Country Rapporteurs of the UN Commission on Human Rights (1999)
Table 39: Possible Sources of Help


GLOSSRIO DE TERMOS ESPECIALIZADOS

issibilidade
Estgio de um procedimento de reclamao particular no qual o rgo judicial ou quase-judicial decide se existem as condies para que ele possa examinar uma reclamao. Se uma reclamao for inissvel, no se pode examin-la.

Agentes no-governamentais
Pessoas que atuam independentemente das autoridades.

Apresentao
Ver COMUNICADO / REQUSIO

Apresentar uma reclamao
Registrar ou protocolar uma reclamao.

Apurao dos fatos
Investigao realizada para apurar os fatos.

Artigo de tratado
Termo usado para denominar as sees de um tratado.

Asilo
Petio por parte de pessoas que no querem voltar a um pas, normalmente o seu, onde correm perigo. Em caso de concesso, outorga-se-lhes o direito de permanecerem em um pas que no o seu. Pode ser provisrio ou permanente.

Carter consultivo
As ONGs podem solicitar participao na ONU em carter consultivo; isso significa que esto oficialmente registradas como organizao que a ONU pode consultar. As ONGs que atuam em carter consultivo gozam de certos privilgios em relao a outras ONGs, como, por exemplo, ter permisso para assistir s sesses da Comisso da ONU sobre Direitos Humanos.

Carta
Ver TRATADO

Competncia
Ver JURISDIO (de um rgo judicial)

Comunicado
Carta ou outra forma de apresentao que transmite informao a um organismo internacional. A ONU costuma empregar o termo para se referir a requisies apresentadas em um procedimento de reclamao particular. A pessoa que redige um comunicado geralmente denominada o autor do comunicado.

Conveno
Ver TRATADO

Corroborao
Prova que sustenta ou confirma a veracidade de uma denncia.

Declarao
Documento de direito internacional que no tem carter juridicamente vinculante, mas que estabelece normas que os Estados se comprometem a respeitar.

Denncia (de tortura)
Afirmao (ainda no comprovada nem refutada) de haver ocorrido um incidente tortura.

Deportao
Expulso de um pas.

Descumprimento (de obrigaes)
Ver VIOLAO

Deteno incomunicada
Ser detido pelas autoridades em condies de incomunicabilidade, sem que se possa ter contato com o mundo exterior ou sem que seja reconhecida a deteno.

Direito nacional ou sistema jurdico
Direito ou ordenamento jurdico de um pas; sistema legal ou jurdico especfico de um determinado pas.

Entrada em vigor (de um tratado)
Momento em que as obrigaes de um tratado comeam a ser aplicadas.

Estado parte (de um tratado)
Estado que concordou em se obrigar a um tratado.

Execuo (de obrigaes)
Colocar em vigor as obrigaes; assegurar que sejam respeitadas.

Extrajudicial (p. ex., execuo)
No imposto por um juiz ou resultante de um processo legal.

Implementao (de obrigaes)
Modo pelo qual as obrigaes so executadas ou respeitadas, ou medidas destinadas a tal fim.

Impunidade
Capacidade de evitar a punio por um comportamento ilegal ou indesejvel.

Instrumento
Termo geral que denomina os documentos de direito internacional, quer sejam juridicamente vinculantes ou no.

Interveno de terceiras partes
Ver RELATO AMICUS CURIAE

Juridicamente vinculante
Se algo juridicamente vinculante para um Estado, isso significa que o Estado est obrigado a agir em conformidade com tal coisa e que pode haver conseqncias jurdicas caso no o faa. Por exemplo, o Estado pode ser acionado perante um tribunal internacional ou pode-se ordenar que ele efetue o pagamento de uma indenizao vtima.

Jurisdio (de um Estado)
rea ou pessoas sobre as quais um Estado exerce sua autoridade.

Jurisdio (de um rgo judicial)
As matrias que cabem jurisdio de um rgo judicial ou quase-judicial so aquelas que ele tem o poder de examinar. Tambm se pode usar a expresso ser competente para examinar uma matria.

Licena (p. ex., solicitar uma licena para apresentar um relato amicus curiae)
Permisso.

Litgio
Processo de apresentao e conduo de um caso perante um tribunal.

Mandato
Fonte dos poderes de um mecanismo; documento que explica o poder do mecanismo.

Medidas provisrias
Medidas temporrias que um rgo judicial ou quase-judicial pode solicitar antes de haver concludo sua deliberao sobre um caso, com a finalidade de evitar dano irreparvel.

Mrito do caso
Estgio de um procedimento de reclamao particular no qual o rgo judicial examina os fatos de um caso e decide se foi cometida uma violao.

Monitoramento
Busca e recebimento de informaes com a finalidade de apresentar um relatrio sobre uma causa ou situao.

Observaes
Comentrios, avaliao.

Organismo intergovernamental
Organismo ou organizao composta de representantes governamentais de mais de um pas.

Organismos de tratado
Organismo criado por um tratado.

rgo de superviso
rgo criado para supervisionar como um Estado cumpre suas obrigaes assumidas nos termos de um tratado.

Pacto
Ver TRATADO

Perpetrador
Pessoa que cometeu um ato.

Petio
Solicitao de medidas judiciais, por exemplo, solicitao para que se investigue uma matria.

Processo quase-judicial
Processo que tramita perante um rgo que examina casos de modo semelhante a um rgo judicial, porm que no composto de juzes e cujas decises no so juridicamente vinculantes.

Processo judicial
Processo que tramita perante um rgo judicial.

Ratificao
Processo mediante o qual um Estado concorda em se obrigar a um tratado.

Reclamao particular
Reclamao relativa a uma srie especfica de fatos que afeta uma ou mais pessoas.

Reclamamante
Pessoa que apresenta uma reclamao em um procedimento de reclamao particular.

Recomendao
Ao sugerida. As recomendaes no tm carter juridicamente vinculante.

Regulamento
Regras pormenorizadas adotadas por um rgo judicial ou quase-judicial que estabelecem o modo pelo qual devem se realizar os processos perante tal rgo.

Relato amicus curiae
Apresentao por uma parte alheia ao processo judicial destinada a informar o rgo judicial sobre uma matria relativa ao processo.

Reparao
Medidas destinadas a reparar um dano causado.

Requisio
Carta ou outra forma de apresentao que solicita que um rgo judicial considere um caso em um procedimento de reclamao particular.

Requisitante
Pessoa que apresenta uma requisio em um procedimento de reclamao particular.

Reserva
Quando da adeso a um tratado, um Estado pode expressar uma reserva: declarao que de algum modo modifica suas obrigaes oriundas do tratado.

Resoluo
Deciso oficial de um rgo internacional, geralmente adotada aps uma votao. Geralmente uma recomendao e, portanto, no juridicamente vinculante.

Responsabilidade estatal
Responsabilizao de um Estado nos termos do direito internacional.

Sano
Penalidade imposta a um Estado por no respeitar suas obrigaes.

Sentena judicial
Deciso juridicamente vinculante na qual um tribunal expressa suas concluses sobre um caso.

Transmisso (de uma denncia)
Envio da denncia, por exemplo, ao Estado envolvido.

Tratado
Documento de direito internacional que estabelece obrigaes juridicamente vinculantes para os Estados.

Violao (de obrigaes)
Descumprimento das obrigaes de um Estado nos termos do direito internacional.

Violaes graves dos direitos humanos
Violaes particularmente graves dos direitos humanos, por exemplo, torturas ou execues extrajudiciais.

PARTE I - QUESTES PRELIMINARES

1. Introduo

2. Como Utilizar Este Manual

2.1. Exposio geral dos principais captulos

2.2. Terminologia

2.3. Questes essenciais de poltica

3. Contexto

3.1. Introduo

3.2. O que se pode esperar conseguir com a apresentao de denncias de tortura?

3.3. O que tortura?

3.4. Como ocorre a tortura?

3.5. Em quais contextos possvel receber ou obter denncias de tortura?

3.6. possvel denunciar agentes no-governamentais?

1. INTRODUO

Para a maioria das pessoas, falar sobre tortura invoca imagens das mais cruis formas de sofrimento fsico e psquico: unhas arrancadas, choques eltricos, simulao de execues, obrigar uma pessoa a presenciar a tortura de pais ou filhos, estupro. Essas imagens geram sentimentos de intensa repulsa em uma pessoa normal e pouqussimas pessoas podem permanecer indiferentes quando tais sofrimentos so impostos a um ser humano. Publicamente, a condenao da tortura tem se generalizado e, com efeito, terminantemente proibida por todos os instrumentos atuais de direitos humanos, desde a Declarao Universal dos Direitos Humanos de 1948. A violao dessa proibio considerada um ato to grave que no pode haver qualquer justificativa legal, nem mesmo em circunstncias excepcionais ou tempos de conflito. Porm, se examinarmos qualquer relatrio do Relator Especial das Naes Unidas sobre a Tortura ou do Comit Europeu para a Preveno da Tortura, ou, ainda, muitos jornais, fica patente que a Tortura no um fenmeno do ado. Ainda que atualmente seja inaceitvel a defesa pblica da tortura por parte de um agente estatal, inegvel que a tortura e outros atos a ela relacionados, tais como castigo e tratamento cruel, desumano e degradante, continuam a ser praticados surdina, longe da visibilidade pblica e a portas fechadas.

No entanto, a chave dessa porta est ao alcance de todas as pessoas que tenham sofrido, presenciado ou sido informadas sobre um incidente de tortura. Essa chave a informao. Somente se esses incidentes forem trazidos luz da comunidade internacional que a erradicao pode ter uma chance de xito. Existe uma srie de rgos cujo objetivo consiste precisamente em garantir que a tortura seja uma coisa do ado. Porm, na ausncia de informao, esses rgos ficam de mos atadas. Raramente podem examinar uma situao com seus prprios olhos: seus poderes de investigao em primeira mo so, na maioria das vezes, muito limitados. Assim, como pode o Relator Especial das Naes Unidas elaborar um relatrio sobre o alcance do problema em todo mundo, ou em um pas especfico, se ningum lhe enviar informaes? Como pode o Comit Europeu para a Preveno Contra a Tortura saber quais categorias de detentos correm maior risco em um determinado pas se no receber nenhum relatrio? A resposta para essas duas perguntas a mesma e muito simples: no podem.

Se a informao a chave, logo segue que as organizaes no-governamentais (ONGs) so as que a possuem. Tal a dependncia que os organismos internacionais tm delas que a falta de liberdade de atuao das ONG0s em um determinado pas pode muito bem significar que no ser possvel atraia a ateno da comunidade internacional para a situao desse pas, ainda que as violaes dos direitos humanos ocorridas em tal pas a meream. Isso se deve ao fato de que mais simples prestar ateno e dedicar recursos aos Estados sobre os quais existe muita informao. A nica forma de abrir os olhos da comunidade internacional para as situaes menos conhecidas garantindo que informaes confiveis cheguem at elas. Nesse contexto, impossvel superestimar a importncia da funo desempenhada pelas ONGs na batalha em prol da erradicao da tortura. Embora algumas ONGs especializadas tenham adotado excelentes mtodos de denncia, muitas ONGs menos experientes no so conscientes da importncia da informao que fornecem ou nunca tiveram a oportunidade de aprender como apresent-la da melhor forma. No contexto especfico de denncias de tortura, infelizmente acontece de uma parte significativa da informao recebida dessas ONGs se perder, no porque as denncias sejam infundadas, mas porque so omitidos fatos importantes, porque a denncia redigida em uma linguagem excessivamente poltica ou porque apresentada em um idioma que a pessoa que recebe a informao no compreende e no dispe de recursos para sua traduo. Em outros casos, talvez devido falta de familiaridade com as diferentes funes, e muitas vezes funes paralelas, dos diversos organismos internacionais, as ONGs enviam sua informao unicamente para uma autoridade que no tem o poder necessrio consecuo dos resultados desejados. O Relator Especial das Naes Unidas Contra a Tortura, por exemplo, no pode ordenar a um Estado que pague uma indenizao a uma vtima de tortura, porm o Tribunal Europeu de Direitos Humanos, por sua vez, pode faz-lo.

O presente manual destina-se principalmente s ONGs com menos experincia, sobretudo as ONGs menores, que atuam no mbito nacional ou comunitrio e que desejam se desenvolver e participar mais ativamente da denncia de casos de tortura. No se trata de proporcionar uma formao jurdica nem mdica, mas sim oferecer informaes centradas mais no processo de denncia propriamente dito. Desse modo, este manual tem por objetivo capacitar essas ONGs para que produzam informaes de alta qualidade sobre incidentes e padres sistemticos da prtica da tortura, a fim de melhorar a utilidade da informao para os organismos internacionais, bem como ajudar essas ONGs a selecionar o procedimento ou os procedimentos mais adequados aos quais dirigir a informao luz do prprio resultado que se deseja. O tema central do manual a tortura, mas boa parte do que nele se explica seria igualmente relevante no contexto de outras violaes dos direitos humanos. Ainda que uma denncia no seja uma violao da proibio da tortura, pode ser uma violao de outra norma dos direitos humanos, por exemplo, do direito liberdade e segurana da pessoa, ou o direito a um julgamento justo. Apesar de essas violaes no serem o objeto central do presente manual, os leitores devem ter presente que tambm existem recursos para as violaes de direitos humanos que no a tortura.

Cabe lembrar que seguir as orientaes estabelecidas no presente manual no constitui garantia de obteno de um determinado resultado de um organismo internacional especfico, e que muitas vezes poder parecer que se conseguiu-se muito pouco em um determinado caso. Ainda que no se possa evitar a frustrao e a decepo nessas ocasies, convm lembrar que a luta pela erradicao da tortura um processo longo e lento e que no deve ser medido unicamente em funo de resultados especficos. Toda informao confivel, coletada meticulosamente, constitui uma arma nessa luta e cada porta que se abre uma porta a menos para que os torturadores se escondam atrs dela.

2. COMO UTILIZAR ESTE MANUAl

IMPORTANTE:

No se sinta intimidado pelo volume deste manual. No preciso ler todo o livro do comeo ao fim para se beneficiar dele, nem necessrio ser um especialista para utiliz-lo.

Se voc tomar conhecimento de que foram cometidos maus tratos mas no puder ou no desejar tomar as medidas voc mesmo, e a informao a algum que o possa.

A fim de adquirir um bom conhecimento do processo geral de preparao e apresentao de uma denncia de tortura, ser necessrio ler todo o volume. No entanto, todas as sees podem ser lidas separadamente e no precisam ser lidas necessariamente em seqncia. Desse modo, possvel consultar o manual de acordo as necessidades especficas do leitor. Recomenda-se, entretanto, que qualquer pessoa que realmente pretende apresentar uma denncia formal de tortura leia atentamente cada seo to logo possvel.

Como se ver medida que se for lendo este manual, sua inteno a de ser o mais prtico possvel. Assim, evitou-se aprofundar excessivamente na natureza tcnica ou terica dos conceitos. Existe um grande nmero de estudos tericos sobre a tortura e outros temas relacionados e entendeu-se que o que faltava era um manual de natureza mais prtica para aqueles que querem apresentar denncias de tortura sem ter de concluir longos estudos mdicos e jurdicos para comearem a entender o assunto. Alm disso, para que um manual desse tipo tenha uma utilidade prtica em campo, preciso que tenha um tamanho de fcil utilizao e oferea pronto o informao que se busca, sem que se tenha de extra-la de textos longos e densos. Por essa razo, foi necessrio ser extremamente seletivo na escolha do contedo deste manual. H muitas reas que as pessoas interessadas em aprender mais sobre o assunto podero querer aprofundar. O Apndice 2 apresenta uma seleo de contatos e referncias para as organizaes ou pessoas que desejem buscar mais informao ou assistncia.

No se esquea que, exceo dos procedimentos especficos da tortura, muitos dos mecanismos descritos tambm podem receber reclamaes ou denncias relativas a uma ampla gama de violaes dos direitos humanos que no a tortura. Boa parte do que aqui se explica tambm vale para essas reclamaes. Como este manual se concentra na denncia de casos de tortura, sua anlise enfatizar os requisitos para a apresentao de informao relacionada tortura, mas nos casos em que no se cumprirem esses requisitos, pode, ainda assim, ser pertinente apresentar uma reclamao com base em outro direito.

2.1. Exposio geral dos principais captulos

A apresentao de uma denncia de tortura no consiste somente em redigir uma carta a um organismo internacional. preciso saber onde olhar e o que procurar, e isso comea pela primeira palavra da entrevista com a pessoa que alega ter sido torturada. Isso se deve ao fato de que a qualidade e a conseqente credibilidade da denncia dependero quase inteiramente da informao registrada. Isso significa saber quais perguntas formular e prestar muita ateno aos detalhes quando da tomada de notas durante a entrevista, porque nem sempre haver uma segunda possibilidade de preencher as lacunas. Tambm necessria uma certa familiaridade tanto com os contextos jurdicos como prticos da tortura, alm de um conhecimento dos objetivos e provveis resultados da apresentao da denncia. As trs principais sees que tratam dos diversos estgios do processo so:

Parte I, Captulo 3 - Contexto: Esse captulo proporciona informao geral para apresentao de uma denncia: analisa o que se pode conseguir comunicando denncias de tortura, explica brevemente o conceito de tortura e outras formas de maus tratos, identifica lugares e situaes em que mais provvel a prtica da tortura e destaca as circunstncias mais favorveis para o recebimento de denncias. Por ltimo, trata do espinhoso tema dos atos praticados por agentes no-governamentais e levanta a questo sobre o que se pode fazer a respeito das denncias que os envolvem.

Parte II - Documentao das Denncias: O objetivo dessa parte oferecer orientaes sobre como reunir informaes sobre incidentes de tortura e outras formas de maus tratos. Essa parte enfatiza a informao indispensvel a qualquer denncia, apresenta indicaes sobre como realizar uma entrevista com uma vtima ou testemunha e identifica o tipo de provas de apoio que podem ser reunidas para se reforar uma denncia ou possibilitar a instaurao de um processo judicial.

Parte III Ao Diante da Informao Coletada: Essa parte apresenta os diferentes mecanismos existentes para a apresentao de denncias de tortura e outras formas de maus tratos, sobretudo no mbito internacional, proporciona uma orientao para a escolha de um mecanismo e explica o melhor modo de preparar e adaptar sua apresentao ao mecanismo escolhido. Tambm reconhece que possvel haver situaes em que no se queira fazer uma denncia em carter pessoal, em que seja necessrio apoio ou aconselhamento sobre como proceder ou situaes em que se queira tomar medidas polticas e judiciais. Essa parte apresenta algumas sugestes sobre onde obter assistncia em tais casos.

2.2. Terminologia

Ele/ Ela: Via de regra, no presente manual procurou-se usar o gnero neutro, salvo nos casos em que foi necessria uma maior preciso em determinado contexto. Em tais casos, a terminologia neutra foi substituda pelo gnero masculino ou feminino. As referncias excepcionais ao gnero masculino ou feminino (em um contexto no relacionado ao gnero especfico) devem ser interpretadas como inclusivas tanto do gnero masculino como do feminino.

Tortura/ Maus tratos: Como se ver no Captulo 3, o termo "tortura" tem um significado muito especfico na legislao de direitos humanos como forma particularmente grave de maus tratos. O uso do termo "tortura" no texto no tem o propsito de ser interpretado no sentido jurdico, a menos que assim se depreenda claramente do contexto. Caso no seja especificado em contrrio, as consideraes vlidas para o termo tortura valero igualmente para outras formas de maus tratos.

Termos especializados: Os leitores devem ter presente que alguns termos podem ter significados especializados ou jurdicos em seu pas, porm podem ter um significado diferente em outro sistema nacional. A terminologia empregada no presente manual no pretende ter implicaes jurdicas e deve ser interpretada em um sentido geral; o termo "priso", por exemplo, no empregado em referncia a uma priso oficial, que pode exigir a acusao de uma pessoa pela prtica de um delito, mas meramente a privao de liberdade ou a deteno de uma pessoa pela polcia, inclusive para fins de interrogatrio extra-oficial. De igual modo, os nomes utilizados para certas instituies prisionais, tais como presdios, podem se referir a um tipo muito diferente de instituio em um determinado pas, mas ser utilizados de modo mais genrico em outro.

2.3. Questes essenciais de poltica

Os leitores devem estar cientes de que h muitos aspectos sobre os quais impossvel falar adequadamente em um manual desta natureza e dimenso, mas que devem ser mantidos presentes medida que lerem este manual, devido a suas importantes implicaes. recomendvel que se dedique certo tempo a uma reflexo sobre esses aspectos e, se necessrio, no caso das organizaes, adoo das medidas cabveis.

Segurana: Os entrevistadores devero ter muito cuidado no sentido de no criar um risco desnecessrio para as pessoas, quer sejam eles mesmos, quer sejam outros membros de sua organizao ou as pessoas entrevistadas. Talvez seja bvio constatar que h certos riscos inerentes ao trabalho na rea dos direitos humanos, sobretudo para o pessoal das ONGs locais, mas importante que os investigadores e trabalhadores dos direitos humanos que no sejam do pas ou que sejam provenientes de outras regies do mesmo pas no se esqueam de que pode haver conseqncias para aqueles que ali ficarem. Ningum dever correr qualquer risco por culpa de uma pessoa excessivamente entusiasmada. Raras so as vezes em que possvel oferecer proteo s pessoas que apresentam denncias, mas aqueles que no tm muito medo de falar muitas vezes acreditam que faz-lo com pessoas de fora lhes garante algum tipo de proteo. preciso assegurar que eles tenham a oportunidade de expressar seu consentimento informado (ver abaixo) entrevista e ao possvel uso da informao registrada.

tica profissional: Muito se escreveu sobre os conflitos entre os deveres para com a comunidade no sentido mais amplo e a relao entre os profissionais, sejam eles mdicos ou advogados, e seus clientes. Nos casos que envolvem maus tratos, esses deveres podem entrar em conflito, porque, enquanto o dever para com a comunidade em geral pode significar que todas as violaes devem se tornar pblicas pelo bem da maioria, a tica profissional costuma ditar que a confidencialidade entre advogados ou mdicos e seus clientes deve ser respeitada pelo bem da pessoa. Esse um dilema que mais provavelmente dir respeito aos mdicos, e existem muitas declaraes e cdigos de tica da profisso mdica, mas um dilema igualmente presente em todas as relaes profissionais, entre as quais se inclui a de um trabalhador de direitos humanos e um entrevistado.

Os mdicos e outros profissionais da sade que desejam buscar assessoramento sobre como tratar tais conflitos ticos devem entrar em contato com uma organizao mdica, seja ela nacional ou internacional, que dever prestar assistncia e orientao sobre a melhor forma de se atuar. Outras organizaes profissionais devero estar em condies de prestar uma assistncia semelhante a seus membros, alm de redes de assistncia profissional de natureza menos fomal ou ONGs especializadas.

Consentimento informado: Significa garantir que quando algum d seu consentimento a algo, por exemplo, quando algum concorda conceder uma entrevista ou apresentar uma denncia, a pessoa est plenamente informada dos possveis benefcios conseqncias negativas da ao proposta. A questo o que significa "plenamente informado"? Trata-se de um assunto em que no aconselhvel adotar uma abordagem sistemtica, mas sim avaliar cada situao especfica individualmente.

Deve haver um equilbrio entre a garantia de que o entrevistado est ciente de todos os riscos em potencial envolvidos ao se fornecer informao e obter toda a informao possvel (porque esse, afinal, o propsito principal da entrevista, a no ser que realizada por razes teraputicas). Enfatizar os riscos em potencial pode fazer com que o entrevistado desista de falar, mas seria inaceitvel dar mais prioridade informao do que ao risco real que uma pessoa pode correr. Uma ttica poderia ser tomar uma deciso em funo do fim para o qual se pretende utilizar a informao. A regra de ouro deve ser que ningum jamais dever ser nomeado nem identificado como fonte, a menos que tenha dado seu consentimento expresso; se sua inteno a de citar o nome de uma pessoa, preciso obter seu consentimento para tanto, bem como para todas as implicaes, tanto positivas como negativas. No entanto, se seu propsito , por exemplo, fazer uma entrevista informal com algum, no necessria a identificao do entrevistado; se estiver buscando somente a corroborao da declarao de uma pessoa entrevistada anteriormente ou de informao geral, pode ser contraproducente e desnecessrio enfatizar os riscos em potencial. Os riscos reais nunca devem ser ocultados, mas importante avaliar qual o risco real em cada caso, em vez de sobrestim-lo e reduzir desnecessariamente o valor da entrevista.

No se esquea que o consentimento no s deve ser informado mas tambm dado com liberdade. As pessoas no devem ser pressionadas a dar seu consentimento quando estiver claro que elas no querem faz-lo aps terem sido plenamente informadas das implicaes.

Apoio e reabilitao da vtima: O trabalhador de direitos humanos tem um inevitvel sentimento de entusiasmo quanto apurao dos fatos, a coleta de denncias e a descoberta de provas. No entanto, para a vtima, falar de semelhante sofrimento pessoal e muitas vezes to horroroso pode gerar reaes muito diferentes. De certo modo, pode ter um efeito teraputico, mas tambm pode voltar a abrir feridas muito profundas e provocar uma enorme tenso psicolgica e at fsica. absolutamente imprescindvel oferecer todo o apoio real e eficaz possvel vtima durante e aps a entrevista. Em se tratando de entrevistas com pessoas que ainda esto detidas, isso pode ser difcil, mas pelo menos o entrevistador pode realizar a entrevista com tato e habilidade (Ver Parte II, Captulo 3.2). Em se tratando de vtimas entrevistadas fora de um contexto de deteno, preciso procurar oferecer-lhes apoio e reabilitao. Isso pode significar colocar sua disposio assessoramento profissional ou simplesmente informar a vtima que a porta sempre estar aberta. As organizaes devem avanar nessa questo junto aos organismos especializados relacionados no Apndice 2. A reabilitao deve ser considerada como parte integral do trabalho com as vtimas da tortura. Afinal, essas pessoas esto compartilhando com o entrevistador algo que profundamente pessoal e doloroso e, embora este possa entender que a entrevista esteja contribuindo para uma mudana positiva ou para fomentar uma causa, a situao pode criar sofrimento para os entrevistados; portanto, cabe ao entrevistador garantir que lhes seja oferecido o apoio de que necessitam para lidar com seu sofrimento e converter o processo em um processo de cura.

3. CONTEXTO

3.1. Introduo

O presente captulo procura responder a algumas perguntas bsicas que se pode ter sobre o processo de apresentao de denncias de tortura e outras formas de maus tratos.

Em primeiro lugar, qual o objetivo do processo? possvel conseguir algo com os procedimentos e os mecanismos explicados neste manual? [Parte I, Captulo 3.2]

Em seguida, cabe perguntar o que queremos dizer por "denncias de tortura". O que exatamente a tortura? Existe uma frmula que diga em que ela consiste? Como se pode ter certeza de que a informao coletada evidencia que foram praticados atos de tortura? Voc precisa saber disso? [Parte I, Captulo 3.3]

Como ocorre a tortura? Para encontrar uma resposta, perguntamos quem so seus autores, onde e quando mais provvel que ajam e quem so suas vtimas mais provveis. [Parte I, Captulo 3.4]

Existe alguma situao tpica em que se possa obter informao relativa a incidentes de maus tratos? Existe algum fator especfico que se deva conhecer em tais situaes? E quanto s fontes de informao menos habituais? [Parte I, Captulo 3.5]

O que acontece quando as violaes so cometidas por pessoas que no tm relao com as autoridades estatais, por exemplo, foras rebeldes em um conflito interno? Tambm possvel apresentar denncias contra elas? [Parte I, Captulo 3.6]

3.2. O que se pode esperar conseguir com a apresentao de denncias de tortura?

A apresentao de denncias de tortura aos mecanismos internacionais pode ser benfica para a situao geral de um pas e para a vtima da tortura.

Atrair a ateno para uma situao/ estabelecer um padro de violaes

Os governos cujos agentes cometem violaes dos direitos humanos preferem manter essas prticas longe da visibilidade pblica, a fim de, assim, escapar da condenao. A apresentao de denncias aos mecanismos internacionais contribui muito para evitar essa situao, uma vez que aumenta a conscincia da situao real existente em um determinado pas. mais provvel que a comunidade internacional tome medidas com relao a situaes sobre as quais recebe muitas informaes. A nica forma de aumentar a possibilidade de o resto do mundo tomar medidas contra violaes dos direitos humanos assegurando que o mundo esteja a par da situao.

Se a informao disponvel assim corroborar, deve-se procurar apresentar provas de um padro sistemtico de violaes. Informaes coerentes e regulares constituem prova desses padres e suscitaro uma maior preocupao da comunidade internacional do que relatos de incidentes isolados. Isso porque demonstra que o problema grave e dificulta a possibilidade de um Estado argumentar que no est envolvido ou que desconhece as prticas alegadas.

Buscar mudanas positivas em uma situao geral

Atrair a ateno para uma situao no s consiste em buscar a condenao ou responsabilizao de um Estado. Ainda mais importante, consiste em buscar melhoras construtivas e duradouras que contribuiro para a eliminao definitiva da tortura em um pas. Esse objetivo muitas vezes exigir mudanas no arcabouo legislativo e nas atitudes oficiais para com a tortura. Muitos dos mecanismos internacionais fazem sugestes aos Estados sobre as formas pelas quais podem melhorar a situao geral, por exemplo, mediante a introduo de garantias jurdicas e prticas que ofeream uma maior proteo aos detidos. Isso pode ar por uma legislao que reduza o perodo pelo qual um detento pode ser retido sem ter o a um advogado, a introduo de exames mdicos peridicos por parte de mdicos independentes para todas as pessoas sob custdia ou medidas para se eliminar a impunidade (discutidas mais adiante). Normalmente, as recomendaes dos organismos internacionais so apenas o incio de um dilogo com o Estado em questo, cujo propsito garantir que sejam implementadas as recomendaes.

3.2.3. Combater a impunidade

Levar a tortura ateno da opinio pblica para responsabilizar os Estados resultado da apresentao de denncias de tortura. Em outro nvel, a denncia de casos de tortura tambm pode ajudar a lanar luz sobre as pessoas que praticam tais atos, para que tenham certeza de que no podem continuar com essa conduta impunes, sem arcar com suas conseqncias. O ideal seria que isso se desse mediante a instaurao de um processo no mbito do sistema jurdico nacional. No entanto, quando a instaurao de um processo no ou no pode ser eficaz, muitos dos organismos internacionais condenam rapidamente a tolerncia oficial da tortura e exigem ou recomendam ao Estado que adote medidas destinadas a eliminar a impunidade. Enquanto os torturadores puderem escapar impunes (e, com efeito, em alguns casos suas chances de promoo aumentam com o emprego da tortura para a obteno de resultados em investigaes), no haver incentivos para abandonarem a prtica da tortura e outras formas de maus tratos.

Se um Estado permite a impunidade para os autores da tortura, tambm se origina um problema de responsabilidade estatal nos termos do direito internacional. Muitos Estados tm a obrigao, em virtude de uma srie de convenes, tais como a Conveno das Naes Unidas contra a Tortura, de assegurar que as pessoas que tenham perpetrado atos de tortura sejam responsabilizadas por suas aes. Se um Estado no processa as pessoas que sabidamente esto envolvidas em atos de tortura, ou no permite que outro Estado o faa, tal Estado pode estar incorrendo em um descumprimento de suas obrigaes assumidas nos termos do direito internacional.

3.2.4. Buscar um recurso jurdico para uma vtima em particular

Os objetivos anteriores podem parecer um tanto indiretos e de longo prazo e podem parecer no proporcionar uma reparao s vtimas. Alm dos benefcios de longo prazo para as pessoas por viverem em um pas com um melhor histrico de direitos humanos, existem vrios benefcios imediatos ou diretos que podem ser obtidos mediante a apresentao de denncias.

3.2.4.1. Constatao de violao

Muitos organismos de tratados internacionais descritos podem se pronunciar sobre a questo de se realmente foram praticados atos de tortura ou violaes a eles relacionadas. Isso significa que eles podem emitir uma declarao autorizada de que o Estado violou suas obrigaes nos termos do direito internacional com relao a uma determinada pessoa. Ainda que isso no oferea uma reaparao para a pessoa em questo, o efeito que foi revelado publicamente a culpabilidade do Estado e que o Estado foi obrigado a prestar contas de seu comportamento.

3.2.4.2. Responsabilizao dos torturadores

Alguns dos mecanismos podem requisitar ou ordenar que se realize uma investigao eficaz sobre uma denncia de tortura e que o torturador seja processado por sua conduta. Da mesma forma que no caso para se eliminar a impunidade em geral, isso importante para garantir a uma vtima que um torturador no pode praticar a tortura sem ter de arcar com as conseqncias de seu ato.

3.2.4.3. Reparao

A reparao consiste em reparar o dano causado a uma pessoa. Muitos rgos judiciais internacionais tm o poder de ordenar a um Estado que repare o dano causado nos casos em que se d a constatao de uma violao. A reparao pode ser concedida de diversas formas. Tradicionalmente, muitas vezes consistiu em uma compensao econmica (indenizao), porm cada vez mais tambm so comuns outros tipos de reparao. As compensaes econmicas so calculadas, via de regra, segundo a perda econmica real, bem como os danos morais, o que equivale a calcular o sofrimento causado pessoa ou a sua famlia, ou a ambas, e atribuir-lhe um valor econmico. Entre as formas menos tradicionais de reparao, que, em muitos sentidos, so uma forma muito mais apropriada e eficaz de compensar as conseqncias das violaes, poderiam incluir-se a inaugurao de uma escola ou hospital em uma comunidade que tenha sofrido violaes, requerer que o Estado informe os familiares de pessoas desaparecidas ou assassinadas acerca da localizao dos corpos das vtimas mortas, ordenar que o Estado contribua financeiramente para a reabilitao da vtima ou at mesmo que o Estado apresente um pedido de desculpas pblico pelo ocorrido.

3.2.4.4. Impedir a deportao de uma pessoa para um pas onde ela poderia correr o risco de tortura

Muitos dos mecanismos esto preparados para tomar medidas urgentes a fim de evitar a deportao de pessoas para pases em que se acredita que elas correm o risco de sofrer torturas. A pessoa deve poder demonstrar que corre esse risco e que o risco permanente; se for possvel demonstrar isso, o organismo pode requerer que o Estado ao qual se solicita asilo no deporte a pessoa, a menos at que o mecanismo em questo tenha tido a oportunidade de considerar o caso. Tais requerimentos no so necessariamente vinculantes para o Estado, mas, muitas vezes, so respeitados.

3.3. O que tortura?

3.3.1. Introduo

A deciso sobre se uma srie de atos constitui ou no tortura pode ser complicada. Existem certos tipos de tratamento que a maioria das pessoas reconhece instintivamente como inaceitveis. Entretanto, existem outros que no so to claros ou que dependem de fatores culturais. importante lembrar que quando se apresenta uma denncia a um mecanismo internacional, procura-se evidenciar que os fatos constituem tortura ou maus tratos em um sentido jurdico, e no s na opinio de quem faz a denncia. Esta seo analisar o que isso significa e quais so as implicaes para aqueles que desejam apresentar uma denncia.

3.3.2. O que o direito internacional diz sobre o significado da tortura?

A definio bsica de tortura a que consta da Conveno das Naes Unidas contra a Tortura (1984). De acordo com o Artigo 1(1), o termo significa:

"qualquer ato pelo qual se inflige intencionalmente um sofrimento ou uma dor grave, seja fsica ou mental, a uma pessoa para fins tais como a obteno de informao sobre uma terceira pessoa ou uma confisso, um castigo por ato que essa pessoa ou uma terceira pessoa tenha cometido ou se suspeite que ela tenha cometido, ou a intimidao ou coero dessa pessoa ou de uma terceira pessoa, ou por qualquer razo com base em qualquer tipo de discriminao, quando tal dor ou sofrimento for infligido por parte ou por instigao ou com o consentimento ou a aquiescncia de um representante pblico ou outra pessoa que atua em capacidade oficial. No inclui dor ou sofrimento decorrente, inerente ou prprio unicamente de sanes jurdicas."

A partir dessa distino, possvel depreender trs elementos essenciais que constituem tortura:

A imposio de um sofrimento ou uma dor mental ou fsica grave

Por parte das autoridades estatais ou com seu consentimento ou aquiescncia

Por um motivo determinado, por exemplo, extrair informao, castigar ou intimidar

"Tortura" uma palavra que suscita emoes, mas que no deveria ser usado de modo inconseqente. Como se depreende da definio anterior, a tortura se caracteriza e se distingue de outras formas de maus tratos pelo grau de sofrimento grave. Por essa razo, importante reservar o termo s formas de maus tratos objetivamente mais graves.

Tratamento cruel e punio ou tratamento degradante ou desumano tambm so termos jurdicos que constituem maus tratos que provocam diversos graus de sofrimento menos intenso que no caso da tortura. As formas de maus tratos que no a tortura no precisam ser impostas por um motivo especfico, mas preciso haver uma inteno de submeter as pessoas a condies que constituem ou resultem em maus tratos. Portanto, os elementos essenciais que constituem maus tratos que no representam tortura devem se limitar a:

Exposio intencional ou a uma dor ou sofrimento mental ou fsico considerveis

Por parte das autoridades estatais ou com seu consentimento ou aquiescncia

Para que os rgos internacionais distingam entre as diferentes formas de maus tratos e avaliem o grau de sofrimento, devem levar em considerao as circunstncias especficas de cada caso e as caractersticas de cada vtima. Isso dificulta a identificao das fronteiras exatas entre as diferentes formas de maus tratos, uma vez que essas circunstncias e caractersticas variaro, porm no torna a lei mais flexvel por permitir que ela se adapte s circunstncias. A questo importante a se ter presente que todas as formas de maus tratos so proibidas pelo direito internacional. Isso significa que, at mesmo nos casos em que o tratamento no for considerado suficientemente grave (em termos jurdicos) a ponto de constituir tortura, possvel declarar que o Estado violou a proibio de maus tratos.

3.3.3. O que isso significa em termos prticos?

O direito internacional nos fornece duas principais orientaes a serem aplicadas na avaliao de se um conjunto de fatos constitui tortura, a saber:

Os fatos devem corroborar os elementos essenciais contidos na definio de tortura.

A tortura pode ser distinguida de outras formas de maus tratos por seu grau de sofrimento grave e a necessidade de um elemento de intencionalidade.

3.3.3.1. Elementos essenciais

Como se ver no excerto da citada Conveno das Naes Unidas contra a Tortura, a definio jurdica de tortura tem uma natureza muito abstrata. No se refere a tipos especficos de maus tratos nem proporciona uma lista de tcnicas proibidas. Em vez disso, estabelece uma srie de elementos essenciais para que um incidente seja considerado como um possvel caso de tortura na acepo jurdica. Os elementos necessrios para que um tratamento constitua maus tratos que no a tortura tambm so abstratos. Esses elementos podem ser recapitulados da seguinte forma:

QUAL ATO FOI PRATICADO? : Dor ou sofrimento mental ou fsico grave (tortura) foi imposto deliberadamente ou ocorreu uma exposio intencional a uma dor ou sofrimento mental ou fsico considervel (maus tratos que no tortura).

QUEM O PRATICOU? : As prprias autoridades estatais impam esse sofrimento, ou dele sabiam ou deveriam ter sabido, porm nada fizeram para evit-lo.

POR QUE O PRATICARAM?: O sofrimento foi imposto com uma finalidade especfica, por exemplo, para se obter informao, castigar ou intimidar a vtima (somente tortura).

O que constitui exatamente esses elementos fica a cargo da interpretao dos organismos internacionais de monitoramento. Estes tm a responsabilidade de elaborar interpretaes coerentes da definio da tortura e outras formas de maus tratos e devem assegurar que suas interpretaes apliquem, em cada caso, as mesmas normas. Isso significa que uma pessoa ou organizao (ONG) no deve decidir se os maus tratos impostos a uma pessoa constituem tortura ou outro tipo de tratamento, mas sim que, documentando os fatos que corroboram os elementos essenciais, possvel fornecer as provas para que os organismos internacionais decidam.

3.3.3.2. Grau de sofrimento

A tortura se distingue de outras formas de maus tratos menores por seu grau de sofrimento grave. Talvez seja esse o aspecto mais difcil para se avaliar a tortura. Os outros dois elementos essenciais podem ser verificados, em grande medida, objetivamente: em geral, objetivamente possvel estabelecer que o torturador tinha um vnculo com o Estado ou que a tortura foi imposta com um propsito especfico. A natureza e o grau do sofrimento experimentado por uma pessoa so outra questo. Podem depender de muitas caractersticas pessoais da vtima: do sexo, idade, crenas religiosas ou culturais, estado de sade, por exemplo. Em outros casos, certas formas de maus tratos ou certos aspectos da deteno, que, por si ss, no constituiriam tortura, podem constituir tortura em combinao um com outro.

Certos tipos de tratamento parecem se inserir objetivamente na categoria de tortura - por exemplo, choques eltricos aplicados nos rgos genitais ou a extrao de unhas. A tortura, entretanto, no se limita a esses exemplos mais conhecidos; inclui muitas formas de sofrimento, de natureza tanto fsica como psicolgica. muito importante no esquecer as formas psicolgicas de maus tratos; muitas vezes essas formas podem ter conseqncias mais duradouras para as vtimas, que podem se recuperar das leses fsicas mas, ainda assim, continuaro sofrendo de profundas cicatrizes psicolgicas. Entre as formas de maus tratos que foram demonstradas como equivalentes tortura, por si ss ou em combinao com outras formas de tratamento, incluem:

Falaka/ falanga: golpes nas solas dos ps

Forca palestina: suspenso pelos braos amarrados nas costas

Espancamentos violentos

Choques eltricos

Estupro

Simulao de execuo

Ser enterrado vivo

Simulao de amputaes

Entretanto, tambm existem muitas "reas cinzentas" que no constituem tortura de uma forma clara, ou sobre as quais ainda existe desacordo, mas que representam uma grande preocupao para a comunidade internacional. Entre os exemplos incluem-se:

Castigo corporal imposto como pena judicial

Certas formas de pena capital e o fenmeno do corredor da morte (presos condenados morte)

Recluso em cela solitria

Determinados aspectos de ms condies de encarceramento, sobretudo se combinados vrios elementos

Desaparecimentos, inclusive o efeito que provocam nos familiares prximos da pessoa desaparecida

Tratamento infligido a uma criana que pode no ser considerado tortura se infligido a um adulto

Um fator particularmente significativo que pode afetar a avaliao da gravidade do grau de sofrimento experimentado pela vtima o fator cultural. importante ter presente que as diferentes culturas e, com efeito, as pessoas de uma determinada cultura, tm diferentes percepes do que constitui tortura. Isso pode ter dois aspectos importantes: por um lado, pode significar que o comportamento que uma cultura ou uma vtima consideram como tortura, pode no constituir tortura para os organismos internacionais. Por outro lado, tambm pode significar que o tratamento que a comunidade internacional considera constitui tortura no visto como tal pela pessoa que o sofreu. Por exemplo, em um pas, espancamentos, ainda que violentos, podem no ser considerados tortura, mas uma prtica normal, ao o que rasgar a roupa de uma mulher (sem mais) pode s-lo. Tambm pode acontecer de o tratamento considerado ilegal no mbito internacional ser legal no mbito nacional. Em tais casos, no se deve deixar de apresentar a denncia, porque os organismos internacionais seguiro as orientaes do direito internacional. Lembre-se que mesmo quando o tratamento no for considerado como tortura, poder, ainda assim, constituir outra forma de maus tratos proibidos.

A fim de assegurar-se de que sejam levadas em conta as possveis variaes culturais ao apresentar uma acusao de tortura, deve-se:

Explicar o significado das atitudes culturais quanto a certos tipos de tratamento em suas denncias e relatos, uma vez que isso pode afetar a avaliao, por parte do organismo internacional, do grau de sofrimento.

Certificar-se de no omitir qualquer detalhe do tratamento a que foi submetida a pessoa, porque os fatos que voc no considera importantes podem na verdade ser muito relevantes para a denncia.

Lembrar-se de que as vtimas tambm podem omitir detalhes que no acreditam ser importantes; voc deve estimul-las a dar todos os detalhes possveis sobre o que aconteceu. (Ver Parte II, Captulo 4 para uma consulta das orientaes sobre qual informao pode ser mais importante)

3.3.4. Concluso: o que tortura?

Todos esses comentrios levam seguinte pergunta: como possvel ter certeza de que os fatos sobre os quais se dispe de informao constituem tortura ou maus tratos? A resposta muito simples: no se pode ter certeza, mas no necessrio t-la.

Sua responsabilidade, como indivduo ou ONG que apresenta uma denncia de tortura, garantir que a informao a ser apresentada corrobore os trs elementos essenciais que constituem a definio jurdica de tortura (ou dois, em caso de denncia de maus tratos).

da responsabilidade dos organismos internacionais determinar exatamente o que constitui e o que no constitui tortura ou maus tratos.

A interpretao do que constitui tortura est em constante evoluo. Isso pode parecer complicar as coisas, mas, na verdade, permite que os organismos internacionais tenham uma relativa liberdade ao avaliarem as formas de maus tratos que anteriormente no foram consideradas como formas que constituem tortura. Para a pessoa que vai apresentar uma denncia de tortura, isso significa que no necessrio que se tenha certeza de que um ato constitui tortura ou no, mas, ao mesmo tempo, no significa que no existam certos critrios mnimos. Lembre-se que sua tarefa procurar estabelecer os elementos essenciais.

Deve-se demonstrar que:

Dor ou sofrimento mental ou fsico grave (tortura) foi imposto deliberadamente ou ocorreu uma exposio intencional a uma dor ou sofrimento mental ou fsico considervel (maus tratos que no tortura).

As prprias autoridades estatais impam esse sofrimento ou dele estavam cientes ou deviam ter estado cientes, porm nada fizeram para evit-lo.

No caso de tortura (ainda que no seja requisito para documentar outras formas de maus tratos), o sofrimento foi imposto com um propsito especfico, por exemplo, com o fim de extrair informao, castigar ou intimidar a vtima.

3.4. Como ocorre a tortura?

3.4.1. Quem so os torturadores?

Conforme enfatiza a seo que descreve o que a tortura, necessrio que o comportamento em questo tenha sido praticado por um representante de uma autoridade investida no poder ou com sua aprovao. Isso significa que qualquer agente estatal pode estar potencialmente envolvido em torturas ou maus tratos. No entanto, considerando os motivos comuns da tortura, que podem ser a obteno de informao durante um interrogatrio ou, cada vez mais, com a finalidade de intimidar a populao em geral diante de uma insurreio ou um distrbio, no surpreendente que os principais agentes sejam os representantes envolvidos no processo de investigao criminal e as pessoas responsveis pela segurana do Estado.

Isso significa que entre as pessoas com maior probabilidade de estarem envolvidas em atos de tortura e outras formas de maus tratos incluem-se:

A polcia

A gendarmerie (nos pases onde essa instituio existe)

O exrcito

As foras paramilitares que atuam em conexo com as foras oficiais

Foras de contra-guerrilha controladas pelo Estado

Mas tambm:

Agentes penitencirios

Esquadres da morte (tortura aps o desaparecimento e antes do assassinato)

Qualquer representante do governo

Profissionais da sade: mdicos, psiquiatras ou enfermeiros podem participar da tortura tanto por ao (participao direta que pode incluir a certificao de que algum est apto para um interrogatrio) como por omisso (falsificando laudos mdicos ou deixando de prestar atendimento adequado)

Outros detentos que atuam com a aprovao ou sob ordens de agentes pblicos

Alm disso, a tortura muitas vezes se d no contexto de conflitos armados, principalmente em conflitos internos dos quais participam foras contrrias autoridade no poder e que controlam parte do territrio. Em tais circunstncias, a tortura e outras formas de maus tratos tambm podem ser impostas por:

Foras de oposio

A populao em geral

(Ver Parte I, Captulo 3.6 para uma anlise das denncias contra agentes no-estatais)

3.4.2. Quem so as vtimas?

Qualquer pessoa pode ser vtima de atos de tortura: homens ou mulheres, jovens ou velhos, religiosos ou ateus, intelectuais ou campesinos. Muitas vezes o fator determinante pode ser o fato de se pertencer a uma minoria ou grupo poltico, religioso ou tnico. No entanto, ningum deveria ser considerado imune.

Existe a tendncia entre as pessoas que apresentam denncias de tortura e outras formas de maus tratos de se concentrar na informao relativa a "presos polticos", pessoas envolvidas na poltica e que costumam se opor s autoridades que detm o poder. No entanto, os criminosos comuns, principalmente os acusados de crimes graves, tipicamente so vtimas de tortura, talvez com o objetivo de se obter informao ou uma confisso ou, simplesmente, para fins de extorso ou intimidao. Quando o objetivo espalhar o terror entre uma populao, todos correm perigo. muito importante no dar a impresso de que s os "presos polticos" esto em situao de risco, centrando-se a ateno neles e excluindo-se as outras vtimas que tambm podem estar muito expostas ao risco.

A identidade da vtima importante porque:

Determinados grupos, tais como crianas, mulheres, pessoas idosas ou religiosos, podem ser mais vulnerveis aos efeitos dos maus tratos, de modo que mais fcil considerar que o grau de sofrimento to grave que constitui ato de tortura.

Contribui para a identificao de padres de violao contra um determinado grupo de vtimas.

Podem ser utilizados mecanismos internacionais complementares especficos para determinados grupos, por exemplo, o Relator Especial da ONU sobre Violncia Contra as Mulheres.

Entre os exemplos em que a identidade da vtima pode ser importante incluem-se:

Crianas: Considera-se que as crianas so um grupo especialmente vulnervel. Em particular, cabe ressaltar que os efeitos de um certo tipo de maus tratos sobre uma criana podem ser diferentes dos efeitos que esses mesmos tratos teriam para um adulto. Tambm convm destacar que uma forma de maus tratos que pode ter seqelas traumticas para uma criana obrig-la a presenciar a tortura de um pai ou familiar prximo. De igual modo, ameaar ou forar os pais a presenciarem a tortura de seus filhos pode ter graves efeitos psicolgicos para os pais.

Tortura em razo do sexo: Estupro ou violao como mtodo de tortura no exclusivo contra as vtimas do sexo feminino, mas comumente usado contra as mulheres como meio de acentuar os sentimentos de fraqueza e subordinao na vtima ou na comunidade. Os casos de violao masculina no costumam ser denunciados por muitas razes, dentre as quais a falta de informao do entrevistador. Entre outros exemplos em que o sexo da vtima pode ser importante inclui-se o caso de mulheres gestantes, que so particularmente vulnerveis, e as mulheres em idade reprodutiva, que podem engravidar como efeito agravante do estupro.

Religiosos: H exemplos em que os maus tratos constituem tortura ou tratamento desumano por causa do carter religioso da vtima, por exemplo, pessoas devotas submetidas a escrnio religioso; por exemplo, arrancar a barba de um sacerdote ortodoxo.

Maus tratos dirigidos profisso de uma pessoa: Em um caso, considerou-se que houve tortura psicolgica quando se submeteu um pianista simulao de amputao de suas mos.

A Parte II, Captulo 4.1 apresenta uma relao mais completa dos tipos de caractersticas que devem ser registradas.

3.4.3. Onde mais provvel que ocorra a tortura?

A tortura pode ocorrer em qualquer lugar, principalmente em pases onde se vive um clima generalizado de violncia. Os lugares de alto risco so aqueles em que provvel que ocorram interrogatrios, tais como delegacias de polcia ou gendarmerie, e qualquer outro estabelecimento de deteno, sobretudo de deteno anterior ao julgamento.

Embora a maioria desses lugares sejam conhecidos dos que vivem na rea local e sejam estabelecimentos de deteno oficiais, tambm relativamente comum haver outros locais de deteno no reconhecidos. Esses locais podem incluir desde instalaes utilizadas regularmente para esses fins (por exemplo, uma fbrica abandonada ou prdios do governo) at instalaes utilizadas em determinados casos porque so convenientes para a ocasio (por exemplo, um prdio escolar usado como rea de deteno, ou mesmo um terreno aberto).

Lembre-se de que a tortura no se limita a um estabelecimento de deteno e que pode ocorrer na prpria casa da vtima ou durante o trajeto para um estabelecimento de deteno oficial.

3.4.4. Quando mais provvel que ocorra a tortura?

Em vez de centrar a ateno demasiadamente nos locais propriamente ditos, talvez seja mais til pensar em termos do estgio do processo de priso e deteno em que os detidos correm mais risco.

O maior risco de as sofrerem tortura e outras formas de maus tratos ocorre durante a primeira fase da priso ou deteno, antes de terem o a um advogado ou comparecerem perante o tribunal. O risco persiste enquanto durar a investigao, independentemente de onde o suspeito estiver sendo detido.

A deteno em condies de incomunicabilidade (isto , deteno no-reconhecida de algum ou deteno em que no se permite que a pessoa detida fale com algum, seja um advogado ou familiar) provavelmente o mais alto fator de risco de tortura porque no h um monitoramento externo do interrogatrio. s vezes, as foras de segurana s registram oficialmente o indivduo uma vez concludo o interrogatrio inicial.

A tortura costuma ser menos freqente nas prises normais para presos condenados, uma vez que a investigao j foi concluda, porm cabe sublinhar que muitos presdios mantm presas pessoas que esto pendentes de julgamento, bem como presos j sentenciados. No deve ser descartado o risco para os presos sob priso preventiva, principalmente nos casos em que as mesmas foras de segurana dirigem a priso ou quando se sabe que mantm com ela uma estreita relao. O risco para os presos sob priso preventiva pode no existir necessariamente dentro da prpria instituio, mas sim na possibilidade de que sejam transferidos de volta para a custdia das autoridades que conduzem a investigao.

Tanto na fase inicial de deteno quanto aps a transferncia para uma priso, convm lembrar que as prprias condies de deteno podem constituir um tratamento desumano ou degradante e, portanto, tambm devem ser documentadas (Ver Parte II, Captulo 4.1)

A tortura tambm pode ocorrer aps seqestros. Nos seqestros temporrios, a vtima libertada aps vrias horas ou vrios dias. No caso de um "desaparecimento", as provas indicam que a vtima est detida por autoridades ou com sua aquiescncia, porm as autoridades no o reconhecem. A vtima pode no ser encontrada ou ser encontrada morta. As duas formas de seqestro ou rapto podem envolver tortura e so utilizadas como meio para infundir medo ou intimidar a comunidade. Ainda que os casos de desaparecimento envolvam violaes que no a tortura (por exemplo, violao do direito vida, do direito liberdade e segurana da pessoa), qualquer indcio de que ocorreu um ato de tortura durante o desaparecimento deve ser documentado. O prprio desaparecimento poderia ser considerado como tortura, tanto da vtima como dos familiares da vtima.

3.5. Em quais contextos possvel receber ou obter denncias de tortura?

As denncias de tortura e outras formas de maus tratos podem ser recebidas em vrios contextos e lugares. Em geral, pouco provvel que sejam recebidas no lugar onde foram praticados os atos de tortura e muitas vezes so recebidas no local em que a vtima da tortura sente que pode falar com liberdade. Esse momento poderia ser aps a transferncia para um presdio, se a vtima foi torturada enquanto estava sob custdia policial; no tribunal, aps sua soltura e retorno comunidade, ou mesmo aps a sada do pas.

Entre os contextos gerais em que possvel receber ou obter denncias incluem-se:

Situaes de agitao poltica ou violncia generalizada

Zonas de conflito

Entre os contextos especficos em que se pode receber ou obter denncias de tortura incluem-se:

Visitas a instituies prisionais

Contextos mdicos

Campos e centros de refugiados e pessoas deslocadas

Pedidos de asilo

A maioria desses contextos evidente. No entanto, s vezes tambm possvel encontrar informao em lugares incomuns, que no nos ocorreriam de imediato, e convm pesquisar os recursos disponveis. particularmente o caso de informaes que podem corroborar ou fornecer provas de uma denncia feita oralmente durante uma entrevista ou em outra situao. Entre os possveis lugares em que se pode buscar informaes ou pessoas com quem falar incluem-se:

Arquivos de tribunais

Arquivos da promotoria

Laudos mdicos

Registros de entrada e soltura em delegacias de polcia e presdios (incoerncias e lacunas nesses registros costumam ser so um sinal de irregularidade)

Registros de comparecimento a um local de trabalho ou estabelecimento educacional (isso pode ajudar a confirmar uma reclamao de que um indivduo no pde comparecer ao local por um determinado perodo devido a leses causadas pela tortura)

Jornais ou noticirios locais

Grupos de assistncia comunitria, tais como grupos de jovens

Pessoal religioso

Outros detentos

Os contextos tpicos em que possvel receber denncias de tortura no exigem muita explicao. No entanto, h alguns contextos em que seria til estar ciente de certos fatores especficos:

Zonas de conflito: Deve-se ter presente que as violaes nessas reas provavelmente so perpetradas pelas duas partes do conflito, sejam elas governamentais ou no, e importante manter registros precisos dos torturadores acusados em cada caso, ou das caractersticas que possam ajudar a identific-los. Lembre-se tambm que o fator medo e intimidao pode ser muito grande, uma vez que os civis muitas vezes so perseguidos pelas duas partes para dissuadir-lhes de oferecer seu apoio e ajuda parte oposta. Ver Parte I, Captulo 3.6 para possveis aes diante de denncias de tortura por parte de agentes no-governamentais.

Visitas a instituies prisionais:

Naturalmente, os detentos se mostram menos dispostos a fazer denncias de maus tratos enquanto continuam sob a custdia das foras que realizam a investigao (deteno anterior ao julgamento) e, em tais circunstncias, deve-se ter especial conscincia da segurana da pessoa. Como regra geral, os detentos se mostram mais dispostos a comentar suas experincias nas mos das autoridades que realizam a investigao quando j foram condenados e esto reclusos em uma priso normal.

A distino entre as duas categorias de centros de deteno e seu respectivo sentido de segurana pode ser um tanto vaga por dois fatores: em alguns pases, tanto os presos pendentes de julgamento como os j condenados podem estar detidos na mesma instituio; em outros, o pessoal de um ou de ambos tipos de instituio pode fazer parte da mesma autoridade encarregada da investigao, como a polcia. Nesses casos, deve-se estar ciente de que a transferncia para outro centro de deteno no implica necessariamente uma transferncia fora do alcance das autoridades investigadoras.

O o a instituies prisionais difcil, mas certas ONGs podem ter um o privilegiado mediante um acordo com as autoridades, normalmente a presos condenados, para prestar assistncia mdica, fornecer alimentos ou como parte de um regime de visitas carcerrias. No entanto, nesses casos preciso ter presente que a confidencialidade pode ser uma condio de o (Ver, em particular, as atividades do Comit Internacional da Cruz Vermelha, Parte III, Captulo 7.2). Outras pessoas que podem ter o a presdios e penitencirias so os advogados e os profissionais da sade.

Nessas circunstncias, trs grandes categorias de denncias podem ser recebidas.

Em primeiro lugar, particularmente no caso dos recm-chegados, possvel receber denncias sobre o tratamento recebido antes da chegada instituio, quando estavam nas mos das autoridades que conduzem a investigao.

Em segundo lugar, possvel receber denncias sobre incidentes ocorridos dentro da instituio, por exemplo, maus tratos a uma pessoa por parte de um agente de segurana carcerria ou de outros presos com a aprovao ou por incitao dos agentes de segurana, um acontecimento especfico tal como um motim em que determinados indivduos foram atacados por agentes de segurana carcerria, um caso particularmente grave de isolamento em cela solitria ou o caso de um indivduo a quem se tenha negado tratamento mdico adequado para um problema de sade grave.

Por ltimo, possvel obter informao sobre as condies gerais da instituio, tais como o espao habitvel, higiene - um aspecto particularmente angustioso dos sistema penitencirio -, mtodos inaceitveis de punio, tal como o uso de correntes ou grilhes, ou isolamento prolongado. Quando possvel, a entrevista individual de presos, mais do que em grupos, permite corroborar melhor as denncias sobre a instituio. Vale a pena ter presente que os presos que j estiverem na instituio por muito tempo estaro mais familiarizados com as condies gerais do que os recm-chegados.

Uma conversa com o mdico da instituio pode gerar muita informao, principalmente se ele estiver disposto a mostrar-lhe os arquivos mdicos dos presos. Naturalmente, o o aos arquivos mdicos deve ser consistente com a necessidade de se proteger a identidade das pessoas quando se faz necessria a confidencialidade (Ver comentrio sobre confidencialidade na Parte I, Captulo 2). Nos casos em que os exames mdicos so realizados aps a chegada priso, particularmente til solicitar vistas do laudo mdico desse primeiro exame, uma vez que ele pode fornecer provas de leses sofridas enquanto o detento se encontrava sob a custdia da polcia ou demonstrar que a pessoa gozava de boa sade quando chegou e que pode ter sofrido leses ou ter ficado doente posteriormente. Os mdicos podero se mostrar mais dispostos a mostrar-lhe provas de fatos que ocorreram fora de sua instituio, uma vez que menos provvel que isso tenha implicaes para eles.

IMPORTANTE: Deve-se estar ciente de que o modo como voc pretende usar essa informao mdica pode trazer conseqncias para o mdico. Se possvel, deve-se comentar esse assunto com o mdico ou outro profissional de sade e obter seu consentimento em caso de necessidade de uso do nome de algum da equipe ou o nome da vtima (Ver nota sobre consentimento informado na Parte I, Captulo 2).

Contextos mdicos:

Nos pases em que a tortura ocorre com certa freqncia os mdicos so, s vezes, as primeiras testemunhas quando so chamados para tratar as leses ou o trauma psicolgico causados pelos maus tratos. Em alguns pases existe uma rea da medicina, conhecida como medicina forense, na qual os mdicos tm um conhecimento especializado dos tipos e das provveis causas de leses ou enfermidades. Por razes jurdicas, a polcia ou os tribunais costumam solicitar que o mdico forense examine as vtimas da violncia e mantenha relatrios circunstanciados. Ainda que os mdicos possam ter muito medo de denunciar, eles mesmos, os casos de tortura, solicitar um laudo mdico do mdico forense, do mdico de famlia, do hospital ou do mdico da priso, se possvel, pode contribuir com informao de grande valia. Tambm devem ser analisadas as questes de consentimento e confidencialidade (Ver Parte I, Captulo 2).

A tica profissional exige que os mdicos produzam relatrios precisos, porm, em alguns casos, pode ocorrer haver uma forte presso para que omitam algumas concluses ou at mesmo falsifiquem relatrios. Uma das dificuldades dos relatrios mdicos pode ser o fato de que as leses, muitas vezes, so descritas sem serem relacionadas com uma provvel causa. Nesse caso, possvel solicitar a um especialista independente que interprete as concluses para ver se so coerentes com as denncias de tortura.

Campos e centros de refugiados e pessoas deslocadas:

Os campos e centros para pessoas deslocadas fora, dentro ou fora de seu pas, sobretudo em zonas de conflito, inevitavelmente abrigam muitas pessoas profundamente traumatizadas que sofreram e presenciaram atos de tortura e que talvez desejem fazer denncias. Quando se busca informao relativa a um incidente especfico ou a uma srie de acontecimentos, esses campos costumam abrigar pessoas originrias de uma mesma regio ou povoado que podem corroborar as informaes. No entanto, preciso proceder com certo cuidado; em primeiro lugar, porque pode haver a possibilidade de se obter um relato tendencioso dos eventos se a populao do campo for majoritariamente composta de um grupo, e, em segundo lugar, porque os torturadores tambm podem se esconder no campo e fornecer informao enganosa. Quando a informao obtida dos refugiados parecer indicar que a tortura generalizada uma das causas do fluxo de refugiados, deve-se pensar em transmitir a informao ao Alto Comissariado das Naes Unidas para Refugiados (Ver Parte III, Captulo 7.2).

Pedidos de asilo: As denncias de tortura de um indivduo em seu pas natal podem formar a base de uma petio de asilo em outro pas. Ainda que o tempo decorrido desde os maus tratos denunciados possa dificultar a coleta de provas, ser necessrio seguir os princpios bsicos expostos neste manual (Ver Parte II, Captulo 5). Tambm convm levar em conta que, s vezes, h pessoas que afirmam falsamente haver sido torturadas com o nico objetivo de evitar a deportao.

3.6. possvel denunciar agentes no-governamentais?

Muitas violaes dos direitos humanos, tais como a tortura, ocorrem em contextos de agitao poltica, tenses e conflitos. Nessas circunstncias, comum que os torturadores no somente sejam representantes do Estado mas tambm pessoas que no tm relao com o Estado (geralmente denominados agentes no-governamentais ou no-estatais). Trata-se de um problema muito difcil e muito real de muitos pontos de vista, mas, para os objetivos deste manual, a questo : possvel tomar medidas em resposta a denncias de tortura por parte de agentes no-governamentais?

3.6.1. possvel tomar medidas com base na legislao de direitos humanos?

O leitor j ter visto neste captulo que a definio bsica de tortura da Conveno da ONU contra a Tortura faz referncia a aes de "um representante pblico ou outra pessoa que atua em uma capacidade oficial". Isso significaria que a legislao de direitos humanos considera que os atos de crueldade particulares so aceitveis? No; a definio se limita a pessoas que atuam em capacidade oficial porque os Estados devem se ocupar das aes das prprias pessoas particulares por meio de sua legislao nacional.

No entanto, a legislao de direitos humanos prev a possibilidade de os Estados no se omitirem. Consequentemente, um Estado pode ser considerado responsvel no s por seus atos (a prtica deliberada de atos de tortura), mas tambm por suas omisses (no tomar medidas efetivas para prevenir a tortura, no processar judicialmente contra os autores de atos de tortura/ no investigar denncias).

Quais conseqncias isso tem para a possibilidade de se recorrer a medidas judiciais em resposta a denncias de tortura por parte de agentes no-governamentais? Vejamos:

Os organismos internacionais responsveis pela implementao da legislao internacional de direitos humanos no podem, em princpio, analisar a possvel responsabilidade de um agente no-governamental por um ato de tortura. Isso se aplica particularmente aos organismos de tratados que somente podem avaliar a responsabilidade dos Estados Parte das convenes por eles criadas.

Podem analisar a possvel responsabilidade do Estado em que ocorreu o ato porque no tomou medidas efetivas para prevenir o ato de tortura.

Tambm podem analisar a possvel responsabilidade de um Estado que queira expulsar uma pessoa para um pas onde ela correr o risco de sofrer torturas, inclusive nas mos de agentes no-governamentais.

3.6.2. possvel aplicar outro tipo de legislao que probe a tortura a agentes no-governamentais?

3.6.2.1. Direito internacional de conflito armado

O direito internacional de conflito armado (DICA) um tipo de direito que se aplica unicamente em situaes de conflito armado, tanto internacional (conflito envolvendo dois ou mais Estados) e no-internacional (o conflito ocorre dentro do territrio de um Estado e pode envolver as foras governamentais e uma ou mais foras de oposio, ou somente foras no-governamentais divididas em faces que se opem).

O DICA probe a tortura, o tratamento cruel, desumano ou degradante de qualquer pessoa em poder da outra parte de um conflito, ainda que, no caso de conflito armado no-internacional, essa parte no seja governamental (Artigo Comum 3 das Convenes de Genebra de 1949).

Isso parece promissor, ou seja, existe uma obrigao jurdica que obriga agentes no-governamentais a no praticarem atos de tortura. Infelizmente, a implementao dessa obrigao esbarra em dificuldades porque o DICA depende do direito penal nacional para sua implementao, o que significa que o governo deve capturar os perpetradores de torturas e julg-los, ou as foras no-governamentais precisam fazer com que seu prprio sistema jurdico incorpore essas obrigaes.

Certas violaes particularmente graves do DICA so consideradas to graves que um Estado tambm pode julgar um torturador em seus tribunais nacionais (jurisdio universal), mas somente se sua legislao nacional assim o permitir. At o momento, poucos Estados tm se mostrado dispostos a faz-lo, mas isso pode mudar no futuro. Nos ltimos anos, viu-se, em duas ocasies, que possvel constituir tribunais internacionais para examinar possveis violaes do DICA, quais sejam, nos casos da ex-Iugoslvia e de Ruanda. No entanto, esses tribunais somente podem examinar os problemas decorrentes desses conflitos em particular. Um novo o, inclusive mais recente, foi a criao de um Tribunal Penal Internacional (TPI) permanente, que poder examinar, entre outras coisas, questes relacionadas a violaes do DICA. No entanto, o TPI ainda no comeou a funcionar e ainda no est clara qual ser a funo que as ONGs tero nesse processo, se tiverem alguma.

3.6.2.2. Crimes contra a humanidade

Os crimes contra a humanidade so violaes particularmente graves dos direitos humanos cometidos em grande escala. Como regra geral, considera-se que compreendem torturas e outros atos desumanos quando cometidos como parte de um ataque sistemtico ou generalizado dirigido contra uma populao civil, com conhecimento do ataque. Os crimes no precisam ser cometidos no contexto de um conflito armado e a poltica de execuo do ataque pode ser empreendida por um grupo no-governamental. Desse modo, possvel responsabilizar agentes no-governamentais por atos de tortura cometidos no contexto de uma poltica mais ampla.

Da mesma forma que no mbito do DICA, existem dificuldades na implementao das disposies relativas aos crimes contra a humanidade. O TPI poder examinar denncias desses crimes quando comear a funcionar, mas difcil prever como isso funcionar. Essa categoria de crimes considerada to grave que os Estados tambm podem exercer jurisdio universal sobre eles, porm somente nos casos em que sua legislao nacional o permitir, da mesma forma que com violaes graves do DICA. Outra conseqncia da gravidade desses crimes que no existe um prazo para instaurao de processo judicial contra os autores envolvidos (em alguns crimes, os julgamentos devem ser iniciados antes de um determinado perodo de tempo, por exemplo, at 10 anos aps o incidente, mas tais limites prescricionais no se aplicam a crimes contra a humanidade).

3.6.2.3. Legislao nacional

A exemplo dos representantes pblicos, os agentes no-governamentais causadores de tortura e outras formas de maus tratos podem ser processados em conformidade com a legislao nacional do pas onde foram praticados os atos de tortura ou os maus tratos. A legislao especfica com base na qual possvel ajuizar ao contra os torturadores pode variar de um pas para outro e pode incluir legislao de implementao do DICA ou de disposies sobre crimes contra a humanidade, conforme mencionado acima. O mais comum que se adote a forma, por exemplo, de uma ao judicial por leso corporal grave ou estupro.

3.6.3. Concluso: Como se pode usar informao em denncias de tortura por parte de agentes no-governamentais?

Isso depender daquilo que se espera conseguir com a informao. As aes possveis so muito mais limitadas do que quando a denncia implica uma ao oficial, e deve-se levar em conta que baixa a probabilidade de se obterem resultados concretos. No entanto, se a informao for apresentada corretamente, aumentam as possibilidades de se conseguir algo.

Se voc busca um recurso particular:

Voc deve comear buscando um recurso nos termos previstos na legislao nacional do Estado em que ocorreu a tortura (como se ver na Parte III, este geralmente o primeiro o na busca de um recurso particular). Lembre-se de verificar se existe uma legislao de implementao vlida que permita a instaurao de processo com base no DICA ou por crimes contra a humanidade.

Se voc no obtiver xito por essa via, poder recorrer a um organismo internacional. Segundo a legislao de direitos humanos, os agentes no-governamentais no podem ser considerados responsveis diretos, razo pela qual deve-se proceder contra o Estado, como seria o caso em uma denncia formal, mas ser necessrio fundamentar sua denncia no argumento de que o Estado no cumpriu suas obrigaes por omisso: que no tomou qualquer medida para evitar a tortura nem para investigar a denncia adequadamente, nem para processar o torturador.

Tambm possvel recorrer a um organismo internacional para evitar a expulso de uma pessoa para um pas onde se acredita que ela correr o risco de sofrer torturas, ainda que esse risco se deva a agentes no-governamentais. Essa possibilidade s se confirmou muito recentemente e tem sido aplicada tanto pelo Comit contra a Tortura como pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos no caso das expulses propostas para a Somlia. possvel que esse caso se converta em um caso especial, dada a absoluta ausncia de autoridade governamental central naquele pas, de modo que se poderia considerar que os agentes no-governamentais desempenham ali as funes de um Governo e, portanto, "atuam em uma capacidade oficial". De qualquer forma, esses so precedentes encorajadores que indicam que o fator importante o risco propriamente dito, no a origem do risco.

Se voc busca um recurso de natureza mais geral:

Da mesma forma que os organismos que examinam casos particulares, os organismos internacionais que examinam a situao geral de direitos humanos de um Estado no esto em uma posio que lhes permita recorrer a medidas judiciais com relao s violaes por parte de agentes no-governamentais, mas muito importante que estejam informados da funo dos agentes no-governamentais nesse panorama geral. Isso lhes ajuda a compreender o contexto e a saber exatamente por que o governo deveria ser responsabilizado. Muitas vezes, os governos procuram demonstrar que todas as violaes ocorridas so perpetradas pelas foras da oposio; se for possvel fornecer informao precisa sobre o que fazem e o que no fazem essas foras, o organismo internacional estar melhor preparado para responder a esses argumentos.

Em ltima anlise, pode ser que a ao mais eficaz seja garantir que os atos praticados pelos agentes no-governamentais sejam de conhecimento pblico, quer seja enviando a informao aos organismos internacionais para o fim de se estabelecerem as circunstncias contextuais, quer seja mediante lobby ativo (Ver Parte III, Captulo 7 para sugestes sobre lobby). Quando a legislao internacional de direitos humanos no puder proporcionar boa parte da assistncia nos casos que envolvam agentes no-governamentais, a presso pblica poder desempenhar esse papel.

RESUMO

PARTE I QUESTES PRELIMINARES

O que se pode esperar conseguir com a apresentao de denncias de tortura?

Atrair a ateno para uma situao/ estabelecer um padro

Buscar mudanas positivas na situao geral

Combater a impunidade

Buscar um recurso para as vtimas:

Constatao de uma violao

Responsabilizao dos torturadores

Reparao

Impedimento da deportao de uma pessoa para um pas onde se acredita que ela corre risco de tortura

O que a tortura?

A tortura pode ser difcil de se definir, mas no necessrio defini-la para se apresentar uma denncia. No mnimo, deve-se poder demonstrar que:

Dor ou sofrimento mental ou fsico grave foi imposto deliberadamente (tortura) ou ocorreu uma exposio intencional a dor ou sofrimento mental ou fsico considervel (maus tratos que no tortura).

As prprias autoridades estatais impam esse sofrimento ou dele estavam cientes ou deveriam ter estado cientes, porm nada fizeram para evit-lo.

No caso de torturas (ainda que no seja um requisito para outras formas de maus tratos), o sofrimento foi infligido com um propsito especfico, por exemplo, para extrair informao, castigar ou intimidar a vtima.

Como ocorre a tortura?

Quem so os torturadores?

Qualquer pessoa que atua em uma capacidade oficial: Esta categoria pode incluir a polcia, gendarmes, foras de segurana, agentes carcerrios, militares, representantes do governo ou funcionrios pblicos, superiores na hierarquia poltica, "esquadres da morte", pessoal mdico.

Membros de grupos armados da oposio

Quem so as vtimas?

Qualquer pessoa

Onde mais provvel que ocorra a tortura?

Em qualquer lugar (por exemplo, durante a transferncia de uma vtima ou em seu prprio domiclio), mas, sobretudo, no lugar onde provvel que ocorra um interrogatrio .

Quando mais provvel que ocorra a tortura?

Nos primeiros estgios da deteno, principalmente se o detento estiver sendo mantido em condies de incomunicabilidade (sem o a um advogado ou famlia). O risco persiste enquanto durar a investigao.

Em quais contextos possvel receber ou obter denncias de tortura?

Contextos gerais: Podem incluir situaes de agitao poltica ou violncia generalizada, ou ainda zonas de conflito.

Contextos especficos: Podem incluir visitas a instituies prisionais, contextos mdicos, campos e centros para refugiados e pessoas deslocadas, ou solicitaes de asilo.

No se esquea de procurar tambm lugares menos comuns. Consulte o texto principal para sugestes.

possvel denunciar agentes no-governamentais?

A responsabilidade dos agentes no-governamentais limitada pelo direito internacional, porm:

No caso de se buscar um recurso particular, possvel:

Buscar um recurso com base na legislao nacional: Pode incluir a instaurao de processo nos termos do Direito Internacional de Conflito Armado ou nas disposies sobre crimes contra a humanidade, se existir uma legislao nacional que o permita.

Recorrer a um organismo internacional de direitos humanos: Uma vez que os agentes no-governamentais no podem ser considerados diretamente responsveis nos termos da legislao de direitos humanos, deve-se denunciar o Estado em que ocorreu o incidente, com base no argumento de que tal Estado no cumpriu suas obrigaes para evitar a tortura, investigar a denncia adequadamente ou processar os torturadores.

No caso de se buscar um recurso de natureza mais geral, possvel:

Manter os organismos internacionais de direitos humanos informados sobre as atividades dos agentes no-governamentais

Exercer lobby

PARTE II DOCUMENTAO DAS DENNCIAS

1. Introduo

2. Princpios Bsicos da Documentao

2.1. Por que so importantes esses princpios?

2.2. Em que consiste uma informao de boa qualidade?

2.3. O que se pode fazer para maximizar a preciso e a confiabilidade da informao?

3. Entrevista com a Pessoa que Denuncia a Tortura

3.1. Introduo

3.2. Consideraes gerais

3.3. Como realizar a entrevista

4. Informaes que Devem Ser Registradas

4.1. Informao modelo

4.2. Contextos especficos

5. Provas

5.1. Provas mdicas

5.2. Declarao da pessoa que faz a denncia

5.3. Provas testemunhais

5.4. Outros tipos de provas

1. INTRODUo

O objetivo deste captulo fornecer orientaes sobre a forma como documentar uma denncia de tortura. Este manual trata, especialmente, da documentao e denncia de torturas, mas desaparecimentos, execues extrajudiciais e outras violaes dos direitos humanos tambm podem ser documentados com informaes muito parecidas, reunidas segundo essas mesmas orientaes.

A denncia particular constitui a base de toda a apresentao. Mesmo que o objetivo final seja elaborar um relatrio que analise a situao geral de um pas, o primeiro o dever ser a compilao de denncias particulares, visto ser esta a melhor maneira de identificar situaes e estabelecer tendncias gerais. As acusaes particulares no precisam ser, necessariamente, apresentadas pela vtima; nos casos em que a vtima desapareceu, foi assassinada ou est em priso incomunicvel, a denncia pode ser apresentada por testemunhas ou familiares que viram por ltima vez a pessoa e constataram leses ou um comportamento alterado que indica a prtica de maus tratos.

A fim de identificar as diretrizes para documentar denncias de torturas e outras formas de maus tratos, este captulo examinar as seguintes questes:

Existem alguns princpios bsicos que devem ser levados em conta quando so documentadas denncias de violao dos direitos humanos. O principal para a apresentao dessas denncias contar com uma informao precisa, confivel e de boa qualidade. O que significa isso exatamente? Pode variar em funo dos mecanismos ou procedimentos aos quais se deseja submeter a informao? Quais as medidas a serem tomadas para garantir que a informao possui as caractersticas devidas? [Parte II, Captulo 2]

Em muitos casos, ser preciso entrevistar a pessoa que faz a denncia. Essa pessoa pode ser a vtima, um familiar da vtima, uma testemunha do incidente de tortura ou outra pessoa que quer denunciar o incidente. Existe alguma considerao especial que deva ser levada em conta durante a realizao da entrevista? [Parte II, Captulo 3]

Que tipo de detalhe preciso registrar durante uma entrevista? Deve-se obter uma quantidade mnima de informaes sempre que possvel? Que tipo de pergunta deve-se formular? Como possvel ter certeza de que se obteve a informao necessria? [Parte II, Captulo 4]

Por que to importante a documentao comprobatria? Que tipo de provas deve-se procurar e onde encontr-las? [Parte II, Captulo 5]

2. PRINCPIOS BSICOS DA DOCUMENTAo

O principal objetivo da documentao de uma denncia de violao dos direitos humanos criar um registro exato, confivel e preciso dos fatos. Esses registros podem ser usados de inmeras maneiras, mas todas elas dependem da qualidade do registro estabelecido. Assim sendo, ao documentar uma denncia, ser preciso:

Buscar obter uma informao de boa qualidade

Tomar as medidas necessrias para maximizar a exatido e a confiabilidade da informao

2.1. Por que so importantes esses princpios?

A no ser que a apresentao de uma denncia seja baseada na prpria experincia do entrevistador, pode ser difcil ter sempre a certeza da qualidade, exatido e confiabilidade da informao reunida. As violaes dos direitos humanos costumam acontecer em circunstncias onde prevalecem emoes e lealdades muito fortes, que podem influir nos relatrios e nas acusaes recebidas. importante fazer o possvel para manter a objetividade no momento de avaliar a natureza da informao; qualquer que seja a opinio que se tenha da situao geral, ou por mais certo que se esteja quanto ao contedo da acusao, preciso levar em considerao, objetivamente, se a informao suficientemente precisa, confivel e de boa qualidade para iniciar uma ao perante uma autoridade nacional ou um organismo internacional. Como ser mostrado a seguir, o nvel de qualidade, exatido e confiabilidade necessrio pode variar em funo da forma de agir selecionada, mas preciso tentar obter a melhor qualidade possvel em cada situao. O rigor uma deciso que compete ao entrevistador ou sua organizao determinar, mas necessrio lembrar que a informao a ser encaminhada um reflexo da credibilidade do entrevistador: isso afetar sua reputao nos organismos internacionais e a seriedade com a qual sero consideradas suas denncias.

2.2. Em que consiste informao de boa qualidade?

A qualidade da informao necessria a uma determinada denncia depende do objetivo para o qual ela ser utilizada. Por exemplo, os procedimentos judiciais, quer nacionais ou internacionais, costumam exigir uma prova de alta qualidade. Por sua vez, os procedimentos de denncia requerem pouca ou nenhuma documentao comprobatria e menos detalhes. Deve-se tentar compilar a melhor informao possvel, segundo as circunstncias; isso no significa, entretanto, que se deva obter sempre a melhor qualidade antes submeter a informao; deve-se, porm, fazer todo o possvel para estruturar uma denncia slida reunindo toda a informao disponvel.

Os fatores que contribuem para a qualidade da informao incluem:

A fonte da informao: Onde foi obtida a informao? Diretamente da vtima, da famlia da vtima, de seus amigos, de uma testemunha presente no local dos acontecimentos, de algum que a ouviu de outra pessoa, de uma reportagem dos meios de comunicao? Quanto mais a informao se afastar da vtima ou do incidente, tanto menos confivel ela ser.

O nvel de detalhe: A acusao muito detalhada? Existem lacunas inexplicveis no relato? Conhecem-se apenas os dados bsicos? Quanto mais detalhes forem obtidos, melhor, porque isso ajudar os demais a entenderem o que aconteceu.

A ausncia ou presena de contradies: A explicao coerente do princpio ao fim? A explicao contm contradies ou elementos sem sentido? A boa informao deve ser coerente, ou pelo menos apresentar um motivo para todas as incoerncias; por exemplo, se uma vtima ou testemunha fez duas declaraes contraditrias, isso pode ser conseqncia de uma intimidao. Incoerncias menores so comuns e no costumam alterar a qualidade geral da informao, mas incoerncias maiores devem estimular o entrevistador a verificar novamente a informao.

A ausncia ou presena de elementos que corroborem ou refutem a denncia: Existem declaraes de testemunhas que confirmem a explicao da vtima? Existe um laudo mdico ou uma autpsia que confirme as leses da vtima? Quanto maior o volume de documentao obtido que sustente a denncia, mais digna de crdito ela ser.

A capacidade da informao de demonstrar um padro: A denncia uma dentre muitas que denunciam casos parecidos? do mesmo tipo que outras j recebidas em uma determinada rea? Quando existem provas de uma prtica habitual, pode-se partir da suposio de que a informao real.

A poca da informao: A informao muito recente? Est relacionada a fatos ocorridos h vrios anos? Quanto mais recente for a informao, mais fcil ser investigar ou comprovar os fatos denunciados.

Primeira mo + detalhada + consistente internamente + corroborada por vrios ngulos + demonstra um padro + recente = tima qualidade

Deve-se ter em mente que isto uma indicao do que seria a tima qualidade. Com freqncia, no possvel obter informao dessa qualidade; mas isso no quer dizer que ela no possa ser utilizada. Antes pelo contrrio, a qualidade ser um fator quando chegar o momento de selecionar o procedimento ou procedimentos para os quais se deseja enviar a informao. Este captulo ressalta a importncia de se documentar a denncia de modo que, em princpio, ela possa ser submetida a praticamente todos os procedimentos disponveis. Todos os requisitos mnimos ou as restries especficas de um procedimento particular so comentados na Parte III.

2.3. O que pode se pode fazer para maximizar a exatido e a confiabilidade da informao?

A verificao da preciso e confiabilidade da informao pode ser uma tarefa difcil e delicada, e verdade que, em grande medida, o entrevistador depende da boa f daqueles que fornecem a informao, do mesmo modo que os organismos internacionais dependem da dele. Contudo, possvel tomar certas precaues gerais para aumentar a probabilidade de que a informao seja precisa e confivel, buscando a corroborao de casos concretos, tanto no momento de uma entrevista quanto posteriormente, e usando o bom senso.

Precaues gerais a serem tomadas para aumentar a confiabilidade incluem:

conhecer as fontes e estar familiarizado com o contexto no qual so feitas as denncias

manter contato com as fontes: talvez seja preciso obter ou verificar pormenores em uma etapa posterior

solicitar os nomes e os dados de contato das vtimas, embora o entrevistador deva mant-los confidenciais

ser mais prudente e minucioso com a informao imprecisa ou geral

evitar basear as denncias somente em reportagens dos meios de comunicao ou em boatos, sem buscar corroborao

No momento das entrevistas, possvel aumentar a preciso e a confiabilidade mediante:

a formulao de perguntas precisas

o enfoque cronolgico da explicao para que seja mais fcil eliminar e corrigir as incoerncias

a reviso das incoerncias aparentes a partir de diferentes ngulos, reformulando as perguntas, se for o caso: o entrevistado pode estar confuso ou no compreender a pergunta

a formulao de perguntas sobre a existncia de testemunhas do incidente denunciado ou de documentao que sustente a denncia, tal como um relatrio mdico ou uma cpia de uma petio apresentada em decorrncia do incidente: deve-se explicar que a documentao que respalda a acusao pode ajudar a formular uma denncia mais slida e aumentar as oportunidades existentes para buscar uma reparao.

a observao da linguagem corporal e do comportamento do entrevistado, perguntando-se a si mesmo se essa pessoa parece confivel. Nesse contexto, preciso ter presente a influncia da cultura, o sexo e o estado mental.

Sempre que possvel, quando um entrevistado indicar a existncia de documentao comprobatria potencial, deve-se tentar obt-la.

Por ltimo, necessrio atuar com bom senso: quando houver dvidas quanto exatido ou veracidade de uma denncia, deve-se dedicar mais tempo corroborao dos fatos do que quando se estiver convencido de sua sinceridade. Se o entrevistador tem reservas quanto denncia, provvel que outros tambm as tenham, porque s podem v-la atravs da perspectiva dele. Se no se consegue dissipar as dvidas, pode-se estar perdendo mais tempo e recursos preparando a acusao do que se perderia dirimindo-as ou confirmando-as.

Deve-se ter presente que quando houver um motivo real para crer que uma pessoa est em perigo e preciso tomar medidas urgentes, talvez seja necessrio atuar com rapidez, embora algumas dvidas ainda persistam quanto confiabilidade; bvio que em tais circunstncias, a prioridade deve ser a segurana da pessoa.

3. ENTREVISTA COm A PESSOA QUE DENUNCIA TORTURAS

3.1. Introduo

Em muitos aspectos, o modo registrar a denncia de torturas o o mais importante de todo o processo de denncia, porque determinar o que se pode fazer com a informao nas etapas posteriores. Entretanto, tambm pode ser o mais difcil de aprender ou de explicar de uma forma a ser aplicada universalmente. A formao de pessoal nas tcnicas de entrevista deve ser parte integrante da preparao de qualquer ONG, antes de ar a documentar denncias, e vai alm do contedo deste manual. As orientaes e sugestes a seguir foram elaboradas para serem utilizadas como um aide memoire, e no pretendem substituir a devida formao do pessoal.

Lembre-se de que quem apresenta uma denncia de tortura pode ser:

a vtima

os familiares da vtima

as testemunhas, como o mdico que reconheceu a pessoa, ou pessoas que viram a deteno da vtima ou estavam presentes durante o incidente de tortura.

Em qualquer dos casos, a informao pode ser obtida por meio de uma entrevista com a pessoa que faz a denncia. A entrevista pode fazer com que se tenha que procurar novas testemunhas, tal como outros presos, ou um mdico que tenha reconhecido a pessoa (Ver Parte II, Captulo 5.3)

3.2. Consideraes gerais

Ao realizar uma entrevista, deve-se ter em mente as seguintes consideraes gerais:

Deve-se ponderar dois requisitos importantes, que deveriam ser complementares, mas que s vezes se chocam: a necessidade de obter um relato til e a importncia de respeitar as necessidades da pessoa entrevistada.

Por um lado, o princpio orientador deve ser tentar obter a explicao mais lgica, precisa e detalhada possvel do incidente, de modo a permitir que o entrevistador ou a pessoa que analisar a denncia compreenda o que aconteceu, e tornar possvel a comprovao ou investigao da informao.

Por outro lado, pode acontecer de um entrevistador, decidido a reconstruir uma seqncia de fatos, esquecer que a prpria entrevista pode ser algo desagradvel para a pessoa que sofreu uma experincia traumtica e a quem se solicita, agora, que conte os detalhes. Os entrevistadores devem mostrar delicadeza em suas perguntas e estar atentos a demonstraes de cansao ou angstia. Tambm devem estar conscientes dos tabus culturais, especialmente do abuso sexual. No apenas a entrevista pode ser desagradvel para a pessoa entrevistada, como tambm a explicao pode ser menos confivel se a pessoa estiver cansada ou transtornada.

preciso, igualmente, lograr um equilbrio entre a necessidade de obter o maior nmero de pormenores possvel e a importncia de no direcionar em excesso a explicao ou influir na mesma. As anotaes devem espelhar os fatos ocorridos, e no os que se acha que ocorreram.

Cada pessoa entrevistada quer seja a vtima, um familiar ou uma testemunha uma pessoa com uma histria particular. Embora conhea pormenorizadamente os padres de violaes que predominam em sua rea ou esteja muito seguro do que aconteceu com uma vtima determinada, o entrevistador no deve partir do princpio de que cada pessoa ter a mesma histria para contar. Deve-se tratar cada entrevista como um registro nico.

Os integrantes da equipe de documentao podem achar que a entrevista das vtimas de torturas lhes causa muita tenso. Devem estar preparados para analisar suas respostas e tratar seus sentimentos entre eles mesmos e, se necessrio, buscar ajuda profissional.

3.3. Como realizar a entrevista

3.3.1. Antes de comear

No se deve esquecer de revisar minuciosamente os comentrios da Parte I, Captulo 2.3, relativos ao consentimento informado, a tica profissional e a segurana. So vitais para a entrevista e existem certos aspectos que devero ser explicados detidamente ao entrevistado.

3.3.2. Como se deve comear a entrevista?

No incio, o entrevistador deve se apresentar, bem como sua organizao e seus objetivos, e explicar os possveis usos da informao reunida. Caso cite uma determinada pessoa pelo nome, deve informar como conseguiu esse nome. necessrio assegurar-se de que o entrevistado no coloca objees ao uso de gravadores ou de intrpretes, nem a anotaes. Deve-se falar sobre o consentimento informado e insistir no carter confidencial da prpria entrevista, cuja utilizao est sujeita ao consentimento da pessoa. importante no criar expectativas que no obedeam realidade do entrevistado; necessrio assegurar-se de que ele compreende que todo processo de denncia pode demorar e vir a produzir poucos resultados.

3.3.3. Deve-se tomar notas da entrevista ?

Tomar notas pormenorizadas da entrevista importante para garantir preciso, mas deve-se explicar pessoa de que modo sero utilizadas essas anotaes e quem ter o informao ali constante. Em alguns casos, pode ser mais adequado escutar apenas (por exemplo em uma delegacia pequena) e tomar notas imediatamente depois.

3.3.4. Quem deve realizar a entrevista?

Entrevistar uma pessoa, sobretudo tratando-se de uma vtima, sobre um incidente de tortura provoca cansao fsico e emocional. particularmente difcil quando o entrevistador est sozinho, pois necessrio ter habilidade para formular perguntas, escutar, criar um relacionamento com o entrevistado, mencionar situaes emocionais difceis, tomar notas e estar atento s omisses e incoerncias, tudo ao mesmo tempo, uma tarefa quase impossvel. Quando as circunstncias o permitam, melhor que a entrevista esteja a cargo de duas pessoas: uma formula as perguntas e a outra toma notas. ainda melhor se as duas pessoas tm habilidades complementares, por exemplo, conhecimentos mdicos e jurdicos. Isso ajuda a ter certeza de que no se perderam aspectos importantes e que foram feitas as perguntas corretas. Entretanto, para evitar confundir o entrevistado e para facilitar a criao de um vnculo, necessrio que um dos entrevistadores tenha a responsabilidade principal de formular as perguntas, dando ao segundo entrevistador a oportunidade de intervir mais para o final.

Deve-se ter presente alguma considerao especial quando so utilizados intrpretes?

Deve-se ter absoluta certeza de que o entrevistado est de acordo com o uso de um intrprete e de que saiba que o intrprete tem o dever profissional de respeitar a natureza confidencial da entrevista.

Deve-se estar ciente de que o contedo da entrevista pode ser difcil para o intrprete.

Deve-se assegurar que o intrprete esteja informado da necessidade de confidencialidade absoluta; isso muito importante no caso de contratao de intrpretes no-profissionais.

Deve-se ter em mente que os intrpretes no-profissionais podem entrar na conversa mais facilmente do que os profissionais; importante explicar que o trabalho solicitado requer a interpretao das palavras exatas do entrevistado. Se eles tambm aram por uma experincia pessoal que queiram explicar, deve-se informar que possvel concertar outra entrevista com eles.

Deve-se evitar utilizar pessoas locais a menos que seja absolutamente necessrio. Isso pode causar a desconfiana do entrevistado e colocar o intrprete em perigo. O mesmo vale para outros presos, familiares e outros parentes, e para toda pessoa implicada de um modo ou de outro na situao. Deve-se recordar, igualmente, que embora em determinadas culturas os familiares sejam considerados como um apoio, em outras pode ser muito inoportuno falar de certos assuntos em sua presena. Por exemplo, para uma mulher pode ser um tabu cultural falar de temas sexuais em presena de um membro masculino de sua famlia. Se o entrevistador ou sua organizao de origem local, provavelmente conhecer todos os aspectos delicados; deve-se sempre ter isso em mente.

O entrevistador no deve se distrair durante a interpretao: embora no esteja falando diretamente com o entrevistado, importante estabelecer uma relao com ele e demonstrar interesse pelo que ele explica.

3.3.6. O que se deve fazer para que o entrevistado se sinta mais vontade?

As entrevistas sobre experincias pessoais, por exemplo de maus tratos, podem ser extremamente intimidadoras. Talvez no se tenha muito controle sobre o ambiente no qual tem lugar a entrevista, mas inclusive os pequenos detalhes da parte do entrevistador podem contribuir para que um entrevistado se sinta mais a vontade.

preciso criar um ambiente o mais cmodo e privado possvel; de preferncia deve-se estar sozinho, a menos que o entrevistado se sinta mais a vontade com outra pessoa presente e que esta pessoa esteja de acordo em no interferir na conversa.

Se no for possvel realizar a entrevista privadamente, deve-se garantir pelo menos que os demais no possam escutar o que dito.

Deve-se ter presente que a postura e a forma de sentar diante do entrevistado podem afetar sua comodidade; por exemplo, em um espao limitado, uma inclinao para a frente pode parecer ameaadora, ao o que, em outras circunstncias, o no faz-lo pode transmitir falta de interesse. Existem pessoas que preferem sentar mais perto do entrevistador, outras so muito ciosas de seu espao pessoal ou fogem do contato fsico. Deve-se reparar no ambiente circundante e observar a linguagem corporal do entrevistado para chegar concluso do que mais apropriado em cada caso.

preciso contar com intervalos para descanso.

3.3.7. Como se deve tratar as pessoas que tm medo de falar?

Algumas entrevistas podem ser realizadas em um lugar relativamente protegido, mas em muitos casos o ambiente no ser seguro. Esse costuma ser o caso quando os entrevistados continuam sob custdia das autoridades. No possvel garantir sua segurana (Ver Parte I, Captulo 2.3, para uma considerao geral sobre temas de segurana), mas podem ser tomadas medidas para que as pessoas no tenham que enfrentar um risco maior do que o necessrio.

O entrevistador deve se certificar de que as pessoas dem seu consentimento informado entrevista (Ver Parte I, Captulo 2.3).

Jamais se deve fornecer s autoridades o nome das pessoas que denunciam maus tratos sem seu consentimento expresso.

Deve-se evitar identificar as pessoas, at mesmo por descuido, como aquelas que forneceram a informao; por exemplo, em um centro de deteno com um nmero muito pequeno de presos, como uma delegacia de polcia, deve-se entrevistar todas as pessoas detidas da mesma maneira, e no se deve reagir imediatamente s denncias de uma forma que permita s autoridades identificar a fonte de informao. Se, por exemplo, o entrevistador achar que deve tratar imediatamente de um tema com um delegado, primeiro deve consultar os entrevistados, e nunca ir falar com o funcionrio sem seu consentimento.

Deve-se deixar muito claro para os entrevistados que se eles, seus familiares ou amigos estiverem sofrendo coaes ou presses em decorrncia da informao que forneceram, devem diz-lo; deve-se entregar um carto de visitas com os dados para contato e ressaltar a importncia de que o faam se necessrio.

Se o entrevistador achar que podem estar correndo algum risco, deve fazer o possvel para acompanhar cada caso; deve manter os registros de todas as pessoas que entrevistou e perguntar pessoalmente por elas; pode realizar novas visitas.

3.3.8. preciso ter presente alguma considerao especial quando se realizam entrevistas em prises ou em outros centros de custdia?

Quando for necessrio selecionar a maneira de abordar a entrevista nesse ambiente, ser importante conhecer a dinmica de grupo e a estrutura da priso.

Quando existir um representante de pavilho ou de presos, pode ser til entrevistar e buscar primeiramente a colaborao dessa pessoa; da mesma forma, possvel que exista uma certa hierarquia entre as pessoas que esto detidas h muito tempo, e poderia ser vantajoso conhec-la.

Se for vivel, deve-se tentar entrevistar todos os presos. Em uma instalao grande isso talvez no seja possvel, mas pelo menos deve-se tratar de entrevistar um grupo significativo de detidos de uma categoria determinada.

Se as entrevistas tiverem de ser realizadas em um pavilho ou em um dormitrio, pode ser proveitoso comear com uma entrevista geral de grupo onde o entrevistador se apresentar e indicar o que procura, mas tambm ser necessrio entrevistar todas as pessoas privadamente. Embora existam outras pessoas na mesma rea e no seja possvel ter intimidade, deve-se tratar de falar com todos, um por um.

3.3.9. Qual a melhor forma de tratar um tema to sensvel?

As entrevistas sobre experincias de torturas podem ser muito delicadas e dolorosas, mas pode-se dar alguns os para minimizar o risco de traumatizar as vtimas. Assim sendo, aconselhvel:

Demonstrar respeito e considerao pelo entrevistado no tom de voz, nas expresses e nas atitudes.

Conhecer os fatores culturais e agir com especial delicadeza em relao aos tabus culturais.

Aconselhar o entrevistado sobre a possibilidade de obter assistncia ou visitar um especialista.

Escutar e permitir a manifestao de preocupaes pessoais e familiares.

Reconhecer a dor e a angstia, mas manter uma fronteira profissional; no criar expectativas exageradas quanto possibilidade de atender suas necessidades.

No pressionar os entrevistados caso sintam angstia; deve-se saber que algumas vtimas no esto preparadas para falar sobre suas experincias.

Quando possvel, realizar vrias entrevistas mais curtas ao invs de uma entrevista longa e intensa.

No encerrar uma entrevista repentinamente, sem levar a conversa para um tema menos delicado.

O que se pode fazer para maximizar a confiabilidade da informao?

Evitar perguntas que sugiram a resposta desejada. Por exemplo: "foi torturado enquanto esteve preso?" seria uma dessas perguntas, mas "aconteceu alguma coisa?" no seria. importante que o entrevistado d sua prpria explicao e no a do entrevistador.

Estimular o entrevistado a usar suas prprias palavras.

Evitar o emprego de listas sempre que possvel, visto que podem levar a equvocos quando os elementos da lista no corresponderem exatamente experincia do entrevistado.

Saber que as incoerncias no significam necessariamente que a denncia falsa. O entrevistado pode estar confuso ou ter dificuldade para entender a pergunta. s vezes pode-se solucionar essas incoerncias fazendo a mesma pergunta de forma diferente.

Observar o entrevistado detidamente; tomar nota da impresso que mereceu sua credibilidade.

3.3.11. No momento da seleo, deve-se ter alguma considerao especial quanto ao sexo de um entrevistador ou de uma equipe de entrevista?

No existe uma regra estrita sobre esse ponto, e depender da pessoa entrevistada e de quem realizar a entrevista. As preferncias podem se basear em fatores culturais ou pessoais. Em geral, melhor ter uma entrevistadora mulher presente quando se entrevista uma mulher, sobretudo se h uma possibilidade de que a explicao se refira a questes sexuais. No to claro em relao aos homens: tambm podem preferir falar com uma mulher sobre questes sexuais, mas em certas culturas isso seria inaceitvel. No se deve esquecer de levar em considerao o sexo do intrprete.

3.3.12. preciso alguma considerao especial quando se entrevista uma criana?

O principal objetivo quando se entrevista uma criana tentar no mago-la. muito diferente entrevistar uma criana do que um adulto, e deve-se agir com muita cautela. Os entrevistadores devem ter experincia de trabalho com crianas; caso contrrio, o efeito de uma entrevista pode ser mais prejudicial do que benfico. O ideal seria ter experincia e conhecimentos, e se nunca o fizeram antes, aconselhvel fazer uma entrevista simulada com outro integrante da equipe de entrevistadores para saber qual o caminho a seguir. Deve-se levar em conta que:

Alm de terem sido torturadas, ou em vez de terem sido torturadas, as crianas foram foradas a presenciar outras torturas, sobretudo de seus pais ou de crianas. No se deve subestimar os efeitos que isso pode ter sobre elas.

importante fazer com que as crianas se sintam seguras e apoiadas durante a entrevista. Isso pode ser logrado com a presena de um dos pais, de um familiar ou tutor, ou de um conselheiro, caso a criana esteja sendo assistida por um.

muito importante observar o comportamento da criana durante a entrevista: sua capacidade de expresso verbal depende de sua idade e etapa de desenvolvimento, e o comportamento pode revelar mais sobre o que aconteceu do que suas palavras.

As crianas so particularmente sensveis ao cansao e no se deve pression-las.

Se a criana pode ter sido vtima de uma agresso fsica ou sexual, no se deve realizar um exame exaustivo por parte de um mdico no-especializado.

Deve-se tentar garantir que a criana disponha de uma rede de assistncia aps a entrevista.

4. INFORMAES QUE DEVEM SER REGISTRADAS

OBSERVAO IMPORTANTE:

As orientaes apresentadas a seguir indicam a informao ideal que se pode reunir. De qualquer maneira, no se trata de uma lista de verificao rgida e deve ser utilizada com flexibilidade, e adaptada a um contexto particular. importante no haver uma concentrao excessiva na obteno de um nmero concreto de detalhes, que podem ser inadequados em um determinado caso ou impedir que sejam selecionados outros aspectos importantes inesperados. inclusive mais importante respeitar a pessoa e no consider-la como uma fonte de informao porque, caso contrrio, a prpria entrevista pode degenerar e se converter em uma forma de interrogatrio.

preciso deixar-se guiar pela impresso quanto clareza da explicao. Deve-se perguntar do princpio ao fim se existe algum aspecto no compreendido ou que parea pouco claro, vago ou contraditrio. O entrevistador deve se certificar de que a explicao faa sentido para ele. Deve ter cuidado com as lacunas na reconstruo cronolgica, quando alguns perodos de tempo ficarem sem explicao. Voltar sobre essas lacunas e contradies aparentes pode revelar elementos no detectados no momento devido. O ideal seria que as anotaes permitissem explicar os acontecimentos ordenadamente, no deixando grandes perguntas sem resposta.

No se pode atrasar o envio da denncia devido ausncia de alguns detalhes como os apresentados a seguir (talvez no sejam importantes ou essenciais), mas a pessoa que apresenta a denncia deve se assegurar de que possvel demonstrar um mnimo de elementos para formular uma acusao de maus tratos (Ver Parte I, Captulo 3.3): que uma vtima sofreu ou corre o risco de sofrer maus tratos em mos de uma autoridade do Estado ou com seu conhecimento e anuncia.

4.1. Informao modelo

DEVE-SE SABER:

QUEM FEZ O QUE EM QUEM?
QUANDO, ONDE, POR QUE e COMO?

4.1.1. Que tipo de detalhes so necessrios para responder a essas perguntas bsicas?

A informao deve:

1. Identificar a vtima ou vtimas

2. Identificar o torturador ou torturadores

3. Descrever como chegou a vtima s mos dos representantes pblicos

4. Explicar onde foram presas/mantidas as vtimas

5. Descrever as condies de recluso

6. Descrever a forma dos maus tratos

7. Descrever qualquer resposta oficial do incidente (incluindo a afirmao de que tal incidente no ocorreu)

Identificar a vtima ou vtimas

Quanto maior o nmero de detalhes obtidos sobre a pessoa, mais clara poder ser a identificao:

Nome completo (e o nome do pai; importante em algumas culturas).

Sexo (pode no ficar claro somente com o nome)

Data de nascimento/idade

Ocupao

Endereo

Aparncia, especialmente as caractersticas pouco comuns

Fotografias da vtima viva ou morta (podem ajudar os especialistas a interpretar qualquer sinal evidente de maus tratos observados nas fotografias)

Alguma indicao sobre o estado de sade da vtima antes de ser presa ou detida: relatrios mdicos, declaraes de testemunhas, etc.

necessrio lembrar que normalmente impossvel tomar medidas urgentes sem um nome.

Identificar o torturador ou torturadores

bom lembrar que para itir a ocorrncia de uma violao, deve-se demonstrar que a vtima esteve sob custdia das autoridades ou detida com sua anuncia, ou que as autoridades no a protegeram. No preciso, necessariamente, identificar os autores de torturas (embora se possvel, deve-se faz-lo), desde que se possa demonstrar que tm uma relao com o Estado.

Quem prendeu a vtima? O ideal seria o nmero de pessoas e seus nomes, patentes e unidade. Se essa informao no for conhecida, os seguintes detalhes podem ajudar a identificao:

A que unidade das foras de segurana, exrcito ou fora paramilitar pertenciam?

O que trajavam? Estavam uniformizados ou a paisana?

Qual o seu aspecto? Possuam alguma caracterstica incomum?

Que tipo de arma carregavam? Algumas armas podem ser especficas de uma corporao.

Que veculos usavam? Com marcas ou sem marcas; foi anotado o nmero da placa?

Descrever como a vtima chegou s mos dos agentes pblicos

O mtodo de seqestro ou de deteno, e o posterior tratamento, podem ser caractersticos de um determinado grupo que opera em uma rea (o que pode ter sido demonstrado por denncias anteriores aos organismos internacionais), e ajudam a demonstrar que a vtima foi detida por autores de torturas.

Onde foi presa a pessoa? Em casa, na rua, em um lugar de culto, fora de uma base militar, etc.

Quando foi presa a pessoa? A data aproximada ou o ms ou a estao do ano. Em que momento do dia ou, se pela manh, tarde ou noite.

Como aconteceu? Foi utilizada alguma forma de controle? Havia outras pessoas presentes que tenham visto o que ocorreu? Se no se conhece nenhum detalhe, onde e quando foi a ltima vez que a vtima foi vista e em companhia de quem? Houve algum aviso, a vtima foi chamada a uma delegacia de polcia; havia manifestao na rua, etc.?

Foi dada alguma razo para a priso? Embora no tenha sido dada qualquer razo oficial, o tipo de perguntas formuladas ou as circunstncias da priso podem sugerir a razo.

Explicar onde foram detidas/mantidas as vtimas

As vtimas podem ter sido mantidas em um lugar determinado ou talvez somente transferidas para uma rea da cidade e logo soltas, ocorrendo os maus tratos durante a transferncia.

Qual o nome e onde est situada a delegacia de polcia/quartel, instituio, rea ou campo militar?

Quanto tempo foram mantidas l?

Foram transferidas para algum lugar? Em caso afirmativo, para onde, por quem e em que data aproximadamente? Como chegaram l? Foi dada alguma razo para a transferncia? Se foi temporria, quanto tempo durou?

Descrever as condies de recluso

As condies de deteno podem fazer parte dos maus tratos, mas isso deve ser decidido pelo organismo ao qual sero apresentadas as denncias. No que se refere aos centros secretos de deteno, os testemunhos combinados de diferentes pessoas podem demonstrar que o centro existe e ajudar a identific-lo. Pode ajudar, igualmente, na elaborao de uma planta da instalao. Nesse caso, deve-se tomar nota de todos os detalhes possveis.

Deve-se solicitar vtima que descreva minuciosamente o centro onde foi mantida, sobretudo a cela ou lugar onde dormiu e todas as demais salas onde esteve, por exemplo para um interrogatrio. possvel que os olhos das vtimas tenham sido vendados; nesse caso, deve-se pedir que descrevam com outros sentidos que no a vista: o que escutaram, cheiraram ou tocaram? A seguir, mostramos o tipo de documento necessrio para documentar as condies:

Localizao da sala dentro da instituio: Foi preciso subir ou descer? O que escutaram e cheiraram? Notaram alguma peculiaridade do terreno no caminho? Se havia uma janela na sala, era possvel ver algo atravs dela?

A prpria sala: Quais as suas dimenses? De que eram feitas as paredes, o piso, o teto e a porta? Que forma tinha? Havia algo incomum?

Outros presos na sala: Havia outras pessoas detidas l? Em caso afirmativo, quantas? Alguma delas pode testemunhar? Observaram alguma coisa sobre o estado de sade da vtima? Qual estado de sade das demais pessoas detidas?

Isolamento: Se a vtima estava isolada, durante quanto tempo e de que maneira esteve isolada?

Contedo da sala: O que havia na sala: camas, mveis, pia, lavabo, etc.?

Ambiente da sala: Qual a temperatura? Havia algum tipo de ventilao? Era mida?

Luz: Havia luz? Era luz natural de uma janela ou luz eltrica? Se era luz eltrica, quanto tempo permanecia acesa? Que aspecto tinha a luz ou que sensao dava, por exemplo, cor, intensidade?

Higiene: Havia instalaes para a higiene pessoal? Onde e como iam ao banheiro? Como era a higiene geral do centro? Havia algum tipo de infestao?

Roupas: Que roupas usavam e era possvel lav-las ou mud-las?

Alimentao e gua potvel: Com que freqncia se distribua comida e gua e em que quantidade? Qual era a qualidade? Era distribuda gratuitamente?

Exerccio: Era dada a oportunidade de sair da cela? Em caso afirmativo, durante quanto tempo e com que freqncia?

Regime: Havia algum aspecto do regime particularmente estrito ou montono?

Servios mdicos: Estava presente ou disponvel um mdico ou outro profissional de sade? Algum dos presos pde ser examinado ou tratado em uma instalao mdica independente, por um mdico de famlia ou em um hospital? Havia disponibilidade de medicamentos? Quem os fornecia?

Visitas familiares: Eram permitidas visitas familiares? Em caso afirmativo, onde eram realizadas? Era possvel escutar as conversas? A famlia sabia onde estava a pessoa?

Representao legal: Era permitido o o a um representante legal? Quando ocorreu a primeira entrevista, ou seja, quanto tempo depois da deteno da vtima? Qual a freqncia? Onde eram realizadas as visitas? A conversa podia ser ouvida por terceiros?

Comparecimento perante um representante judicial: A vtima compareceu perante um magistrado ou tribunal? Quando, ou seja, quanto tempo depois da deteno da vtima?

Subornos: Era preciso pagar algum suborno por obter qualquer um desses servios?

Descrever a forma dos maus tratos

Deve-se lembrar que os maus tratos podem ser fsicos e psicolgicos, e que ambos podem constituir tortura. As formas de maus tratos so limitadas apenas pela imaginao do torturador, e no possvel nem desejvel proporcionar uma lista. A data e o lugar no qual foram praticados os maus tratos podem ajudar a identificar o torturador, por exemplo, possibilitando a comprovao de quem estava de servio naquele momento.

Deve-se solicitar vtima ou testemunha que explique a natureza exata do tratamento infligido:

Onde ocorreu, o que aconteceu, com que freqncia, que efeitos causou vtima na ocasio e posteriormente?

Pode-se perguntar:

O que podem lembrar sobre a identidade do torturador ou torturadores.

Se havia algo caracterstico na sala onde ocorreram os maus tratos.

Se havia outros presos presentes na ocasio, se viram o que ocorreu com a vtima e se aconteceu algo com eles.

Se foi feita alguma pergunta vtima durante os maus tratos ou se lhe disseram qualquer outra coisa; isso pode dar algum indcio sobre o motivo, caso exista algum, dos maus tratos.

Pedir uma descrio exata do que ocorreu e com que freqncia; quando os maus tratos forem fsicos, deve-se pedir uma descrio de todos os instrumentos usados e as partes do corpo onde foram aplicados. Quando o tratamento for psicolgico, deve-se perguntar vtima se pode descrever exatamente como se sentiu, tanto naquele momento quanto depois.

Quais foram os efeitos imediatos de cada forma de maus tratos sobre a pessoa.

Se a vtima recebeu tratamento mdico, imediatamente ou algum tempo depois, inclusive aps ter sido solta.

Se havia pessoal mdico presente um pouco antes, durante ou depois dos maus tratos; em caso afirmativo, eles se identificaram? Qual era sua funo?

Se h ou houve conseqncias de longo prazo (fsicas ou mentais) que a vtima atribui aos maus tratos.

qual foi a resposta oficial, caso tenha havido resposta, sobre o incidente?

A famlia da vtima dirigiu-se s autoridades, em qualquer momento, a fim de obter informaes sobre a vtima, por exemplo, durante as primeiras etapas da deteno? Obteve alguma resposta?

Se a vtima compareceu perante um magistrado ou tribunal em algum momento durante o perodo de deteno, foram-lhe comunicadas as acusaes? Havia algum representante legal? Nesse momento, a vtima tinha algum sinal visvel de leso?

A vtima pde ser atendida por um mdico durante a deteno ou aps ter sido solta? Que tipo de mdico era, por exemplo, um mdico independente, um mdico da priso ou um mdico do Estado? Como chegou a vtima ao mdico? Algum a acompanhou? Uma vez l, o mdico realizou um exame? Havia algum presente durante o exame? O mdico preparou um relatrio mdico? O que dizia o relatrio? A vtima tinha sinais evidentes de leses na ocasio?

A vtima queixou-se a algum de ter sofrido maus tratos ou contou a algum com autoridade? Que resposta recebeu?

Foi realizada um inqurito? Do que constou? Foram entrevistadas testemunhas? Foram entrevistados os autores das torturas? Se a vtima faleceu enquanto estava detida, foi feita uma autpsia?

A vtima teve algum contato com os funcionrios que a detiveram (ou com outros funcionrios da mesma fora ou corporao) desde o incidente?

O que se pode fazer para obter esses detalhes sem modificar o contedo da explicao?

A descrio exaustiva e cronologicamente precisa dos fatos no fcil para as vtimas. Elas necessitaro de orientao para saber sobre quais aspectos devem falar mais detidamente; deve-se lembrar que a funo do entrevistador exatamente essa, ou seja, proporcionar uma orientao, e no colocar palavras na boca do entrevistado. preciso comear sempre com perguntas gerais ou abertas (perguntas cuja resposta ilimitada, por exemplo, "aconteceu-lhe alguma coisa?", ao invs de "foi torturado?"), e ir tornando-se mais especfico medida que a informao for sendo prestada.

Estudo de caso:

A seguir, duas formas de apresentar a mesma histria:

relatrio 1 - Bsico:

Jos Torres, de 23 anos, declarou que foi preso em 23 de janeiro de 1999, transferido para a delegacia central de polcia de Pueblo e posto em liberdade, sem qualquer acusao, em 25 de janeiro. Denunciou que, enquanto se encontrava preso, recebeu repetidos golpes na cabea e, em uma ocasio, foi submetido a choques eltricos por parte de agentes desconhecidos enquanto era interrogado.

relatrio 2 - Elaborado:

Jos Torres, de 23 anos, declarou ter sido preso em sua casa s 5 da manh do dia 23 de janeiro de 1999 e transferido para a delegacia central da polcia de Pueblo, onde chegou s 7 da manh. Foi colocado sozinho em uma cela, no sto, sem janelas nem lavabo e infestada de ratos.

Aproximadamente 4 horas mais tarde, dois agentes vestidos a paisana retiraram Jos da cela e subiram com ele no elevador at o terceiro andar, onde entraram em um escritrio direita de um longo corredor. No escritrio havia 3 cadeiras de metal e plstico cinza, uma escrivaninha de madeira e 3 mveis com gavetas de metal cinza. Havia um pequeno tapete marrom e na parede em frente da porta havia uma janela pequena com uma persiana fechada. Um dos agentes era muito baixo, tinha cabelos crespos e barba. O outro usava culos, tinha uma pequena cicatriz triangular sobre a sobrancelha direita e fumava cigarros. Durante o interrogatrio, o agente com barba referiu-se ao agente com a cicatriz como "Sargento".

(Informe 2, continuao)

Jos foi mantido no escritrio durante duas horas. Durante esse perodo, o agente com a cicatriz pediu-lhe repetidamente que revelara informaes sobre uma quadrilha de traficantes de drogas que operava em Pueblo. Quando ele disse que no sabia nada sobre uma quadrilha de traficantes de drogas, o agente da barba amarrou-lhe as mos nas costas e bateu repetidamente em sua cabea com uma lista telefnica amarela que retirara da gaveta superior de um armrio.

Desceram novamente Jos para a mesma cela de antes. Dezoito horas depois, dois agentes a paisana vieram busc-lo. Um deles era o agente da cicatriz do dia anterior. O outro era louro e tinha cabelos curtos e uma voz grave. Levaram-no para o mesmo escritrio do terceiro andar. Desta vez, o agente louro disse a ele que retirara a camiseta e amarrou suas mos novamente enquanto estava sentado em uma cadeira. O mesmo agente retirou uma caixa preta retangular da gaveta esquerda da escrivaninha, com uns 5 cm x 7 cm de tamanho e com dois pinos de metal que saam de uma extremidade. Apoiou-a contra o mamilo direito de Jos e apertou um boto. Jos ouviu um zumbido curto e sentiu uma dor intensa na regio do mamilo. O mesmo foi feito trs vezes. Durante o tempo em que esteve no escritrio, o agente com a cicatriz fez-lhe algumas perguntas sobre a quadrilha de traficantes de drogas de Pueblo e pediu-lhe detalhes sobre uma grande remessa de herona esperada para a semana seguinte.

Jos foi solto sem ser acusado, em 25 de janeiro.

Quando Maria, representante da ONG X, entrevistou-o em sua casa, no dia 28 de janeiro, pde constatar duas pequenas marcas vermelhas, com aproximadamente 8 mm, prximas ao mamilo direito de Jos, bem como marcas circulares roxas e amarelas ao redor dos pulsos. Ele mostrou a Maria extensas contuses na parte inferior das costas e um inchao considervel na regio dos rins, e queixou-se, tambm, de dor ao urinar. Queixou-se, igualmente, de uma dor de cabea contnua e de um zumbido agudo nos ouvidos. Parecia nervoso enquanto descrevia os fatos, estava com olheiras, mudava de posio repetidamente e parecia estar com frio, embora a temperatura fosse normal.

O Relatrio 1 no inexato nem errneo; apenas faltam pormenores. Esses pormenores, contudo, so as chave que abriro diversas possibilidades de ao para o entrevistador. Observando o Relatrio 1, v-se que ele apresenta os elementos bsicos de uma denncia de tortura (vtima, torturador vinculado s autoridades, maus tratos), mas a descrio dos maus tratos mnima e so fornecidas poucas indicaes sobre quem pode ser o torturador, ou como possvel corroborar a denncia. Isso torna difcil a adoo de qualquer medida significativa relacionada denncia.

O Relatrio 2, por sua vez, muito detalhado e informativo, e fornece muitas oportunidades para a corroborao. Alm do mais, apresenta os elementos bsicos para uma denncia de tortura:

Fornece muitos pormenores sobre os autores, o que pode possibilitar sua identificao.

Descreve a localizao e distribuio do escritrio onde ocorreram os maus tratos, o que permite ach-lo se for realizada uma visita delegacia.

Pode possibilitar a busca dos instrumentos usados nos maus tratos caso seja realizada uma visita delegacia.

Esclarece o motivo da deteno e do interrogatrio.

Fornece pormenores sobre as condies em que a vtima foi detida.

Descreve os maus tratos de uma maneia precisa, tornando possvel que um especialista mdico d sua opinio a respeito das leses da vtima.

Descreve as leses da vtima, incluindo uma indicao bsica de seu estado emocional.

As perguntas que Maria poderia ter formulado para obter um relatrio mais completo seriam as seguintes:

Declarao de Jos:
Perguntas de Maria:

Fui preso em 23 de janeiro.
Onde aconteceu a deteno?

Em que momento ocorreu a deteno?


Levaram-me para a delegacia central de Pueblo.
Quando chegou delegacia?

Para onde foi transferido quando chegou?

Compartilhava a cela com outra pessoa?
A cela tinha alguma janela?

A cela tinha um lavabo?

Como era a higiene da cela?

Enquanto estive preso recebi repetidos golpes na cabea.
Quando isso ocorreu?

Onde ocorreu?

Como chegou at l?

Subiu ou desceu?

Quem o levou at l?

Que aspecto tinham?

Observou algo pouco comum sobre eles?

Como era o escritrio?

Estava mobiliado?

Observou algo especial nele?

O que ocorreu exatamente quando chegou l?
Tinha liberdade de movimentos?

Diz que o espancaram, quem o fez?

Usaram algum objeto?

Viu de onde o retiraram?

Disseram algo ou fizeram perguntas?

Lembra-se do que foi perguntado?

Quanto durou?

Para onde o transferiram depois?

Submeteram-me a choques a eltricos e me interrogaram.
Quando aconteceu isso?

Onde aconteceu?

Quem o levou at l?

O que aconteceu quando chegou l?

Tinha liberdade de movimentos?

O que aconteceu em seguida?

Que aspecto tinha a caixa?

O que ele fez com ela?

Onde, exatamente, ele o tocou com a caixa?
O que ele fez a seguir?

Ouviu ou sentiu algo?

Quantas vezes isso aconteceu?

Disseram algo ou fizeram perguntas?

O tratamento imposto deixou marcas?

Importa-se que d uma olhada?

Sofre outras conseqncias em decorrncia do que aconteceu?

O Relatrio 2 tambm pode ser melhorado em certos aspectos, embora seja mais do que adequado para a maioria dos objetivos. No identifica possveis testemunhas; por exemplo, no se sabe se algum viu como tiraram Jos de sua casa. A descrio das condies da deteno imprecisa e poderia ser mais elaborada. No indica se Jos teve permisso de contatar seu advogado ou sua famlia, se fizeram um exame mdico em algum momento durante sua deteno ou se ele apresentou uma reclamao formal sobre os maus tratos a algum que tivesse autoridade. Tampouco traz informaes sobre o que pode ter ocorrido entre o segundo interrogatrio de Jos e o momento em que foi solto.

Existe um outro aspecto ainda mais importante. Observando-se detidamente o relatrio, v-se que Maria se esqueceu de uma coisa. Jos foi preso s 5 da manh, mas s chegou delegacia s 7 da manh. Como ela no morava na localidade, no se lembrou de perguntar a distncia entre a delegacia de polcia e a casa de Jos. Na realidade, elas distam apenas trs ruas. O que aconteceu, portanto, entre as 5 e as 7 da manh? Maria tambm deixou ar outra pista: as contuses e o inchao na parte inferior das costas e na regio dos rins e a dor ao urinar. At para um advogado, esses sintomas seriam difceis de conciliar com a explicao de Jos de que recebeu golpes na cabea e choques eltricos no mamilo. Ele insistiu que esses foram os nicos maus tratos que sofreu na delegacia. provvel que antes de chegar delegacia tenham levado Jos para um lugar a fim de espanc-lo com golpes ou talvez chutes, principalmente na regio dos rins. Caso tivesse reparado a tempo nessa incoerncia, Maria teria descoberto outro incidente de maus tratos que Jos esqueceu de mencionar ou pensou que no era importante se comparado com o que ocorreu na delegacia. Maria pode ter sido concreta demais em suas perguntas durante as primeiras fases da entrevista, perguntando a Jos o que aconteceu na delegacia, em vez de o que ocorreu depois que o tiraram de casa, ou apenas o que aconteceu a seguir.

4.2. Contextos especficos

Os exemplos e as perguntas apresentados na seo anterior sobre a informao modelo esto muito orientados para os incidentes de maus tratos no contexto da deteno policial ou outra forma de deteno oficial a curto prazo, porque trata-se do tipo mais habitual de denncia que se recebe. Embora a maioria dos elementos e das normas gerais tambm seja vlida para outros contextos, deve-se ter em mente que nem todos sero pertinentes nem adequados. Quando o entrevistador se prepara para uma visita a outro tipo de instituio ou para uma entrevista em um contexto diferente do descrito anteriormente, deve dedicar certo tempo para pensar sobre a necessidade de utilizar novas abordagens no momento da entrevista.

Entre os exemplos de instituies de deteno longa esto as prises (com pessoas em priso preventiva e condenados), outros centros de recluso onde os presos esperam julgamento, s vezes durante longo perodo de tempo, e centros de deteno juvenil. Nessas instituies, se o enfoque for o tratamento dispensado dentro da instituio (ao invs dos fatos que ocorreram antes da priso) pouco provvel que o entrevistador deva se preocupar com perguntas sobre a deteno ou o seqestro. Em vez disso, deve fazer mais perguntas sobre as condies de encarceramento, o regime carcerrio, as relaes com os carcereiros e os incidentes particulares de maus tratos. Com relao a este ltimo ponto, poderiam ser feitos os mesmos tipos de perguntas feitas por Maria quando pedia informaes sobre o que aconteceu com Jos quando o tiraram da cela. Tambm preciso pensar na possibilidade de maus tratos coletivos, ou o emprego excessivo de fora ou a brutalidade em resposta a problemas disciplinares, tais como distrbios.

Tampouco se deve esquecer que instituies como as prises so uma fonte importante de denncias relacionadas a fatos que ocorreram antes do encarceramento, sobretudo os maus tratos da polcia. o caso dos presos recm-chegados, porque pode ser a primeira vez que se sintam seguros para falar sobre suas experincias. Ver Parte I, Captulo 3.4 e 3.5, para uma anlise mais extensa sobre este ponto.

Nos contextos de recluso no-punitiva, como abrigos para crianas e asilos de idosos, ou instituies psiquitricas, talvez seja necessrio, igualmente, prestar ateno ao entorno e s condies gerais, ao relacionamento com o pessoal de superviso e a todos os incidentes de maus tratos. Nesses contextos, os maus tratos costumam adotar a forma do abuso fsico ou sexual, mas tambm podem incluir vrias formas de abuso psicolgico. bom lembrar que para as crianas melhor que a entrevista seja realizada por algum que tenha certa experincia de trabalho com crianas. Uma prtica habitual em muitas instituies psiquitricas que d margem a controvrsia a utilizao de amarras para restringir os movimentos dos pacientes.

Nas instituies militares, os problemas podem derivar do regime disciplinar, que costuma ser muito rgido. Nesses casos, provvel que devam ser investigadas denncias de castigos que podem constituir maus tratos, como a incomunicabilidade ou a retirada de certos privilgios. preciso lembrar que se deve pedir informaes no s sobre a punio propriamente dita, como ocorre, quanto tempo dura, sua freqncia, etc., mas tambm sobre o processo mediante o qual as punies ou medidas disciplinares so determinadas. Outra possvel causa de preocupao pode ser a tolerncia oficial das intimidaes dentro das foras armadas, que em certos casos poderiam constituir maus tratos. muito importante anotar os detalhes sobre a forma exata das intimidaes, sua freqncia e intensidade, o nmero de pessoas implicadas, a possibilidade de que seja generalizada, as conseqncias fsicas e psicolgicas que a vtima pode estar sofrendo, e qualquer indicao sobre a tolerncia oficial dessa prtica.

Nos centros de deteno para estrangeiros, o problema pode dizer respeito aos maus tratos aos estrangeiros por parte da polcia local ou de outras autoridades (que, em geral deve ser examinado de uma maneira parecida s outras formas de deteno a curto prazo), mas mais provvel que implique processos de deportao de pessoas para pases onde corram o risco de ser torturadas. Em tais casos, deve-se rear de forma exaustiva todas as etapas do processo de deportao e obter cpias das decises importantes. Deve-se, tambm, entrevistar as pessoas sobre suas razes para crer que sofrero torturas, a fim de estabelecer um slido motivo para evitar que sejam deportadas. Deve-se obter informaes sobre os incidentes anteriores de tortura sofridos pelo entrevistado ou por familiares prximos, bem como sobre todas as ameaas recebidas por eles e suas razes para temer que a pessoa corre um risco. Deve-se ter em mente que preciso centrar a anlise no risco atual e no no anterior.

No caso de seqestros, desaparecimentos e execues extrajudiciais, normalmente no ser realizada uma entrevista com a prpria vtima, e sim com um familiar ou amigo prximo. O entrevistador dever se concentrar nas circunstncias que cercaram o desaparecimento da pessoa, no modus operandi dos seqestradores e, sobretudo, na tarefa de identificar as testemunhas que possam fornecer informao no apenas sobre as circunstncias da priso, mas tambm sobre o estado da vtima quando foi detida. Caso tenha sido encontrado o corpo da vtima, isso ser muito importante para ajudar a demonstrar que todas as marcas de leses no corpo ocorreram durante a deteno.

Quando for necessrio reunir denncias em campos de refugiados e de pessoas deslocadas, possvel que se recebam denncias de maus tratos ocorridos antes chegada ao campo e de maus tratos ocorridos dentro do campo. muito importante manter registros muito precisos sobre os autores dos incidentes denunciados e ser extremamente minucioso em sua identificao. Isso igualmente vlido para as acusaes apresentadas em relao, geralmente, s zonas em conflito.

5. PROVAS

Fazer uma denncia slida no consiste somente em apresentar a explicao de algum sobre o que lhe aconteceu. Consiste, igualmente, em que outros acreditem que os fatos relatados so verdadeiros. Por muito crvel e digna de confiana que possa parecer uma pessoa durante uma entrevista, importante reunir todas as provas possveis, por vrios motivos:

Em primeiro lugar, a menos que a vtima preste declarao perante um tribunal, pouco provvel que outras pessoas tenham a oportunidade de observar seu comportamento da mesma forma que o entrevistador. Isso significa que ele deve convenc-los de que a vtima sincera.

Em segundo lugar, todos os procedimentos, nacionais e internacionais, esto sempre alertas com relao a denncias falsas, especialmente em contextos polticos delicados. Quanto mais provas forem apresentadas, menos dvidas tero quanto a veracidade da acusao.

Por ltimo, os procedimentos judiciais e quase judiciais, em geral, no podem emitir um veredicto de culpabilidade, quer do Estado, quer de um torturador especfico, com base apenas em uma denncia. Isso significa que pouco provvel que o julgamento seja bem-sucedido, a menos que existam provas que corroborem a denncia.

As provas podem adotar a forma de um relatrio mdico, uma avaliao psicolgica, uma declarao da vtima, declaraes de testemunhas, outras formas de prova de terceiros, como o testemunho de um mdico ou de outro especialista, ou uma prova objetiva de incidentes generalizados de tortura nas circunstncias referidas. Ou seja, qualquer coisa que possa ajudar a corroborar e demonstrar uma denncia.

5.1. Prova mdica

Os procedimentos tcnicos para que o pessoal mdico realize um exame fsico ou psicolgico nas supostas vtimas de tortura so descritos em muitos outros documentos e manuais especializados (ver Apndice 2), e no se tratar desse assunto neste manual. importante, porm, que todos os que desejem apresentar denncias de torturas e de outras formas de maus tratos compreendam a funo da prova mdica, as dificuldades que gera e algumas medidas bem bsicas que podem ser tomadas para fazer constar esse tipo de prova na falta de uma oportunidade para enviar uma suposta vtima a um especialista mdico para um exame.

A prova mdica , provavelmente, a mais importante que se pode obter, e pode gerar um slido respaldo s declaraes das testemunhas. A prova mdica no costuma ser incontroversa (provar com absoluta certeza que existiu tortura), porque:

Existem muitas formas de tortura que deixam muito pouco rastro, e so poucas as que deixam sinais fsicos duradouros.

possvel que algumas leses ou marcas, apresentadas como sendo conseqncia de torturas, sejam produto de outras causas.

O que realmente pode demonstrar a prova mdica que os padres de leso ou de comportamento identificados na suposta vtima so coerentes com a (poderiam ter sido causados pela) tortura descrita. Se ocorrer uma combinao de provas fsicas e psicolgicas coerentes com uma denncia, isso reforar o valor geral da prova mdica.

Os exames fsico e psicolgico devero estar a cargo de pessoal mdico especializado, no s porque exigem conhecimento tcnico, mas tambm porque se os relatrios forem utilizados em um tribunal, ser necessrio demonstrar que foram elaborados e interpretados por profissionais qualificados. Entretanto, isso no significa que se deva deixar de fazer constar todos os sinais fsicos ou o comportamento evidente observado durante a entrevista; muito ao contrrio, podem ser de muita utilidade, sobretudo quando no se pode realizar um exame mdico na ocasio. Um questionrio minucioso e os detalhes sobre o tratamento recebido pela vtima tm pelo menos tanto valor quanto fazer constar os efeitos fsicos e psicolgicos. E falar com uma testemunha, como a esposa, por exemplo, pode ajudar muito a descobrir a aparncia da vtima depois das torturas e a observar todas as mudanas em seu comportamento.

Aps a obteno da prova mdica, importante ter presente a diferena entre medicina teraputica (tratamento dos sintomas do paciente) e a medicina forense (legal) . O objetivo da medicina forense demonstrar as causas e as origens das leses; trata-se de uma disciplina especializada. Em muitos pases, as funes teraputicas e forenses esto sob a responsabilidade dos mesmos profissionais mas, sempre que possvel, deve-se buscar o auxlio de algum que tenha conhecimentos forenses e conhea a diferena entre as duas formas de medicina.

5.1.1. Prova fsica

Caso no seja possvel contar com a presena imediata de um mdico, melhor fazer constar provas grficas dos maus tratos, mas somente aps o consentimento da pessoa. O entrevistador deve deixar claro que no mdico e que talvez no possa oferecer tratamento imediato. Em um contexto de deteno, qualquer observao pode estar fundamentada apenas em uma breve entrevista, mas quando a suposta vtima no estiver detida, poder retirar parcialmente a roupa para que seja possvel uma observao mais pormenorizada.

mais provvel que os sinais externos sejam visveis em um lapso de poucos dias aps a leso, mas deve-se procurar esses sinais mesmo em casos mais antigos. imprescindvel fazer constar toda a informao possvel. preciso lembrar que a ausncia de leses visveis no significa a inexistncia de maus tratos.

guisa de orientao, seria aconselhvel fazer constar o seguinte:

Todas as leses evidentes, como inchao, contuses, cortes, arranhes ou queimaduras.

Todas as dificuldades de movimento corporal ao andar, subir escadas, sentar ou ficar de p durante longos perodos de tempo, inclinar-se ou levantar os braos.

Todas as deformidades de forma ou postura nas costas ou nos membros.

Como fazer constar as observaes:

Anotar REGIO, TAMANHO, FORMA, COR e TIPO (corte, contuso, queimadura, etc.) de todas as leses.

Utilizar, se possvel, uma rgua; caso contrrio, calcular o tamanho comparando-o com um objeto comum (mas evitar objetos de tamanho varivel, como uma laranja).

Caso existam muitas leses, indique-as em um diagrama (ver Apndice 4).

As fotografias, embora no sejam profissionais, podem ser teis para o exame posterior dos especialistas. O ideal incluir uma foto da localizao geral das leses e um primeiro plano de cada leso. Deve-se incluir um indicador de tamanho, de preferncia uma rgua, mas serve, tambm, um objeto comum como uma caixa de fsforos. A indicao da data de muito valor. Se possvel, deve-se chamar mais tarde um fotgrafo profissional.

Descrever as aparncias com toda preciso e detalhe, por exemplo "Uma contuso inchada e roxa, circular, de 4 cm de dimetro, na parte exterior do brao direito, 10 cm acima do cotovelo".

Solicitar ao entrevistado que mostre a postura ou o movimento anmalo.

Perguntar ao entrevistado sobre o desenvolvimento dos sintomas desde o incidente. Uma resposta possvel : "Na semana ada no podia levantar os braos em um ngulo de 90 graus, mas agora posso levant-los acima da cabea. Ainda no posso mexer completamente o pulso e minha mo ainda est inchada". Essas declaraes podem ser citadas literalmente.

Caso necessrio, essas orientaes podem ser adaptadas para o exame em um cadver. Nesses casos, deve-se tambm elaborar um relatrio sobre as condies em que foi encontrado (por exemplo, onde estava situado, o tipo de superfcie sobre a qual estava, se fazia muito calor ou frio, se o lugar era particularmente mido), tendo em vista que isso pode ajudar um especialista forense a determinar se ainda possvel encontrar sinais de tortura no corpo.

5.1.2. Prova psicolgica

Mesmo a tortura intensa, praticada com percia, pode no deixar marcas fsicas, mas sim profundas repercusses psicolgicas. Esse ser o caso se a vtima sofreu torturas psicolgicas, como isolamento prolongado, humilhao religiosa ou sexual, ou ameaas de morte ou contra a famlia. Embora a avaliao psicolgica de uma pessoa s possa ser realizada por um especialista, deve-se fazer constar as observaes que uma pessoa no-profissional faa sobre o comportamento do indivduo, juntamente com todos os comentrios subjetivos que possam ter sido feitos pela vtima sobre si mesma (descrio de um pesadelo, pensamentos suicidas), para sua posterior interpretao por parte de um especialista.

Os seguintes sinais podem ser evidentes ou explicados pelo entrevistado. Embora sejam indicadores de tenso, no so especficos da tortura, apesar de que o tema dos sonhos ou os flashbacks podem indicar sua origem. Pensamentos sobre fatos traumticos voltam persistentemente, por exemplo, por meio de angustiosos sonhos ou lembranas recorrentes dos fatos, reaes ou sensaes repentinas como estivesse revivendo os fatos traumticos (flashbacks).

Intensa angstia ao viver situaes que simbolizam ou se parecem com aspectos da tortura. H uma constante necessidade de evitar os estmulos associados ao trauma ou uma paralisao emocional total.

Sintomas de crescente excitao, tal como dificuldade para dormir, irritabilidade ou ataques de raiva e dificuldade de concentrao. O entrevistador pode notar impacincia, agitao ou uma reao de medo exagerada.

Tendo em vista que a maioria dos sintomas psicolgicos subjetiva, muito til obter indcios que os corroborem com a famlia ou com amigos, por exemplo: "Ele acorda gritando e suando de noite, tem pesadelos de que est sendo torturado" ou "Zanga-se com facilidade. Antes de ser preso, tinha um temperamento fcil e agradvel" ou "Sempre evita ar pelo lugar onde foi presa".

5.2. Declarao da pessoa que faz a denncia

Deve-se preparar uma declarao escrita que descreva os fatos e seja assinada pela vtima ou por outra pessoa que apresente a denncia, sempre que possvel quando a vtima no estiver presa. Isso no ser essencial em todas as circunstncias, mas ajudar em todos os processos a reforar a credibilidade da acusao. Alm disso, a falta dessa declarao escrita afetar as diversas possibilidades de ao e poder impedir o incio do processo judicial.

A declarao deve descrever em detalhe o incidente ou incidentes de tortura e os fatos anteriores e posteriores s torturas. No existe um formato determinado para essa declarao, mas deve ser, antes de mais nada, informativa. Os tipos ideais de detalhe que devem ser includos so descritos na a Parte II, Captulo 4.

Essa declarao no precisa ser escrita pela pessoa que faz a denncia; tambm pode ser redigida de preferncia, datilografada pelo entrevistador. Posteriormente, a pessoa dever l-la novamente ou, se for analfabeta, o entrevistador dever l-la em voz alta. A pessoa dar sua aprovao e dever a declarao, ou colocar nela sua impresso digital do polegar. Caso exista a inteno de utilizar a declarao em processos judiciais, deve ser assinada e datada no s pela pessoa que faz a denncia, mas tambm pela pessoa que tomou a declarao e, se possvel, por uma segunda testemunha.

As organizaes costumam registrar essas declaraes, solicitando pessoa que apresenta a denncia que preencha um questionrio padro, no qual presta a informao solicitada.

5.3. Prova testemunhal

Uma vez que a tortura, geralmente, praticada em segredo, difcil encontrar testemunhas do incidente em si. Caso existam testemunhas, estas podem no querer falar sobre o que presenciaram com medo de sofrer represlias ou porque a experincia foi traumtica demais. Entretanto, quando houver testemunhas dispostas a fazer uma declarao sobre o que viram, isso pode contribuir muito para a credibilidade da denncia, bem como fornecer detalhes que a prpria vtima ou a pessoa que apresenta a acusao talvez no possa dar. Pode ajudar a reconstruir os fatos e coloc-los em contexto. O objetivo das declaraes das testemunhas ajudar a compreender exatamente o que aconteceu e, portanto, devem ser bem pormenorizadas.

As testemunhas teis no unicamente aquelas que presenciaram o incidente de tortura.

As que estiveram presentes no momento em que a vtima foi presa podem fornecer uma informao muito valiosa sobre a identidade do torturador, o tratamento dado vtima enquanto a levavam, e o estado da pessoa no momento em que foi detida. Isso pode ser muito importante se a vtima morreu, o corpo mostra sinais de tortura e o Estado afirma que nunca prendeu essa pessoa ou que as leses no foram infligidas por agentes seus.

Se uma pessoa sabia que a vtima estava recebendo mensagens ou ligaes telefnicas ameaadoras antes de ser detida, aconselhvel fazer constar essa informao.

Outros presos podem confirmar que a vtima foi levada para interrogatrio e descrever seu estado antes e depois de ter sido levada, ou que nunca voltou. Podem declarar que ouviram sons, como gritos ou urros, ou que viram manchas de sangue ou instrumentos de tortura. Podem dar testemunho de sua prpria tortura ou da de outras pessoas que pudessem ter presenciado, o que ajudaria a demonstrar que no centro em questo se pratica a tortura, ou que um guarda da priso ou um determinado agente de polcia perpetrou torturas. Isso pode ajudar a estabelecer padres, por exemplo: os policiais da delegacia X sempre leva a vtima ao escritrio Y do andar Z ou os guardas da priso sempre chegam depois da mudana de turno do dia e levam a vtima para um determinado lugar da priso onde sabido que se praticam maus tratos.

Um mdico que reconhea um preso pouco depois de um incidente tambm pode fornecer uma prova crucial.

A melhor maneira de identificar possveis testemunhas seguir a cronologia do que ocorreu com a vtima, averiguando em cada etapa se havia algum presente: no momento da deteno, no momento em que chegou instituio ou no lugar onde foi mantida, se compartilhou a cela ou se havia algum nas celas vizinhas, se algum viu quando a levaram para ser torturada, se assistiu a tortura, viu as leses resultantes ou presenciou o desmaio, se algum sofreu experincias parecidas. Quando a vtima no a pessoa que apresenta a denncia porque est morta, desaparecida ou ainda est detida, os parentes mais prximos, os vizinhos ou membros da comunidade local podem sugerir possveis testemunhas, ou fornecer informao til eles prprios.

No se deve esquecer que para as testemunhas valem os mesmos princpios de consentimento informado que para as vtimas (Ver Parte I, Captulo 2.3). Esse fato particularmente vlido quando se toma uma declarao escrita. No caso de um comentrio informal de uma possvel testemunha que no se pretende citar, talvez no seja necessrio entrar em detalhes, conforme as circunstncias. Mas preciso lembrar de jamais citar o nome de uma pessoa sem seu consentimento.

Tal como com as declaraes da pessoa que denuncia torturas, as declaraes escritas das testemunhas devem ser assinadas e datadas pela testemunha e pela pessoa que toma a declarao.

5.4. Outros tipos de provas

No existe uma lista de outros tipos de provas comprobatrias. O tipo de prova que se queira utilizar depender muito da denncia que se busca demonstrar, e dever ser identificado em um julgamento, caso a caso. Por um lado, deve-se tentar identificar o que corrobora o caso em questo e, por outro, qual a prova objetiva que ajudar a demonstrar como a denncia se encaixa na situao geral. Vale a pena ser criativo, e as possibilidades so enormes. A seguir, so listados alguns outros tipos de prova:

Reportagens dos meios de comunicao: Essa prova deve ser utilizada com certa cautela, e geralmente insuficiente para iniciar uma reclamao, mas pode ser muito til para fornecer uma prova independente de que ocorreu o incidente ou para dar uma indicao sobre uma situao geral.

Relatrios de especialistas: Trata-se, sobretudo, de relatrios forenses ou mdicos, relatrios de balstica, ou qualquer outra forma de investigao ou testemunho especialistas, realizada por encomenda.

Declaraes e relatrios oficiais: Os pareceres de relatrios elaborados durante investigaes ou visitas nacionais especiais de organismos internacionais - por exemplo, de um relator especial da ONU ou uma delegao da T - podem ser utilizados para fornecer uma fonte de informao mais oficial. Tambm podem ser utilizadas as resolues adotadas pelos organismos internacionais que expressam sua preocupao sobre a situao de um pas, como as resolues da Comisso da ONU sobre os Direitos Humanos, a Assemblia Geral da OEA ou o Parlamento Europeu. Quanto aos casos de deportao, o Alto Comissariado da ONU para os Refugiados pode proporcionar valiosa informao. O Departamento de Estado dos Estados Unidos tambm elabora relatrios anuais sobre a situao dos direitos humanos em todo o mundo.

Qualquer prova de uma prtica de torturas no pas ou regio em questo: Esse material aumenta a credibilidade da denncia, uma vez que demonstra a existncia de precedentes do tipo de comportamento denunciado. Isso de suma importncia nos casos em que o objetivo impedir a deportao de uma pessoa para um pas onde corre o risco de sofrer torturas; embora a pessoa possa demonstrar que corre perigo, ser mais fcil se for possvel demonstrar que a tortura uma prtica habitual no pas em questo.

Essa informao pode ser encontrada com mais facilidade nos relatrios das ONGs. Entretanto, o valor desses relatrios varia em funo da reputao da organizao. Os relatrios que tendem a exagerar a situao de um pas tero pouco peso, e os relatrios de ONGs nacionais devem ser tratados com certa prudncia porque, apesar de apresentarem uma opinio muito prxima da realidade, pode-se ficar com a sensao de que so menos objetivos. Entretanto, caso sejam os nicos relatrios disponveis, no h a menor dvida de que devem ser apresentados. Contudo, a melhor opo utilizar, sempre que possvel, os relatrios das grandes ONGs internacionais, que gozam de credibilidade mundial devido sua exatido e veracidade. Pode-se, ainda, complementar a informao com relatrios de ONGs menores e nacionais.

Investigao especfica: Se o objetivo demonstrar um determinado tema, os padres podem ser igualmente identificados por meio de investigaes particulares. Por exemplo, pode-se tentar demonstrar a existncia de uma tolerncia oficial da tortura reunindo um nmero significativo de casos nos quais no foi iniciado um processo judicial, nem os autores de torturas foram considerados culpados, apesar de existirem slidas provas a respeito; ou pode-se encontrar um especialista mdico disposto a testemunhar que observou na regio muitos casos de leses decorrentes de torturas.

Cpias de decises nacionais: Se o propsito apresentar um caso perante uma das instncias de reclamao internacional (Ver Parte III, Captulo 3), deve-se demonstrar que a vtima no pde obter uma soluo jurdica no mbito nacional. Para tanto, deve-se fornecer cpias de todas as decises nacionais, quer sejam judiciais ou istrativas, adotadas no caso. Isso inclui as decises de no abrir um processo nem instaurar um inqurito, e as cpias de todas as peties apresentadas pela vtima ou pela famlia da vtima, bem como todos os veredictos dados pelos tribunais.

RESUMO

PARTE II - DOCUMENTAO DAS DENNCIAS

Princpios bsicos de documentao

Ao documentar denncias, deve-se:

Tentar obter informao de boa qualidade: Dentre os fatores que contribuem para a qualidade da informao incluem-se a fonte da informao, o nvel de detalhe, a ausncia ou presena de contradies, a ausncia ou presena de elementos que corroborem ou refutem a denncia, at que ponto a informao estabelece um padro, e a poca da informao.

Fazer o necessrio para maximizar a exatido e a credibilidade da informao: Aumentar a exatido e a credibilidade tomando precaues gerais, buscando a corroborao de casos especficos durante a entrevista e depois dela, e exercendo o bom senso.

Entrevista da pessoa que denuncia torturas

Entrevistar uma pessoa que faz uma denncia de torturas uma tarefa difcil e delicada, mas pode ser simplificada se preparada com antecedncia. Deve-se revisar o texto principal minuciosamente antes de realizar uma entrevista.

Durante toda a entrevista, deve-se ponderar:

A necessidade de obter uma explicao til e a importncia de respeitar as necessidades da pessoa que se entrevista.

A necessidade de obter todos os detalhes possveis e a importncia de no direcionar excessivamente a explicao.

Antes de comear a entrevista, deve-se pensar a respeito das seguintes consideraes: consentimento informado; como comear a entrevista; anotaes; quem deve dirigir a entrevista; o uso de intrpretes; fazer com que o entrevistado se sinta mais a vontade; tratar com as pessoas que tm medo de falar; realizar entrevistas em locais de deteno coletiva; como tratar um tema to sensvel; maximizar a credibilidade da informao; composio de homens/mulheres da equipe de entrevista; entrevista de crianas (ver texto principal para maiores informaes)

Informaes que devem ser registradas

A informao deve assinalar:
QUEM fez O QUE em QUEM?
QUANDO, ONDE, POR QUE e COMO?

Deve:

Identificar a vtima ou vtimas

Identificar o torturador ou torturadores

Descrever como a vtima chegou s mos dos representantes oficiais

Explicar onde foi presa ou mantida a vtima

Descrever as condies de deteno

Descrever a forma dos maus tratos

Descrever a resposta oficial sobre o incidente

Para obter esses detalhes sem influir no contedo da explicao, deve-se evitar formular perguntas que sugiram as respostas; comear sempre com perguntas abertas ou gerais (pergunta cuja resposta ilimitada, por exemplo: "aconteceu alguma coisa?" em vez de "sofreu torturas?") e tornar-se mais especfico em funo da informao fornecida. (Ver estudo de caso)

Ter presente que os diferentes contextos de entrevista podem exigir abordagens diferentes. (Ver texto principal para maiores informaes)

Provas

Ao apresentar uma denncia, o objetivo deve ser sempre o de proporcionar o maior nmero possvel de provas fundamentadas; isso ajuda a convencer outras pessoas da sinceridade tanto do entrevistador quanto da vtima,e a dissipar todas as dvidas que o entrevistador ou outras pessoas possam ter sobre a veracidade da denncia. Alm disso, trata-se de um requisito para certas aes, sobretudo em procedimentos judiciais.

Formas habituais de provas:

Provas mdicas: Fsicas ou psicolgicas, ou ambas.

Uma declarao da pessoa que apresenta a denncia: Pode ser uma declarao escrita oficial ou um questionrio.

Prova testemunhal: Inclui testemunhas do incidente real de tortura, da deteno da vtima, da condio fsica da vtima, prvia ou posteriormente a qualquer perodo de deteno, ou de comportamentos ameaadores por parte das autoridades antes da deteno da vtima. A melhor maneira de identificar possveis testemunhas por meio de uma anlise cronolgica dos fatos com a vtima, perguntando a ela quem, se que havia algum, estava presente em cada etapa.

Outros tipos de provas podem incluir: reportagens da mdia, relatrios de especialistas; declaraes e relatrios oficiais; qualquer prova de prtica de tortura no pas; investigao especfica; cpias de decises nacionais, istrativas e judiciais.

PARTE III - AES DIANTE DA INFORMAO COLETADA

1. Introduo s Possveis Linhas de Ao

1.1. Ao no mbito internacional

1.2. Ao no mbito nacional

2. O Que se Deve Saber Sobre os Mecanismos Internacionais de Denncia e Como Utiliz-los

2.1. Que tipo de caractersticas gerais deve ter seu comunicado?

2.2. Apresentao de informao a um rgo de monitoramento: o que seu comunicado deveria incluir?

2.3. Apresentao de informao no contexto do procedimento de relatrio estatal

2.4. Apresentao de informao a um rgo de apurao de fatos

3. O Que se Deve Saber Sobre os Procedimentos Internacionais de Reclamao e Como Utiliz-los

3.1. O que se pode procurar conseguir com os procedimentos de reclamao particular?

3.2. Quais tipos de reclamao os procedimentos de reclamao particular podem examinar?

3.3. Como funcionam os procedimentos de reclamao particular?

3.4. O que uma deve conter uma requisio em um procedimento de reclamao particular?

3.5. Dicas prticas para utilizao dos procedimentos de reclamao particular

4. Mecanismos e Procedimentos: Naes Unidas

4.1. Introduo ao sistema das Naes Unidas

4.2. Mecanismos de denncia no mbito do sistema das Naes Unidas

4.3. Procedimentos de reclamao no mbito do sistema das Naes Unidas

5. Mecanismos e Procedimentos: Esfera Regional

5.1. O sistema europeu

5.2. O sistema interamericano

5.3. O sistema africano

5.4. Outras regies

6. Tabelas de Avaliao Comparativa dos Procedimentos Internacionais

7. Onde se Pode Obter Mais Ajuda?

7.1. Por que seria desejvel obter mais ajuda?

7.2. Fontes especficas de ajuda

1. INTRODUO S POSSVEIS LINHAS DE AO

Uma vez concluda a coleta da informao bruta, ser necessrio pensar em selecionar o lugar mais adequado para onde envi-la e como apresent-la do modo mais propcio a que se obtenha o resultado desejado. Este captulo identifica e avalia as possveis linhas de ao e apresenta orientaes sobre como otimizar seu uso.

De um modo geral, seu ponto de partida ser buscar uma soluo no mbito do sistema nacional, principalmente quando a informao estiver relacionada a um caso particular. Por razes prticas, este manual se concentra na obteno de solues jurdicas no mbito do sistema internacional, mas isso no significa que os recursos nacionais no devam ser usados. Ao contrrio, h muitas razes pelas quais eles deveriam ser usados sempre que possvel:

importante fortalecer e consolidar as instituies nacionais para se alcanar progresso no longo prazo na situao de direitos humanos em um pas.

Nos casos em que os recursos nacionais so eficazes, eles geralmente identificarm satisfao mais imediata e direta aos reclamantes do que os procedimentos internacionais, que podem levar um longo tempo para chegar a uma concluso.

Nos termos do direito internacional, considera-se que os Estados deveriam ter uma oportunidade de reparar qualquer violao de direitos humanos pela qual sejam responsveis antes de qualquer interveno por parte dos organismos internacionais; por conseqncia, os procedimentos internacionais de reclamao particular geralmente exigem que tenham sido esgotados os recursos nacionais (Ver Parte III, Captulo 3.3.2.2 para uma explicao deste requisito) antes de aceitarem examinar a reclamao.

mais adequado iniciar uma ao no mbito internacional nos casos em que:

Os recursos nacionais so ineficazes ou no podem proporcionar uma soluo satisfatria em um caso particular.

Seu objetivo alertar a comunidade internacional sobre a situao de direitos humanos em um pas, tanto em geral como em relao a aspectos especficos.

1.1. Ao no mbito internacional

No mbito internacional, muito amplo o conjunto de mecanismos aos quais se pode solicitar assistncia com relao a uma denncia de tortura e outras formas de maus tratos. Este manual - e, em particular esta parte do manual - concentra-se nesses procedimentos internacionais aos quais possvel enviar informao e cuja funo consiste em comentar se um Estado respeitou ou no suas obrigaes relativas tortura nos termos do direito internacional. Isso se deve ao fato de que eles so responsveis por supervisionar a implementao do sistema internacional para a proteo dos direitos humanos; por meio desses procedimentos que podem ser invocadas as obrigaes de um Estado nos termos do direito internacional para se obter uma resposta formal ou oficial s denncias de tortura e obter algum tipo de soluo jurdica da violao. No entanto, importante no esquecer que tambm existem fontes adicionais de assistncia s quais possvel recorrer em busca de assessoramento, apoio ou outras formas de assistncia, particularmente se o recorrente se sentir vontade utilizando um procedimento formal. Essas fontes de ajuda so comentadas na Parte III, Captulo 7.

1.1.1. Conjunto de procedimentos internacionais

Existem muitas possibilidades de ao no mbito internacional. Existem mecanismos criados pelas Naes Unidas que podem examinar a situao de pases em todo o mundo. Tambm existem outros mecanismos criados no mbito de uma organizao regional que somente podem atuar com relao aos Estados da respectiva regio. Existem mecanismos que foram criados para examinar somente questes relativas tortura (especficos de tortura) e outros que esto capacitados para examinar questes mais gerais de direitos humanos, que incluem a tortura. As formas pelas quais os mecanismos desempenham suas funes podem variar muito de um mecanismo para outro. A melhor maneira de distinguir um organismo de outro considerar sua origem (isto , como foram criados) e suas funes.

1.1.1.1. Origem do mecanismo

Nem todos os mecanismos podem ser utilizados com cada pas. A origem do mecanismo importante porque indica sobre quais pases possvel receber acusaes. A principal diferena reside entre organismos de tratados e mecanismos que no so de tratados.

Os organismos de tratados so aqueles criados por um acordo juridicamente vinculante entre Estados, a exemplo de um contrato. Esse tipo de acordo geralmente denominado tratado, mas tambm pode receber outros nomes, tais como conveno, pacto ou carta. Os organismos de tratados so constitudos para supervisionar o cumprimento de um acordo por parte dos Estados que dele so parte (isto , os que acordaram respeit-lo). A Conveno das Naes Unidas contra a Tortura, por exemplo, estabelece uma srie de obrigaes que os Estados Parte devem respeitar, e tambm criou um organismo de superviso chamado Comit contra a Tortura, cuja tarefa consiste em comprovar que essas obrigaes so respeitadas. O aspecto mais importante que se deve ter presente que se algum deseja enviar uma denncia de tortura a um organismo de tratado, a primeira coisa que se deve fazer certificar-se de que o pas sobre o qual se apresenta a denncia parte do respectivo tratado. Uma vez que o organismo de tratado foi criado mediante acordo, ele no pode examinar a situao de Estados que no so parte desse acordo.

Os mecanismos que no so de tratados so aqueles que no so constitudos com o objetivo especfico de supervisionar um determinado tratado. Podem ser um organismo poltico constitudo por representantes estatais, como a Comisso das Naes Unidas sobre os Direitos Humanos, ou ainda mecanismos criados por uma resoluo (deciso oficial, normalmente adotada por voto) desses rgos polticos. Isso significa que o mecanismo tem automaticamente o poder de examinar a situao dos Estados que integram o respectivo organismo intergovernamental, sem a necessidade de esses Estados darem seu acordo por escrito. A Comisso da ONU sobre Direitos Humanos, por exemplo, criou a figura do Relator Especial sobre Tortura mediante uma resoluo. Isso significa que o Relator Especial pode examinar e receber denncias de qualquer Estado Membro das Naes Unidas. Como se pode ver, os organismos que no so de tratados podem receber denncias de mais Estados porque no se limitam queles que firmaram um acordo especial.

A origem do mecanismo tambm pode limitar, de outra maneira, os Estados que podem ser supervisionados. Quando um organismo criado no contexto de uma organizao intergovernamental, normalmente ele se destina a aplicao somente aos Estados que integram essa organizao. Esse critrio tambm vale para os mecanismos de tratados e para os mecanismos que no so de tratados. Isso significa que:

Quando uma organizao intergovernamental for regional, isso geralmente limitar o trabalho do mecanismo para os Estados dessa regio. Por exemplo, somente os Estados Membros da OEA podem ser parte da Conveno Americana de Direitos Humanos e aceitar a superviso do Tribunal Interamericano de Direitos Humanos. A nica exceo seria se os Estados que instituram o mecanismo acordassem possibilitar que Estados de fora da organizao ou da regio se tornassem partes, como poder em breve acontecer no mbito da Conveno Europia para a Preveno da Tortura.

Quando um mecanismo criado no contexto de uma organizao mundial, como as Naes Unidas, ele est aberto a qualquer Estado Membro da organizao em todo o mundo. No caso da ONU isso equivale a praticamente quase todos os pases do mundo.

1.1.1.2. Funes do mecanismo

Muitos dos organismos descritos neste manual desempenham mais de uma funo. No se deve pensar que recebem somente denncias particulares. Muitos dos mecanismos tambm foram concebidos para tratar de uma situao mais ampla a fim de, em ltima instncia, gerar efeitos preventivos. importante compreender as diferenas entre as vrias funes porque cada um responde a diferentes formas de informao e proporciona diferentes tipos de solues. Assim sendo, preciso certificar-se de que, por um lado, sua informao esteja em uma forma qual o mecanismo pode responder e que, por outro lado, o mecanismo pode proporcionar-lhe o tipo de soluo desejada. As principais funes dos mecanismos podem ser divididas, em linhas gerais, em dois tipos: funes de elaborao de relatrios e procedimentos de reclamao.

As funes de elaborao de relatrios compreendem:

Considerao dos relatrios estatais: Certos organismos de tratados recebem e analisam relatrios elaborados pelos Estados Parte sobre a situao em seu pas e o modo como tm procurado efetivar suas obrigaes assumidas no tratado. O organismo de tratado, em seguida, apresenta seus comentrios sobre o relatrio e emite recomendaes com vistas a melhorar a situao. Esses comentrios e recomendaes geralmente so de natureza pblica.

Monitoramento: Certos mecanismos de tratados e mecanismos que no so de tratados podem se ocupar das funes de monitoramento, muitas vezes de um ponto de vista especifico. Pode ser tanto a situao mundial como regional no que se refere a uma questo especfica, por exemplo, a tortura ou violncia contra mulheres, ou a situao geral de direitos humanos em determinado pas. Normalmente, isso envolve o recebimento e a anlise de informao sobre denncias particulares e gerais para se poder elaborar um relatrio sobre a situao.

Apurao dos fatos: Certos mecanismos de tratados e mecanismos que no so de tratados tambm podem desempenhar uma funo de apurao de fatos e podem visitar pases, periodicamente ou atendendo a circunstncias especficas de cada caso, quando se considerar que constituem motivo de preocupao.

Os procedimentos de reclamao compreendem:

Recebimento e processamento de reclamaes particulares: Essa uma funo desempenhada unicamente pelos organismos de tratados. Ao contrrio da funo apresentao de relatrios, em que tambm podem ser recebidas denncias particulares, embora seja usada essencialmente como meio para se compreender uma situao mais geral, um procedimento de reclamao um processo judicial ou comparvel a um litgio. O foco da ateno incide na denncia particular propriamente dita e seu objetivo demonstrar que um Estado violou os direitos humanos de uma pessoa ou pessoas nos termos do tratado aplicvel. como levar um caso perante um tribunal: trata-se de um processo formal que funciona segundo um procedimento definido a ser seguido.

Recebimento e processamento de reclamaes interestatais: De acordo com este procedimento, os Estados podem apresentar reclamaes contra outros Estados, denunciando violaes de seus compromissos ou suas obrigaes de direitos humanos. Esta funo pode ser desempenhada tanto por organismos de tratados como por outros que no sejam de tratados. Este manual no discute este tipo de procedimento de reclamao porque normalmente ele no permite a participao de uma ONG.

Tabela 1: Resumo de Mecanismos Internacionais Por Origem e Funo

Mecanismo
Origem
Funes

Tratado
No-tratado
Regional
Mundial
Elaborao de Relatrios
Reclamaes Particulares

Relatrios

Estatais
Monitora-mento
Apurao dos Fatos
Opcional
Obriga-

trio

Comit Contra a Tortura

Naes Unidas

?*


Comit de Direitos Humanos

Naes Unidas


Comit dos Direitos da Criana

Naes Unidas

?*

Comit para a Eliminao da Discriminao contra a Mulher

Naes Unidas

?*

Comit para a Eliminao da Discriminao Racial

Naes Unidas


Relatores Especiais da Comisso da ONU sobre Direitos Humanos

Naes Unidas


Procedimento 1503

Naes Unidas

Tribunal Europeu de Direitos Humanos

Conselho da Europa

Comit Europeu para a Preveno da Tortura

Conselho da Europa (Ver nota 1)


Comisso Interamericana de Direitos Humanos

Organizao dos Estados Americanos



Tribunal Interamericano de Direitos Humanos

Organizao dos Estados Americanos

Comisso Africana de Direitos Humanos e dos Povos

Organizao da Unidade Africana





Nota 1: possvel que num futuro prximo seja adotado um protocolo do Comit Europeu para a Preveno da Tortura, o que possibilitar que Estados que no integram o Conselho da Europa sejam parte da conveno.

Nota ?*: Essas funes estaro ou podero estar disponveis para esses mecanismos em um futuro prximo. Ver os comentrios especficos sobre cada mecanismo para maiores detalhes.

1.1.2. Como selecionar um procedimento internacional

A fim de selecionar um procedimento dentre os vrios existentes no mbito internacional, deve se considerar:

DISPONIBILIDADE: quais mecanismos lhe esto abertos?

ADEQUAO: quais mecanismos so os mais adequados a seus objetivos?

1.1.2.1. Disponibilidade: quais mecanismos lhe esto abertos?

Isso depender do pas sobre o qual se tem informao.

Conforme discutido acima, os mecanismos da ONU que no so de tratados podero se aplicar a todos os pases do mundo, sem que para isso seja necessrio seu consentimento. No entanto, os organismos regionais ou da ONU que foram criados por tratado so, por lei, aplicveis somente aos Estados que se obrigaram a esse tratado. No caso dos organismos regionais, normalmente o mecanismo ser limitado aos Estados da regio.

Alm disso, alguns dos tratados que estabelecem procedimentos de reclamao particular tornam esses procedimentos facultativos para os Estados Parte. Nesses casos, para que o procedimento de reclamao particular esteja disponvel com relao a um determinado Estado, no suficiente que esse Estado seja parte do tratado: ele deve, alm disso, dar seu consentimento expresso ao procedimento. Isso significa que um Estado pode ser parte de um tratado que estabelece um procedimento de reclamao particular mas no permitir essas reclamaes contra si mesmo.

Ademais, quando de sua adeso como parte de um tratado, os Estados geralmente tm a oportunidade de expressar uma reserva ao tratado. Uma reserva significa que o Estado no aceita os termos exatos do tratado, mas modifica uma ou mais de suas disposies como condio para aceitar o tratado. Deve-se sempre certificar no s que um Estado parte do tratado, mas tambm se o Estado em questo fez alguma reserva que possa ser relevante para o caso.

Isso significa que, a fim de identificar quais mecanismos aceitaro informao sobre um determinado pas, necessrio formular as seguintes perguntas:

O mecanismo foi criado por tratado especfico?

Em caso afirmativo:

O pas parte desse tratado? Se o for, o mecanismo aceitar a informao. Se no for, o mecanismo normalmente no poder responder informao.

Se existe um procedimento de reclamao particular, o pas aceitou esse procedimento? Caso tenha aceitado, o mecanismo pode examinar reclamaes particulares a seu respeito. Caso no tenha aceitado, o mecanismo pode receber informao sobre o pas no exerccio de suas demais funes, mas no pode ativar o procedimento de reclamao particular.

O Estado expressou alguma reserva ao tratado que possa modificar sua aplicao em seu caso?

Em caso negativo: Normalmente isso significar que o mecanismo foi constitudo por uma organizao intergovernamental.

O pas integrante dessa organizao intergovernamental? Se o for, o mecanismo aceitar a informao. Lembre-se de que os mecanismos das Naes Unidas que no so de tratados, em princpio, aceitaro informao sobre qualquer pas do mundo.

1.1.2.2. Adequao: quais mecanismos so os mais adequados a seus objetivos?

Uma vez identificados os mecanismos que lhe esto disponveis, ser preciso decidir o que se pretende conseguir apresentando a informao, a fim de selecionar o mecanismo ou mecanismos que tm mais probabilidade de alcanar seus objetivos. Siga as consideraes abaixo como orientao geral:

Tabela 2: Adequao dos Tipos de Mecanismos a Objetivos Possveis

Objetivo possvel
Tipo de mecanismo com mais probabilidades de xito

Objetivos gerais:


Chamar a ateno para uma situao/ demonstrar um padro
Qualquer mecanismo de elaborao de relatrios ou procedimento de reclamao

Buscar mudanas positivas em uma situao general
Qualquer mecanismo de elaborao de relatrio ou procedimento de reclamao

Combater a impunidade
Qualquer mecanismo de elaborao de relatrio ou procedimento de reclamao

Objetivos particulares:


Constatao de uma violao
Qualquer procedimento de reclamao

Responsabilizar o torturador
Qualquer procedimento de reclamao; mecanismo de elaborao de relatrios que se ocupe de denncias particulares

Reparao
Procedimentos de reclamao que podem conceder reparaes

Impedimento da deportao de uma pessoa para um pas onde se acredita que ela corre risco de sofrer torturas
Procedimentos de reclamao que podem ordenar ou recomendar medidas provisrias; mecanismos de elaborao de relatrios que se ocupam de denncias particulares

1.2. Ao no mbito nacional

Existem tantas variaes dentre os recursos nacionais, sua natureza exata, forma e procedimentos aplicveis quantos pases no mundo. Este manual no poderia se propor a descrever todos eles exaustivamente sem incluir muitos mais volumes. Por essa razo, esta parte do manual apresentar apenas algumas das linhas de ao que tm mais probabilidade de xito no mbito do sistema nacional, a fim de fomentar a conscincia sobre sua existncia. No entanto, aconselhamos enfaticamente o leitor a consultar um advogado nacional ou uma ONG nacional com mais experincia para obter maiores informaes sobre os recursos atualmente disponveis em um determinado pas, bem como a viabilidade prtica de seu uso.

As possveis aes no mbito nacional incluem:

1.2.1. Processos penais

Uma pessoa que denuncia ter sido submetida a maus tratos por parte de um representante pblico geralmente pode instaurar um processo penal apresentando uma denncia polcia, ao Ministrio Pblico da localidade ou a um tribunal local. Em muitos sistemas jurdicos nacionais, a instaurao de um processo somente se dar se o Ministrio Pblico decidir que assim apropriado, e uma vtima no pode ajuizar uma ao diretamente. O leitor dever consultar um advogado nacional para saber exatamente como funciona o processo no sistema do pas. O objetivo de um processo penal a punio do infrator, no a indenizao da vtima, e as possveis solues jurdicas incluem a condenao do perpetrador de torturas a uma multa, liberdade condicional ou priso.

O pessoal militar geralmente pode ser processado da mesma forma que qualquer outro representante oficial, mas tambm pode estar sujeito unicamente disciplina militar interna, como, por exemplo, a responsabilidade de um conselho de guerra (julgamento de pessoal militar perante um tribunal militar que aplica a legislao militar). Os processos de conselhos de guerra somente podem ser instaurados no mbito interno corporao, mas algum que denuncia torturas ou maus tratos por parte de um integrante do exrcito poderia apresentar uma requisio ao oficial superior, que, em um mundo ideal, estaria em condies de iniciar uma investigao. No se pode ignorar o fato de que em um pas onde o exrcito est no poder, o mais provvel que no se realize qualquer investigao, ou que a investigao se mostre ineficaz. No entanto, se o oficial superior no iniciar a investigao de uma denncia de torturas em conformidade com a legislao militar, isso poderia caracterizar omisso da responsabilidade de investigar uma denncia, bem como tolerncia oficial da tortura, de modo que convm ter presente este meio de investigao, inclusive se a vtima no puder inici-lo diretamente. Tal situao constitui igualmente uma violao do direito internacional de conflito armado (Ver Parte I, Captulo 3.6), uma vez que responsabilidade dos comandos investigar os casos de descumprimento das leis de guerra por parte de seus subordinados.

1.2.2. Processos civis

O processo civil deve fundamentar-se nas disposies de um cdigo nacional de obrigaes, em algum tipo de legislao ou no direito consuetudinrio. Essas disposies tratam de diversas questes, porm todas elas constituem uma forma de violao do dever geral que toda pessoa deve exercer em suas relaes com as demais. De um modo geral, os processos civis so um recurso utilizado por pessoas que querem obter uma compensao, geralmente econmica, da pessoa responsvel. Os processos so de natureza judicial e tramitam nos tribunais ordinrios.

1.2.3. Processos istrativos

Entre os exemplos de recursos istrativos que podem ser importantes para uma vtima de tortura inclui-se um requerimento dirigido a uma comisso de compensao criada para proporcionar compensao a vtimas de crimes violentos, ou uma requisio a uma autoridade de reclamao ou ouvidoria policial. Os processos istrativos no se do necessariamente perante um juiz ordinrio. Muitas vezes envolvem a tomada de deciso por parte de tribunais especializados ou oficiais que tm conhecimentos especiais ou a responsabilidade jurisdicional por uma determinada matria.

1.2.4. Processos disciplinares

Para od fins deste manual, os processos disciplinares relevantes so os da polcia, do exrcito, de outras divises das foras de segurana e os da istrao estatal. Trata-se de processos no-judiciais nos quais um caso examinado por um superior ou superiores dos representantes pblicos. Da mesma forma que com os processos militares, uma pessoa que denuncia torturas pode protocolar uma reclamao, porm a deciso de instaurar sindicncias s pode ser tomada internamente. Os tipos de sanes que podem ser impostas em processos disciplinares normalmente esto relacionadas ao trabalho e podem incluir a reteno de remunerao, suspenso temporria do emprego, transferncia para outro posto de trabalho ou mesmo a demisso.

1.2.5. Pedidos de asilo

A natureza geral do processo de asilo consiste em identificar as pessoas que tm um temor fundado de que sero perseguidas se regressarem para um determinado pas, que em geral o pas de sua nacionalidade. Nos termos da legislao geral sobre direitos humanos e de refugiados, os Estados tm a obrigao de no enviar essas pessoas de volta a tal pas. Em muitos casos, a base para se demonstrar a possibilidade de perseguio consistir em demonstrar que essas pessoas correm risco de tortura. Alm disso, os Estados Parte da Conveno contra a Tortura obrigam-se, nos termos da legislao de direitos humanos, a no expulsar uma pessoa para um pas onde se acredita que ela correr risco de tortura.

Em tais casos, o objetivo no ser demonstrar que o Estado no qual se encontra uma pessoa responsvel por um incidente de tortura, mas sim demonstrar que existe um risco se ela for deportada, a fim de se ativar a obrigao do Estado de no expulsar a pessoa. Os requisitos especficos podem variar de um pas para outro, mas, como regra geral, ser necessrio demonstrar que:

A pessoa corre risco pessoal de tortura (isto , no s que a tortura praticada naquele pas)

Que o risco persiste (isto , no s que existiu o risco, mas que o risco ainda existe)

Quando o risco de tortura se originar de agentes no-governamentais, pode ser mais difcil comprov-lo, mas existe uma corrente a favor de se colocar esse risco na mesma categoria que o risco proveniente dos agentes estatais para fins do processo de asilo (Ver Parte I, Captulo 3.6).

Se a solicitao de asilo for indeferida e se for fixada uma data para a deportao, deve-se ter presente que existe uma srie de mecanismos que podem adotar medidas provisrias, tais como uma petio ao governo para adiar a deportao at que o caso tenha sido considerado. O Relator Especial contra a Tortura tambm interveio algumas vezes nesses casos, enviando uma apelao urgente. Nenhuma dessas peties tem carter vinculante, mas elas do a um Estado respeitvel um bom tema para reflexo e geralmente so atendidas, pelo menos temporariamente.

1.2.6. Recursos extraordinrios

Em muitos pases, existem recursos extraordinrios aos quais as pessoas privadas de liberdade tm direito para questionar a legalidade de sua deteno perante uma autoridade judicial que tenha poder de ordenar sua liberdade. Algumas dessas figuras so o habeas corpus e o amparo. Essas solues jurdicas podem ser iniciadas mediante uma petio a um tribunal, por parte dos prprios indivduos interessados ou, se possvel, por parte de outra pessoa que atue em seu nome. Em alguns sistemas, pode ser necessria a interveno de um advogado. Essas peties geralmente podem ser feitas em qualquer momento e devem ter prioridade sobre outras questes do tribunal. Nos termos da legislao internacional de direitos humanos, esses recursos devem poder ser utilizados a qualquer momento, inclusive durante estados de emergncia. So particularmente importantes quando uma pessoa est detida em condies de incomunicabilidade, situao considerada como de maior risco de tortura.

Quando se entende que uma pessoa corre risco de tortura durante um interrogatrio, tambm possvel recorrer a um tribunal para um mandado de segurana (uma ordem judicial para que algum se abstenha de um determinado tipo de conduta) perante os representantes pblicos cabveis.

1.2.7. Outros procedimentos

Em alguns pases podem existir rgos oficiais especializados cujo nico objetivo examinar ou investigar possveis violaes dos direitos humanos. Alguns deles, como as instituies de ouvidoria pblica e comisses nacionais de direitos humanos, ocupam-se das violaes atuais, ao o que outros, como as comisses da verdade, tm por misso especfica a investigao de crimes de um determinado perodo do ado. Os procedimentos e poderes especficos mudam de um rgo para outro, mas normalmente podem ser encontrados na lei que disps sobre sua criao. Alguns podem decidir sobre casos particulares (certas comisses nacionais de direitos humanos), enquanto outros podem se ocupar mais de uma situao geral (comisses da verdade). Nem todos esses rgos so to eficazes e independentes como deveriam ser.

2. O QUE SE DEVE SABER SOBRE OS MECANISMOS INTERNACIONAis de denncia E COMO US-LOS

O termo "mecanismo de denncia" empregado no texto para designar:

Qualquer mecanismo internacional que recebe ou busca informao, ou ambas as coisas, para informar ou comentar se um Estado respeita suas obrigaes assumidas nos termos da legislao internacional de direitos humanos. A informao que o mecanismo de denncia recebe pode estar relacionada a acusaes gerais e particulares, mas o objetivo final obter um retrato preciso da situao geral e fazer recomendaes.

O objetivo principal dos mecanismos de denncia monitorar e avaliar o cumprimento, por parte dos Estados, para com suas obrigaes segundo a legislao internacional de direitos humanos.

O que podem fazer?

Receber e coletar informaes dos Estados e de terceiras partes para informar sobre a situao em um Estado (Monitoramento)

Examinar e comentar relatrios elaborados pelos prprios Estados e fazer recomendaes para melhorar a situao (Considerao dos relatrios estatais)

Realizar visitas de investigao aos Estados (Apurao dos fatos)

O que no podem fazer?:

Adotar decises juridicamente vinculantes

Conceder reparaes s vtimas

A informao prtica geral relacionada a cada uma dessas funes examinada a seguir. No entanto, existe muita variao quanto aos mtodos e poderes dos diferentes mecanismos, e todas as peculiaridades sero observadas durante a anlise dos mecanismos correspondentes na Parte III, Captulos 4 e 5.

2.1. Que tipo de caractersticas gerais deve ter seu comunicado?

Os mecanismos de denncia recebem muitssimas informaes que carecem de um grande nmero de fontes, boa parte das quais de qualidade duvidosa ou no possui o grau de detalhamento preciso para que sejam teis. A melhor maneira de se garantir que sua informao se sobressaia dentre as demais certificando-se de que seu comunicado :

vel

Equilibrado

Crvel

2.1.1. vel

possvel fazer com que a sua denncia seja vel prestando ateno ao idioma utilizado e extenso da apresentao.

Idioma:

A maioria das organizaes internacionais distingue entre idiomas oficiais e idiomas de trabalho. Como regra geral, ainda que os comunicados possam ser redigidos nos idiomas oficiais, a maioria dos integrantes da organizao poder trabalhar somente com os idiomas de trabalho. Ao mesmo tempo, muitas das organizaes dispem de recursos limitados, o que significa que a traduo nem sempre uma prioridade, sobretudo se no se souber do comunicado.

Para que seu comunicado receba a mxima considerao, deve-se fazer todo o possvel para apresentar seu comunicado em um idioma de trabalho (especificados para cada organizao na Parte III, Captulos 4 e 5); isso no significa que devam ser traduzidos todos os documentos de apoio, mas que sua carta introdutria deve ser redigida em um desses idiomas e que ela deve indicar claramente o contedo de cada um dos documentos anexados. Se no for possvel faz-lo, deve-se, pelo menos, apresentar um breve resumo em um idioma de trabalho que indique os elementos essenciais da informao ou reclamao. O que essencial depender do procedimento, mas, como regra geral, deve-se indicar:

1. A quem dirigido o documento

p. ex. Relator Especial contra a Tortura

p. ex. Comit contra a Tortura

2. Sua identificao

p. ex. ONG que trabalha com meninos e meninas de rua

p. ex. ONG que trabalha com pessoas que pedem asilo

3. Qual pas est sendo denunciado

4. O objetivo ou contedo de sua informao e se necessrio tomar medidas urgentes

p. ex. 10 acusaes de tortura de meninos/ meninas de rua, indicando o padro de maus tratos cometidos contra as vtimas por parte da polcia. Os maus tratos incluem espancamentos, estupro e simiulao de execues.

p. ex. Violao do Artigo 3 da CCT. A Sra. Y ser deportada para o pas X, onde provvel que sofra torturas. Sofreu vrias torturas 8 meses antes de sair do pas (inclusive choques eltricos e espancamentos, o que lhe causou uma fratura craniana; anexo o laudo mdico) e seu irmo ainda est no pas e foi preso recentemente e interrogado a respeito da reclamante. Deportao prevista para . (data) - URGENTE.

No suponha que o pessoal que receber sua denncia possui conhecimentos especializados; importante que eles compreendam o que voc est apresentando e os termos que para voc podem parecer simples, talvez no sejam compreendidos fora de seu pas. Certifique-se de que sempre seja usada uma linguagem simples e explique os termos especializados. Evite, em particular, o uso de abreviaturas e siglas, a menos que sejam explicadas.

Extenso das apresentaes:

Em geral, as apresentaes no precisam ter uma extenso especificada, mas ao preparar seu comunicado, tenha presente as limitaes do quadro de pessoal e do tempo disponveis. Isso significa que ele no deve ser mais longo do que o necessrio e, se exceder 8 a 10 pginas, apresente um resumo dos aspectos essenciais de modo que o pessoal possa facilmente ver se ele til.

2.1.2. Equilibrado e crvel

possvel fazer com que sua apresentao seja equilibrada e crvel apresentando-se e evitando alegaes sensacionalistas.

Apresente-se:

A resposta que sua apresentao obtiver depender muito da impresso que se der de sua organizao, sua confiabilidade e seus motivos para enviar a informao. muito melhor falar dessas questes diretamente em vez de deix-las para a imaginao do funcionrio do organismo que ler o comunicado. importante criar uma boa reputao voc e para sua organizao, de modo que, com o tempo, vocs se tornem uma fonte em que o organismo confia.

Se voc no tiver se apresentado anteriormente a uma organizao, possvel comear explicando seu mandato: faa-o no prprio comunicado ou, melhor ainda, inclua uma cpia de seus estatutos ou de um relatrio anual que contenha boas indicaes sobre suas atividades. Se for filiado a uma ONG internacional, registre o fato: isso proporciona um meio simples de se verificar suas credenciais. Lembre-se de explicar no s suas atividades, mas tambm seu propsito e objetivos. Em se tratando de uma organizao de orientao poltica, faa a meno: isso ajudar a contextualizar sua informao e tambm a demonstrar que no h nada a esconder. Explique seus mtodos de trabalho: como coletada sua informao? informao de primeira mo ou foi obtida de se ouvir falar ou de matrias publicadas na imprensa? O objetivo incluir toda informao que ajude o mecanismo a formar uma impresso exata de sua organizao e da qualidade de sua informao.

Seja objetivo:

Certifique-se sempre de que sua apresentao da informao seja equilibrada. Uma opinio objetiva e equilibrada de uma situao far com que seu comunicado seja muito mais vel de credibilidade e demonstra que o interesse de quem apresenta a informao apresentar a situao real, em vez de apenas um ponto de vista. Ainda que seja normal que a informao parea um tanto parcial quando se trata de demonstrar um padro sistemtico de violao, importante apresent-la em um contexto objetivo. Explique cuidadosamente as circunstncias antecedentes, de modo que no se possa pensar que a informao foi colocada fora de contexto (Ver Parte III, Captulo 2.2.1 para uma indicao do tipo de detalhes que se pode incluir). Isso inspira confiana no material e significa que a prxima vez que sua organizao enviar uma informao, ser reconhecido que ela provm de uma organizao que no ado demonstrou sua credibilidade.

Evite reclamaes sensacionalistas:

provvel que o uso de uma linguagem sensacionalista ou descries dramticas seja prejudicial a sua apresentao. Os mecanismos internacionais recebem muitos comunicados repletos de alegaes sensacionalistas que no contm fatos nem substncia. Um comunicado equilibrado e informativo, respaldado por exemplos, vai se sobressair dentre as muitas outras denncias infundadas e receber muito mais ateno.

2.1.3. Detalhado

Para que sua apresentao seja detalhada no necessrio que ela seja longa: preciso que seja informativa. Deve-se apresentar informaes suficientes para que um organismo internacional possa extrair suas prprias concluses sobre a prtica da tortura ou de maus tratos, ao mesmo em que seja o mais conciso e breve possvel.

preciso certificar-se de que os detalhes includos so relevantes, isto , que ajudam a corroborar sua denncia. Materiais extensos nos quais a denncia est muito "enterrada" e deve ser extrada dificultam o trabalho dos organismos internacionais, da mesma forma que as grandes quantidades de informao geral com poucos detalhes precisos. Concentre-se na incluso de todos os detalhes possveis relacionados s denncias propriamente ditas, e seja breve com o material geral, embora informativo: preciso documentar esse material geral para se estabelecer o contexto, mas ele no deve predominar ou ser o centro da ateno do comunicado.

2.2. Apresentao de informao a um rgo de monitoramento: o que seu comunicado deve conter?

O contedo de seu comunicado variar um pouco em funo daquilo que se procura provar. No entanto, possvel seguir as orientaes abaixo sobre o que se deve incluir.

2.2.1. Envio de informao geral a um rgo de monitoramento

Ao enviar informao geral a um mecanismo de denncia, procure estabelecer o contexto e demonstrar padres.

Estabelecer o contexto: muito difcil para qualquer mecanismo ter uma idia clara dos problemas de um pas ou fazer recomendaes teis se ele no tiver um bom entendimento do contexto em que esto ocorrendo esses problemas. de grande valia um resumo objetivo da situao geral no pas. Isso no significa fazer afirmaes generalizantes, acusando o Estado de violaes generalizadas dos direitos humanos; significa explicar brevemente as condies presentes no pas que podem afetar o respeito do Estado a suas obrigaes de prevenir a tortura. Os fatores relevantes so:

Os principais grupos polticos e sua respectiva situao, inclusive qualquer controvrsia sobre a chegada ao poder do atual governo e as principais rivalidades.

Quaisquer tenses entre grupos tnicos, sociais ou religiosos.

A existncia de um conflito armado e as partes envolvidas.

A estrutura e os poderes das foras de segurana e militares, principalmente se as foras armadas estiverem no controle.

Costumes, prticas e crenas tradicionais relevantes.

O quadro jurdico, em particular quaisquer leis que conferem poderes especiais, por exemplo, leis anti-terrorismo e outras leis relevantes.

O objetivo incluir os fatos que algum de fora precisa saber para compreender o que est acontecendo no pas.

Demonstrar padres: Em comparao com as denncias particulares, que dizem respeito aos resultados de um caso especfico, a informao geral deve esboar um panorama geral da prtica da tortura em um pas ou identificar um aspecto especfico dessa prtica.

Para demonstrar um padro, no basta:

Fornecer uma lista de alguns casos particulares.

Fazer afirmaes no-corroboradas sobre a prtica da tortura em um pas.

Ao contrrio, necessrio:

Utilizar todos os exemplos possveis.

Analisar as denncias particulares a fim de identificar padres.

Por exemplo, se for constatado que muitas de suas denncias esto relacionadas com a aplicao de choques eltricos em todo um pas ou violao de mulheres detidas em uma determinada delegacia de polcia, pode-se indicar que as acusaes, em seu conjunto, corroboram um padro: a aplicao de choques eltricos como mtodo habitual de tortura, ou o estupro de mulheres em uma determinada delegacia de polcia.

Outros padres aparentes que poderiam ser relevantes incluem uma alta coincidncia de torturas e outras formas de maus tratos entre suspeitos detidos a fora com base em uma determinada lei que permite a deteno em condies de incomunicabilidade, uma alta incidncia de tortura entre detentos de uma determinado grupo tnico ou social, a no-instaurao de processos judiciais contra autoridades acusadas de atos de tortura, um elevado ndice de mortes no-explicadas durante a deteno, ou relatos generalizados da tortura de mulheres ou crianas.

O objetivo demonstrar que certas formas de tortura, ou comportamento que favorece a tortura, no se limitam a uns poucos incidentes isolados, mas ocorrem com freqncia.

Ao apresentar suas constataes sobre os padres identificados, ser melhor:

Em primeiro lugar, resuma todos os padres identificados.

Em seguida, tome cada afirmao uma a uma e explique-a em termos gerais.

Aps cada afirmao, apresente todos os exemplos possveis para corroborar sua afirmao.

Tabela 3: Lista de Verificao para Apresentao de Informao Geral a um Mecanismo de Denncia

LISTA DE VERIFICAO: Apresentao de informao geral a um mecanismo de denncia

Sua apresentao compreende:
Uma breve introduo sobre os objetivos e mtodos de trabalho de sua organizao?

Um resumo do contexto em que se do as acusaes, particularmente o arcabouo jurdico?

Uma apresentao de todos os padres de violao identificveis?

Tantos exemplos detalhados quantos possveis? (Ver Parte III, Captulo 2.2.2 para orientaes sobre a informao a ser includa em cada denncia particular)

Toda a documentao de apoio disponvel?

Uma relao das pessoas ou organizaes locais que podem ser contatadas para se obter informao sobre o pas em questo?

2.2.2. Envio de uma denncia particular a um rgo de monitoramento

Se voc deseja enviar informao sobre uma denncia particular a um mecanismo de denncia, deve incluir, no mnimo, o seguinte sempre que possvel:

Nome da vtima: Deve incluir nome e sobrenome, a menos que o costume local seja usar somente um nome. O objetivo a identificao: se o nome muito comum, necessrio dar outros detalhes, tais como o endereo ou o local de domiclio, idade, sexo ou profisso. Esses detalhes sempre so valiosos e devem ser fornecidos, se conhecidos. A maioria dos mecanismos no pode tomar medidas em nome de uma pessoa no-identificada, que normalmente uma pessoa com nome e sobrenome. A nica exceo na qual os nomes no so necessrios seria quando se tratar claramente de um grupo identificvel - por exemplo, um grupo de 50 estudantes presos aps uma manifestao em frente prefeitura da cidade X no dia 19 de novembro de 1999 - , porm, se disponveis, os nomes sempre devem ser includos.

Data do incidente: Deve ser muito precisa e incluir tanto a data de deteno pelos representantes oficiais como a de todos os incidentes de tortura, se forem diferentes. As datas so importantes porque ajudam a entender a seqncia dos fatos. Quando se sabe o momento do dia (hora exata ou se ocorreu pela manh ou tarde) essa informao pode ser de grande ajuda.

Local do incidente: Deve incluir o nome da cidade, povoado ou distrito local e o nome do Estado ou regio, quando pertinente. Certifique-se de incluir o lugar de todos os incidentes de tortura e outros maus tratos, que podem incluir mais de um lugar se ocorreram vrios incidentes, bem como o lugar da deteno, se for diferente.

Suposto(s) torturador(es): Deve incluir o nome e o posto ou a graduao do torturador, se conhecidos, mas pelo menos a fora de segurana ou a fora armada envolvida ou a delegacia de polcia em que trabalha. Muitas vezes possvel identificar o grupo envolvido por sua farda. Lembre-se que o torturador precisa ter uma relao com o Estado: em uma rea em que se sabe serem freqentes as detenes por parte de militares ou policiais paisana, talvez no seja necessrio citar o nome dos autores, uma vez que ser possvel extrair uma slida deduo a partir das circunstncias que cercam o caso. Ver Parte I, Captulo 3.6 para uma anlise sobre o que fazer se a acusao estiver relacionada a agentes governamentais.

Detalhes do tratamento sofrido: Evite utilizar o termo "tortura" ou "torturado" sem descrever o tratamento. Nem todos os incidentes de tratamento desagradveis so to graves que constituem tortura em termos jurdicos, ainda que voc creia firmemente ser esse o caso. A melhor abordagem descrever o tratamento com todos os detalhes possveis. Dessa maneira, o organismo internacional poder determinar por si mesmo se ocorreu tortura no sentido jurdico. Quando a tortura foi fsica, devem ser includas descries do tratamento, de todos os instrumentos utilizados, das partes do corpo nas quais foi innfligido o tratamento e todas as leses sofridas. Por exemplo, em lugar de dizer que "o Sr. X foi espancado", que pode significar muitas coisas, muito mais informativo dizer "o Sr. X foi violentamente espancado no rosto e na cabea com uma barra de ferro, o que lhe provocou uma fratura craniana e perfurao do tmpano". Quando a tortura foi psicolgica, deve-se descrever em que consistiu, como a vtima se sentiu durante o incidente e posteriormente, e fornecer detalhes de qualquer maneira em que o comportamento ou o estado mental da vtima tenha sido visto alterado pelo tratamento, por exemplo se a vtima sofre pesadelos ou parania.

Embora haja uma quantidade mnima de detalhes que devem ser documentados, no existe uma quantidade mxima de detalhes relevantes. O que significa relevante? Basicamente, tudo o que ajude os organismos internacionais a entender o que aconteceu e permita que decidam se um Estado respeitou suas obrigaes. Uma vez que os Estados tm a obrigao de investigar e reparar os incidentes de tortura, essa obrigao inclui informao sobre o que ocorreu aps o incidente. Os detalhes que podem ser importantes e devem ser includos, se conhecidos, compreendem:

Idade, sexo e profisso da vtima: particularmente til mencionar se uma pessoa homem ou mulher, uma vez que para algum que no conhece o idioma local, isso pode ser difcil de se determinar.

Nmero da carteira de identidade.

Endereo ou local de domiclio.

Raa ou grupo tnico.

Quaisquer leses ou conseqncias duradouras sofridas.

A vtima teve o a um advogado e/ou mdico durante sua deteno?

A vtima apresentou uma denncia do incidente de tortura?

Se foi apresentada uma denncia, qual foi a resposta das autoridades estatais? Foi realizada uma investigao ou instaurado um processo judicial? Se foi instaurado um processo judicial, foi imposta alguma pena?

Tabela 4: Lista de Verificao para Apresentao de uma Denncia Particular a um Mmecanismo de Denncia

LISTA DE VERIFICAO: Apresentao de uma denncia particular a um mecanismo de denncia

Sua apresentao inclui:
Uma breve introduo sobre os objetivos e mtodos de trabalho de sua organizao?

Todos os detalhes possveis, mas pelo menos:

o nome ou outra caracterstica que identifique a vtima?

a data e o local do incidente(s)?

suposto(s) torturador(es)?

detalhes do tratamento sofrido?

(Ver acima para uma explicao mais detalhada)

Toda a documentao disponvel que corrobore os fatos?

Uma indicao clara de que o caso urgente se for solicitada uma ao urgente?

Uma indicao clara de todos os detalhes que so confidenciais?

2.3. Apresentao de informao no contexto do procedimento de relatrio estatal

2.3.1. Como funciona o procedimento de relatrio estatal?

O objetivo do procedimento de relatrio estatal ajudar os organismos de tratados (atualmente s se aplica aos comits de tratados das Naes Unidas) a obter um retrato fidedigno de at que ponto os Estados Parte esto respeitando as obrigaes por eles assumidas nos tratados, solicitando aos Estados que descrevam como esto implementando essas obrigaes. Os Estados tm a obrigao de apresentar relatrios periodicamente, embora muitos retardem a apresentao desses relatrios durante meses ou anos. Quando um organismo de tratado recebe um relatrio estatal, deve analis-lo cuidadosamente para identificar as reas de interesse. O relatrio analisado em uma reunio oficial aberta ao pblico. Durante essa reunio o Estado cujo relatrio est sendo analisado tem a oportunidade de apresentar seu relatrio e normalmente a comisso lhe solicitar que responda a perguntas originadas a partir do relatrio. Por fim, a comisso adotar suas concluses e far recomendaes ao Estado sobre como melhorar a implementao de suas obrigaes.

2.3.2. O que se pode conseguir apresentando informao no contexto do procedimento de relatrio estatal?

Os relatrios recebidos pelos organismos de tratados so elaborados pelos prprios Estados. Isso no significa necessariamente que sejam inexatos, mas que representam a opinio oficial de um Estado sobre uma situao. importante assegurar-se de que, quando os organismos de tratado chegam a suas concluses e fazem recomendaes, eles o faam com base em informaes que refletem com preciso a situao de um pas. A apresentao de informao confivel pode ajudar os organismos de tratados a:

chegar a concluses sobre a situao de um pas

formular as perguntas certas quando analisarem o relatrio do Estado

fazer recomendaes teis e adequadas situao

A anlise de um relatrio estatal por um dos organismos de tratados um fato significativo que recebe muita divulgao. Sua apresentao pode ajudar a garantir que as concluses que receberem essa divulgao sejam confiveis e atraiam a ateno para as reas de interesse real. Alm disso, quando se utiliza uma apresentao para fazer sugestes construtivas para melhorar a situao, muito possvel que essas sugestes influenciem as recomendaes do comit.

2.3.3. O que deve conter um relatrio de uma ONG no contexto do procedimento de relatrio estatal ?

Siga as orientaes gerais estipuladas na Parte III, Captulo 2.2.1, para a apresentao de informao geral a um mecanismo de denncia. Alm disso, uma vez que o procedimento de relatrio estatal inclui uma avaliao, por um organismo de tratado, de at que ponto as obrigaes assumidas em virtude de um tratado especfico esto sendo respeitadas, deve-se seguir as disposies desse mesmo tratado e as concluses anteriores com relao ao Estado, bem como o objetivo do procedimento.

Portanto, quando se prepara uma apresentao, deve-se levar em conta que:

Uma vez que o ponto de referncia usado pelo comit em sua anlise ser o prprio tratado, faz sentido elaborar seu relatrio em torno s disposies do tratado. Selecione aquelas sobre as quais dispe de informao e explique como esto sendo implementadas no pas. Isso garante que sero tratadas as questes de maior interesse para o comit e o ajuda a identificar os aspectos nos quais se deve concentrar. Uma vez que o Estado certamente apresentar informao sobre a situao jurdica oficial, legislao existente etc., a grande pergunta que voc dever responder ser, em geral, como funciona essa legislao na prtica.

Se o relatrio no for o primeiro a ser apresentado por esse Estado, tambm convm fazer referncia s concluses anteriores do comit sobre esse Estado, para ajud-lo a identificar as reas de interesse do comit. Deve-se comentar at que ponto as recomendaes do comit tm sido implementadas desde a anlise do ltimo relatrio.

Se houver um intervalo de tempo entre a publicao do relatrio estatal e sua anlise, pode ser til comentar o contedo do prprio relatrio estatal, se est de acordo ou no com ele (sempre apresente argumentos) ou se existe informao adicional que deveria ser apresentada perante o comit. Isso tambm lhe ajuda a centrar a ateno nos aspectos de maior utilidade para o comit. Certifique-se de que seu relatrio objetivo e no se concentra unicamente nos aspectos negativos: se o que o governo informou certo, isso deve ser reconhecido, e tambm devem ser reconhecidas as medidas que o governo pode ter tomado e que tenham alcanado certos resultados para melhorar a situao. Uma abordagem equilibrada reforar sua credibilidade e tambm permitir que o comit veja quais so as medidas que realmente parecem funcionar na prtica, o que o ajudar a fazer recomendaes em outros casos.

A menos que seja possvel faz-lo de modo muito conciso, no se deve procurar falar de todos os aspectos elaborados pelo governo ou contidos no tratado; concentre-se nas questes mais importantes. Lembre-se que melhor ser conciso sempre que possvel.

Procure apresentar o mximo possvel de exemplos e estatsticas precisas. A idia que se proporcione informao geral de modo que o comit possa chegar s suas prprias concluses. Isso significa que no se deve fazer afirmaes infundadas. Evite, por exemplo, afirmar que algo ineficaz sem dar exemplos especficos de porqu o .

Ajude a contextualizar suas denncias. Ver Parte III, Captulo 2.2.1 para sugestes sobre como descrever as circunstncias antecedentes gerais em um pas.

Procure sugerir algumas perguntas que o comit possa querer perguntar ao analisar o relatrio estatal. Isso pode ajudar o comit a identificar reas de interesse importantes que o relatrio estatal pode no ter aprofundado.

Por fim, no se esquea de apresentar sugestes construtivas para melhorar a situao. Muitas vezes quem apresenta a denncia est em melhores condies que o comit de saber quais medidas podem ter uma repercusso positiva na situao geral, e isso pode ser muito til ao comit. Alm disso, ajuda a mostrar que seus motivos no so meramente contestar o governo, mas genuinamente procurar melhorar a situao geral no pas.

2.3.4. Dicas prticas para apresentao de informao no contexto do procedimento de

relatrio estatal

Qualquer Estado Parte dos tratados de direitos humanos que estabelecem um procedimento de relatrio estatal tem o dever de apresentar esses relatrios: certifique-se que seu Estado parte.

Para saber quando se prev que seu pas apresentar um relatrio, entre em contato com a Secretaria em Genebra ou verifique sua pgina na Internet (Ver Apndice 2) para saber quais relatrios sero analisados na prxima sesso do comit. Normalmente a deciso tomada ao final da sesso anterior.

Nos ltimos anos, o nmero de Estados que apresentam relatrios comeou a diminuir. Se voc tiver conhecimento de problemas graves em um pas, vale a pena alertar os comits sobre os fatos, mesmo que o pas ainda no tenha apresentado um relatrio. Mas isso no deve substituir o envio da informao prximo data de anlise de um relatrio: os organismos de tratados recebem tanta informao que podem esquecer a informao recebida com muita antecedncia.

Quando souber que o relatrio de seu Estado ser analisado na prxima sesso, comece seu trabalho to logo possvel, de modo a dispor de muito tempo hbil para preparar sua apresentao.

O relatrio estatal deve estar disponvel ao pblico seis semanas antes da reunio da comisso: entre em contato com a Secretaria se desejar uma cpia ou verifique se est publicada na pgina do organismo na Internet. No espere at que o relatrio estatal esteja disponvel para comear a preparar sua apresentao, uma vez que ser necessrio muito tempo para pesquisa e elaborao de um bom relatrio.

Os comits recebem um grande volume de informao. A preparao das apresentaes em conjunto com outras ONGs uma boa forma de se reduzir a duplicao de esforos e chegar a uma apresentao mais completa. Os comits geralmente preferem receber uma nica apresentao completa e bem elaborada do que uma dezena de declaraes que repetem os mesmo pontos e omitem outros.

Se tiver a oportunidade de ir a Genebra para entregar sua apresentao pessoalmente, faa-o: isso tambm ajuda a diferenci-la das demais informaes recebidas e, alm disso, permite que voc possa chamar ateno para as partes mais importantes de sua apresentao. Tambm pode ajudar a criar uma impresso sobre sua pessoa e sua organizao, e de se esperar que seja uma boa impresso.

2.4. Apresentao de informao a um rgo de apurao de fatos

A informao a um rgo dedicado apurao de fatos pode ser proporcionada antecipadamente ou durante uma visita de apurao dos fatos. Isso afetar o foco de ateno que sua informao deve ter.

2.4.1. Apresentao de informao antes de uma visita de apurao de fatos

Antes de uma visita de apurao de fatos, deve-se proporcionar informao que ajude o rgo a programar e preparar sua visita. A considerao preponderante deve ser que as visitas para apurao de fatos costumam ser curtas demais para uma anlise de todos os aspectos da situao de um pas. Isso exige que os responsveis pelo planejamento e preparao de uma visita sejam seletivos. Sua informao deve ajudar o rgo de apurao dos fatos a identificar os aspectos da situao que so mais importantes e as atividades mais teis que podem ser realizadas durante a visita.

Sua informao deve ajudar o rgo a programar e preparar a visita das seguintes formas:

Identificando as reas de interesse que devem ser examinadas mais de perto.

Identificando as reas, cidades e instituies especficas que devem ser visitadas (aquelas sobre as quais so recebidas muitas denncias e que parecem ter os problemas mais graves).

Incluindo todos os detalhes possveis relacionados planta das instituies que devem ser visitadas e a localizao das salas ou reas dentro da instituio onde os atos de tortura so praticados com maior freqncia. s vezes, at possvel traar uma planta ou diagrama ou descrever o o sala de interrogatrio com base na informao fornecida pelas vtimas, principalmente nos casos em que se tiver recebido a mesma descrio por parte de mais de uma vtima, p. ex.: "Fui levado por uma porta atrs do balco da recepo principal da delegacia, que levou ao andar de baixo; descemos dois andares pela escada e viramos esquerda em um longo corredor. A sala onde me interrogaram era a ltima porta direita no final do corredor".

Explicando o contexto social e jurdico de um pas, com particular ateno para quaisquer leis especficas que parecem contribuir para o problema, por exemplo, legislao que permite longas detenes em condies de incomunicabilidade (deteno incomunicvel) ou que restringe a liberdade de se instaurar processo judicial contra representantes oficiais ou legislao ou jurisprudncia que permite o uso de confisses obtidas mediante tortura como provas perante um tribunal.

Identificando qualquer agente estatal ou parlamentar com quem seria muito importante falar: seja por estarem eles mesmos esto envolvidos em incidentes de maus tratos (por exemplo, quando se sabe que um mdico do governo emitiu laudos ou relatrios mdicos falsos, ocultando a presena de leses sofridas sob deteno policial; quando se sabe que um promotor pblico no inicia diligncias relativas a denncias de maus tratos contra representantes pblicos), seja por tentativas da parte do agente estatal ou parlamentar no sentido de abordar problemas de maus tratos (por exemplo, integrantes de uma comisso nacional independente de direitos humanos).

Fornecendo uma lista de contatos com os quais o rgo pode querer organizar reunies durante a visita, por exemplo, representantes de ONGs nacionais de direitos humanos (tais como as que atuam na defesa, denncia e reabilitao), associaes profissionais, como as de mdicos e de advogados, advogados que conhecem bem o sistema jurdico nacional ou que exercem uma representao ativa de vtimas, organizaes de assistncia a vtimas.

Informando o rgo se voc puder providenciar uma reunio com as supostas vtimas de tortura durante a visita.

2.4.2. Apresentao de informao durante uma visita de apurao de fatos

Durante a visita, caso no tenha sido proporcionada informao ao rgo de apurao de fatos antecipadamente, siga as orientaes sugeridas acima, bem como as consideraes a seguir. Voc mesmo precisa ser muito seletivo nessa etapa. O rgo de apurao de fatos ter uma agenda de trabalho muito apertada e suas reunies com as ONGs sero relativamente curtas.

O objetivo de uma visita para apurao dos fatos reunir FATOS. Nessa etapa, supondo-se que o rgo pde analisar a informao geral antes da visita, seu interesse maior provavelmente estar centrado em trs coisas:

Exemplos concretos do que realmente acontece na prtica.

Reunir-se com as supostas vtimas para documentar testemunhos pessoais; provavelmente ser melhor que a reunio ocorra em separado de sua reunio informativa inicial (embora isso dependa do programa da visita) e em um lugar que no intimide as vtimas. Isso deve ser conversado com os representantes do rgo de apurao de fatos, caso no tenha sido providenciado com antecedncia. Lembre-se de levar para a reunio fotocpias de qualquer documentao que corrobore as denncias da vtima, tais como relatrios mdicos ou sentenas judiciais.

A obteno dos nomes e da localizao das pessoas que foram presas recentemente, principalmente se estiverem sendo interrogados ou j o foram interrogados, e que possam ser visitadas enquanto detidas (seja na delegacia de polcia, seja em um centro de deteno preventiva para o qual tenham sido transferidos aps o interrogatrio). Tambm seria til identificar as pessoas que acabam de ser soltas e afirmam ter sido torturados. No caso de uma pessoa detida ter um representante legal, tambm seria til fornecer os dados de contato de seu representante legal.

Se voc estiver apresentando informao pessoalmente, voc deve:

Lembrar-se de abordar primeiro os pontos importantes, caso no haja mais tempo disponvel.

Escutar atentamente todas as perguntas que lhe forem feitas e respond-las com preciso, ainda que isso signifique que voc no possa falar de tudo o que havia preparado; as perguntas que lhe forem feitas so as que a delegao visitante mais precisa saber.

Preparar tambm uma apresentao por escrito e lev-la consigo para a reunio para servir de apoio a sua apresentao: caso no disponha de muito tempo, esse apresentao escrita deveria apresentar toda a informao necessria, o que ajudar os representantes do rgo de apurao de fatos a se lembrar de voc.

Levar cpias de qualquer documentao que explique quem voc e o que faz, por exemplo, um relatrio de atividades.

Evite usar a reunio para fazer declaraes polticas: se o fizer, voc no dispor de tempo para apresentar a informao de que o rgo de apurao de fatos realmente precisa.

3. O QUE SE DEVE SABER SOBRE OS PROCEDIMENTOS INTERNACIONAIS DE RECLAMAO E CoMO US-LOS

O termo "procedimento de reclamao" usado em todo o texto para designar:

Um processo oficial de tipo jurdico no qual uma pessoa ou grupo de pessoas apresenta uma reclamao ou queixa a um organismo jurdico internacional, alegando que seus direitos particulares foram violados em um caso especfico. Uma reclamao no mbito de uma procedimento dessa natureza tambm pode ser denominada requisio, petio ou comunicado.

Os mecanismos internacionais de reclamao foram concebidos para casos particulares de violao, por parte dos Estados, das obrigaes assumidas nos termos da legislao de direitos humanos, e no para examinar uma situao geral de direitos humanos. Funcionam de modo semelhante aos processos jurdicos nacionais e a eles esto associados mais requisitos oficiais do que aos procedimentos de denncia. Como regra, no forma pensados para servir como primeiro recurso, mas somente aceitam reclamaes nos caos em que no tiver sido possvel obter uma soluo jurdica no mbito nacional (quando os recursos nacionais tiverem se "esgotado", ver Parte III, Captulo 3.3.2.2). As decises adotadas no contexto dos procedimentos internacionais de reclamao geralmente so vinculantes para os Estados, mas difcil assegurar seu cumprimento.

A informao a seguir vale para todos os procedimentos particulares de reclamao como regra geral. Todas as excees encontram-se anotadas na anlise no exame do respectivo mecanismo na Parte III, Captulos 4 e 5.

3.1. O que se pode procurar obter com os procedimentos de reclamao particular?

Os procedimentos de reclamao podem:

Tratar casos individuais de violaes de direitos.

Dar ampla divulgao a casos particulares.

Ordenar ou recomendar medidas provisrias, tais como a no-expulso de uma determinada pessoa para um pas onde ela corre o risco de sofrer tortura.

Encarregar-se de certas formas de apurao de fatos e investigao.

Levar a decises juridicamente vinculantes.

Adotar constataes de violao em casos particulares.

Conceder uma reparao s pessoas.

Os procedimentos de reclamao no podem:

Tratar adequadamente um problema generalizado.

3.2. Quais tipos de reclamao os procedimentos de reclamao particular podem examinar?

Os procedimentos de reclamao particular podem examinar reclamaes:

Que estiverem relacionadas a uma suposta violao de uma disposio do respectivo tratado.

Nos casos em que a violao supostamente foi cometida por um Estado que tenha aceitado o procedimento de reclamao particular (e a competncia do organismo executivo para examinar as reclamaes particulares, caso seja necessrio, para tanto, o consentimento em separado, por exemplo, a competncia do Tribunal Interamericano de Direitos Humanos deve ser expressamente aceita, embora o procedimento de reclamao particular previsto na Conveno Americana de Direitos Humanos seja vlido para todas as partes).

Nos casos em que a violao supostamente tiver sido cometida contra uma pessoa ou grupo de pessoas sob a jurisdio do Estado e

Nos casos em que a reclamao for apresentada pela vtima, sua famlia ou um representante autorizado (que pode ser uma ONG).

Violao:

Um Estado pode incorrer em violao de suas obrigaes de direitos humanos no s por suas aes (a prtica deliberada de atos de tortura), mas tambm por suas omisses (p. ex., no tomar medidas efetivas para prevenir a tortura/ no processar os autores de atos de tortura/ no investigar denncias). Isso significa que uma suposta violao pode abarcar mais do que o incidente de tortura propriamente dito, e tambm poderia ser comprovada pelas circunstncias que cercaram o incidente.

Cabe destacar que embora alguns dos tratados analisados neste manual sejam especficos sobre a tortura, outros so de natureza mais geral e englobam mais direitos humanos. As reclamaes submetidas a um tratado geral podem denunciar violaes de mais de um direito. Por exemplo, se uma pessoa foi detida arbitrariamente e veio a falecer enquanto estava sob deteno em decorrncia das torturas, seria possvel denunciar violaes do direito liberdade e segurana da pessoa e do direito vida, alm do direito de no ser torturado.

Jurisdio:

Nos termos da legislao dos direitos humanos, os Estados se comprometem a respeitar e proteger os direitos de todas as pessoas sob sua jurisdio. Isso compreende, basicamente, todas as pessoas sobre as quais o Estado pode exercer controle, inclusive todas as que se encontrem dentro do territrio do Estado (inclusive estrangeiros, e no somente os cidados do Estado em questo), mas tambm pode incluir pessoas que so afetadas pelas aes dos representantes oficiais do Estado no exterior, por exemplo, pessoas afetadas pelas aes das foras armadas de um Estado em outro territrio.

3.3. Como funcionam os procedimentos de reclamao particular?

Cronologia bsica

Todos os procedimentos de reclamao particular baseiam-se nos mesmos os cronolgicos principais:

Recebimento de uma reclamao

Anlise inicial para se ter certeza de que:

1) a reclamao envolve um Estado Parte da respectiva conveno que aceitou o procedimento de reclamao particular

2) os fatos que so objeto da reclamao esto relacionados ao tema da conveno e

3) existe uma possibilidade real de ter ocorrido uma violao (isto , a alegao no absurda)

Avaliao da issibilidade da reclamao, por exemplo, a oportunidade para as duas partes apresentarem suas observaes (este o s vezes se funde com o seguinte; se for o caso, voc ser informado)

Anlise do mrito da reclamao, por exemplo, a oportunidade para as duas partes apresentarem seus argumentos e (dependendo de seus poderes especficos) para que o organismo internacional rena informaes sobre o caso que lhe ajudem a chegar a uma deciso. Isso pode incluir defesas orais ou escritas, ou ambas, investigao para apurao dos fatos e deliberao sobre provas de especialistas ou relatos amicus curiae.

Uma deciso do organismo sobre se ocorreu uma violao e (dependendo dos poderes do organismo) sobre quais solues jurdicas, se for o caso, devem ser concedidas.

Em qualquer etapa do processo, a maioria dos organismos que recebem reclamaes particulares pode:

Solicitar ou ordenar a adoo de medidas provisrias.

Colocar-se disposio das partes para a busca de uma soluo amistosa (acordo quanto a uma soluo satisfatria para ambas as partes e que torna desnecessria a continuao do processo).

Convm explicar alguns desses os.

issibilidade

3.3.2.1. O que issibilidade?

A etapa de issibilidade funciona como uma espcie de limiar: se um caso for declarado issvel, ele a a uma anlise do mrito, mas se for declarado inissvel, encerra-se a o caso.

Quando um rgo judicial examina a issibilidade de uma requisio, basicamente ele se pergunta se pode considerar o caso. No analisa se os fatos revelam uma violao da legislao internacional dos direitos humanos (isso o que ocorre na etapa do mrito); em vez disso, o que o rgo judicial faz, na etapa de issibilidade, perguntar se existe alguma razo que lhe impede de examinar o caso.

3.3.2.2. Por que uma reclamao poderia ser declarada inissvel?

As razes (os "argumentos") pelas quais um organismo internacional declara inissvel um caso so indicadas quando se considera esse mecanismo, mas muitas delas so comuns maioria dos procedimentos de reclamao particular. A maioria das razes envolve argumentos procedimentais, o que significa que no esto relacionados aos fatos do caso, mas sim forma como foi feita a requisio. As principais razes de inissibilidade so:

A reclamao annima.

O reclamante no a vtima e no obteve a autorizao da vtima ou da famlia da vtima para apresentar uma reclamao.

A requisio sobre fatos que ocorreram antes de o tratado entrar em vigor para o Estado em questo. Por exemplo, segundo o Artigo 27 da Conveno contra a Tortura, essa conveno entra em vigor (a a ser aplicvel) 30 dias aps o Estado a ratificar. Isso significa que se o Estado X ratificar a conveno (e aceitar o procedimento de reclamao particular) em 31 de maro de 2000, a conveno entrar em vigor para esse Estado em 30 de abril de 2000. A Comisso contra a Tortura somente pode examinar as reclamaes sobre fatos que ocorreram em ou a partir do dia 30 de abril de 2000.

O prazo limite para apresentao de uma requisio venceu. Como regra geral, o prazo limite comea a contar a partir do momento em que se toma uma deciso oficial definitiva. Pode ser a data do incidente nos casos em que no se buscou uma soluo jurdica (ver abaixo comentrio sobre o esgotamento de recursos nacionais), mas, em geral, trata-se da data da deciso de no processar, de uma sentena, da apresentao, pela vtima, de uma petio qual no se recebeu uma reposta, ou qualquer outra deciso que represente o o final no processo de busca de uma soluo jurdica no mbito do sistema nacional.

O comunicado incompatvel com as disposies da respectiva conveno.

A reclamao considerada manifestamente infundada ou um abuso do direito de apresentao. Esse o nico argumento de inissibilidade sobre o qual os rgos judiciais podem se referir aos fatos de um caso. Esse argumento avaliado caso a caso e aplicado quando se considera que os fatos poderiam no revelar a violao alegada, sendo, portanto, claramente uma denncia sem fundamento, para a qual o direito de apresentao no deveria ter usado.

Os fatos do caso j foram analisados por este ou outro procedimento internacional de soluo.

No se esgotaram os recursos nacionais.

O argumento mais comum para se declarar inissvel uma reclamao o no-esgotamento dos recursos nacionais, mas tambm o mais difcil de se ter certeza e deve, portanto, ser analisado mais detidamente.

O que significa "esgotamento dos recursos nacionais"?

Basicamente, significa que se a vtima de uma violao dos direitos humanos quer levar um caso particular perante um organismo internacional, ela deve, primeiro, ter procurado obter uma soluo das autoridades nacionais. Deve ficar comprovado que foi dada ao Estado uma oportunidade de solucionar o caso antes de se recorrer a um organismo internacional. Isso reflete o fato de que no se considera que os Estados tenham violado suas obrigaes de direitos humanos se eles proporcionarem solues reais e efetivas para as vtimas das aes de representantes estatais, em reconhecimento da possibilidade de certos indivduos terem um comportamento inaceitvel sem a aprovao de seus governos.

No entanto, os organismos internacionais reconhecem que, em muitos pases, os recursos podem no existir ou ser ilusrios. Por isso, foram criadas regras sobre as caractersticas que os recursos devem ter, a forma como devem ser esgotados os recursos e as circunstncias especiais em que no necessrio esgot-los.

Que tipo de recursos um reclamante deve ter esgotado?

Um reclamante deve ter esgotado qualquer recurso (quer seja de natureza jurdica, quer istrativa):

Disponvel: os recursos existem e a vtima (ou outra pessoa em seu nome) pode utiliz-los sem restries;

Eficaz: possvel que o recurso seja utilizado com xito;

Adequado: o recurso pode proporcionar uma reparao adequada reclamao; por exemplo, se uma pessoa vai ser deportada, um recurso que no pudesse suspender a deportao no proporcionaria uma reparao adequada.

Se os recursos nacionais existentes no cumprirem esses critrios, a vtima no dever necessariamente esgot-los antes de reclamar a um organismo internacional. No entanto, um reclamante deve poder demonstrar que esses recursos no atendem a esses critrios na prtica, no simplesmente na opinio da vtima ou na de seus representantes legais. possvel, por exemplo, que seja necessrio demonstrar que nenhuma pessoa que denunciou torturas e usou alguma vez um determinado recurso jamais obteve uma compensao. Se existe alguma dvida sobre a eficcia de um recurso, o reclamante deve poder demonstrar pelo menos que tentou utiliz-lo. Alm disso, se o recurso tiver se tornado indisponvel ou no mais vel de utilizao por uma falta do prprio reclamante (por exemplo, no caso de o reclamante no ter respeitado os prazos de apresentao de uma apelao, razo pela qual o procedimento de apelao no est mais disponvel e no pode ser utilizado), isso normalmente no seria aceito como justificativa para o no-esgotamento do recurso.

Se um reclamante deseja argumentar que um determinado recurso no deve ser esgotado porque no existe, ineficaz ou inadequado, o procedimento :

1. O reclamante afirma que o recurso no precisava ser esgotado porque ineficaz (ou indisponvel/ inutilizvel ou inadequado); isso ainda no precisa ser comprovado.

2. O Estado deve, ento, demonstrar que o recurso eficaz.

3. Se o Estado puder demonstr-lo, ento o reclamante deve demonstrar que ele efetivamente esgotou o recurso, ou que o recurso no poderia ter sido eficaz nesse caso especfico, ainda que pudesse s-lo em geral.

Como o recurso deve ter sido esgotado?

O motivo da reclamao perante o organismo internacional deve ser mencionado na reclamao tramitada perante as autoridades nacionais. A razo garantir que o Estado tenha tido a oportunidade de proporcionar uma reparao reclamao especfica que est sendo levada ateno do organismo internacional.

Por exemplo: um reclamante iniciou uma ao judicial na esfera nacional a fim de obter uma compensao por um ato de tortura e, durante o processo, no questionou a natureza da investigao policial da reclamao em nenhum momento. Se o tribunal no concedeu uma compensao porque a prova apresentada era insuficiente para demonstrar que ocorreu um ato de tortura e o reclamante afirma perante o Comit contra a Tortura que ocorreu uma violao da obrigao do Estado de garantir uma investigao rpida e imparcial de todas as acusaes de tortura, bastante possvel que essa reclamao no seja aceita porque ela nunca foi levantada perante as autoridades nacionais, ainda que seja possvel uma reclamao pela no-concesso de compensao.

Quando pode no ser necessrios esgotar os recursos nacionais?

Em circunstncias especiais, o organismo internacional pode considerar que os recursos nacionais no tinham necessariamente de ser esgotados, ainda que pudessem ser utilizados e fossem potencialmente eficazes e adequados. As circunstncias especiais podem ser:

Quando os recursos se prolongam injustificadamente, por exemplo, quando o processo judicial ou a investigao das denncias excessivamente longo, porm no por culpa do reclamante.

Quando no existe um poder judicirio independente.

Quando existe um clima geral de intimidao tal que no possvel obter uma representao legal.

Cada caso ser considerado com base em seus fatos, e os argumentos que em um caso tiverem sido rejeitados, s vezes so aceitos em outro, de modo que no se deve hesitar em ser criativo nos argumentos apresentados. No entanto, cabe uma palavra de advertncia: o desconhecimento dos recursos disponveis muito provavelmente no ser aceito como justificativa para o no-esgotamento. Certifique-se de estar plenamente informado de todos os recursos nacionais disponveis em cada caso.

3.3.3. Relatos amicus curiae/ Intervenes de terceiras partes

Amicus curiae significa "amigo do tribunal" e o objetivo desse relatrio (apresentao) ajudar o rgo judicial fornecendo-lhe informao que o ajude a tomar uma deciso. uma prtica que ainda no foi adotada no contexto dos mecanismos da ONU, o que no significa necessariamente que no vir a ser aceita no futuro, mas tem sido utilizada com relativa freqncia pelos Tribunais Europeu e Interamericano de Direitos Humanos.

Um relato amicus uma apresentao feita por uma terceira parte interessada no processo, ou seja, por um indivduo, uma organizao ou at mesmo outro Estado que no nem o reclamante, nem o Estado reclamado, nem, no caso de um parecer consultivo, o rgo ou Estado solicitante, mas sim uma parte que se considera pode contribuir significativamente para o processo. Em geral, essas intervenes so solicitadas explicitamente pelo tribunal, ou a terceira parte interessada procurar obter permisso para apresentar um relato, que o tribunal pode aceitar ou indeferir.

O contedo do relato propriamente dito variar de caso a caso, embora normalmente tratar de questes e situaes gerais, em vez de algo especfico de uma reclamao particular. No entanto, o requerimento de permisso ("licena") para se apresentar um relato amicus normalmente deve conter os seguintes elementos:

Explique brevemente quem voc e o que sua organizao faz.

Explique por que voc ou sua organizao est particularmente qualificado(a) para intervir, por exemplo, qualquer experincia especial na rea de relevncia ou em um determinado pas; um determinado projeto realizado sobre uma matria relevante etc.

Explique o que sua apresentao acrescentar ao processo, ou seja, resuma brevemente o que se pretende dizer e explique como isso contribuir e ser til ao tribunal.

3.3.4. Medidas provisrias

Quando um procedimento de reclamao particular permite a adoo de medidas provisrias, isso possibilita que, em qualquer etapa do processo, o rgo correspondente solicite ou ordene ao Estado Parte que tome medidas para evitar possveis danos irreparveis s pessoas relacionadas ao caso. A adoo de medidas provisrias no tem conseqncias para o resultado final do caso: no significa que o rgo tenha chegado a uma deciso sobre sua issibilidade ou mrito, mas meramente uma precauo para dar-lhe tempo para deliberar.

Essa funo utilizada de modo generalizado nos casos que envolvem a expulso iminente de uma pessoa para um pas em que se acredita que ela corre o risco de sofrer torturas. Nesses casos, trs critrios devem ser atendidos quando se apresenta um pedido de medidas provisrias:

Foram apresentados argumentos sobre a obrigao do Estado de no-expulso perante os tribunais nacionais.

A reclamao deve demonstrar que o indivduo est pessoalmente sob risco de sofrer torturas. No bastar afirmar que as pessoas em geral so torturadas no pas em questo: deve ficar demonstrado que h argumentos para se acreditar que essa pessoa em particular seria torturada naquele pas.

Deve-se demonstrar que h um risco contnuo que existe no presente. Normalmente no basta demonstrar que uma pessoa foi torturada em algum momento do ado. Ser necessrio demonstrar que o risco persiste, por exemplo, porque o nome dessa pessoa aparece na lista de pessoas-alvo, ou porque familiares que ainda vivem no pas foram torturados recentemente, ou talvez porque a pessoa um lder da oposio muito conhecido no pas.

3.4. O que deve conter uma requisio a um procedimento de reclamao particular?

Deve-se pensar em dois componentes de um comunicado. O primeiro sua carta introdutria, que deve conter um certo nmero de detalhes. Se no forem apresentados esses detalhes, voc ser solicitado a complementar sua requisio para que ela possa continuar a ser processada. O segundo componente a documentao de apoio.

Sua carta introdutria deve conter:

Nome, nacionalidade, profisso, endereo postal e do reclamante, ou o nome e a dos representantes legais ou de qualquer pessoa autorizada pela suposta vtima para atuar em seu nome. Se for possvel comprovar a identidade do reclamante (por exemplo, carteira de identidade nacional), deve-se anexar uma cpia do documento.

Cite o nome do Estado Parte contra o qual dirigido o comunicado.

Disposio ou disposies da conveno que supostamente foram violadas.

Uma explicao do ato ou atos denunciados (Ver Parte III, Captulo 2.2.2 para os detalhes que devem ser includos).

Uma indicao de que o Estado responsvel ou por ao ou por omisso.

Informao sobre os esforos realizados para esgotar os recursos nacionais e seus resultados, inclusive a sentena, se houve apelao da sentena e a data da sentena final, ou informao sobre a impossibilidade de esgotamento dos recursos.

Indicao de at que ponto a mesma matria est sendo examinada em outro procedimento internacional de investigao.

Uma indicao de qualquer parte do comunicado (inclusive nome do reclamante) que deve ser mantida em carter confidencial.

Procure sempre anexar toda a documentao de apoio possvel (Ver Parte II, Captulo 5) a seu comunicado. Essa documentao pode incluir:

Uma carta de autorizao: deve conter a da vtima ou explicar por que a autorizao foi dada pela famlia da vtima (Sempre inclua essa informao se a pessoa que envia o comunicado no nem a vtima nem um familiar da vtima).

Quaisquer peties ou reclamaes feitas s autoridades.

Quaisquer decises judiciais e istrativas do caso, inclusive as decises proferidas em todas as instncias do poder judicirio (primeira instncia, apelao, supremo tribunal), detalhes de quaisquer penas decretadas contra o torturador ou torturadores, quaisquer decises istrativas, inclusive as da autoridade policial de queixas, decises do promotor de no processar ou de no dar continuidade a um processo, decises quanto incompetncia para examinar um caso.

Declaraes da vtima.

Declaraes das testemunhas.

Laudos ou relatrios mdicos, inclusive avaliaes tanto fsicas como psicolgicas, se existentes.

Autpsias.

Fotografias.

Matrias divulgadas nos meios de comunicao.

Informao geral, por exemplo, relatrios de ONGs que indiquem a prtica da tortura.

Sempre envie cpias dos documentos, no os originais, uma vez que eles no lhe sero devolvidos.

Os documentos oficiais geralmente podem ser apresentados em seu idioma original, mas preciso indicar sua importncia; se possvel, apresente um breve resumo, em um dos idiomas de trabalho, do resultado do julgamento, por exemplo, ou das leses documentadas no laudo mdico.

3.5. Dicas prticas para utilizao dos procedimentos de reclamao particular

Sempre faa todo o possvel para respeitar os prazos dados pelos organismos internacionais: se voc sabe que no poder cumprir um prazo, sempre solicite uma prorrogao com antecedncia. A maioria dos organismos internacionais compreensiva quanto necessidade de prorrogao de prazos, mas logo podero perder a pacincia se voc no os mantiver informados.

Sempre declare claramente quais partes do comunicado so confidenciais, se houver.

Sempre declare CLARAMENTE na capa de seu comunicado se devem ser tomadas medidas urgentes.

Todos os organismos internacionais adotaram um "Regulamento" ou "Normas processuais" que estabelecem pormenorizadamente como funcionam e quais medidas podem adotar. Geralmente so textos bastante tcnicos, mas so a melhor fonte de consulta quando se quer a resposta para uma pergunta muito especfica sobre o procedimento.

Se voc estiver atuando como representante legal no contexto de um procedimento de reclamao particular, preciso assegurar-se de manter constante contato com o reclamante a todo o momento: muitas vezes necessrio contatar os reclamantes para obter informaes solicitadas com pouco tempo de antecedncia pelo organismo internacional, e cabe lembrar que eles tambm devem ser mantidos informados do andamento do processo.

4. MECANISMOS e PROCEDIMENTOS: NAES UNIDAS

4.1. Introduo ao sistema das Naes Unidas

Todos os mecanismos de direitos humanos das Naes Unidas baseiam-se e emanam do Escritrio do Alto Comissariado para Direitos Humanos (EACDH) na sede da ONU em Genebra. H dois aspectos gerais que devem ser conhecidos por quem deseja apresentar informao aos mecanismos da ONU. Um deles diz respeito aos idiomas e o outro distribuio.

Idiomas: A ONU tem seis idiomas oficiais (ingls, francs, espanhol, russo, chins e rabe), mas apenas trs idiomas de trabalho (ingls, francs e espanhol) e, na prtica, o idioma cujo conhecimento mais generalizado no Escritrio do Alto Comissariado para Direitos Humanos o ingls. Os recursos do EACDH, da mesma forma que os de muitas organizaes internacionais, so muito limitados. Ver Parte III, Captulo 2.2.1, para sugestes relativas ao idioma de apresentao de seu comunicado nessas circunstncias.

Tambm convm saber que a ONU tem normas complicadas para a traduo de documentos oficiais, o que significa que, em geral, um relatrio s se tornar pblico quando tiver sido traduzido para todos os idiomas oficiais. Isso s vezes pode criar longos atrasos e muitas vezes a razo pela qual um documento no chega antecipadamente s sesses da Comisso de Direitos Humanos.

Distribuio: Se voc deseja que seu comunicado seja enviado a mais de um procedimento do EACDH, o mtodo mais confivel voc mesmo enviar uma cpia a cada um deles. Por duas razes: 1) como qualquer organizao de grande porte, s vezes possvel ocorrer que a informao no seja ada de um procedimento a outro dentro do EACDH e 2) geralmente ser necessrio enfatizar diferentes aspectos para os diferentes procedimentos.

Se voc no disp dos recursos necessrios para enviar mais de uma cpia, deve-se indicar muito claramente quem voc quer que receba a informao, a fim de garantir que ela seja distribuda a todos os procedimentos que voc escolheu. Isso ser particularmente importante quando se quiser que a informao seja enviada a vrios Relatores Especiais (Ver Parte III, Captulo 4.2.1.2.1). Algumas organizaes que apresentam informao periodicamente ao EACDH elaboraram um formulrio padro com uma relao de todos os procedimentos disponveis e marcam os que elas desejam contatar em cada caso.

4.2. Mecanismos de denncia no mbito do sistema das Naes Unidas

4.2.1. Procedimentos No-regulados por Tratados das Naes Unidas

Os dois principais organismos responsveis por questes relacionadas aos direitos humanos dentro do sistema das Naes Unidas so: a Comisso de Direitos Humanos e a Subcomisso para a Promoo e a Proteo dos Direitos Humanos. Uma das maneiras pelas quais cumprem suas tarefas mediante a criao e superviso de procedimentos auxiliares que lhes ajudam na realizao de estudos, redao de documentos e monitoramento. Esses procedimentos auxiliares geralmente prestam contas de suas atividades Comisso ou Subcomisso de Direitos Humanos. Os procedimentos apresentados a seguir se inserem nessa categoria, foram criados pela Comisso de Direitos Humanos e dependem dela e da Subcomisso para fins de execuo.

A Comisso e a Subcomisso so dois organismos particularmente adequados ao exerccio do lobby de influncia (Ver Parte III, Captulo 7). Em ambos os casos, os integrantes ou Estados Membros podem ter uma influncia importante sobre as questes consideradas durante suas sesses, e o exerccio do lobby pode alterar as questes que estaro dispostos a apoiar. Essa uma forma muito eficaz de chamar a ateno para as violaes dos direitos humanos em um pas. Somente as ONGs que atuam em carter consultivo tm o direto Comisso e Subcomisso, mas algumas delas esto dispostas a ajudar outras ONGs a comparecerem s sesses. Ver Apndice 2 para dados sobre as ONGs com sede em Genebra que podem proporcionar assistncia.

Tabela 5: Dados Bsicos: Comisso de Direitos Humanos da ONU

DADOS BSICOS: Comisso de Direitos Humanos da ONU

Origem:
Como foi criada?
Mediante duas resolues de 1946 do Conselho Econmico e Social da ONU


Quando comeou a funcionar?
1947

Composio:
Quantas pessoas a compem?
Os representantes diplomticos de 53 Estados


Essas pessoas so especialistas independentes ou representantes estatais?
Representantes estatais

Objetivo:
Objetivo geral
Examinar questes relacionadas aos direitos humanos, tanto no que se refere aos Estados Membros como de um ponto de vista geral, e adotar medidas destinadas a melhorar a situao dos direitos humanos em todo o mundo.

Tabela 6: Dados Bsicos: Subcomisso da ONU para Promoo e Proteo dos Direitos Humanos

DADOS BSICOS: Subcomisso da ONU para Promoo e Proteo dos Direitos Humanos (anteriormente Subcomisso para a Preveno da Discriminao e Proteo das Minorias)

Origem:
Como foi criada?
Mediante uma resoluo de 1947 da Comisso da ONU de Direitos Humanos sob a autoridade do Conselho Econmicos e Social


Quando comeou a funcionar?
1947

Composio:
Quantas pessoas a compem?
26


Essas pessoas so especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes eleitos com relao a Estados especficos

Objetivo:
Objetivo geral
Realizar estudos, fazer recomendaes e elaborar normas relacionadas aos direitos humanos, a fim de remet-las Comisso de Direitos Humanos para consideraes suplementares e possvel adoo.

4.2.1.1. O Procedimento 1503

4.2.1.1.1. Como funciona o Procedimento 1503?

Nota: O procedimento 1503 atualmente est sendo revisado e podero ser introduzidas mudanas significativas num futuro prximo.

O procedimento 1503 deriva seu nome do nmero da resoluo da Comisso de Direitos Humanos que o criou. Seu objetivo examinar as denncias de violaes graves de direitos humanos em um pas a fim de identificar padres de violao. No responsabilidade de um rgo especial, mas implementado pela Subcomisso para Promoo e Proteo dos Direitos Humanos e pela Comisso de Direitos Humanos. A caracterstica mais notvel do procedimento que ele tem carter confidencial e as pessoas que apresentam informao no so informadas do resultado.

Tabela 7: Cronologia bsica: Procedimento 1503

CRONOLOGIA BSICA: Procedimento 1503


Recebe-se o comunicado.



SE O COMUNICADO SE QUALIFICA para exame (por exemplo, no est sendo examinado por um procedimento pblico da Comisso de Direitos Humanos), a reclamao transmitida ao governo em questo, que solicitado a comentar.
SE O COMUNICADO NO SE QUALIFICA o comunicado no prossegue.


Julho: Exame das reclamaes e respostas por um Grupo de Trabalho da Subcomisso composto de cinco membros (GT sobre Comunicados). Os comunicados que "parecem" revelar um padro sistemtico de violaes so transmitidos Subcomisso.

Se o comunicado no parece revelar um padro sistemtico de violaes, ele no prossegue ou fica pendente at o ano seguinte.


Agosto: Anlise pela Subcomisso dos comunicados e das respostas recebidas do GT sobre Comunicados. Se parece revelar uma "situao", enviado Comisso de Direitos Humanos.

Se parece no revelar uma "situao", no prossegue ou fica pendente at o ano seguinte.


Fevereiro/maro: Anlise das reclamaes e respostas por um Grupo de Trabalho da Comisso de Direitos Humanos (GT sobre Situaes) antes da sesso da Comisso. Sua tarefa produzir recomendaes Comisso sobre uma linha de ao a ser adotada.


Maro/abril: Durante sua sesso, a Comisso de Direitos Humanos considera as situaes a ela encaminhadas em reunies privativas, com a exceo de que os governos so convidados a comparecer sesso em que ser considerada sua "situao".


Informam-se os nomes dos pases analisados, bem como os daqueles cujos comunicados no prosseguiram. Isso significa que, por eliminao, so anunciados publicamente os Estados que esto sendo examinados. s vezes uma situao pode tornar-se pblica e ar a ser objeto de discusso aberta na Comisso.

Tabela 8: Dados Bsicos: Procedimento 1503

DADOS BSICOS: Procedimento 1503

Origem:
Como foi criado?
Mediante uma resoluo do Conselho Econmico e Social da ONU em 1970.

Quando comeou a funcionar?
1972

Composio:
O Procedimento 1503 implementado pela Subcomisso para Promoo e Proteo dos Direitos Humanos e pela Comisso de Direitos Humanos da ONU.

Objetivo:
Objetivo geral
Exame confidencial de reclamaes de violaes graves dos direitos humanos em um pas a fim de identificar padres de violaes.

Funes
Monitoramento

4.2.1.1.2. O Que se Pode Conseguir Apresentando Informao ao Procedimento 1503?

A eficcia do Procedimento 1503 claramente prejudicada por sua natureza confidencial. Entretanto, a prtica, que a Comisso de Direito Humanos vem desenvolvendo, de anunciar os nomes dos Estados que esto sendo examinados e indicar aqueles cuja anlise no prosseguir, at certo ponto funciona no sentido de melhorar o procedimento. Isso significa pelo menos que o fato de que um Estado est sendo examinado a a ser de domnio pblico.

Apesar das restries do procedimento confidencial, possvel fazer com que um Estado preste contas e responda s denncias dirigidas contra ele. Uma conseqncia "colateral" do procedimento que a mera transmisso de uma reclamao a um governo pode fazer com que este investigue e corrija a situao denunciada, ou o leve a suspender ou pr fim a uma prtica, com a finalidade de no chamar a ateno e fazer com que a reclamao no seja remetida Subcomisso. No caso das reclamaes e respostas que am da instncia da Subcomisso adiante, a Comisso identifica questes de interesse durante sua anlise das "situaes" e pode requisitar que os Estados em questo implementem melhoras. A comisso pode requerer respostas a perguntas especficas e tem o poder de iniciar um estudo ou criar um rgo de investigao especial com o consentimento expresso do governo envolvido, mas, ao longo dos anos, vem desenvolvendo seus prprios meios de lidar com casos graves nomeando um especialista independente que realiza misses de campo e apresenta um relatrio confidencial Comisso em sua prxima sesso.

Em casos excepcionalmente graves, a Comisso de Direitos Humanos pode optar por transferir a situao para um procedimento pblico, o que pode envolver a nomeao de um Relator Especial (Ver Parte III, Captulo 4.2.1.2).

O Procedimento 1503 pode ser utilizado para:

Despertar a conscincia sobre uma situao de violaes graves dos direitos humanos, pelo menos no mbito da Comisso de Direitos Humanos.

Fazer sugestes para melhorar uma situao dessa natureza.

O Procedimento 1503 no adequado quando se pretende:

Obter uma soluo jurdica imediata para uma pessoa em particular.

Receber resposta a denncias apresentadas. Voc somente receber uma confirmao de que sua reclamao foi recebida e segue o trmite do procedimento.

4.2.1.1.3. O que Deve Conter um Comunicado ao Procedimento 1503?

Um comunicado ao Procedimento 1503 deve:

Ser dirigido ONU ou a algum de seus organismos ou funcionrios de seu quadro de pessoal. Ou seja, no deve ser dirigido especificamente ao Procedimento 1503, mas deve pelo menos solicitar uma ao por parte da ONU.

Um comunicado ao Procedimento 1503 no deve:

Ser annimo. O nome ser eliminado antes de o comunicado ser transmitido ao Estado, a menos que o autor do comunicado no tenha objeo divulgao de seu nome.

Conter uma linguagem insultante.

Ser motivado por objetivos meramente polticos nem fazer propaganda: o comunicado deve ser a expresso de um motivo genuno de queixa por uma injustia sofrida.

O Procedimento 1503 foi concebido para identificar e acompanhar as "situaes que parecem revelar um padro sistemtico de violaes graves de direitos humanos, fidedignamente atestadas como tais".

Isso significa que devem ser levadas em conta as seguintes consideraes quando se prepara um comunicado ao Procedimento 1503:

O objetivo do comunicado chamar a ateno para uma situao, em vez de para um caso particular, e deve ajudar a demonstrar um padro de violaes. Assim sendo, muito til reunir casos particulares em um s documento, em vez de apresent-los separadamente, um a um; e, apesar de que um fato particular somado a outros pode iniciar a anlise de uma "situao", raramente ele ser suficiente por si s.

A prova deve se relacionar a violaes graves dos direitos humanos (inclusive tortura).

A prova deve ser consistente ao longo do tempo e entre diferentes fontes de informao.

A prova de violao deve ser fidedigna. Isso significa que se deve evitar contradies e apresentar provas para corroborar suas denncias, evitando declaraes vagas.

Quando exp sua explicao de cada denncia, siga as orientaes contidas na Parte III, Captulo 2.2.2, quanto ao contedo de um comunicado padro tanto quanto possvel, mas, alm disso, deve-se:

Explicar por que voc entende que houve uma violao e por que voc acredita que os fatos revelam um padro consistente de violaes graves.

Fornecer todas as provas possveis que corroborem os fatos (Ver Parte III, Captulo 5, e Parte III Captulo 3.4 para exemplos de provas de apoio).

Explicar se foram utilizados quaisquer recursos nacionais e quais foram os resultados, inclusive cpias de sentenas judiciais, se for o caso; se no tiverem sido utilizados os recursos nacionais, informar as razes.

Incluir quaisquer sugestes que se tenha para uma ao adequada, por exemplo, a nomeao de um Relator Especial ou uma investigao, ou simplesmente uma ao por parte da ONU para pr fim s violaes.

4.2.1.1.4. Dicas Especficas

Quem ser informado do comunicado/ identidade da fonte?

O nome do autor do comunicado ser apagado para ser transmitido ao Governo, a menos que o autor no tenha objeo divulgao de seu nome. Por se tratar de um procedimento confidencial, nenhum dos casos analisados publicado.

Voc receber alguma resposta sobre seu comunicado?

Como o procedimento confidencial, voc no receber uma resposta sobre o contedo do comunicado apresentado nem sobre qualquer medida adotada. No entanto, receber uma acusao de recebimento indicando que o comunicado segue o trmite do procedimento.

Se quiser que seu comunicado seja analisado na prxima sesso do Grupo de Trabalho da Subcomisso no ms de julho, voc deve se certificar de que ele chegue ao EACDH at meados de abril. Do contrrio, ele s ser analisado em julho do ano seguinte.

O Procedimento 1503 aceita comunicados enviados por correio eletrnico, ao contrrio do Comit contra a Tortura e o Comit de Direitos Humanos.

Convm observar que:

No sero aceitas reclamaes referentes a um Estado:
Sero aceitas reclamaes referentes a um Estado:

Que est sendo examinado por um procedimento pblico da Comisso de Direitos Humanos.

Que aceitou o direito de petio particular nos termos do PID, do CCT ou do CEDR, e se a reclamao for sobre uma violao particular de um direito protegido por um desses instrumentos.
Que aceitou o direito de uma petio particular nos termos do PID, do CCT ou do CEDR, mas a reclamao se refere a informao geral sobre o Estado, em vez de uma reclamao particular.

4.2.1.2. Procedimentos Especiais da Comisso de Direitos Humanos da ONU

Os procedimentos especiais da Comisso de Direitos Humanos da ONU foram criados para monitorar reas temticas especficas em escala mundial ou determinados pases com relao a todos os direitos humanos. Esse procedimentos so mais conhecidos como relatores especiais ou grupos de trabalho, mas tambm h outros nomes, tais como especialistas independentes e representantes especiais. So criados mediante resoluo em resposta a situaes consideradas suficientemente preocupantes a ponto de exigirem um estudo em profundidade. Os procedimentos prestam contas publicamente Comisso de Direitos Humanos a cada ano e alguns tambm Assemblia Geral da ONU.

Cada procedimento tem seus prprios mtodos de trabalho, que podem diferir um pouco entre si, mas sua nomeao segue o mesmo critrio, as consideraes bsicas so as mesmas quanto preparao de um comunicado e tambm se aplicam todos os princpios gerais descritos acima no que se refere aos comunicados dirigidos aos mecanismos da ONU. O procedimento que mais provvel convenha ser utilizado no contexto de denncias de tortura o Relator Especial contra a Tortura, que, por essa razo, utilizaremos como exemplo bsico. No entanto, cabe recordar que o Relator Especial apenas um dos vrios procedimentos que podem receber denncias de atos de tortura.

4.2.1.2.1. Relatores Temticos e Grupos de Trabalho

Todos os procedimentos temticos devem ser abordados de modo semelhante ao descrito a seguir com referncia ao Relator Especial contra a Tortura. O aspecto mais importante que se deve ter presente que os diferentes mecanismos temticos no so mutuamente excludentes e podem fazer intervenes conjuntas ou separadas com relao a uma mesma denncia.

De um modo geral, quando uma denncia estiver relacionada a um tratamento que parece constituir tortura ou maus tratos, ser necessrio envi-la ao Relator Especial contra a Tortura, mas quando os fatos tambm revelarem outras possveis violaes dos direitos humanos, voc dever procurar envi-la a todos os procedimentos especiais cabveis ou indicar em sua carta a quais procedimentos quer que seu comunicado seja distribudo. A ao por parte de mais de um relator ou grupo de trabalho costuma ter maior peso e provvel que influencie um Estado mais do que quando somente um procedimento expressa preocupao.

Um exemplo de denncia que poderia ser distribuda a mais de um procedimento seria a deteno e priso violenta de uma jornalista por representantes oficiais por suas atividades jornalsticas, inclusive estupro e espancamento com cassetetes quando da priso. Dependendo dos detalhes disponveis e das circunstncias especficas, seria possvel motivar uma ao do Relator Especial contra a Tortura, Violncia contra as Mulheres e Liberdade de Expresso, bem como do Grupo de Trabalho sobre Deteno Arbitrria.

igualmente possvel que um caso sobre o qual o Relator Especial decidir que no pode tomar medidas seja um caso do qual se possa ocupar outro procedimento especial. importante no centrar a ateno exclusivamente em um procedimento quando outros tambm podem ser competentes para examinar o caso. Por exemplo, quando o tratamento sofrido por um detento no for considerado suficientemente grave para a interveno do Relator Especial contra a Tortura, os fatos podem ainda assim revelar um caso de deteno arbitrria do qual pode se ocupar o Grupo de Trabalho sobre Deteno Arbitrria. Uma vez que o Relator Especial deve decidir cada caso com base em seus prprios fatos, difcil prever, com exatido, se ele poder agir em um determinado caso. Portanto, melhor ampliar a possibilidade de a denncia ser acompanhada assegurando que ela chegue a todos os procedimentos que possam ter competncia para tanto, em vez de limitar o comunicado a um nico mecanismo.

Uma vez que os mandatos dos procedimentos temticos dependem da Comisso de Direitos Humanos, pode ocorrer que um Relator Especial ou um Grupo de Trabalho seja descontinuado ou que seja criado outro de um ano para o outro. A tabela a seguir expe os procedimentos temticos existentes quando da redao deste manual, bem como os aspectos especficos de cada um.

Tabela 9: Procedimentos Temticos Relevantes da Comisso de Direitos Humanos da ONU

Procedimento Temtico:
Comentrios:

GT sobre deteno arbitrria
Voc deve explicar por que se acredita que a deteno arbitrria. Para o GT isso significa que a deteno: 1) no tem fundamento legal; 2) uma resposta ao exerccio dos direitos fundamentais, como liberdade (por exemplo, a priso de um jornalista pelo exerccio de sua profisso); ou 3) interpretada como arbitrria porque no foram observadas as garantias processuais (por exemplo, se algum no prontamente levado a comparecer em juzo). No basta considerar que a deteno "injusta". O GT normalmente no analisa um caso quando a pessoa tiver sido solta, a menos que envolva uma questo de princpio.

GT sobre desaparecimentos forados ou involuntrios
O GT atua somente em casos particulares claramente identificados. Se a pessoa ou organizao que apresenta a informao no um familiar, mas atua direta ou indiretamente a pedido da famlia, ela precisa manter contato com a famlia a todo momento, uma vez que quaisquer respostas recebidas destinam-se unicamente informao da familiares. Deve-se indicar se deseja que seu comunicado seja tratado em carter confidencial.

RE sobre execues extrajudiciais, sumrias ou arbitrrias
O RE pode agir em casos em que, das aes de representantes oficiais do Estado ou de grupos que colaboram com o Governo ou so tolerados por este, resultam as seguintes conseqncias: 1) pena de morte, quando o julgamento foi injusto, quando no se observou o direito de apelao, ou quando envolve um menor, um deficiente mental ou demente, uma mulher gestante ou uma me que deu luz h pouco tempo; 2) ameaas de morte ou risco iminente de execuo extrajudicial; 3) mortes sob custdia decorrentes de atos de tortura, negligncia, uso da fora ou condies de deteno que representam ameaa vida; 4) mortes em decorrncia do uso desnecessrio ou inadequado da fora; 5) mortes em violao do DICA; 6) expulso para um pas onde a pessoa corre risco de vida; 7) genocdio; 8) violao da obrigao de investigar, processar os autores de torturas perante os tribunais e proporcionar uma compensao adequada. Deve-se indicar se a informao confidencial.

RE sobre a promoo e proteo do direito liberdade de opinio e de expresso
As reas de interesse do RE compreendem: pessoas que exercem/ promovem o exerccio do direito, tais como profissionais do rea da informao; partidos polticos da oposio e ativistas sindicais: os meios de comunicao (imprensa e veculos de radiodifuso), inclusive Qualquer ameaa contra sua independncia; editores e executantes em outros meios de comunicao; defensores dos direitos humanos; barreiras ao direitos das mulheres de serem ouvidas; barreiras ao o informao. Deve-se indicar se deseja que seu comunicado seja tratado em carter confidencial.

RE sobre a independncia de juzes e advogados
Pode receber informao sobre juzes, advogados e magistrados. O RE ocupa-se essencialmente das garantias e do bom funcionamento do sistema de justia.

RE sobre a questo da tortura
Ver quadro abaixo.

RE sobre a violncia contra mulheres
O RE analisa casos de violncia contra as mulheres em razo de seu sexo: seu comunicado deve indicar por que se acredita que a mulher em questo foi alvo da violao por causa de seu sexo. Uma caracterstica especial deste mandato que ele centra a ateno na violncia no s por parte de representantes oficiais do Estado, mas tambm nos casos em que o Estado permite que ela continue ocorrendo na comunidade e na famlia. Com relao informao geral, deve-se observar que o RE tem particular interesse pelos exemplos de boa prtica que possam ser utilizados como base para recomendaes em outros Estados. Os comunicados so confidenciais.

Outros procedimentos temticos relevantes:

RE sobre a venda de crianas, prostituio infantil e pornografia infantil; RESG sobre crianas em conflitos armados; RESG sobre pessoas deslocadas; RE sobre os direitos humanos de migrantes; RE sobre formas contemporneas de racismo, discriminao racial, xenofobia e intolerncia; RE sobre a questo da intolerncia religiosa.

Legenda: RE = Relator Especial; RESG = Representante Especial do Secretrio Geral da ONU; GT = Grupo de Trabalho

4.2.1.2.2. Relator Especial sobre a Tortura

Tabela 10: Dados Bsicos: Relator Especial da ONU sobre a Tortura

DADOS BSICOS: Relator Especial da ONU sobre a Tortura

Origem:
Como foi criado?
Mediante resoluo da Comisso das Naes Unidas de Direitos Humanos


Quando comeou a funcionar?
1985

Composio:
Quantas pessoas o compem?
1


So especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialista independente

Objetivo:
Objetivo geral
Monitorar a prtica da tortura no mundo e informar a Comisso de Direitos Humanos a esse respeito


Funes
Monitoramento

Apurao dos fatos

4.2.1.2.2.1. Como Funciona o Relator Especial sobre a Tortura?

O trabalho do Relator Especial consiste em apresentar Comisso de Direitos Humanos o retrato mais preciso possvel da prtica da tortura em todo o mundo. Para tanto, ele depende das informaes que recebe de toda uma srie de fontes, tais como ONGs, pessoas e os prprios governos. Com base nessa informao o Relator:

Estabelece um dilogo com os governos sobre as denncias razoveis levadas a sua ateno.

Realiza visitas para apurao de fatos.

Dilogo:

O dilogo do Relator Especial com um governo pode comear de duas formas. Se ele acredita que as denncias que recebeu so fidedignas, ele transmitir um apelo urgente ou far a denncia em um comunicado padro.

O procedimento de apelo urgente concebido para responder com urgncia informao sobre o risco de tortura de uma pessoa e utilizado para evitar possveis incidentes de tortura. Ser utilizado, portanto, somente quando a informao for muito recente. Trata-se de um procedimento no-acusatrio, no qual se solicita ao governo que tome medidas para assegurar que a pessoa no seja torturada, sem adotar qualquer posio sobre se o temor de torturas justificado ou no.

Os comunicados padro so transmitidos aos governos periodicamente e consistem de denncias relativas a casos especficos (denncias particulares) e as relativas a tendncias gerais, padres e fatores especiais que contribuem para a prtica da tortura em um pas (denncias gerais).

Esses comunicados so transmitidos ao governo contra o qual so dirigidas as denncias, para dar-lhe uma oportunidade de examin-las. Dependendo da resposta recebida do governo, o Relator Especial pode prosseguir a investigao ou fazer recomendaes. Todos os comunicados enviados e recebidos ao longo do ano so detalhados em um relatrio anual, juntamente com outras recomendaes e comentrios gerais, quando apropriado, inclusive recomendaes sobre medidas que deveriam ser tomadas para erradicar a tortura.

Apurao de fatos:

O Relator Especial sobre a Tortura tambm realiza visitas para esclarecer e apurar fatos e obter informao em primeira mo. No tem o poder de visitar qualquer pas de sua escolha, mas deve, primeiro, obter um convite do governo para realizar uma visita. Durante a visita, o Relator Especial se rene com representantes do governo, representantes de ONGs e as supostas vtimas, alm de visitar centros de deteno, tais como presdios ou delegacias. Seu objetivo ter uma boa percepo de qual a situao real em campo. Ao concluir a visita, o Relator produz um relatrio no qual apresenta suas concluses sobre o alcance do problema, ou se no existe o problema, no pas visitado e faz recomendaes sobre as medidas que poderiam ser tomadas para melhorar a situao.

4.2.1.2.2.2. O Que se Pode Conseguir Apresentando Informao ao Relator Especial sobre a Tortura?

O poder do Relator Especial reside na Comisso de Direitos Humanos e na natureza pblica do procedimento. Suas concluses no so juridicamente vinculantes e ele no tem poderes de execuo. No entanto, no existem muitos Estados imunes condenao pblica e a publicidade de suas concluses cria presso sobre os Estados para que cooperem, introduzindo reformas ou implementando suas recomendaes.

Se seu objetivo que sejam adotadas medidas com relao a uma situao general, pode-se recorrer ao Relator Especial sobre a Tortura para:

Divulgar publicamente a prtica da tortura em um pas, inclusive a tolerncia oficial dessa prtica.

Fazer recomendaes aos governos sobre melhoras a serem que deveriam ser feitas.

Solicitar uma visita de apurao de fatos para chamar a ateno da opinio pblica sobre uma situao especfica.

Se seu objetivo que sejam adotadas medidas com relao a um caso particular, pode-se recorrer ao Relator Especial sobre a Tortura para:

Divulgar publicamente incidentes particulares de tortura.

Fazer recomendaes aos governos com relao a incidentes particulares de tortura, inclusive recomendar a instaurao de processo judicial contra os autores dos atos de tortura.

Procurar evitar a tortura de pessoas que se acredita correm um risco, solicitando, por exemplo, que no se mantenha uma pessoa sob deteno incomunicada ou que lhe seja dado tratamento mdico urgente.

Procurar evitar a deportao de uma pessoa para um pas em que se acredita que ela corre um risco fundado de tortura.

O Relator no pode:

Visitar pases sem o consentimento de seus governos.

Adotar decises juridicamente vinculantes em casos particulares.

Fazer cumprir as recomendaes que faz aos governos.

Conceder uma reparao s pessoas.

4.2.1.2.2.3. O Que Deve Conter um Comunicado ao Relator Especial sobre a Tortura?

Se voc pretende que o Relator Especial adote medidas com relao a um incidente de tortura particular no-urgente, deve seguir as orientaes expostas na Parte III, Captulo 2.2.2, sobre o contedo de um comunicado padro.

Se voc pretende que o Relator Especial utilize um procedimento de apelo urgente, siga as orientaes recomendadas, mas, alm disso, tenha presente que:

Nos casos em que a tortura ainda no tiver ocorrido, a data, a hora e o lugar geralmente sero os da deteno.

Deve-se demonstrar que existe risco de que a tortura ocorra. Isso significa que se deve enfatizar os fatores que demonstram que esse risco existe: por exemplo, a natureza de incomunicabilidade ou o no-reconhecimento da deteno da pessoa; o fato de que essa mesma pessoa j foi torturada quando detida em uma ocasio anterior; o conhecimento de que as pessoas presas por essa diviso especfica da polcia geralmente so torturadas, ou que os integrantes de um determinado grupo a que essa pessoa pertence muitas vezes so torturados quando detidos.

No existem orientaes precisas para a apresentao de informao ao Relator Especial para uso em suas denncias gerais. As denncias gerais so aquelas que no se limitam a um caso particular ou a um nico incidente. No entanto, geralmente se fundamentam em um conjunto de incidentes particulares e so usadas para identificar padres de violao com base em relatos consistentes e para expressar preocupao acerca de fatores especficos que facilitam a prtica da tortura em um pas. Entre os exemplos dos temas que so objeto das denncias gerais incluem-se:

Uso generalizado de um mtodo especfico de tortura, por exemplo, choques eltricos .

Uma lei que permite o uso de grilhes nos presos nas prises.

Uma lei que permite a deteno incomunicada durante um longo perodo de tempo.

Relatos consistentes indicando que as pessoas processadas por tortura nunca so condenadas.

Relatos consistentes indicando que uma determinada delegacia ou diviso das foras de segurana pratica a tortura.

Relatos consistentes indicando que os membros de um determinado grupo tnico tm mais probabilidade de sofrer torturas do que outros.

Relatos consistentes indicando que negado atendimento mdico a presos com enfermidades graves.

Como se pode ver, o fator mais importante ser demonstrar um padro. Ver Parte III, Captulo 2.2.1 para indicaes sobre como faz-lo. Quantos mais casos se puder reunir que corroborem suas denncias gerais, tanto melhor, uma vez que eles demonstram que as prticas identificadas no so meros incidentes isolados, mas caracterizam uma situao grave e generalizada.

4.2.1.2.2.4. Dicas Especficas

Quem ser informado do comunicado/ identidade da fonte?

Para que o Relator Especial tome medidas em um caso particular, necessrio transmitir o nome da suposta vtima ou vtimas ao governo em questo. O nome da suposta vtima tambm se tornar conhecido do pblico quando for registrado no relatrio anual do Relator Especial. Se voc especificar que no quer que o nome ou nomes sejam divulgados ao governo, no ser possvel investigar o caso, mas o incidente pode proporcionar uma base para denncias gerais em conjunto com outras informaes. O nome da fonte da denncia nunca revelado, nem no comunicado ao governo, nem no relatrio anual.

Voc receber alguma resposta a seu comunicado?

Voc no receber uma acusao de recebimento de sua informao. Se suas denncias forem transmitidas ao governo, qualquer resposta recebida do governo normalmente lhe ser enviada a fim de lhe oferecer a oportunidade de comentar sobre seu contedo. Todos os casos que so transmitidos aos governos so resumidos no relatrio anual do Relator Especial Comisso de Direitos Humanos, de modo que isso tambm lhe dir se foi adotada alguma medida com base em suas denncias.

Parte do trabalho do Relator Especial sobre a Tortura consiste em identificar e monitorar os maus tratos a determinados grupos de pessoas. Nos ltimos anos, seu trabalho tem se concentrado principalmente nos maus tratos a crianas, mulheres e defensores dos direitos humanos. Caso voc tenha informao relativa a alguma dessas categorias, ou outros grupos identificveis, seria importante envi-la ateno do Relator Especial.

4.2.1.2.3. Relatores Nacionais

Alm dos relatores temticos e dos grupos de trabalho, a Comisso de Direitos Humanos tambm nomeia relatores para um pas (ou especialistas independentes ou representantes especiais) cuja tarefa informar sobre todos os direitos humanos, inclusive incidentes de tortura e tratamento desumano no pas especfico do qual se ocupam. Em geral, esses relatores so nomeados para pases que tm situaes de direitos humanos particularmente graves, inclusive aquelas provocadas por guerra ou conflito interno. No entanto, a escolha de um pas para um escrutnio desse tipo , sem dvida, uma questo politicamente delicada e deve haver um consenso suficiente entre os Estados representados na Comisso de Direitos Humanos para a criao e nomeao de um relator especfico para um pas.

A exemplo dos relatores temticos, o objetivo dos relatores especficos de um pas pintar um quadro preciso de uma situao, mas, em vez de ser um quadro mundial de um determinado fenmeno, deve ser um relatrio muito mais exaustivo sobre a situao de direitos humanos em um nico pas. As acusaes de tortura e tratamento desumano so as de maior relevncia para esse relator, que precisa estar em condies de informar sobre o fenmeno no contexto de seu relatrio sobre pas em questo. Portanto, quando houver um relator especial nomeado para o pas sobre o qual voc deseja apresentar uma denncia de tortura, o relator deve ser includo na lista de procedimentos aos quais sua denncia deve ser enviada. Assim, se a priso e a deteno da jornalista mencionada anteriormente, por exemplo, ocorreu em um pas para o qual existe um relator especial nomeado, por exemplo, Birmnia, Guin Equatorial ou Ir, esse relator tambm deve receber a informao.

Quando da redao deste manual, existiam mandatos especficos para os seguintes pases:

Tabela 11: Relatores de pas da Comisso de Direitos Humanos da ONU (1999)

Afeganisto (RE)

Birmnia (RE)

Burundi (RE)

Camboja (RESG)

Congo, Repblica Democrtica (RE)

Chipre (SG)
Ex-Iugoslvia: Kosovo (SG)

Guin Equatorial (RECDH)

Haiti (EI)

Iraque (RE)

Ir, Repblica Islmica (RECDH)

Ruanda (RECDH)
Somlia (EI)

Sudo (RE)

Territrios rabes Ocupados (SG, RE e

Comit Especial)

Timor Leste (RE)

Legenda: RE = Relator Especial; RESG = Representante Especial do Secretrio Geral; RECDH = Representante Especial da Comisso de Direitos Humanos; EI = Especialista Independente

4.2.2. Organismos de Tratados das Naes Unidas

Os organismos de tratados das Naes Unidas foram criados para supervisionar a implementao pelos Estados Parte de suas obrigaes assumidas em virtude de uma srie de tratados de direitos humanos da ONU. Os principais comits aos quais possvel apresentar denncias de tortura so:

Comit contra a Tortura (CCT): supervisiona a Conveno da ONU contra a Tortura

Comit de Direitos Humanos (CDH): supervisiona o Pacto Internacional sobre os Direitos Civis e Polticos

Comit dos Direitos da Criana (CDC): supervisiona a Conveno da ONU sobre os Direitos da Criana

Comit para a Eliminao da Discriminao contra a Mulher (CEDM): supervisiona a Conveno da ONU sobre a Eliminao da Discriminao contra a Mulher

Comit para a Eliminao da Discriminao Racial (CEDR): supervisiona a Conveno da ONU sobre a Eliminao da Discriminao Racial

Os mais importantes para os fins de material relacionado tortura so o CCT, que se concentra exclusivamente no tema da tortura, e o CDH, um organismo consagrado que se ocupa de toda uma ampla gama de direitos humanos, inclusive a tortura. No entanto, os demais comits so muito importantes nos casos em que as denncias de tortura esto relacionadas a certas categorias identificveis de pessoas, a saber, crianas, mulheres e grupos raciais.

Os mtodos de trabalho de cada um desses organismos so muito semelhantes. Todos eles tm o poder de examinar e comentar os relatrios estatais, e a maioria tambm pode receber reclamaes particulares ou esto em vias de criar um procedimento dessa natureza.

Comit Contra a Tortura

Tabela 12: Comit Contra a Tortura

DADOS BSICOS: Comit Contra a Tortura

Origem:
Como foi criado?
Pela Conveno da ONU Contra a Tortura de 1984


Quando comeou a funcionar?
1988

Composio:
Quantas pessoas o compem?
10


So especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes

Objetivo:
Objetivos gerais
Garantir que os Estados respeitem suas obrigaes assumidas em virtude desse tratado, a fim de prevenir e punir a prtica da tortura.


Funes
Anlise dos relatrios estatais (Artigo 19, CNUCT)

Apurao de fatos mediante um procedimento de investigao confidencial (Artigo 20, CNUCT)

Reclamaes interestatais (Artigo 21, CNUCT)

Reclamaes particulares (facultativo) (Artigo 22, CNUCT) (Ver Parte III, Captulo 4.3.1)

4.2.2.1.1. Como Funciona o Comit Contra a Tortura?

O Comit responsvel por monitorar o respeito, pelos Estados, de suas obrigaes no sentido de implementar a Conveno Contra a Tortura, isto , prevenir, proibir e punir a tortura. O Comit realiza sua tarefa principalmente mediante:

A anlise dos relatrios apresentados periodicamente pelos Estados (Ver Parte III, Captulo 2.3 para uma descrio de como funciona o procedimento de relatrio estatal).

Alm disso, o Comit pode:

Realizar uma investigao confidencial de denncias de uma prtica sistemtica de tortura em um Estado Parte (ainda que alguns Estados Parte possam no o permitir; Ver Parte III, Captulo 4.2.2.1.4).

Com relao aos Estados que aceitaram o procedimento de reclamao particular, o Comit examina as denncias recebidas de particulares sobre incidentes especficos de tortura, tais como casos que envolvem a expulso iminente de pessoas para um pas em que se acredita que elas correm risco de tortura (essa funo ser considerada na Parte III, Captulo 4.3.1).

O procedimento de investigao um procedimento confidencial para investigar denncias de uma prtica sistemtica de torturas em um Estado Parte da conveno. Uma investigao pode ser iniciada quando se recebe "informao fidedigna" que "parece conter indicaes fundadas de que a tortura est sendo praticada sistematicamente". A grande parte dessa informao proceder das ONGs, e possvel solicitar expressamente uma investigao quando se acredita que se dispe de informao suficiente para demonstrar uma prtica sistemtica, embora no se deva esperar ser informado se suas informaes originaram aes. Se um Estado Parte o aceitar, a investigao pode envolver uma visita ao pas para levantamento e apurao dos fatos. Em tais casos, o Comit far contato com as ONGs locais, com base no entendimento de que elas mantero o mais alto respeito pela natureza confidencial da visita.

Por fim, o Comit chegar a uma concluso sobre se existe ou no uma prtica sistemtica de tortura. Essa concluso, juntamente com quaisquer recomendaes cabveis, ser transmitida ao Estado Parte. O processo continuar sendo confidencial, porm, quando concludo, a Comisso, aps uma consulta com o Estado Parte, pode optar por incluir uma explicao resumida de seus resultados em seu relatrio anual.

4.2.2.1.2. O Que se Pode Conseguir Apresentando Informao ao Comit Contra a Tortura?

Ver Parte III, Captulo 2.3 para sugestes sobre o que se pode conseguir no contexto do procedimento de relatrio estatal.

A fora do procedimento de investigao, apesar de sua natureza confidencial, a repercusso muito negativa de se iniciar uma investigao contra um pas. Isso somente ocorrer nos casos em que as situaes forem consideradas extremamente graves; para um Estado, ser identificado como um pas que tolera a prtica sistemtica da tortura uma penalidade pesada. Apesar de o processo continuar sendo confidencial durante toda a investigao, existe a possibilidade de divulgar ao pblico um resumo das concluses e isso inclui uma constatao afirmativa de que existe uma prtica sistemtica da tortura. Essa sano foi utilizada apenas em dois casos at o momento. Mesmo nos casos em que o Comit no torna pblicas suas concluses, o procedimento pode ser til: o simples fato de o Comit ter a possibilidade de tornar pblicas suas constataes pode criar presso para que um Estado tome medidas para alterar a legislao ou evitar certas prticas, no intuito de desestimular o Comit de ir adiante com suas aes.

4.2.2.1.3. O Que Deve Conter um Comunicado ao Comit Contra a Tortura?

Ver Parte III, Captulo 2.3.3, para orientaes gerais sobre o que deve conter um comunicado no contexto do procedimento de relatrio estatal.

A Conveno Contra a Tortura cria obrigaes muito especficas, muitas das quais devem ser implementadas pelos Estados Parte por meio de medidas legislativas ou de outro tipo. Um Estado Parte geralmente expor de modo muito amplo a situao jurdica oficial com relao a cada uma dessas obrigaes. Em seu comunicado, seu principal objetivo deve ser descrever o que geralmente acontece na prtica, dando tantos exemplos quantos possveis. Nunca simplesmente afirme que algo ineficaz sem explicar por qu.

Por exemplo:

Quando o Estado tiver adotado medidas legislativas, istrativas, jurdicas e outras medidas para evitar atos de tortura e outras formas de maus tratos, na prtica, elas efetivamente evitam tais atos? D exemplos de casos em que essas medidas funcionaram/ no funcionaram.

Se a tortura um crime nos termos previstos em lei, alguma autoridade foi efetivamente processada e condenada com base nessa lei? Que tipo de pena recebeu? D exemplos de quaisquer processos instaurados e de decises de no instaurar processo judicial, bem como quaisquer condenaes e penas aplicadas.

O Estado investiga as denncias de tortura e maus tratos e, se o faz, qual o resultado dessas investigaes? Por exemplo, os promotores pblicos levam esses casos a srio? As investigaes alguma vez resultam na instaurao de processo penal contra os responsveis pelos atos tortura? Que tipo de mtodos so utilizados para investigar?

As vtimas de torturas chegam a receber uma compensao ou outro tipo de reparao? Se so concedidas indenizaes, d exemplos das quantias pagas a ttulo de compensao.

Uma pessoa pode ser condenada por uma declarao obtida mediante tortura? Ou seja, se um juiz sabe que uma confisso ou outra declarao incriminatria foi feita sob tortura, ele ainda assim pode condenar a pessoa?

Se voc deseja solicitar uma investigao confidencial, seu objetivo duplo: demonstrar a existncia de uma prtica sistemtica de tortura no pas e explicar o contexto, principalmente o contexto jurdico.

Prtica sistemtica: O Comit elaborou alguns critrios gerais que so levados em considerao para determinar se existe uma prtica sistemtica. O Comit considera que a tortura praticada sistematicamente quando:

evidente que os casos de tortura denunciados no ocorreram de modo fortuito em um determinado lugar ou em um determinado momento, mas so habituais, generalizados e deliberados pelo menos em uma parte considervel do territrio em questo.

Alm disso, o Comit considera que:

Isso no necessariamente resultado de uma inteno direta de um governo, mas pode ser conseqncia de fatores que o governo tem dificuldade de controlar e sua existncia pode indicar uma discrepncia entre a poltica definida pelo governo central e sua implementao pela istrao local.

Uma legislao inadequada que, na prtica, d margem para o uso da tortura tambm pode contribuir para a natureza sistemtica dessa prtica.

As ONGs devem fornecer informao sobre um grande nmero de incidentes de tortura e estruturar bem sua apresentao desses incidentes a fim de utiliz-los da melhor forma para demonstrar a natureza sistemtica da prtica. Isso significa que no basta denunciar uns poucos casos isolados: preciso haver uma concentrao geogrfica de incidentes ou mltiplas denncias relacionadas a uma determinada lei, por exemplo.

Contexto: Para que o Comit esteja a par da existncia ou no de uma prtica sistemtica em um pas, muito til explicar-lhes o contexto, principalmente o contexto jurdico. Esse aspecto particularmente importante para ajudar o Comit a identificar as possveis causas de uma prtica sistemtica, principalmente quando em se tratando de legislao inadequada. As ONGs devem apresentar informao sobre todas as leis anti-terrorismo aplicveis no pas e chamar a ateno do Comit para quaisquer leis que parecem estar causando problemas; por exemplo, uma lei que permite o prolongamento da deteno incomunicada ou protege as autoridades da instaurao de processos judiciais por atos de tortura.

4.2.2.1.4. Dicas Especficas

Os Estados tm o direito de fazer uma declarao afirmando que no reconhecem a competncia do Comit para realizar uma investigao confidencial conforme prev o Artigo 20. Isso significa que se supe que os Estados Parte consentem no procedimento, a menos que especifiquem em contrrio. Se voc deseja solicitar uma investigao, a primeira coisa que dever fazer comprovar que o Estado em questo no fez tal declarao.

As ONGs podem solicitar o incio desse procedimento, porm, como se trata de um procedimento estritamente confidencial, elas no recebero uma resposta. No subestime a importncia da natureza confidencial do procedimento: se algum se dirigir a voc para lhe pedir informao no contexto de uma investigao desse tipo, inclusive no caso de uma visita para apurao dos fatos, voc deve respeitar a confidencialidade da investigao se quiser que sua organizao seja consultada novamente.

Atualmente est sendo discutida a elaborao de um protocolo Conveno Contra a Tortura que conferiria ao Comit Contra a Tortura poderes semelhantes aos do Comit Europeu para a Preveno da Tortura, criando, assim, um sistema de visitas peridicas a centros de deteno.

4.2.2.2. Comit de Direitos Humanos

Tabela 13: Dados Bsicos: Comit de Direitos Humanos

DADOS BSICOS: Comit de Direitos Humanos

Origem:
Como foi criado?
Pelo Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Polticos de 1966


Quando comeou a funcionar?
1976

Composio:
Quantas pessoas o compem?
18


So especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes

Objetivo:
Objetivo geral
Supervisionar a implementao, pelos Estados, de suas obrigaes nos termos desse tratado


Funes
Anlise dos relatrios estatais (Artigo 40, PID)

Reclamaes interestaduais (Artigo 41, PID) (nunca foi usado)

Reclamaes particulares (opcional) (Protocolo Opcional ao PICDP) (Ver Parte III, Captulo 4.3.2)

4.2.2.2.1. Como Funciona o Comit de Direitos Humanos?

O Comit responsvel por assegurar que os Estados Parte cumpram suas obrigaes de respeitar e garantir a todas as pessoas os direitos contidos no PID, inclusive o direito de no ser submetido a tortura ou a tratamento ou punio cruel, desumano ou degradante (Artigo 7) e o direito de todas as pessoas privadas de sua liberdade de receber um tratamento humano e digno (Artigo 10). O Comit realiza seu trabalho de duas formas:

Analisa e comenta relatrios a ele encaminhados periodicamente pelos Estados Parte.

Analisa as denncias que recebe de pessoas sobre incidentes especficos de violao (assunto a ser considerado na Parte III, Captulo 4.3.2).

Ver Parte III, Captulo 2.3, para uma descrio de como funciona o procedimento de relatrio estatal, sugestes sobre o que se pode conseguir no contexto do procedimento do relatrio estatal e o que deve conter um comunicado.

4.2.2.2.2. Dicas Especficas

O Comit de Direitos Humanos pode solicitar aos Estados Parte que apresentem um relatrio especial se as circunstncias assim parecerem exigir. Potencialmente, essa solicitao pode ser feita em resposta a informao de violaes graves. Entre os Estados aos quais se solicitou a elaborao desses relatrios inclui a antiga Iugoslvia no perodo subseqente sua independncia.

Se possvel, devem ser fornecidas 25 cpias dos relatrios das ONGs.

Outros Comits

TABELA 14: DADOS BSICOS: COMIT DOS DIREITOS DA CRIANA

DADOS BSICOS: Comit dos Direitos da Criana

Origem:
Como foi criado?
Pela Conveno da ONU sobre Direitos da Criana de 1989


Quando comeou a funcionar?
1991

Composio:
Quantas pessoas o compem?
10


So especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes

Objetivo:
Objetivo geral
Supervisionar a implementao, pelos Estados Parte, de suas obrigaes nos termos da CNUDC


Funes
Anlise de relatrios estatais (Artigo 44, CNUDC)

Atualmente est sendo discutida a possibilidade de se adotar um protocolo CNUDC que permitiria reclamaes particulares.



Tabela 15: Dados bsicos: Comit para a Eliminao da Discriminao contra a Mulher

DADOS BSICOS: Comit para a Eliminao da Discriminao Contra a Mulher

Origem:
Como foi criado?
Pela Conveno da ONU sobre a Eliminao da Discriminao Contra a Mulher


Quando comeou a funcionar?
1981

Composio:
Quantas pessoas o compem?
23


So especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes

Objetivo:
Objetivo geral
Supervisionar a implementao, pelos Estados Parte, de suas obrigaes nos termos da CNUEDM


Funes
Anlise de relatrios estatais (Artigo 18, CNUEDM)

No incio de 1999, finalmente foi alcanado um acordo para a criao de um procedimento de reclamao particular, mas ele ainda no havia comeado a funcionar at a data de redao deste manual.

Tabela 16: Dados Bsicos: Comit para a Eliminao da Discriminao Racial

DADOS BSICOS: Comit para a Eliminao da Discriminao Racial

Origem:
Como foi criado?
Pela Conveno para a Eliminao de Todas as Formas de Discriminao Racial de 1965


Quando comeou a funcionar?
1969

Composio:
Quantas pessoas o compem?
18


So especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes

Objetivo:
Objetivo geral
Supervisionar a implementao, pelos Estados Parte, de suas obrigaes nos termos da CNUEDR


Funes
Anlise de relatrios estatais (Artigo 9, CEDR)

Reclamaes interestatais (Artigo 11, CEDR) (nunca foi usado)

Reclamaes particulares (opcional) (Artigo 14, CNUEDR) (Ver Parte III, Captulo 4.3.3)

Desses trs comits, todos atualmente funcionam principalmente por meio do procedimento de relatrio estatal. O CEDR o nico que hoje dispe de um procedimento de reclamao particular em funcionamento (Ver Parte III, Captulo 4.3.3), mas provavl que tanto o CDC como o CEDM tambm o tenham em breve.

Consulte a Parte III, Captulo 2.3, para uma descrio sobre como funciona o procedimento de relatrio estatal, sugestes sobre o que se pode conseguir por meio de um procedimento desse tipo e orientaes sobre como preparar um comunicado a ser apresentado no contexto desse procedimento.

4.2.2.3.1. Dicas Especficas

O CDC realiza uma sesso prvia com um grupo de trabalho antes de sua prxima reunio, na qual elaborada uma lista de temas a serem levantados junto aos governos que apresentam seus relatrios. Essa lista elaborada a partir de um exame do relatrio estatal, dos comunicados apresentados por ONGs e pelos respectivos organismos da ONU e rgos especializados, e solicita ao governo que apresente respostas por escrito s perguntas, antes da sesso em que ser examinado o relatrio. importante ter presente que os comunicados de ONGs relativos a um Estado devem ser apresentados, portanto, antes da reunio prvia que precede a sesso de anlise do relatrio do Estado em questo.

O CEDM est ando a solicitar aos Estados que elaborem relatrios peridicos sobre temas mais especficos, em vez de relatrios gerais sobre todas as obrigaes previstas na Conveno. Isso sugere que, via de regra, seria prefervel receber esse tipo de relatrio tambm das ONGs.

4.3. Procedimentos de reclamao no mbito do sistema das Naes Unidas

4.3.1. Comit Contra a Tortura

Tabela 17: Cronologia Bsica do Procedimento de Reclamao Particular: CCT

CRONOLOGIA BSICA DO: Procedimento de Reclamao Particular CCT


Recebimento de seu comunicado


Um integrante do CCT nomeado como relator para decidir se o comunicado deve ser enviado ao governo (informao suplementar pode ser solicitada)


O comunicado enviado ao governo para que este faa seus comentrios. O governo recebe:



OU 3 meses para apresentar observaes sobre a issibilidade
Ou 6 meses para comentar a issibilidade e o mrito



Os comentrios do governo so enviados ao reclamante, ao qual se concede:



OU 4 semanas para que responda aos comentrios sobre a issibilidade
Ou 6 semanas para comentar a issibilidade e o mrito



O CCT adota uma deciso sobre a issibilidade



O governo dispe de 6 meses para comentar o mrito



Os comentrios do governo so enviados ao reclamante, que dispe de 6 semanas para coment-los



O CCT considera toda a informao levada sua ateno e adota um parecer sobre o caso, bem como sobre se houve ou no uma violao


Parecer e concluso do CCT so enviados ao reclamante e ao Estado Parte, que pode ser convidado a informar ao CCT sobre as medidas tomadas para cumprir o parecer do CCT


Um resumo do caso publicado no relatrio anual do CCT

Ver Parte III, Captulo 4.2.2.1, Dados Bsicos: Comit Contra a Tortura.

4.3.1.1. Que tipo de reclamaes pode examinar?

Ver Parte III, Captulo 3.2, sobre o tipo de reclamaes que podem ser analisadas pelos procedimentos de reclamao particular.

A Conveno Contra a Tortura cria obrigaes para os Estados Parte no s com respeito tortura, mas tambm no sentido de adotarem medidas preventivas e reparadoras contra a tortura. Isso significa que possvel apresentar uma reclamao contra um Estado Parte no s pelo incidente de tortura propriamente dito, mas tambm com relao a qualquer das obrigaes do Estado Parte previstas na Conveno. As principais obrigaes compreendem (Ver Artigos 2-16 da CNUCT para uma relao completa):

A obrigao de no expulsar, retornar ou extraditar uma pessoa para outro Estado onde h razes fundamentadas para se acreditar que a pessoa pode correr risco de ser submetida a torturas (Artigo 3).

A obrigao de investigar com diligncia e imparcialidade uma denncia de tortura e, portanto, a obrigao de proteger um denunciante e testemunhas de qualquer intimidao (Artigo 13).

A obrigao de garantir que o sistema jurdico conceda uma reparao a vtimas de tortura, bem como uma compensao justa e adequada ou, caso a vtima venha a falecer em decorrncia da tortura, a seus descendentes (Artigo 14).

A obrigao de garantir que qualquer declarao comprovadamente feita mediante tortura no seja invocada como prova em processos judiciais, salvo contra uma pessoa acusada de tortura (Artigo 15).

4.3.1.2. Quais so os requisitos de issibilidade ?

Um comunicado ser declarado inissvel se:

o comunicado for annimo.

o comunicado for um abuso do direito de apresentao de um comunicado particular.

o comunicado for incompatvel com as disposies da conveno.

a mesma matria j tiver sido ou estiver sendo examinada por outro procedimento internacional de investigao.

no tiverem sido esgotados os recursos nacionais, salvo quando os recursos forem injustificadamente prolongados ou quando for improvvel que tenham um efeito reparador para a vtima.

4.3.1.3. Dicas Especficas

Certifique-se de que o Estado parte da Conveno Contra a Tortura e que aceitou as reclamaes particulares em conformidade com o Artigo 22.

Lembre-se que possvel denunciar uma violao de qualquer disposio da Conveno Contra a Tortura, no s o incidente de tortura propriamente dito. A maioria dos casos levados ateno do Comit, exceto os casos de deportao, tm relao com as disposies sobre reparao. Se sua denncia for sobre essas disposies, devero ser enfatizados os fatos relacionados no-concesso de reparao pelo Estado Parte.

O Comit e sua Secretaria levam muito a srio a confidencialidade do processo. Isso significa que no oferecero informao sobre um caso a nenhuma pessoa, exceto o autor do comunicado e seu representante nomeado na carta de autorizao. Tambm significa que o autor do comunicado e seu representante no devem revelar qualquer informao sobre o processo ao pblico. Em caso de dvida, certifique-se sempre junto Secretaria sobre qual informao pode ser divulgada e qual deve permanecer em carter confidencial.

Se voc deseja fazer uma reclamao sobre a deportao iminente de uma pessoa (conforme dispe o Artigo 3 da CNUCT), procure no deixar sua requisio para a ltima hora. Nos ltimos anos, tem havido um certo abuso do procedimento de medidas provisrias e o Comit est comeando a fechar a porta para essas requisies. A abordagem mais sensata seria entrar em contato com a Secretaria to logo tenha sido fixada uma data para a deportao, mesmo que voc ainda esteja recorrendo da deciso. Explique a situao e advirta que, caso seja negado o recurso interposto, sua inteno requisitar medidas provisrias do Comit. Isso significa que os membros do Comit podero se preparar para a possibilidade de uma interveno de ltima hora, em vez de serem tomados de surpresa. Alm disso, eles tambm podero aconselh-lo sobre a solidez de seu caso.

Tabela 18: Aspectos Prticos do Uso do Procedimento de Reclamao Particular: CCT

ASPECTOS PRTICOS DO PROCEDIMENTO DE RECLAMAO PARTICULAR: Conveno da ONU Contra a Tortura

Quem pode apresentar um caso a este procedimento?
Qualquer pessoa que afirme ser vtima de uma violao da Conveno, seus familiares, um representante designado, ou outras pessoas nos casos em que a vtima no puder fazer a apresentao ela mesma e o autor do comunicado puder justificar sua atuao em nome da vtima.

Existe um prazo para se apresentar uma requisio?
No, mas a violao alegada deve ter ocorrido aps a declarao do Estado Parte aceitando que o procedimento entrou em vigor.

possvel apresentar um caso a este procedimento se o caso j tiver sido apresentado a outro procedimento com relao aos mesmos fatos?
No

necessria representao jurdica?
No

possvel oferecer assistncia financeira?
No

So aceitos relatos amicus?
No est previsto, mas no se exclui a possibilidade.

Quem tomar conhecimento do comunicado?
O autor do comunicado e seu representante, o Comit e sua Secretaria e o Estado Parte. A identidade do autor somente divulgada se o Comit constatar que ocorreu uma violao, mas pode ser mantida em carter confidencial a pedido do autor, mesmo em tais casos.

Quanto tempo dura este procedimento?
Normalmente um ano, mas pode se prolongar.

Quais medidas, se houver, o mecanismo pode adotar para ajudar a alcanar uma deciso? Por exemplo, audincias para apurao dos fatos; visitas in loco; postulaes escritas; audincias orais; outras.
Postulaes escritas e audincias orais.

possvel utilizar medidas provisrias ou urgentes?
Sim

Comit de Direitos Humanos

Ver Parte III, Captulo 4.2.2.2, Dados Bsicos: O Comit de Direitos Humanos.

A cronologia bsica do procedimento de reclamao particular do Comit de Direitos Humanos a mesma que a do CCT. Ver Parte III, Captulo 4.3.1.

Ver Parte III, Captulo 3.2, sobre o tipo de reclamaes que podem ser examinadas.

4.3.2.1. Quais so os requisitos de issibilidade?

Um comunicado ser declarado inissvel se:

o comunicado for annimo

o comunicado for um abuso do direito de apresentao

o comunicado for incompatvel com as disposies do Pacto

a mesma matria estiver sendo analisada por outro procedimento internacional de investigao

no tiverem sido esgotados os recursos nacionais, salvo quando os recursos forem injustificadamente prolongados



Tabela 18: Aspectos Prticos do Uso do Procedimento de Reclamao Particular: Protocolo Opcional ao PID

ASPECTOS PRTICOS DO USO DO PROCEDIMENTO DE RECLAMAO PARTICULAR: Protocolo Opcional ao Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Polticos

Quem pode apresentar um caso a este procedimento?
Pessoas que afirmem ser vtimas de uma violao do PID. So aceitos comunicados de familiares prximos ou de um representante autorizado (deve haver uma carta de autorizao da vtima ou de sua famlia). Deve-se apresentar uma explicao nos casos em que as vtimas no iniciarem a ao elas mesmas.

Existe um prazo para se apresentar uma requisio?
No, mas no havendo uma justificativa para uma longa demora, o Comit pode declarar o caso inissvel.

possvel apresentar um caso a este procedimento se o caso j tiver sido apresentado a outro procedimento com relao aos mesmos fatos?
Sim, mas somente se o Estado Parte em questo no tiver feito uma reserva a esse respeito.

necessria representao jurdica?
No

possvel oferecer assistncia financeira?
No

So aceitos relatos amicus?
No

Quem tomar conhecimento do comunicado?
O Estado Parte sempre ser informado da identidade do reclamante, para que responda s denncias, mas o Comit no tornar pblico o nome do requisitante se assim lhe for solicitado. O reclamante e o Estado Parte envolvido tm o direito de divulgar informao relacionada ao procedimento, a menos que o reclamante ou o Estado Parte solicite confidencialidade.

Quais medidas, se houver, o mecanismo pode adotar para ajudar a alcanar a uma deciso?
Todo o procedimento baseia-se em postulaes escritas das partes; outras medidas no so possveis.

Quanto tempo dura este procedimento?
Normalmente entre dois e cinco anos, embora possa ser reduzido para um ano em casos urgentes.

possvel utilizar medidas provisrias ou urgentes?
Sim, mas o Comit raramente exerce esta opo.



4.3.2.2. Dicas Especficas

Certifique-se de que o Estado parte do PID e que aceitou as reclamaes particulares nos termos do Protocolo Opcional.

Neste procedimento, um comunicado declarado inissvel se estiver sendo examinado por outro procedimento internacional de investigao; isso significa que um caso que tiver sido considerado em outro procedimento j concludo continua sendo issvel. Portanto, possvel tentar buscar uma soluo jurdica por meio de outro procedimento internacional primeiro e, subseqentemente, apresentar o caso perante o Comit de Direitos Humanos. No entanto, muitos Estados Parte tm feito reservas que impedem que o Comit examine casos j examinados por outros organismos. Certifique-se, portanto, se essas reservas se aplicam a seu caso.

Em vez de anexar um resumo dos pareceres a seu relatrio anual, o Comit de Direitos Humanos publica seus pareceres.

4.3.3. Outros Comits

Ver Parte III, Captulo 4.2.2.3, Dados Bsicos: Comit dos Direitos da Criana, Dados Bsicos: Comit para a Eliminao da Discriminao contra a Mulher e Dados Bsicos: Comit para a Eliminao da Discriminao Racial.

Somente o Comit da CEDR atualmente analisa reclamaes particulares, mas essa funo recentemente foi aprovada para o Comit da CEDM e tambm est em discusso para o CDC.

A cronologia bsica do procedimento de reclamao particular do Comit para a Eliminao da Discriminao Racial a mesma que a do CCT. Ver Parte III, Captulo 4.3.1.

Ver Parte III, Captulo 3.2, para o tipo de reclamaes que podem ser examinadas.

4.3.3.1. Quais so os requisitos de issibilidade?

Um comunicado ser declarado inissvel se:

o comunicado for annimo

o comunicado for um abuso do direito de apresentao

o comunicado for incompatvel com as disposies do Pacto

no tiverem sido esgotados os recursos nacionais, inclusive perante um rgo nacional designado, a menos que os recursos sejam injustificadamente prolongados

for apresentado mais de seis meses depois de esgotados todos os recursos nacionais, salvo no caso de circunstncias extraordinrias comprovadas

4.3.3.2. Dicas Especficas

Cerfifique-se de que o Estado parte da CEDR e que aceitou as reclamaes particulares nos termos do Artigo 14.

Embora a CEDR seja uma conveno amplamente ratificada, poucos Estados Parte aceitaram o procedimento de reclamao particular.

A CEDR estipula que os Estados Parte que aceitaram o procedimento de comunicao particular podem declarar ou indicar que um rgo nacional competente para examinar tais reclamaes no mbito nacional. Somente se no for obtida qualquer soluo jurdica desse rgo que, ento, ser possvel apresentar uma requisio ao Comit da CEDR.

A CEDR pode declarar um comunicado issvel mesmo se o caso estiver sendo examinado por outro procedimento internacional.

O Comit da CEDR no revela a identidade do reclamante sem seu expresso consentimento.

Tabela 20: Aspectos Prticos do Uso do Procedimento de Reclamao Particular: CEDR

ASPECTOS PRTICOS DO USO DO PROCEDIMENTO DE RECLAMAO PARTICULAR: Conveno da ONU sobre a Eliminao da Discriminao Racial

Quem pode apresentar um caso a este procedimento?
Uma pessoa que alegue ser vtima de uma violao dos direitos previstos na CEDR. O comunicado em geral deve ser apresentado pela prpria vtima ou por um familiar ou representante designado, mas excepcionalmente pode ser aceito de uma terceira parte atuando em nome da suposta vtima quando esta no puder atuar pessoalmente e a terceira parte puder justificar sua atuao.

Existe um prazo para se apresentar uma requisio?
At seis meses aps o esgotamento dos recursos nacionais, salvo se houver circunstncias excepcionais comprovveis.

possvel apresentar um caso a este procedimento se o caso j tiver sido apresentado a outro procedimento com relao aos mesmos fatos?
Sim

necessria representao jurdica?
No

possvel oferecer assistncia financeira?
No

So aceitos relatos amicus?
No est disposto, mas no se exclui a possibilidade.

Quem tomar conhecimento do comunicado?
A identidade da pessoa no revelada sem seu expresso consentimento.

Quanto tempo dura este procedimento?
Normalmente de 1 a 3 anos.

Quais medidas, se houver, o mecanismo pode adotar para ajudar a alcanar uma deciso? Por exemplo, audincias para apurao dos fatos; visitas in loco; postulaes escritas; audincias orais; outras.
Postulaes escritas; audincias orais; solicitao de documentao pertinente de organismos da ONU e rgos especializados.

possvel utilizar medidas provisrias ou urgentes?
Sim

5. MECANISMOS E PROCEDIMENTOS: ESFERA REGIONAL

5.1. O Sistema Europeu

Existem muitas organizaes internacionais no mbito da Unio Europia: a Organizao para Segurana e Cooperao na Europa, o Conselho da Europa e a Unio Europia. Quando da redao deste manual, somente o Conselho da Europa havia estabelecido procedimentos oficiais para lidar com denncias de tortura e outras formas de maus tratos, embora a OSCE tambm trabalhe na rea dos direitos humanos, como se observar na Parte III, Captulo 7.

Dentro do Conselho da Europa, existem dois rgos de relevncia para este manual: o Comit Europeu para a Preveno da Tortura e o Tribunal Europeu de Direitos Humanos. O Comit Europeu para a Preveno da Tortura ser discutido pormenorizadamente porque desempenha uma funo singular que nenhum outro rgo atualmente est capacitado para exercer.

Idiomas: Os idiomas oficiais e de trabalho do Conselho da Europa so o ingls e o francs. Procure apresentar pelo menos um breve resumo de suas denncias em um desses idiomas. Ver Parte III, Captulo 2.1.1, para sugestes sobre o idioma de apresentao de seu comunicado.

5.1.1. Mecanismo de Denncia: Comit Europeu para Preveno da Tortura

Tabela 21: Dados bsicos: Comit Europeu para a Preveno da Tortura

DADOS BSICOS: Comit Europeu para a Preveno da Tortura

Origem:
Como foi criado?
Pela Conveno Europia para a Preveno da Tortura de 1987


Quando comeou a funcionar?
1989

Composio:
Quantas pessoas o compem?
Tantos membros quantos Estados Parte da Conveno (atualmente 40)


So especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes

Objetivo:
Objetivo geral
Melhorar a proteo s pessoas privadas de liberdade, trabalhando para prevenir a tortura e tratamento ou punio desumana ou degradante.


Funes
Monitoramento

Apurao de fatos

5.1.1.1. Como funciona o Comit Europeu para a Preveno da Tortura?

As funes do Comit so estritamente preventivas, mas tambm so as mais intervencionistas de todos os organismos analisados neste manual. Realiza visitas aos centros de deteno nos Estados Membros para examinar o tratamento dado s pessoas privadas de liberdade e elabora um relatrio de suas constataes e recomendaes, que transmitido ao Estado em questo. Esse relatrio confidencial, mas pode ser dado a conhecer ao pblico com o consentimento do Estado. Em circunstncias excepcionais, quando um Estado Parte no colabora com o Comit ou recusa a implementao de suas recomendaes, o Comit pode decidir emitir uma declarao pblica sobre o pas. O objetivo de todo o processo no tanto condenar os Estados mas, sim, identificar as reas de interesse e fazer sugestes para melhorar a proteo s pessoas privadas de liberdade de atos de tortura e punio ou tratamento desumano ou degradante.

Caractersticas das visitas do Comit:

O que particularmente importante nas visitas do Comit em comparao com as realizadas por outros mecanismos que:

Podem ser realizadas a qualquer momento.

Podem ser realizadas em qualquer lugar dentro da jurisdio do Estado Parte em questo onde as pessoas so privadas da liberdade por agentes estatais ou da ordem pblica. Isso inclui lugares no s comumente reconhecidos como centros de deteno, tais como delegacias de polcia e gendarmerie, prises, locais de deteno anterior ao julgamento e instalaes istrativas, mas tambm instituies tais como instalaes militares, hospitais psiquitricos, centros de deteno para estrangeiros, zonas de trnsito aeroporturio, centros de desintoxicao, abrigos para crianas e asilos de idosos.

O Comit pode viajar por todo o pas e visitar as instituies sem qualquer restrio.

O Comit pode realizar entrevistas em particular com pessoas privadas da liberdade.

O Comit pode se comunicar livremente com qualquer pessoa que ele acredita possa fornecer-lhe informao relevante.

Ou seja, uma vez que um Estado aceitou as obrigaes previstas na Conveno, as atividades do Comit no dependem do consentimento do Estado Parte.

Modalidades das visitas do Comit:

As visitas do Comit so principalmente de dois tipos: visitas peridicas e visitas ad hoc. As visitas peridicas ocorrem regularmente a todos os Estados Parte. As visitas ad hoc ocorrem em resposta a alegaes graves e consistentes de um problema urgente em um determinado Estado Parte e podem ser realizadas a qualquer momento. Alm disso, o Comit realiza visitas de acompanhamento de situaes investigadas anteriormente, quando as circunstncias assim parecem exigir.

Na prtica, embora no seja especificamente necessria uma notificao das visitas, o Comit criou um procedimento de notificao de visitas peridicas que inclui: 1) anunciar, no incio do ano, os pases que o Comit pretende visitar, 2) notificar o Estado em questo das datas propostas para visita cerca de duas semanas antes da visita e, por ltimo, 3) fornecer ao Estado uma lista dos lugares que a delegao deseja visitar alguns dias antes do incio da visita. Durante a visita, a delegao tambm pode decidir fazer visitas no-anunciadas a lugares que no tenham sido indicados previamente. Essa prtica de notificao no se aplica s visitas ad hoc, que podem ser realizadas dentro de um curtssimo prazo de notificao prvia.

Os Estados tm a possibilidade de recorrer a uma lista limitada de razes excepcionais (defesa nacional, segurana pblica, distrbios graves nos lugares em que as pessoas se encontram privadas de liberdade; ou que se est sendo realizado um interrogatrio urgente relacionado a um crime grave) para adiar uma visita. No entanto, essas razes s podem ser invocadas para adiar a visita, no para evitar indefinidamente uma visita.

5.1.1.2. O que se pode conseguir apresentando informao ao Comit para a Preveno da Tortura?

Em geral:

A natureza confidencial do trabalho do Comit significa que, embora a informao enviada Secretaria sempre seja objeto de uma acusao de recebimento (voc receber uma carta que lhe dir que seu comunicado foi recebido), o Comit no pode expressar qualquer opinio sobre a qualidade ou a importncia do material, nem indicar se ser utilizado ou como ser utilizado. Para a ONG que envie a informao, o processo pode parecer mais ou menos como lanar uma pedra em um poo muito profundo e ouvir um breve "plinc" que lhe indica que a pedra chegou ao fundo, mas no se pode ver onde. muito importante no se deixar desanimar por isso. Do ponto de vista do Comit, sua informao imprescindvel para maximizar a eficcia das funes que o Comit desempenha e importante que voc considere suas chances de sucesso de um ponto de vista mais a longo prazo.

Sua informao pode ajudar o Comit a:

Centrar a ateno nos problemas mais graves em um pas no que diz respeito ao tratamento de pessoas privadas de liberdade e aos riscos de tortura ou maus tratos, bem como a identificar as possveis origens desses problemas.

Determinar a possvel necessidade de uma visita ad hoc.

Programar suas visitas, identificando as instituies que devem ser visitadas e as reas de interesse que precisam ser examinadas com mais ateno.

Compreender o contexto social e jurdico de um pas.

Avaliar at que ponto suas recomendaes esto sendo implementadas, principalmente no que se refere s garantias, no mbito do contnuo dilogo entre o Comit e os governos, como parte do processo de cooperao.

Monitorar os contnuos desdobramentos em um Estado Parte, tanto positivos como negativos.

Do ponto de vista de quem apresenta a informao, isso significa que, ao faz-lo, voc est contribuindo para a identificao de problemas graves relacionados com o tratamento de pessoas privadas de liberdade e, ainda mais importante, para a identificao das causas desses problemas e a implementao de medidas para evit-los.

Em particular:

Ao contrrio dos outros mecanismos, o Comit para a Preveno da Tortura no se ocupa de casos particulares per se. Na regio europia, isso competncia do Tribunal Europeu de Direitos Humanos, que se ocupa quase exclusivamente das denncias particulares, como ser analisado adiante. O Comit para a Preveno da Tortura est em melhores condies e dispe de meios mais adequados para contribuir para uma melhora de longo prazo da proteo geral das pessoas sob deteno oficial, e para prevenir, mais do que remediar, incidentes de tortura. No entanto, s porque o Comit no oferece recursos especficos s pessoas como parte de suas funes no significa que as pessoas no possam se beneficiar direta ou indiretamente de suas atividades.

Em primeiro lugar, importante recordar que mediante denncias particulares que possvel identificar padres, e que essas pessoas se beneficiam da eliminao de uma prtica negativa. Se, por exemplo, o Comit recebe um nmero expressivo de denncias sobre maus tratos que vm ocorrendo em um abrigo para crianas e o Comit investiga e faz recomendaes para eliminar as causas, isso trar um benefcio imediato para as pessoas da instituio.

Alm disso, as intervenes em nome de pessoas particulares no se entendem por si ss, mas ocorrem no contexto das atividades gerais do Comit. So utilizadas como uma espcie de estudo de caso para investigar uma prtica especfica ou uma acusao geral. O Comit atuou, por exemplo, em casos de pessoas detidas com base em uma legislao anti-terrorismo com o propsito de verificar denncias relacionadas a maus tratos dessas pessoas. Tambm podem ocorrer intervenes quando uma situao urgente levada ateno de uma delegao durante uma visita a um pas, e cabe destacar que, em um caso concreto, o Comit chegou a realizar uma visita ad hoc em resposta deteno de uma figura pblica que estaria correndo um risco particularmente alto. O aspecto importante que se deve ter presente que, embora a interveno do Comit nesses casos no tenha por objetivo proporcionar uma soluo particular, na prtica, pode ter efeitos equivalentes.

5.1.1.3. O que deve conter um comunicado ao Comit para a Preveno da Tortura?

Consulte as orientaes gerais na Parte III, Captulo 2, sobre como preparar uma apresentao a um mecanismo de denncia. Alm disso, tenha presente tambm o seguinte:

Caractersticas da informao:

O contedo de sua informao ser, at certo ponto, determinado pelo objetivo especfico que voc tiver em mente; por exemplo, se voc acredita que desejvel uma visita ad hoc, convm enfatizar a urgncia e a natureza extrema de uma situao. Mas, acima de tudo, a informao deve ser equilibrada (ver Parte III, Captulo 2.1.2, para sugestes sobre como faz-lo) e ser vel de comprovao pelo Comit. Isso significa que:

As denncias apresentadas devem ser to recentes quanto possvel.

Os detalhes devem ser to precisos quanto possvel.

Ambos aspectos so imprescindveis para que o Comit esteja em condies de comprovar a informao, e a natureza recente das denncias tambm importante para que o Comit possa identificar os problemas atuais. No se esquea que as provas que corroboram os fatos sustentam e confirmam os detalhes de suas denncias, principalmente provas mdicas consistentes com as acusaes.

Alm disso, exceo da informao comunicada sobre, por exemplo, a implementao das recomendaes do Comit por um determinado Estado, h outra caracterstica importante que deve estar presente:

O foco da informao deve consistir em estabelecer provas de um padro ou de uma "situao".

Isso importante porque o trabalho do Comit se destina a investigar e melhorar a situao geral de todos os Estados Membros. Se voc apresentar um nico caso particular, esse caso pode ser til como parte de um conjunto maior de informaes recebidas de outras fontes (e com certeza deve ser enviado), mas normalmente no basta demonstrar que existe um problema generalizado. Se voc puder apresentar uma srie de casos, voc conseguir avanar muito mais no sentido de estabelecer um padro, ou seja, demonstrar uma situao, e mais provvel que estimule o Comit a realizar novas investigaes da situao.

Tema:

No se limite s instituies prisionais mais bvias, como presdios ou delegacias. Sem dvida, elas so uma importante foco de interesse para o Comit, mas h outras instituies em que as pessoas esto privadas de liberdade por agentes estatais, que tambm se inserem no mbito do mandato do Comit. Entre os exemplos dessas instituies incluem-se estabelecimentos militares, centros de deteno para estrangeiros, centros de desintoxicao, abrigos para crianas, asilos para idosos e instituies psiquitricas, embora esta no deva ser considerada uma lista exclusiva. As instituies relevantes devem ter duas caractersticas: abrigar pessoas que no tm liberdade de deixar o estabelecimento por vontade prpria, e a privao de liberdade deve ser conseqncia de uma ao de uma autoridade pblica.

Tambm deve-se levar em considerao que o Comit est interessado em todos os aspectos do tratamento das pessoas privadas de liberdade. Isso inclui no s os incidentes de tortura em uma instituio, mas tambm todos os fatores que contribuem para a criao de um ambiente desumano ou degradante na instituio, tais como o tamanho das celas e sua ocupao, condies de higiene e saneamento, oportunidades de exerccio fsico, atendimento sade, recluso em cela solitria e restries de contatos com o mundo exterior. O Comit pode fazer recomendaes no s sobre as condies materiais e sociais da deteno, mas tambm de um ponto de vista mais a longo prazo, abordando questes tais como garantias legislativas ou a capacitao de pessoal.

5.1.1.4. Dicas Especficas

Quem tomar conhecimento do comunicado apresentado/ fonte da informao?

O Comit para a Preveno da Tortura nunca citar o nome de pessoas em seus relatrios, salvo se os respectivos casos j forem de domnio pblico. Tambm no citar o nome das ONGs com as quais se rene durante as entrevistas e das quais recebe informao, se esse for o desejo das ONGs participantes.

Voc receber uma resposta a seu comunicado?

Uma vez que o procedimento baseia-se no princpio da confidencialidade, a pessoa que apresenta a informao no receber qualquer resposta direta sobre sua apresentao.

Certifique-se de que o Estado sobre o qual voc est enviando informao parte da Conveno Europia para a Preveno da Tortura.

No que se refere informao apresentada com relao a uma visita peridica, ela pode ser muito til quando apresentada durante a visita, mas ainda mais til se for recebida com antecedncia, de modo que haja tempo de examinar seu contedo. Certifique-se de quais so os pases que o Comit visitar ao longo do ano (o Comit emite um comunicado imprensa com essa informao ao final de cada ano, normalmente em dezembro), de modo que voc possa se preparar para enviar a informao antecipadamente. importante observar que a visita peridica pode ocorrer a qualquer momento do ano e voc s saber quando ela ocorrer.

No espere at que seja programada uma visita peridica para enviar informao sobre um pas. O dilogo entre o Comit e os Estados Parte prossegue entre visitas e o Comit precisa manter-se a par das evolues. Sua informao pode, inclusive, proporcionar a base para a identificao da necessidade de uma visita ad hoc.

O Comit costuma reunir-se com ONGs nacionais no primeiro dia de sua visita a um pas: isso lhes d a oportunidade de apresentar informaes recentes e possivelmente influenciar a escolha dos locais que o Comit decidir visitar.

5.1.2. Procedimento de Reclamao: Conveno Europia de Direitos Humanos

Tabela 22: Dados Bsicos: Tribunal Europeu de Direitos Humanos

DADOS BSICOS: Tribunal Europeu de Direitos Humanos

Origem:
Como foi criado?
Pela Conveno Europia sobre Direitos Humanos de 1950, revisada pelo 11 Protocolo da conveno, 1994


Quando comeou a funcionar?
Em 1998, conforme o sistema revisado

Composio:
Quantas pessoas o compem?
Tantos juzes quantos Estados Parte da Conveno


So especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes

Objetivo:
Objetivo geral
Analisar denncias de violao da CEDH


Funes
Reclamaes interestatais (obrigatrio) (Artigo 33, CEDH)

Reclamaes particulares (obrigatrio) (Artigo 34, CEDH)

Apurao dos fatos (somente no contexto de reclamaes particulares e constitui um o opcional deste procedimento)

5.1.2.1. Quais so os requisitos de issibilidade ?

Um comunicado ser declarado inissvel se:

o comunicado for annimo

o comunicado no tiver sido apresentado dentro de seis meses aps a data da deciso final no caso pelas autoridades nacionais

o comunicado for manifestamente infundado ou constituir um abuso do direito de petio.

o comunicado for incompatvel com as disposies da Conveno

a requisio for fundamentalmente a mesma que o Tribunal ou outro procedimento internacional de investigao j tiver examinado e no contiver informao nova relevante

no tiverem sido esgotados os recursos nacionais, a menos que os recursos sejam ineficazes ou injustificadamente longos

5.1.2.2. O que deve conter sua requisio?

Sua carta introdutria deve conter:

um breve resumo de suas queixas

uma indicao de quais direitos da Conveno voc acredita terem sido violados

uma indicao dos recursos que voc usou

uma lista das decises oficiais adotadas em seu caso, bem como a data de cada deciso, quem a tomou, uma indicao de seu contedo; anexe uma cpia de cada deciso.

Se voc em seguida receber um formulrio, siga as instrues contidas no formulrio e na carta que o acompanha.

Tabela 23: Cronologia Bsica do Procedimento de Reclamao Particular: CEDH

CRONOLOGIA BSICA: Procedimento de reclamao particular - CEDH


Sua carta introdutria, contendo informaes mnimas, enviada ao Tribunal


possvel que lhe solicitem informaes suplementares; se parecer tratar-se de uma requisio legtima, voc receber um formulrio.


Aps o recebimento, sua requisio registrada e levada ateno do Tribunal.


As denncias so comunicadas ao Governo, que solicitado a apresentar suas observaes sobre a issibilidade da requisio.


O requisitante responde s observaes do Governo.


s vezes, o Tribunal pode decidir realizar uma audincia de issibilidade. O Tribunal decide se a requisio issvel.


Possibilidade de uma soluo amistosa.


As partes so solicitadas a apresentarem novas observaes sobre o mrito/ provas adicionais .


O Tribunal examina o mrito e adota uma sentena, provavelmente aps uma audincia oral.


O Tribunal geralmente decide a questo da justa satisfao ao mesmo tempo, mas pode optar por faz-lo em data posterior.


O Estado Parte deve executar a sentena sob a superviso do Comit de Ministros do Conselho da Europa.

Tabela 24: Aspectos Prticos do Uso do Procedimento de Reclamao Particular: CEDH

ASPECTOS PRTICOS DO USO DO PROCEDIMENTO DE RECLAMAO PARTICULAR: Conveno Europia de Direitos Humanos

Quem pode apresentar um caso a este procedimento?
Pessoas particulares, ONGs e grupos de pessoas que afirmam ser vtima de uma violao dos direitos humanos. Um caso pode ser apresentado por um familiar da vtima quando a vtima no puder faz-lo pessoalmente, isto , porque est desaparecida ou morta.

Existe um prazo para se apresentar uma requisio?
At seis meses contados a partir da data da deciso final adotada no caso pelas autoridades estatais.

possvel apresentar um caso a este procedimento se o caso j tiver sido apresentado a um outro procedimento com relao aos mesmos fatos?
No

necessria representao jurdica?
No necessria no momento da requisio, mas sim para os atos processuais aps um caso ter sido declarado issvel, salvo se o Presidente do Tribunal conceder uma permisso excepcional para que o reclamante apresente seu prprio caso.

fornecida assistncia financeira?
Sim, mas somente se a requisio for comunicada ao Governo, no no momento da requisio. Ser necessrio preencher uma declarao assinada por sua junta nacional de assistncia jurdica, uma vez que a assistncia jurdica s concedida em caso de necessidade financeira.

So aceitos relatos amicus?
Sim, mediante permisso (Norma 61, Normas Processuais)

Quem tomar conhecimento do comunicado?
Em princpio, os atos processuais so pblicos, a menos que o Presidente da Cmara decida em contrrio. Em casos excepcionais, quando um reclamante no desejar que sua identidade seja divulgada e apresentar uma declarao explicando suas razes, o Presidente pode autorizar o anonimato.

Quanto tempo dura este procedimento?
Vrios anos.

Quais medidas, se houver, o mecanismo pode adotar para ajudar a alcanar uma deciso? Por exemplo, audincias para apurao dos fatos; visitas in loco; postulaes escritas; audincias orais; outras.
Audincias para apurao dos fatos; provas de especialistas; postulaes escritas; audincias orais.

possvel utilizar medidas provisrias ou urgentes?
Sim, mas se trata de uma prtica que o Tribunal desenvolveu e no se baseia na Conveno. Aplica-se somente em determinados casos, principalmente em casos de imigrao/ deportao, quando existe um "risco real" se uma pessoa for enviada de volta (Norma 39, Normas Processuais)

5.1.2.3. Dicas Especficas

De acordo com o procedimento original, que foi substitudo em 1998, as etapas iniciais do processo se desenrolavam perante a Conveno Europia de Direitos Humanos. Se voc estiver investigando um determinado tema com base na jurisprudncia da Conveno, lembre-se de pesquisar relatrios emitidos pela Comisso, bem como sentenas proferidas pelo Tribunal.

Se o perodo de seis meses para apresentao de uma requisio estiver prestes a vencer e no houver tempo para se preparar uma requisio completa, envie uma requisio "de pausa" com um breve resumo de sua reclamao, que logo dever ser suplementada com a requisio completa to logo seja possvel.

A fim de respeitar os prazos concedidos pelo Tribunal, a data vlida a da postagem, e no a do recebimento; no entanto, aconselhvel pelo menos notificar o Tribunal, no dia do prazo final, de que a apresentao foi despachada pelo correio, o que se pode fazer enviando ao Tribunal uma cpia por fax da carta introdutria, ou por correio eletrnico ou telefone.

O Tribunal pode, por iniciativa prpria ou a pedido de uma das partes, obter as provas que considerar teis ao processo, inclusive mediante a realizao de audincias de apurao dos fatos. Quando uma das partes solicitar essas medidas, normalmente caber a esta parte arcar com os custos decorrentes, embora a Cmara possa decidir de outro modo. Se voc no deseja arcar com esses custos, aconselhvel redigir sua carta cuidadosamente: sugira ao Tribunal que talvez seja o caso de o Tribunal exercer sua discrio no sentido de adotar medidas destinadas obteno de provas.

O Tribunal realiza a maior parte de seu trabalho habitual em Cmaras de 7 juzes. Quando se considera que um caso suscita uma questo grave ou pode envolver uma mudana dos pareceres do Tribunal com relao a uma determinada matria, o caso pode ser transferido para uma Grande Cmara composta por 17 juzes. Quando um caso tiver sido considerado por uma Cmara e tiver sido proferida uma sentena, possvel, em circunstncias excepcionais, solicitar, dentro de trs meses da sentena, que o caso seja transferido para a Grande Cmara para sua considerao. (Norma 73, Normas Processuais)

possvel solicitar a interpretao de uma sentena dentro de um ano aps ela ser proferida. (Norma 79, Normas Processuais). Tambm possvel solicitar, dentro de seis meses aps a descoberta, a reviso de uma sentena caso sejam descobertos novos fatos importantes que teriam influenciado as concluses do Tribunal (Norma 80, Normas processuais).

5.2. O Sistema Interamericano

A organizao regional nas Amricas Amricas do Norte, Central e do Sul, bem como a regio do Caribe a Organizao dos Estados Americanos (OEA). Muitos instrumentos de direitos humanos foram adotados no mbito da OEA, inclusive a Declarao Americana dos Direitos e Deveres do Homem, a Conveno Americana de Direitos Humanos, a Conveno Interamericana para a Preveno e Punio da Tortura, a Conveno Interamericana sobre o Desaparecimento Forado de Pessoas e a Conveno Interamericana para a Preveno, Punio e Erradicao da Violncia contra a Mulher. Existem dois mecanismos responsveis pela implementao de todos esses instrumentos, a saber, a Comisso e o Tribunal Interamericano de Direitos Humanos.

Idiomas: Os idiomas oficiais do Comit e do Tribunal so o espanhol, o francs, o ingls e o portugus. O Tribunal e a Comisso selecionam seu idioma ou idiomas de trabalho segundo os idiomas falados por seus membros. No contexto do procedimento de reclamao particular, o Tribunal pode optar por trabalhar no idioma de uma das partes em um determinado caso, contanto que esse idioma tambm seja um idioma oficial.

Tabela 25: Dados Bsicos: Tribunal Interamericano de Direitos Humanos

DADOS BSICOS: Tribunal Interamericano de Direitos Humanos

Origem:
Como foi criado?
Pela Conveno Americana de Direitos Humanos de 1969


Quando comeou a funcionar?
1979

Composio:
Quantas pessoas o compem?
7


So especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes

Objetivo:
Objetivo geral
Supervisionar a implementao da Conveno Americana de Direitos Humanos


Funes
Reclamaes particulares (opcional) (Artigos 61-62, CADH)



Tabela 26: Dados Bsicos: Comisso Interamericana de Direitos Humanos

DADOS BSICOS: Comisso Interamericana de Direitos Humanos

Origem:
Como e quando foi criada?
Mediante uma resoluo dos Ministros de Relaes Exteriores da OEA em 1959, com vistas promoo do respeito Declarao Americana dos Direitos e Deveres do Homem.

Revisada pela Conveno Americana de Direitos Humanos em 1969.

Composio:
Quantas pessoas a compem?
7


So especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes

Objetivo:
Objetivo geral
Promover o respeito e a defesa dos direitos humanos


Funes
Monitoramento (Artigo 41, CADH)

Apurao de fatos (Artigo 41, CADH)

Reclamaes interestatais (opcional) (Artigo 45, CADH)

Reclamaes particulares (obrigatria) (Artigo 44, CADH)

Mecanismo de Denncia: Comisso Interamericana de Direitos Humanos

5.2.1.1. Como funciona a Comisso Interamericana de Direitos Humanos?

A Comisso Interamericana responsvel pela superviso do respeito, pelos Estados, de suas obrigaes assumidas em uma srie de instrumentos de direitos humanos da OEA. Possui funes de denncia, bem como recebimento de reclamaes particulares (Ver Parte III, Captulo 5.2.2).

Com relao a todos os Estados Membros da OEA (quer sejam ou no parte da Conveno Americana de Direitos Humanos), a Comisso Interamericana tem o poder de promover a conscientizao sobre os direitos humanos, fazer recomendaes aos governos, realizar estudos e elaborar relatrios, instar os governos a apresentarem informao relativa aos direitos humanos e atuar como rgo consultivo na rea de direitos humanos. Sua importncia para os fins deste manual reside no fato de que ela pode:

Elaborar relatrios sobre a situao dos direitos humanos em determinados pases, com base em uma combinao de visitas para apurao dos fatos (nos casos em que o Estado Membro em questo der seu consentimento), provas de especialistas e informaes recebidas em diversos formulrios, inclusive peties particulares.

Elaborar um relatrio anual, no qual tem-se adotado a prtica de incluir menes a Estados Membros especficos.

Com relao aos Estados Parte da Conveno Americana para a Preveno e Punio da Tortura, a Comisso tambm tem o poder de:

Receber informaes dos Estados Parte relativas a quaisquer medidas adotadas a ttulo de aplicao da Conveno e analisar, em seu relatrio anual, a situao nos Estados Membros da OEA com relao preveno e eliminao da tortura (Artigo 17).

O que se pode conseguir apresentado informao Comisso Interamericana de Direitos Humanos?

Apesar de poder adotar seu prprio mtodo de apurao dos fatos, as informaes que a Comisso recebe de vrias fontes, inclusive ONGs, ajuda a Comisso Interamericana a identificar as situaes que mais necessitam de sua ateno. A apresentao de informao lhe d a oportunidade de:

Chamar a ateno para uma situao

Buscar mudanas positivas em uma situao geral

Combater a impunidade

Alm disso, a informao fornecida no contexto dos preparativos de visitas in loco proporciona a oportunidade de se chamar a ateno da Comisso Interamericana para os problemas mais urgentes de um modo bastante especfico.

O poder da Comisso Interamericana, conforme a Conveno para a Preveno e Punio da Tortura, de relatar sobre a prtica da tortura nos Estados Membros tem um grande potencial de ajudar a centrar a ateno no problema da tortura nessa regio. No entanto, um poder que a Comisso Interamericana ainda no exercitou. Nesse sentido, as ONGs podem fomentar e facilitar esse exerccio contribuindo com informaes especfica sobre incidentes de tortura.

5.2.1.3. O que deve conter um comunicado Comisso Interamericana de Direitos Humanos?

Ver Parte III, Captulo 2, para sugestes sobre como apresentar informao particular e geral a um rgo de denncia.

Procedimento de Reclamao: Comisso Interamericana e Tribunal Interamericano de Direitos Humanos

Ver Parte III, Captulo 5.2, para Dados Bsicos: Comisso Interamericana de Direitos Humanos e Dados Bsicos: Tribunal Interamericano de Direitos Humanos.

Uma reclamao no mbito do sistema interamericano pode basear-se ou na Conveno Americana de Direitos Humanos (caso em que um Estado parte dessa Conveno) ou nas normas dos direitos humanos fundamentais estabelecidas pelo direito internacional, com especial referncia Declarao Americana dos Direitos e Deveres do Homem (caso em um Estado membro da OEA mas no parte da Conveno Americana de Direitos Humanos).

Na prtica, o procedimento de requisio funciona da mesma forma em ambos os casos, contanto que a reclamao continue sendo examinada pela Comisso. No entanto, as reclamaes s podem ser transferidas para o Tribunal se forem relacionadas a:

um Estado Parte da Conveno Americana de Direitos Humanos

que tiver aceitado a jurisdio do Tribunal

Tabela 27: Cronologia Bsica do Procedimento de Reclamao Particular: Sistema Interamericano

CRONOLOGIA BSICA: Procedimento de Reclamao Particular - Sistema Interamericano


A Comisso recebe um comunicado


Abre-se um processo. O requerente poder ser solicitado a apresentar informao suplementar.


No existe uma fase oficial de issibilidade: a Comisso pode declarar um caso issvel ou inissvel nessa fase ou simplesmente confirmar a issibilidade do caso em seu relatrio sobre o mrito.


Solicita-se ao Governo que apresente informao relevante dentro de 90 dias (ou at 180 dias, se for solicitada uma prorrogao). Em casos urgentes, a informao ser solicitada prontamente. O requerente tambm pode se solicitado a fornecer informao suplementar.


Ambas partes tm a oportunidade de comentar as informaes apresentadas pela outra parte.


A Comisso tambm pode coletar informaes ela mesma, mediante visitas in loco, uma audincia ou qualquer outro meio necessrio.


A Comisso oferece seus servios a fim de ajudar as partes a alcanarem uma soluo amistosa.


Caso no se alcance uma soluo amistosa, a Comisso produz um relatrio confidencial com suas concluses e recomendaes, e o transmite ao Estado.


Se o Estado Membro no cumprir as recomendaes e:



No for parte da CADH ou for parte porm no tiver acatado a jurisdio do Tribunal, a Comisso pode elaborar um segundo relatrio, que geralmente divulgado ao pblico. Encerra-se aqui o caso.
For parte da CADH e tiver acatado a jurisdio do Tribunal, o caso pode ser encaminhado ao Tribunal pela Comisso ou pelo Estado Parte, mas no pelo requerente. possvel que o requerente seja solicitado a assistir Comisso.


O Tribunal coleta informao sobre o caso mediante audincias escritas e orais e qualquer outro meio necessrio.


O Tribunal adota uma sentena na qual declara se ocorreu uma violao.


O Tribunal tambm se ocupa da questo da reparao, seja na sentena original, seja em outra.

5.2.2.1 O que se pode conseguir usando este procedimento?

A Comisso Interamericana de Direitos Humanos pode:

Adotar concluses em um caso particular na forma de um relatrio.

Tornar pblico seu relatrio quando um Estado no adotar as medidas adequadas para cumprir as concluses.

Solicitar que o Governo adote medidas preventivas nos casos em que houver probabilidade de um dano irreparvel s pessoas.

Solicitar em carter confidencial que o governo apresente informao sobre o paradeiro das pessoas supostamente desaparecidas.

O Tribunal Interamericano de Direitos Humanos pode:

Adotar uma sentena juridicamente vinculante, inclusive uma constatao de violao.

Ordenar a instaurao de processo judicial contra um torturador.

Conceder uma reparao.

Ordenar medidas provisrias de proteo em casos urgentes, nos quais haja probabilidade de dano irreparvel s pessoas.

Que tipo de reclamaes podem ser examinadas?

Pela Comisso Interamericana de Direitos Humanos:

Quando envolver um Estado Parte da Conveno Americana de Direitos Humanos, uma reclamao pode ser examinada se:

denunciar uma violao da Conveno Americana de Direitos Humanos pela qual o Estado pode ser considerado responsvel (Ver Parte I, Captulo 3.6 para uma anlise das aes de agentes no-governamentais).

Quando envolver um Estado Membro da OEA que no parte da Conveno Americana de Direitos Humanos, uma reclamao pode ser examinada se:

estiver relacionada com uma suposta violao das normas fundamentais de direitos humanos, nos termos do direito internacional, com especial referncia Declarao Americana sobre os Direitos e Deveres do Homem.

Pelo Tribunal Interamericano de Direitos Humanos:

Uma reclamao pode ser examinada se:

denunciar uma violao da Conveno Americana de Direitos Humanos pela qual o Estado pode ser considerado responsvel (Ver Parte I, Captulo 3.6 para um exame das aes de agentes no-governamentais)

estiver relacionada a um Estado Parte da Conveno Americana de Direitos Humanos que tiver acatado a jurisdio do Tribunal

tiver sido examinada primeiramente pela Comisso

tiver sido encaminhada ao Tribunal por um Estado Parte ou pela Comisso

5.2.2.3. Quais so os requisitos de issibilidade ?

Um comunicado ser inissvel se:

No tiverem sido esgotados os recursos nacionais adequados e eficazes.

O caso no tiver sido apresentado dentro de 6 meses aps a notificao da deciso final sobre o caso, ou dentro de um "tempo razovel" nos casos em que no for possvel o esgotamento dos recursos nacionais.

A Comisso ou outro tribunal internacional j tiver examinado ou estiver examinando um caso que trata dos mesmos fatos, exceto se este caso tiver sido apresentado por uma terceira parte sem a autorizao da vtima ou da famlia da vtima, e o caso atual for apresentado pela vtima, por um familiar da vtima ou por um representante autorizado.

O comunicado for annimo ou carecer de certos dados sobre o requerente.

O comunicado no contiver fatos que revelem uma violao de direitos.

O comunicado for manifestamente improcedente (infundado).

5.2.2.4. Dicas Especficas

Certifique-se de que o Estado parte da CADH e que aceitou a competncia do Tribunal para examinar reclamaes particulares. Em caso negativo, as reclamaes particulares referentes aos Estados Membros da OEA ainda assim podero ser apresentadas Comisso com base na Declarao Americana.

As reclamaes devem se basear na CADH (ou na Declarao Americana), mas pode ser importante fazer referncia Conveno Interamericana para a Preveno e Punio da Tortura, Conveno Interamericana sobre o Desaparecimento Forado de Pessoas, Conveno Interamericana sobre a Preveno, Punio e Erradicao da Violncia contra a Mulher a fim de ajudar a esclarecer um determinado aspecto.

Na fase em que o Tribunal considerar a questo das reparaes, os representantes da vtima ou a famlia da vtima tm o direito de apresentar seus prprios argumentos sobre a matria.

Tabela 28:Aspectos Prticos do Uso do Procedimento de Reclamao Particular: Sistema Interamericano

ASPECTOS PRTICOS DO USO DO PROCEDIMENTO DE RECLAMAO PARTICULAR: Sistema Interamericano

Quem pode apresentar um caso a este procedimento?
Qualquer grupo ou pessoa, ou entidade de ONG reconhecida juridicamente em um ou mais Estados Membros, seja em representao prpria, seja em nome de uma terceira pessoa. No necessrio ter contato com a vtima, mas geralmente com a famlia da vtima ou um representante autorizado.

Existe um prazo para se apresentar uma requisio?
At seis meses aps a deciso final adotada no caso, quando esgotados os recursos nacionais, ou dentro de um prazo razovel aps os fatos denunciados, quando no for possvel esgotar os recursos nacionais.

possvel apresentar um caso a este procedimento se o caso j tiver sido apresentado a outro procedimento com relao aos mesmos fatos?
No, a menos que o caso tenha sido apresentado por uma terceira parte sem autorizao da vtima ou de sua famlia.

preciso ter uma representao jurdica?
No necessariamente, mas aconselhvel.

possvel oferecer assistncia financeira?
No

So aceitos relatos amicus?
Sim

Quem tomar conhecimento do comunicado?
Os requerentes podem realizar uma reunio com a imprensa aps a apresentao do requerimento.

Quanto tempo dura este procedimento?
Pode durar anos.

Quais medidas, se houver, o mecanismo pode adotar para ajudar a alcanar uma deciso? Por exemplo, audincias para apurao dos fatos; visitas in loco; postulaes escritas; audincias orais; outras.
Audincias para apurao dos fatos; visitas in loco; provas de especialistas; postulaes escritas; audincias orais.

possvel utilizar medidas provisrias urgentes?
Sim

5.3. O Sistema Africano

O sistema africano para a proteo dos direitos humanos baseia-se na Carta Africana de Direitos Humanos e dos Povos, adotada sob os auspcios da Organizao da Unidade Africana (OUA). A superviso do respeito Carta tem sido, at o presente, domnio exclusivo da Comisso Africana de Direitos Humanos e dos Povos. No contexto de seu trabalho, a Comisso Africana nomeou uma srie relatores especiais, a saber, Relator Especial sobre Execues Extrajudiciais, Relator Especial sobre Mulheres e, de particular interesse para os propsitos deste manual, o Relator Especial sobre Prises e Condies de Deteno na frica. Em 1998, foi adotado um Protocolo para a criao de um Tribunal Africano, que funcionar junto Comisso, porm esse Tribunal s comear a funcionar quando 15 Estados tiverem assinado o Protocolo. Com base nas atuais informaes dadas pelos Estados africanos, possvel que isso leve entre cinco a dez anos.

Idiomas: Os idiomas oficiais da Comisso so o rabe, o ingls, o francs e o portugus, mas, na prtica, a Secretaria utiliza o ingls e o francs. Se uma parte deseja fazer uma apresentao em outro idioma, deve providenciar a traduo.

Tabela 29: Dados Bsicos: Comisso Africana de Direitos Humanos e dos Povos

DADOS BSICOS: Comisso Africana de Direitos Humanos e dos Povos

Origem:
Como foi criada?
Pela Carta Africana de Direitos Humanos e dos Povos de 1981.


Quando comeou a funcionar?
1987

Composio:
Quantas pessoas a compem?
11


So especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes.

Objetivo:
Objetivo geral
Promover e proteger os direitos humanos e dos povos na frica.


Funes
Anlise de relatrios estatais (Artigo 62, CADHP).

Monitoramento (Artigo 45, CADHP)

Apurao de fatos (Artigos 45 e 58, CADHP)

Recebimento de comunicados, inclusive de Estados (Artigo 47, CADHP) e de pessoas particulares (automtico) (Artigo 55, CADHP)

Mecanismos de Denncia

Comisso Africana de Direitos Humanos e dos Povos

Funes

A Comisso Africana pode:

analisar relatrios estatais peridicos (Artigo 62, CADHP).

empreender pesquisas e estudos, inclusive mediante visitas de apurao de fatos (Artigo 45(1)(a), CADHP)

realizar um estudo em profundidade e uma investigao ativa quando receber comunicados que indiquem a existncia de uma srie de violaes graves e em grande escala dos direitos humanos (Artigo 58, CADHP)

Ver Parte III, Captulo 2.3, para informao sobre como funcionam os procedimentos de relatrio estatal.

5.3.1.1.2. Dicas Especficas

Qualquer ONG sria, seja ela africana ou no-africana, pode solicitar a condio de observador perante a Comisso Africana. No necessrio ter a condio de observador para enviar comunicados, mas o fato de t-la d organizao certos direitos: estar informada, comparecer e participar de reunies pblicas, receber documentos e publicaes da Comisso Africana e solicitar que um determinado assunto seja includo na pauta de trabalho da Comisso. Qualquer solicitao de introduo de um item na pauta deve ser feita pelo menos 10 semanas antes da abertura da sesso.

Qualquer solicitao da condio de observador deve ser apresentada por escrito e deve incluir: o ato constitutivo da organizao e informao sobre sua estrutura, liderana, nmero de membros e atividades. Tambm seria til incluir cpias de publicaes e relatrios de atividades. Um relator designado para tratar a solicitao e fazer recomendaes Comisso Africana sobre a possibilidade de se conceder a condio de observador.

5.3.1.2. Relator Especial sobre Prises e Condies de Deteno na frica

Tabela 30: Dados Bsicos: Relator Especial sobre Prises e Condies de Deteno na frica

DADOS BSICOS: Relator Especial sobre Prises e Condies de Deteno na frica

Origem:
Como foi criado?
Mediante uma resoluo da Comisso Africana de Direitos Humanos e dos Povos de 1996


Quando comeou a funcionar?
1996

Composio:
Quantas pessoas o compem?
1


So especialistas independentes ou representantes estatais?
Especialistas independentes

Objetivo:
Objetivo geral
Examinar a situao de pessoas privadas de liberdade nos territrios dos Estados Parte da CADHP.


Funes
Monitoramento

Apurao de fatos

O Relator Especial sobre Prises pode exercer suas funes com relao a todos os Estados Parte da CADHP.

O REP pode:

Ocupar-se do monitoramento com vistas identificao de reas problemticas e fazer recomendaes para melhor-lhas.

Fazer recomendaes em casos particulares.

Recomendar uma ao urgente em casos particulares.

Buscar e receber informao sobre casos e situaes que se inserem no mbito de seu mandato.

Realizar visitas para apurao de fatos com o consentimento dos Estados Parte. Os relatrios dessas visitas so apresentados oralmente perante a CoADHP em uma sesso pblica e, embora a prpria Carta indique que os relatrios s podem ser divulgados ao pblico por deciso da Assemblia de Chefes de Estado e de Governo, na prtica, a Comisso os torna pblicos sem consultar a OUA.

As principais reas de interesse para o REP compreendem:

Condies das prises.

Questes de sade em contextos de deteno.

Deteno ou priso arbitrria ou extrajudicial.

Tratamento de pessoas privadas de liberdade.

Condies de deteno de grupos especialmente vulnerveis, tais como refugiados, pessoas portadoras de deficincia fsica ou mental ou crianas.

Procedimento de Reclamao: Comisso Africana de Direitos Humanos e dos Povos

Tabela 31: Cronologia Bsica do Procedimento de Reclamao Particular: CoADHP

CRONOLOGIA BSICA: Procedimento de Reclamao Particular CoADHP


Recebimento de um comunicado de uma pessoa ou ONG.

A Secretaria pode solicitar informaes adicionais.



Se h informao suficiente, o comunicado transmitido ao Governo; o nome do autor no revelado se tiver sido solicitado anonimato.
Se a informao insuficiente para indicar que ocorreu uma violao, o comunicado no pode ser transmitido ao Governo.



Ambas as partes so convidadas a apresentar seus comentrios sobre a issibilidade.



A Comisso considera a issibilidade do caso. Em se declarando issvel o caso, a Comisso procede considerao do mrito.


A Comisso coloca-se disposio das partes para ajud-las a chegar a uma soluo amistosa.


A fim de examinar o mrito, ambas as partes devem apresentar suas observaes sobre a matria. Muitas vezes realizada uma audincia oral perante a Comisso.


A Comisso chega a uma deciso sobre se houve ou no uma violao da Carta; sua considerao sobre o mrito ocorre em carter privativo.


A Comisso continua trabalhando com as partes para ajudar na implementao, mas no existe um mecanismo de execuo formal e ela depende essencialmente da OUA para fins de execuo.

5.3.2.1. Quais so os requisitos de issibilidade?

Um comunicado ser considerado inissvel se:

No indicar os nomes dos autores (embora estes possam solicitar Comisso que seja protegido seu anonimato).

No tiverem sido esgotados os recursos nacionais, exceto no caso de os recursos se prolongarem injustificadamente (Ver, no entanto, Dicas Especficas abaixo).

O comunicado no tiver sido apresentado dentro de um prazo razovel aps o esgotamento dos recursos nacionais.

O comunicado for incompatvel com as disposies da Carta da OUA ou com a Carta Africana.

O comunicado estiver redigido em uma linguagem insultante para com o Estado em questo.

As denncias se basearem exclusivamente em notcias veiculadas pelos meios de comunicao.

A denncia tratar de assuntos j solucionados pelos Estados envolvidos em conformidade com os princpios da Carta da ONU e da OUA ou da Carta Africana.

Tabela 32: Aspectos Prticos do Uso do Procedimento de Reclamao: CADHP

ASPECTOS PRTICOS DO PROCEDIMENTO DE RECLAMAO PARTICULAR INTERNACIONAL: Carta Africana de Direitos Humanos e dos Povos

Quem pode apresentar um caso a este procedimento?
Qualquer pessoa ou ONG que possa fornecer detalhes suficientemente precisos sobre um incidente para se iniciar uma investigao. No necessrio que seja a vtima ou um familiar da vtima, levando-se em considerao as dificuldades prticas no contexto africano.

Existe um prazo para se apresentar uma requisio?
A denncia deve ser apresentada dentro de um tempo razovel, mas a interpretao da Comisso muito generosa nesse particular.

possvel apresentar um caso a este procedimento se o caso j tiver sido apresentado a um outro procedimento com relao aos mesmos fatos?
No

necessria representao jurdica?
No, mas permitida

possvel oferecer assistncia financeira?
No

So aceitos relatos amicus?
Aceita-se qualquer informao que possa ajudar a Comisso, mas todos devem respeitar a confidencialidade do procedimento.

Quem tomar conhecimento do comunicado?
A pedido do autor, sua identidade poder ser mantida em carter confidencial.

Quanto tempo dura este procedimento?
Nos primeiros casos houve longas demoras, mas hoje o procedimento dura de 18 meses a 2 anos.

Quais medidas, se houver, o mecanismo pode adotar para ajudar a alcanar uma deciso? Por exemplo, audincias para apurao de fatos; visitas in loco; postulaes escritas; audincias orais; outras.
Postulaes escritas; audincias orais; visitas in loco nos casos que envolvam grupos de reclamantes.

possvel utilizar medidas provisrias ou urgentes?
Sim

5.3.2.2. Dicas Especficas

A Comisso proceder ao exame do comunicado mesmo se o Estado Parte no responder s denncias.

Alm dos detalhes bsicos, deve-se indicar se o comunicado diz respeito a violaes graves ou em grande escala dos direitos humanos.

Nos casos de violaes graves ou em grande escala, e quando as denncias envolvem um grande nmero de pessoas ou violaes que ocorrem h muito tempo, a Comisso, na prtica, no tem exigido o esgotamento dos recursos nacionais, com base no entendimento de que essa seria uma medida pouco prtica e indesejvel.

Por outro lado, quando as denncias envolvem violaes graves e de grande escala, possvel fundamentar o comunicado no Artigo 58 a fim de se evitar a necessidade de esgotamento dos recursos nacionais.

A Comisso exige que os autores do comunicado forneam seus nomes e endereos, mas quando as circunstncias o inviabilizarem (por exemplo, devido a um grande nmero de vtimas), no necessrio citar os nomes de todas as vtimas. A informao, no entanto, deve ser suficientemente precisa para permitir a realizao de uma investigao.

Boa parte do procedimento aplicvel a reclamaes particulares tem se desenvolvido a partir das normas processuais e da prtica da Comisso: no se surpreenda se voc no encontrar muita informao sobre o procedimento na Carta propriamente dita.

5.4. Outras regies

Atualmente no h outras regies que tenham estabelecido procedimentos formais para considerar denncias de violaes dos direitos humanos, apesar de muitas j comearem a mostrar um crescente interesse pelos direitos humanos em geral. Nos prximos anos, muito possvel que se veja um aumento no nmero de organismos internacionais capazes de considerar denncias, e tambm provvel que novos organismos regionais fundamentar-se-o nos procedimentos bem estabelecidos, testados e comprovados, descritos acima para a Europa, as Amricas e a frica.

Nesse nterim, importante no se deixar desanimar diante da ausncia de recursos internacionais prximos de onde voc vive. Os organismos da ONU no esto sujeitos a limites geogrficos e podem examinar situaes em qualquer parte do mundo. Informe-se dos tratados dos quais seu Estado faz parte e lembre-se que os procedimentos que no so de tratados podem examinar a situao dos direitos humanos em qualquer Estado Membro da ONU.

6. TABELAS DE AVALIAO COMPARATIVA DOS PROCEDIMENTOS INTERNACIONAIS

Tabela 33: Avaliao Comparativa I - CCT, CDH e CEDR (Geral)

CCT
CDH
CEDR

pre
pi
prp
pre
prp
pre
prp

At que ponto o mecanismo adequado para:

Chamar a ateno para uma situao?

O procedimento pblico?
S
N
N
S
N
S
N

As constataes so pblicas?
S
possvel
S
S
S
S
S

O mecanismo pode realizar visitas de apurao dos fatos?
N
S
N
N
N
N
N

As constataes dessas visitas so conhecidas pelo pblico?
-
possvel
-
-
-
-
-

Buscar mudanas em uma situao geral?

O mecanismo pode fazer recomendaes de natureza geral ou sistmica?
S
S
S
S
N
S
N

O Estado est juridicamente obrigado a cumprir essas recomendaes?
N
N
N
N
-
N
-

Os Estados costumam cumpri-las?
Varia
S
Jurispru-dncia insuficiente
Varia
-
Varia
-

O mecanismo dispe de um procedimento de acompanhamento?
Prximo relatrio
No, mas poderia caso a caso
No, mas no se exclui
em desen-volvi-mento
-
Prximo relatrio
-

Existe alguma sano especial que o mecanismo pode impor aos Estados que no cooperam?
N
Pode publicar um resumo dos resultados
N
N
-
N
-


Buscar solues jurdicas particulares?

De um mecanismo de denncia:

Ampla divulgao de um caso particular no contexto de uma situao geral

Impedir a deportao

O mecanismo pode fazer recomendaes em casos particulares?
N
Sim, embora no o faa com freqncia
N
N

O Estado est juridicamente obrigado a cumprir essas recomendaes?
_
N
_
_

Os Estados costumam cumpri-las?
_
S
_
_

O mecanismo dispe de um procedimento de acompanhamento para casos particulares?
-
N
N
N

Podem ser utilizadas medidas urgentes?
-
S
N
N

Um Estado est juridicamente obrigado a cumprir essas medidas?
-
N

Os Estados costumam cumpri-las?
-
S

Legenda: CCT = Comit Contra a Tortura; CDH = Comit de Direitos Humanos das Naes Unidas; CEDR = Comit para a Eliminao da Discriminao Racial; PRE = Procedimento de Relatrio Estatal; PI = Procedimento de Investigao; PRP = Procedimento de Reclamao Particular; S = Sim; N = No

Tabela 34: Avaliao Comparativa II - CDC, CEDM, RE-CDH e 1503 (Geral)

CDC
CEDM
RE-CDH
1503

pre
pre
com
af
com

At que ponto o mecanismo adequado para:

Chamar a ateno para uma situao??

O procedimento pblico?
S
S
N
N
N

As constataes so pblicas?
S
S
S
S
No, mas o fato de um Estado estar sendo considerado pblico

O mecanismo pode realizar visitas de apurao dos fatos?
N
N
N
S
Sim, mas geralmente no utiliza essa opo

As constataes dessas visitas so conhecidas pelo pblico?
-
-
-
S
N

Buscar mudanas em uma situao geral?

O mecanismo pode fazer recomendaes de natureza geral ou sistmica?
S
S
S
S
Sim, mas em carter confidencial

O Estado est juridicamente obrigado a cumprir essas recomendaes?
N
N
N
N
N

Os Estados costumam cumpri-las?
varia
varia
varia
Com freqncia
Varia

O mecanismo dispe de um procedimento de acompanhamento?
Prximo relatrio
Prximo relatrio
Pode continuar o dilogo
Dilogo de acompanha-mento
Pode manter Estado sob considerao at o ano seguinte

Existe alguma sano especial que o mecanismo pode impor aos Estados que no cooperam?
N
N
N
Pode fazer uma declarao ao apresentar o relatrio CDH da ONU
Pode transferir caso para um procedimento pblico, o que pode implicar nomear um Relator Especial


Buscar solues jurdicas particulares?

De um mecanismo de denncia:

Ampla divulgao de um caso particular no contexto de uma situao geral

Impedir a deportao

O mecanismo pode fazer recomendaes em casos particulares?
N
N
S
S

O Estado est juridicamente obrigado a cumprir essas recomendaes?
_
_
N
N

Os Estados costumam cumpri-las
_
_
Varia
Regularmente

O mecanismo dispe de um procedimento de acompanhamento para casos particulares?
N
N
Oportunidade para a fonte comentar a resposta do Estado
Pode continuar dilogo

Podem ser utilizadas medidas urgentes?
N
N
S
S

Um Estado est juridicamente obrigado a cumprir essas medidas?
-
-
N
N

Os Estados costumam cumpri-las?
-
-
Regular-mente
Regular-mente

Legenda: CDC = Comit dos Direitos da Criana ; CEDM = Comit para a Eliminao da Discriminao contra a Mulher; 1503 = Procedimento 1503; RE-CDH = Relatores Especiais/ Grupos de Trabalho/ Especialistas Independentes/ Representantes Especiais da Comisso de Direitos Humanos da ONU; PRE = Procedimento de Relatrio Estatal; AF = Apurao dos Fatos; COM = Procedimento de Comunicado; S = Sim; N = No

Tabela 35: Avaliao Comparativa III - T, CIADH e TIADH (Geral)

CEPT
CIADH
TIADH

af
af
prp
prp

At que ponto o mecanismo adequado para::

Chamar a ateno para uma situao?

O procedimento pblico?
N
N
N
N

As constataes so pblicas?
Ver apurao de fatos
Ver apurao de fatos
No automatica-mente
S

O mecanismo pode realizar visitas de apurao de fatos?
S
S
S
S

As constataes dessa visitas so conhecidas pelo pblico?
S se o Estado concordar com sua publicao: na prtica, a maioria dos Estados concorda
Geralmente
No automatica-mente
Mencionadas na sentena

Buscar mudanas em uma situao geral?

O mecanismo pode fazer recomendaes de natureza geral ou sistmica?
S
S
S
S

O Estado est juridicamente obrigado a cumprir essas recomendaes?
N
N
N
S

Os Estados costumam cumpri-las?
S
Varia
Varia
S

O mecanismo dispe de um procedimento de acompanhamento?
Visitas de acompanhamento e dilogo contnuo
Visitas de acompanhamento
Pode solicitar ser informado das medidas tomadas
Pode solicitar ser informado das medidas tomadas

Existe alguma sano especial que o mecanismo pode impor aos Estados que no cooperam?
Declarao pblica
N
Relatrio pblico/ Encaminhar ao Tribunal
N


Buscar solues jurdicas particulares?

De um mecanismo de denncia:

Ampla divulgao de um caso particular no contexto de uma situao geral

Impedir a deportao

O mecanismo pode fazer recomendaes em casos particulares?
S
S

O Estado est obrigado juridicamente a cumprir essas recomendaes?
N
N

Os Estados costumam cumpri-las
S
Varia

O mecanismo dispe de um procedimento de acompanhamento para casos particulares?
Pode acontecer
Pode pedir informaes sobre o caso

Podem ser utilizadas medidas urgentes?
Pode acontecer
S

Um Estado est juridicamente obrigado a cumprir essas medidas?
N
N

Os Estados costumam cumpri-las?
S
Varia

Legenda: CEPT = Comit Europeu para a Preveno da Tortura; CIADH = Comisso Interamericana de Direitos Humanos; TIADH = Tribunal Interamericano de Direitos Humanos; AF = Apurao de Fatos; PRP = Procedimento de Reclamao Particular; S = Sim; N = No

Tabela 36: Avaliao comparativa IV - CNADH e REP (Geral)

CoADHP
REP

pre
af/ep
prp
af
com

At que ponto o mecanismo adequado para::

Chamar a ateno para uma situao?

O procedimento pblico?
S
N
N
N
N

As constataes so pblicas?
S
Geralmente
Anexadas ao relatrio anual da CADHP
S
S

O mecanismo pode realizar visitas de apurao dos fatos?
-
S
Para grupos de reclamaes
S
S

Os resultados dessas visitas so conhecidos pelo pblico?
-
Geralmente, mas pode haver longas demoras
Podem ser
Sim, mas pode haver demora na publicao
Sim, mas pode haver demora na publicao

Buscar mudanas em uma situao geral?

O mecanismo pode fazer recomendaes de natureza geral ou sistmica?
S
S
Sim, se referente a uma "situao"
S
Sim, se referente a uma "situao"

O Estado est juridicamente obrigado a cumprir essas recomendaes?
N
N
N
N
N

Os Estados costumam cumpri-las?
s vezes
s vezes
s vezes
s vezes
s vezes

O mecanismo dispe de um procedimento de acompanhamento?
Prximo relatrio estatal
Pode manter o assunto na agenda
Possivel-mente por meio da OUA
Misses de acompanha-mento
No se exclui

Existe alguma sano especial que o mecanismo pode impor aos Estados que no cooperam?
N
N
N
N
N


Buscar solues jurdicas particulares?

De um mecanismo de denncia:

Ampla divulgao de um caso particular no contexto de uma situao geral

Impedir a deportao

O mecanismo pode fazer recomendaes em casos particulares?
N
S
S
S

O Estado est juridicamente obrigado a cumprir essas recomendaes?
-
N
N
N

Os Estados costumam cumpri-las
-
s vezes
s vezes
s vezes

O mecanismo dispe de um procedimento de acompanhamento para casos particulares?
-
N
N
No se exclui

Podem ser utilizadas medidas urgentes?
-
S
S
S

Um Estado est juridicamente obrigado a cumprir essas medidas?
-
N
N
N

Os Estados costumam cumpri-las?
-
s vezes
s vezes
s vezes

Legenda: CoADHP = Comisso Africana de Direitos Humanos e dos Povos; REP = Relator Especial sobre Prises e Condies de Deteno na frica; PRE= Procedimento de Relatrio Estatal; AF = Apurao de Fatos; EP = Estudo em Profundidade; PRP= Procedimento de Reclamao Particular; COM = Procedimento de Comunicado; S = Sim; N = No

Tabela 37: Avaliao Comparativa IV - CCT, CDH e CEDR (Procedimento de Reclamao Particular)

CCT
CDH
CEDH

At que ponto o mecanismo adequado para:

Buscar solues jurdicas particulares?

De um procedimento de reclamao:

Constatao jurdica de violao
S
S
S

Impedir a deportao
S
S
Potencialmente

Que tipo de reparao, se houver, possvel conceder?
Indicao de ao necessria para restabelecer o cumprimento
Indicao de ao necessria para restabelecer o cumprimento
Indicao de ao necessria para restabelecer o cumprimento

Os Estados esto juridicamente obrigados a cumprir a deciso final?
N
N
N

Os Estados costumam cumpri-la?
Geralmente
Varia
Varia

Existe alguma maneira de fazer valer a deciso?
No, mas possvel solicitar ser informado de quaisquer medidas adotadas
N
N

possvel utilizar medidas provisrias ou urgentes?
S
S
S

O Estado est juridicamente obrigado a cumprir essas medidas?
N
N
N

Os Estados costumam cumpri-las?
Geralmente
S
S

Legenda: CCT = Comit Contra a Tortura; CDH: Comit de Direitos Humanos; CEDR = Comit para a Eliminao da Discriminao Racial.

Tabela 38: Avaliao Comparativa V - TEDH, CIADH, TIADH e CoADHP (Procedimento de Reclamao Particular)

TEDH
CIADH
TIADH
CoADHP

At que ponto o mecanismo adequado para:

Buscar solues jurdicas particulares?

De um procedimento de reclamao:

Constatao jurdica de violao
S
S
S
S

Impedir a deportao
S
S
S
S

Que tipo de reparao, se houver, possvel conceder?
Pode incluir compensao financeira
-
Pode incluir compensao financeira e outras solues jurdicas menos tradicionais
-

Os Estados esto juridicamente obrigados a cumprir a deciso final?
S
N
S
N

Os Estados costumam cumpri-la?
S
Varia
S
s vezes

Existe alguma maneira de fazer valer a deciso?
Pode ser considerado pelo Comit de Ministros
No, embora a possibilidade de encaminhamento ao Tribunal ou de publicao da deciso pode motivar seu cumprimento
Pode ser objeto de ao nos tribunais nacionais
N

possvel utilizar medidas provisrias ou urgentes?
S
S
S
S

O Estado est juridicamente obrigado a cumprir essas medidas?
N
N
S
N

Os Estados costumam aceit-las?
S
Varia
S
s vezes

Legenda: TEDH = Tribunal Europeu de Direitos Humanos; CIADH = Comisso Interamericana de Direitos Humanos; TIADH = Tribunal Interamericano de Direitos Humanos; CoADHP = Comisso Africana de Direitos Humanos e dos Povos

7. ONDE SE PODE BUSCAR MAIS AJUDA?

7.1. Por que seria desejvel buscar mais ajuda?

Os procedimentos oficiais perante mecanismos internacionais constitudos com o propsito exclusivo de avaliar se os Estados esto respeitando suas obrigaes estabelecidas no direito internacional no so, de modo algum, o nico meio de ajuda ao qual se pode recorrer em resposta a denncias de tortura. Existem vrias razes para se querer buscar ajuda de outra fonte como medida adicional ou alternativa , recorrendo a um procedimento formal.

Em certas circunstncias, pode ser que voc esteja relutante em recorrer aos mecanismos internacionais. Talvez esteja preocupado quanto sua prpria segurana ou se sinta intimidado pelo processo. Nos casos em que voc disp de informao que pode ajudar uma pessoa a obter uma soluo jurdica ou mesmo salvar a vida de uma pessoa, ou informao que pode ser importante para os organismos internacionais, deve-se pelo menos considerar uma ao que no necessariamente o envolva pessoalmente, mas que garanta que a informao no seja desperdiada. Uma possvel soluo seria remeter a informao a outro grupo ou organizao que esteja em melhores condies de dar continuidade ao processo. Tambm possvel recorrer a certas organizaes para obter apoio e orientao; elas podero lhe aconselhar sobre a melhor linha de ao a seguir.

importante lembrar que, independentemente de se utilizar ou no um procedimento oficial para buscar uma soluo jurdica, certamente a melhor assistncia que se pode proporcionar a uma vtima da tortura consiste em oferecer-lhe apoio e reabilitao. Uma vez mais, existem organizaes especializadas nessa rea com as quais talvez seja o caso de voc entrar em contato.

Um complemento extremamente eficaz e geralmente mais rpido do que os procedimentos formais o lobby, particularmente junto Comisso de Direitos Humanos e Subcomisso para Proteo e Promoo dos Direitos Humanos das Naes Unidas, mas tambm junto a uma srie de rgos polticos.

Tabela 39: Possveis Fontes de Ajuda

Tipo de Ajuda
possvel fonte (Ver Apndice II para mais detalhes)

Organizaes que podem adotar aes com base em sua informao
Comit Internacional da Cruz Vermelha

Alto Comissariado das Naes Unidas para Refugiados

ONGs nacionais e internacionais mais experientes

Misses de campo, tais como as da OSCE, do Alto Comissariado das Naes Unidas para os Direitos Humanos, ou de grandes ONGs internacionais

Organizaes especficas para vtimas, tais como as conferncias da OIT ou a UIP.

Organizaes que podem oferecer assessoramento e apoio
ONGs internacionais ou nacionais mais experientes

Organizaes e redes profissionais

Organizaes que podem ajudar as vtimas mediante apoio e reabilitao
Fundo Voluntrio das Naes Unidas para Vtimas da Tortura

ONGs nacionais e internacionais de reabilitao

Organizaes ou rgos onde o exerccio ativo do lobby pode ser eficaz
Comisso das Naes Unidas de Direitos Humanos

Subcomisso das Naes Unidas para Promoo e Proteo dos Direitos Humanos

7.2. Algumas fontes especficas de ajuda

Comit Internacional da Cruz Vermelha

O Comit Internacional da Cruz Vermelha (CICV) uma organizao neutra e independente que intervm principalmente no contexto de um conflito armado, mas tambm em situaes de violncia e agitao poltica. O Comit tem sua sede em Genebra, Sua, mas tem delegaes de campo em muitos pases onde sua interveno se faz necessria, geralmente mediante acordo com as autoridades do pas. Nesses contextos, uma de suas funes atuar como intermedirio neutro entre as pessoas detidas e as autoridades que efetuam a deteno. Seus representantes realizam visitas a locais de deteno onde as pessoas so mantidas por razes relacionadas ao envolvimento no conflito ou na agitao, e examinam as condies de deteno e tratamento e entrevistam os detentos sobre sua experincia em deteno. Devem ter o a todos os locais de deteno onde so mantidos detentos que se inserem no campo de atividade do Comit, bem como a oportunidade de entrevistar os prprios detentos em particular e sem a presena de testemunhas. Em troca disso, mantm absoluta confidencialidade sobre o que observam durante as visitas. Devido a seu mandato especial e a seus mtodos de trabalho, o CICV geralmente tem o a locais de deteno que outros grupos no podem visitar.

O CICV dispe de sua prpria rede e seu prprio quadro de pessoal, exercendo suas funes independentemente de outras organizaes. No entanto, o Comit est aberto a receber informao sobre padres de violao ou pedidos de informao sobre detentos especficos ou pessoas desaparecidas que o Comit poderia estar em condies de acompanhar. O CICV prefere receber tal informao diretamente dos familiares, mas aceita informaes de ONGs com base no entendimento de que a confidencialidade que protege seu trabalho significa que a ONG no deve esperar um retorno sobre qualquer ao adotada. No caso de pessoas desaparecidas, o Comit pode enviar uma resposta famlia. Em geral, o Comit procura fazer contato direto com a famlia antes de decidir adotar alguma ao. O princpio que norteia sua conduta que qualquer ao que venha a adotar se faa em prol e em nome dos prprios detentos, no de outras organizaes.

A informao transmitida ao CICV deve ser conter o mximo de detalhes possvel sobre a priso e a deteno. Como regra geral, o CICV tender a agir mais rapidamente em casos que indiquem um padro do que em casos particulares.

Alto Comissariado das Naes Unidas para Refugiados

O Alto Comissariado das Naes Unidas para Refugiados (ACNUR) atua no sentido de proteger e proporcionar assistncia a pessoas que tenham tido de fugir de seu pas devido a um temor fundado de perseguio e no podem ou no querem regressar (refugiados), bem como a outros grupos em situaes semelhantes, tais como pessoas deslocadas em seu prprio pas (PDs) e vtimas da guerra civil.

Uma das maneiras pelas quais o ACNUR desempenha essas funes por meio de uma rede de pessoal em todo o mundo, com base em vrias localidades onde h pessoas que se inserem no objeto de seu mandato, inclusive capitais, campos remotos de refugiados ou de PDs, bem como ao longo de reas fronteirias. Seu propsito proteger e minimizar o risco de ataques a grupos e campos de refugiados e de PDs, identificar e tratar as causas de deslocamento em situaes especficas. Nesse contexto, muito importante fornecer-lhe informao sobre: 1) quaisquer maus tratos a refugiados e PDs em seu lugar de origem ou durante o trnsito, e 2) quaisquer maus tratos a refugiados e PDs dentro dos campos.

Visitas e misses de campo

Tanto organizaes intergovernamentais, tais como a OSCE e a ONU, quanto organizaes no-governamentais internacionais podem criar misses de campo ou realizar visitas de campo. Essas visitas podem ser permanentes (contnua) ou ad hoc (em resposta a um acontecimento ou situao especfica). A maioria dessas misses e visitas concebida para coletar e monitorar informaes sobre a situao e dependem intensamente das informaes fornecidas por vrias fontes.

ONGs internacionais e nacionais ou locais e outras organizaes de apoio

Existe uma vasta gama de ONGs nacionais e internacionais. Um ponto inicial de contato poderia ser uma grande ONG nacional experiente. Em geral, essa a melhor maneira de se reunir informao bsica sobre recursos nacionais ou sobre os tratados dos quais o Estado parte. As ONGs podem prestar uma assistncia de grande valia, seja assumindo responsabilidade pelo encaminhamento de denncias, seja aconselhando-o sobre como proceder. Um tipo de ONG internacional particularmente til a chamada "organizao guarda-chuva". Trata-se de ONGs que atuam como ponto central de contanto para uma rede de ONGs nacionais menores. Em geral, para poder participar de uma rede, as ONGs nacionais devem explicar seus objetivos, mtodos de trabalho etc., e devem poder demonstrar que tanto elas quanto suas informaes so fidedignas (Ver Apndice II para exemplos dessas organizaes).

Tambm possvel obter assistncia e respaldo de organizaes profissionais e redes de apoio (Ver Apndice II para exemplos dessas organizaes).

Fundo Voluntrio das Naes Unidas para as Vtimas da Tortura

O Fundo Voluntrio das Naes Unidas para Vtimas da Tortura foi criado com a finalidade de distribuir financiamento a ONGs que prestam assistncia mdica, psicolgica, jurdica, social, financeira, humanitria e qualquer outro tipo de assistncia s vtimas da tortura e a seus familiares. Qualquer ONG disposta a realizar um projeto desse tipo pode solicitar uma subveno do Fundo. Deve-se preencher um formulrio com informaes detalhadas sobre o projeto proposto e a organizao beneficiada dever apresentar um relatrio sobre o emprego da subveno concedida. Os formulrios devem ser entregues at 31 de dezembro de cada ano e os recursos financeiros so distribudos cerca de seis meses depois (Ver Apndice II para detalhes).

Lobby

Nada pode substituir a opinio pblica quando se trata de buscar mudanas efetivas. No h dvida de que o lobby perseverante pode ajudar a trazer tona e lanar luz sobre os abusos cometidos contra os direitos humanos. O lobby mais importante o que ocorre em Genebra durante as sesses da Comisso de Direitos Humanos e a Subcomisso para Proteo e Promoo dos Direitos Humanos das Naes Unidas. O exerccio do lobby junto aos membros e representantes estatais pode fazer a diferena entre excluir um tema da agenda ou adotar uma resoluo em condenao a um Estado. Se voc deseja participar, recomenda-se que voc entre em contato com uma ONG sediada em Genebra, que poder ajud-lo e fornecer-lhe informao sobre como solicitar permisso para comparecer s sesses e como fazer uma apresentao escrita ou oral (Ver Apndice II para contatos).

Outros foros onde se realiza um lobby ativo em matria de direitos humanos so os rgos polticos de organizaes internacionais, a exemplo do Parlamento Europeu, e representantes governamentais (no necessariamente de seu pas), principalmente os de Estados influentes.

RESUMO

PARTE III - AO DIANTE DA INFORMAO COLETADA

Introduo s possveis linhas de ao

possvel agir

No mbito internacional

No mbito nacional

Se houver recursos eficazes no mbito nacional, deve-se procurar utiliz-los antes de recorrer aos mecanismos internacionais. No mbito nacional, existem recursos tais como processos penais; processos civis; processos istrativos; processos disciplinares ou pedidos de asilo.

Para escolher uma linha de ao no mbito internacional, deve-se considerar:

A disponibilidade do mecanismo: ele pode ser utilizado?

A adequao do mecanismo: ele adequado a seus objetivos?

O que se deve saber sobre os mecanismos internacionais de denncia e como us-los

Um mecanismo internacional de denncia um mecanismo que recebe ou busca informao com a finalidade de denunciar ou comentar se os Estados esto respeitando suas obrigaes nos termos da legislao internacional dos direitos humanos. A informao que esse mecanismo recebe pode estar relacionada a acusaes gerais e particulares, mas seu objetivo, em ltima anlise, obter um retrato preciso da situao geral e fazer recomendaes.

Os mtodos mais comumente utilizados pelos mecanismos internacionais de denncia no desempenho de suas funes so:

Monitoramento

Anlise de relatrios estatais

Visitas de apurao dos fatos

O contedo e a forma de sua apresentao variar segundo as funes do mecanismo (Ver texto principal para indicaes), mas todos os comunicados devem ser:

veis

Equilibrados e crveis

Detalhados

O que se deve saber sobre os procedimentos internacionais de reclamao e como us-los

Um procedimento internacional de reclamao um processo formal de natureza jurdica no qual uma pessoa ou grupo de pessoas apresenta uma denncia a um organismo jurdico internacional, alegando que seus direitos individuais foram violados em um caso especfico. Uma reclamao nos termos deste procedimento tambm pode ser denominada: requisio, petio ou comunicado.
Ao considerar uma reclamao particular, o organismo faz duas perguntas principais:

O organismo tem poder para examinar a reclamao? Trata-se da questo de issibilidade. Se o rgo conclui que o caso inissvel (que ele no tem poder para examinar a reclamao), o caso se encerra e os fatos no so examinados (Ver texto principal para as razes pelas quais uma reclamao pode ser declarada inissvel).
Os fatos indicam ter ocorrido uma violao das obrigaes do Estado? o que se chama considerao do mrito do caso, e s acontece se o caso for considerado issvel.
Um comunicado a um procedimento internacional de reclamao sempre deve conter:

Uma carta introdutria que exponha um mnimo de detalhes (Ver texto principal para sugestes).
Tanta documentao de apoio Quanto for possvel (Ver texto principal para sugestes).

Mecanismos e procedimentos: Naes Unidas

Os mecanismos e procedimentos de denncia mais importantes no mbito do sistema das Naes Unidas so:
O Procedimento 1503
Os Procedimentos Especiais da Comisso de Direitos Humanos da ONU: Relatores Temticos e de Pases
O Comit Contra a Tortura
O Comit de Direitos Humanos
O Comit dos Direitos da Criana
O Comit para a Eliminao da Discriminao contra a Mulher
O Comit para a Eliminao da Discriminao Racial

Os procedimentos de reclamao mais importantes no mbito do sistema das Naes Unidas fundamentam-se nos seguintes instrumentos:

Conveno Contra a Tortura (implementada pelo Comit contra a Tortura)
Protocolo Opcional do PID (implementado pelo Comit de Direitos Humanos)
Conveno para a Eliminao da Discriminao Racial (implementada pelo Comit para a Eliminao da Discriminao Racial)

Mecanismos e procedimentos: esfera regional

EUROPA:
O mecanismo de denncia mais importante no sistema europeu :

O Comit Europeu para a Preveno da Tortura
O procedimento de reclamao mais importante no sistema europeu fundamenta-se no seguinte instrumento:

Conveno Europia de Direitos Humanos (implementada pelo Tribunal Europeu de Direitos Humanos)
AMRICAS:

O mecanismo de denncia mais importante no sistema interamericano :

A Comisso Interamericana de Direitos Humanos
O procedimento de reclamao mais importante no sistema interamericano fundamenta-se nos seguintes instrumentos:

Conveno Americana de Direitos Humanos ou Declarao Americana sobre os Direitos e Deveres do Homem (implementadas pela Comisso e pelo Tribunal Interamericano de Direitos Humanos)
FRICA:

Os mecanismos de denncia mais importantes no sistema africano so:

A Comisso Africana de Direitos Humanos e dos Povos
O Relator Especial sobre Prises e Condies de Deteno na frica

O procedimento de reclamao mais importante no sistema africano fundamenta-se no seguinte instrumento:

Carta Africana de Direitos Humanos e dos Povos (implementada pela Comisso Africana de Direitos Humanos e dos Povos)

Onde se pode buscar mais ajuda?

Pode ser que voc esteja relutante em recorrer aos mecanismos internacionais por iniciativa prpria, ou pode ser que voc precisa de apoio ou orientao, tanto para voc mesmo quanto para uma vtima. Nos casos em que voc tomar uma ao voc mesmo, talvez convenha reforar ou agilizar o processo mediante o exerccio do lobby.
Em tais casos, entre as organizaes ou rgos aos quais voc pode recorrer incluem-se aqueles que podem adotar suas prprias aes com base em sua informao ou que podem lhe proporcionar assessoramento e apoio; aqueles que podem ajudar as vtimas com apoio ou reabilitao; e aqueles junto aos quais o lobby ativo pode se mostrar eficaz.

APNDICES

1. Apndice I - Lista de Instrumentos Relevantes

2. Apndice II Dados para Contato e Obteno de Maiores Informaes

3. Apndice III - Formulrios de Requisio Padro

4. Apndice IV Diagramas do Corpo

1. APNDICE I - LISTA DE INSTRUMENTOS RELEVANTES

Todos os instrumentos relacionados a seguir podem ser relevantes para qualquer pessoa que queira denunciar maus tratos a rgos internacionais ou mesmo no mbito do sistema nacional. Os instrumentos foram organizados por tema para facilitar a escolha de todos os instrumentos relevantes para um determinado assunto. Dentro das divises temticas, os instrumentos foram subdivididos segundo sua origem, isto , a organizao internacional que os criou. Por razes de espao, no foi possvel reproduzir aqui todos os instrumentos, mas o Apndice II contm referncias de possveis fontes para obteno de cpias dos instrumentos.

Instrumentos Gerais de Direitos Humanos:

Naes Unidas:

Declarao Universal dos Direitos Humanos

Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Polticos

Protocolo Opcional do Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Polticos

Conselho da Europa:

Conveno Europia de Direitos Humanos

Organizao dos Estados Americanos:

Declarao Americana dos Direitos e Deveres do Homem

Conveno Americana de Direitos Humanos

Organizao da Unidade Africana:

Carta Africana de Direitos Humanos e dos Povos

Instrumentos de Direitos Humanos Especficos Tortura:

Naes Unidas:

Declarao para a Proteo de Todas as Pessoas Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Punies Cruis, Desumanos ou Degradantes

Conveno Contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Punies Cruis, Desumanos ou Degradantes

Conselho da Europa:

Conveno Europia para a Preveno da Tortura

Organizao dos Estados Americanos:

Conveno Interamericana para a Preveno e Punio da Tortura

Normas Gerais para o Tratamento de Pessoas sob Custdia Oficial:

Naes Unidas:

Normas Mnimas para o Tratamento de Prisioneiros

Princpios Bsicos para o Tratamento de Prisioneiros

Conjunto de Princpios para a Proteo de Todas as Pessoas sob Qualquer Forma de Deteno ou Priso

Regras das Naes Unidas para a Proteo de Menores Privados de Liberdade

Normas Mnimas das Naes Unidas para a istrao de Justia Juvenil ("Regras de Pequim")

Conselho da Europa:

Regulamento Prisional Europeu

Normas Profissionais:

Naes Unidas:

Princpios ticos Mdicos pertinentes Funo do Pessoal de Sade, principalmente Mdicos, na Proteo de Presos e Detentos contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Punies Cruis, Desumanos ou Degradantes

Regras Modelos de Autpsias

Cdigo de Conduta das Autoridades de Execuo da Lei

Princpios Bsicos sobre o Uso de Fora e Armas de Fogo por Autoridades de Execuo da Lei

Princpios Bsicos sobre a Funo dos Advogados

Orientaes sobre a Funo dos Promotores

Princpios Bsicos sobre a Independncia do Poder Judicirio

Conselho da Europa:

Declarao sobre a Polcia

Instrumentos Relativos Mulher:

Naes Unidas:

Declarao sobre a Eliminao de Todas as Formas de Discriminao contra a Mulher

Conveno sobre a Eliminao de Todas as Formas de Discriminao contra a Mulher

Declarao sobre a Eliminao da Violncia contra a Mulher

Organizao dos Estados Americanos:

Conveno Interamericana para a Preveno, Punio e Erradicao da Violncia contra a Mulher

Instrumentos Relativos a Crianas:

Naes Unidas:

Declarao sobre os Direitos da Criana

Conveno sobre os Direitos da Criana

Regras das Naes Unidas para a Proteo de Menores Privados de Liberdade

Normas Mnimas das Naes Unidas para a istrao de Justia Juvenil ("Regras de Pequim")

Organizao da Unidade Africana

Carta Africana sobre os Direitos e o Bem-estar da Criana

Instrumentos Relativos a Pessoas Detidas por Razes de Sade Mental:

Naes Unidas:

Princpios para a Proteo de Pessoas com Doenas Mentais e a Melhoria do Atendimento em Sade Mental

Instrumentos Relativos a Discriminao Racial, Apartheid e Genocdio:

Naes Unidas:

Declarao das Naes Unidas para a Eliminao de Todas as Formas de Discriminao Racial

Conveno Internacional para a Eliminao de Todas as Formas de Discriminao Racial

Conveno para a Preveno e Punio do Crime de Genocdio

Conveno Internacional para a Supresso e Punio do Crime de Apartheid

Instrumentos Relativos a Desaparecimentos e Execues Extrajudiciais:

Naes Unidas:

Declarao para a Proteo de Todas as Pessoas contra Desaparecimentos Forados

Princpios sobre a Preveno e Investigao Efetivas de Execues Extrajudiciais, Arbitrrias e Sumrias

Organizao dos Estados Americanos:

Conveno Interamericana sobre o Desaparecimento Forado de Pessoas

Instrumentos Jurdicos Humanitrios:

Conveno I de Genebra para a Melhoria das Condies dos Feridos e Enfermos das Foras Armadas no Campo

Conveno II de Genebra para a Melhoria das Condies dos Feridos, Enfermos e Nufragos Membros das Foras Armadas no Mar

Conveno III relativa ao Tratamento de Prisioneiros de Guerra

Conveno IV de Genebra relativa Proteo de Civis em Tempo de Guerra

Protocolo Adicional s Convenes de Genebra de 12 de agosto de 1949, relativo Proteo de Vtimas de Conflitos Armados Internacionais (Protocolo I)

Protocolo Adicional s Convenes de Genebra de 12 de agosto de 1949, relativo Proteo de Vtimas de Conflitos Armados No-Internacionais (Protocolo II)

Outros Instrumentos Importantes:

Naes Unidas:

Declarao sobre o Direito e a Responsabilidade de Indivduos, Grupos e rgos da Sociedade pela Promoo e Proteo dos Direitos Humanos e das Liberdades Fundamentais Reconhecidos Universalmente ("Declarao sobre os Defensores dos Direitos Humanos")

Garantias de Proteo dos Direitos dos Condenados Pena de Morte

Declarao de Princpios Bsicos de Justia para Vtimas de Crimes e Abuso de Poder

Estatuto do Tribunal Penal Internacional

2. APNDICE II DADOS PARA CONTATO E OBTENO DE MAIORES INFORMAES

DADOS PARA CONTATO:

Mecanismos Internacionais:

COMISSO AFRICANA DOS DIREITOS HUMANOS E DOS POVOS:

Kairaba Avenue, P.O. Box 673

Banjul, Gmbia

Telefone: +220-392962

Fax: +220-390764

Correio eletrnico: [email protected]

COMIT CONTRA A TORTURA:

OHCHR-UNOG

CH 1211 Genebra 10, Sua

Telefone: +41-22-917 9000

Fax: +41-22-917 9011

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.unhchr.ch/

COMIT PARA A ELIMINAO DA DISCRIMINAO RACIAL:

OHCHR-UNOG

CH 1211 Genebra 10, Sua

Telefone: +41-22-917 9000

Fax: +41-22-917 9011

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.unhchr.ch/

COMIT PARA A ELIMINAO DA DISCRIMINAO CONTRA A MULHER:

OHCHR-UNOG

CH 1211 Genebra 10, Sua

Telefone: +41-22-917 9000

Fax: +41-22-917 9011

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.unhchr.ch/

COMIT SOBRE OS DIREITOS DA CRIANA:

OHCHR-UNOG

CH 1211 Genebra 10, Sua

Telefone: +41-22-917 9000

Fax: +41-22-917 9011

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.unhchr.ch/

COMIT EUROPEU PARA A PREVENO DA TORTURA:

Conselho da Europa

F-67075 Estrasburgo Cedex

Frana

Correio eletrnico: [email protected]

Telefone: +33-3-88 41 20 24

Fax: +33-3-88 41 27 04

http://www.t.coe.int/

TRIBUNAL EUROPEU DE DIREITOS HUMANOS:

Tribunal Europeu de Direitos Humanos

Conselho da Europa

F - 67075 Estrasburgo-Cedex

Frana

Telefone: +33-3-88 41 20 18

Fax: +33-3-88 41 27 30

http://www.echr.coe.int/

COMIT DE DIREITOS HUMANOS:

OHCHR-UNOG

CH 1211 Genebra 10, Sua

Telefone: +41-22-917 9000

Fax: +41-22-917 9011

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.unhchr.ch/

COMISSO INTERAMERICANA DE DIREITOS HUMANOS:

Comisso Interamericana de Direitos Humanos

1889 F St., NW, Washington, D.C., EE.UU. 20006.

Telefone: +1-202-458 6002

Fax: +1-202-458 3992.

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.cidh.oas.org/

TRIBUNAL INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS:

Tribunal Interamericano de Direitos Humanos

Apdo 6906-1000

San Jos, Costa Rica

Telefone: + 506-234 0581 or +506-225 3333

Fax: +506-234 0584

Correio eletrnico: [email protected]

http://www1.umn.edu/humanrts/iachr/iachr.html

ESCRITRIO DO ALTO COMISSARIADO DAS NAES UNIDAS PARA DIREITOS HUMANOS:

OHCHR-UNOG

CH 1211 Genebra 10, Sua

Telefone: +41-22-917 9000

Fax: +41-22-917 0099

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.unhchr.ch/ (inclui dados sobre todas as presenas no campo do EACDH e textos de muitos instrumentos internacionais de direitos humanos)

RELATOR ESPECIAL SOBRE PRISES E CONDIES DE DETENO NA FRICA

Kairaba Avenue, P.O. Box 673

Banjul, Gmbia

Telefone: +220-392962

Fax: +220-390764

Correio eletrnico: [email protected]

RELATOR ESPECIAL DAS NAES UNIDAS SOBRE A TORTURA:

OHCHR-UNOG

CH 1211 Genebra 10, Sua

Telefone: +41-22-917 9000

Fax: +41-22-917 9006

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.unhchr.ch/

PROCEDIMENTO 1503

OHCHR-UNOG

CH 1211 Genebra 10, Sua

Telefone: +41-22-917 9000

Fax: +41-22-917 9011

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.unhchr.ch/

Outras Fontes de Ajuda:

Organismos Intergovernamentais Especializados:

ORGANIZAO INTERNACIONAL DO TRABALHO:

Departamento Internacional de Normas Trabalhistas e Direitos Humanos (NORMES)

4 route de Morillons

CH-1211 Genebra 22

Sua

Telefone: +41-22-799 7126

Fax: +41-22-799 6926

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.ilo.org/

ESCRITRIO PARA INSTITUIES DEMOCRTICAS E DIREITOS HUMANOS:

Organizao para Segurana e Cooperao na Europa

Escritrio para Instituies Democrticas e Direitos Humanos

Aleje Ujazdowskie 19

00-557 Varsvia

Polnia

Telefone: +48-22-520 06 00

Fax: +48-22-520 06 05

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.osce.org/odihr/ (inclui dados atuais de operaes de campo)

PROGRAMA DAS NAES UNIDAS PARA O DESENVOLVIMENTO (PNUD)

1 UN Plaza

Nova York, NY 10017

Estados Unidos

http://www.undp.org (esta pgina d o a muitos escritrios do PNUD em todo o mundo)

ALTO COMISSARIADO DAS NAES UNIDAS PARA REFUGIADOS:

C.P. 2500,

1211 Genebra 2,

Sua

http://www.unhcr.ch/ (inclui link para endereos de correio eletrnico e dados sobre todas as atividades de campo do ACNUR)

UNICEF:

UNICEF House

3 United Nations Plaza

Nova York, NY 10017

Estados Unidos

Telefone: +1-212-326 7000

Fax: +1-212-887 7465

http://www.unicef.org/

Organizao Humanitria Internacional:

COMIT INTERNACIONAL DA CRUZ VERMELHA:

19 Avenue de la Paix

CH 1202 Genebra

Sua

Telefone: +41-22-734 60 01

Fax: +41-22-733 20 57 (Central de Informao ao Pblico)

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.icrc.org/

ONGs Internacionais:

"Organizaes guarda-chuva":

ASSOCIAO PARA A PREVENO DA TORTURA (APT)

Route de Ferney 10

Case postale 2267

CH-1211 Genebra 2

Sua

Telefone: +41-22-734 2088

Fax: +41-22-734 5649

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.apt.ch/ (inclui cpias de muitos relatrios e estudos)

ORGANIZAO MUNDIAL CONTRA A TORTURA (OMCT)

Secretaria Internacional

PO Box 35 - 37 Rue de Varemb

CH1211 Genebra CIC 20

Sua

Telefone: + 41-22-733 3140

Fax: + 41-22-733 1051

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.omct.org/

FEDERAO INTERNACIONAL DAS LIGAS DOS DIREITOS HUMANOS (FIDH)

17 age de la Main d'Or

75011 Paris, Frana

Telefone : +33-1-43 55 25 18

Fax : +33-1-43 55 18 80

Correio eletrnico : [email protected]

http://www.fidh.imaginet.fr/

Outras ONGs Internacionais:

ANISTIA INTERNACIONAL (AI)

Secretaria Internacional

1 Easton St

Londres

WC1X 8DJ

Reino Unido

Telefone: +44-171-413 5500

Fax: +44-171-956 1157

Correio eletrnico:[email protected]

http://www.amnesty.org/ (o ponto de partida para o a todos os relatrios e comunicados imprensa da AI, bem como dados para contato com escritrios nacionais)

AO CRIST PARA A ABOLIO DA TORTURA E DAS EXECUES CAPITAIS (ACAT)

7 rue Georges Lardennois

75019 Paris, Frana

Telefone: +33 -1-40 40 42 43

Fax : +33 -1-40 40 42 44

Correio eletrnico: [email protected]

http://home.worldnet.fr/acatfr/

FIACAT:

Federao Internacional da ACAT

27 rue de Maubeuge

75009 PARIS

Frana

Telefone : +33-1-42 80 01 60

Fax : +33-1-42 80 20 89

Correio eletrnico: [email protected]

DIREITOS HUMANOS NA INTERNET (HRI):

8 York StrRET, Suite 302

Ottawa, Ontrio

K1N 5S6 Canad

Telefone: +1-613-789 7407

Fax: +1-613-789 7414

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.hri.ca/

HUMAN RIGHTS WATCH (HRW):

350 Fifth Avenue, 34th Floor

Nova York, NY

10118-3299 EUA

Telefone: +1-212-290 4700

Fax: +1-212-736 1300

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.hrw.org/

FEDERAO INTERNACIONAL DE HELSINKI PARA OS DIREITOS HUMANOS:

Rummelhardtg. 2/18

A-1090 Viena

ustria

Telefone: +43-1-408 88 22

Fax: +43-1-408 88 22-50

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.ihf-hr.org/

INSTITUTO INTERAMERICANO DE DIREITOS HUMANOS:

A.P. 10.081-1000

San Jos, Costa Rica

Tel.: +506-234 0404

Fax: +506-234 0955

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.iidh.ed.cr/

SERVIO INTERNACIONAL PARA OS DIREITOS HUMANOS:

(fornece informaes e presta assistncia s ONGs que desejam utilizar o sistema da ONU)

1 Rue de Varemb

P.O. Box 16

Ch-1211 Genebra CIC

Sua

Telefone: +41-22-733 5123

Fax: +41-22-733 0826

REFORMA PENAL INTERNACIONAL

Unit 114, The Chandlery

50 Westminster Bridge Rd

Londres SE1 7QY

Reino Unido

Telefone: +44-171-721 7678

Fax: +44-171-721 8785

Correio eletrnico: Headofsecretariat @pri.org.uk

http://www.penalreform.org (inclui dados dos escritrios regionais)

MDICOS PELOS DIREITOS HUMANOS (PHR)

100 Boylston St.

Suite 702

Boston, MA 02116

Estados Unidos

Telefone: +1-617-695 0041

Fax: +1-617-695 0307

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.phrusa.org/

Apoio a Vtimas:

CONSELHO INTERNACIONAL DE REABILITAO PARA VTIMAS DA TORTURA (IRCT)

P.O. Box 2107

DK-1014 Copenhague K

Dinamarca

Telefone: +45-33-76 06 00

Fax: +45-33-76 05 00

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.irct.org (inclui dados para contato com centros de apoio a vtimas de tortura em muitos pases)

FUNDO VOLUNTRIO DAS NAES UNIDAS PARA VTIMAS DA TORTURA

(Ajuda a financiar projetos voltados para a reabilitao de vtimas da tortura)

OHCHR -UNOG (Trust Funds Unit)

CH-1211 Genebra 10, Sua

Telefone: +41-22-917 9000

Fax: +41-22-917 9011

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.unhchr.ch/

Organizaes Profissionais:

UNIO INTERPARLAMENTAR (UI)

C.P. 438

1211 GENEBRA 19

Sua

Telefone: +41-22-919 41 50

Fax: +41-22-733 31 41, +41-22-919 41 60

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.ipu.org/

COMIT DE ADVOGADOS PARA OS DIREITOS HUMANOS (LCHR)

333 Seventh Avenue, 13th Floor

Nova York, NY 10001

Estados Unidos

Telefone: +1-212-845 5200

Fax: +1-212-845 5299

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.lchr.org/

ASSOCIAO MDICA MUNDIAL (WMA)

PO Box 63

01212 Ferney-Voltaire Cedex

Frana

Telefone: +33-4-50 40 75 75

Fax: +33-4-50 40 59 37

Correio eletrnico: [email protected]

http://www.wma.net/

COMO OBTER MAIS INFORMAES

Onde possvel encontrar cpias dos instrumentos mencionados neste manual?

O modo mais fcil de encontrar a maioria desses instrumentos pela Internet. Normalmente, possvel ter o aos instrumentos citados pelo site da organizao que os criou (ver Dados para Contato acima para os endereos na Internet). O ponto de partida para encontrar muitos dos textos de tratados internacionais seria a pgina do Escritrio do Alto Comissariado das Naes Unidas para Direitos Humanos, http://www.unhchr.ch/html/intlist.htm. Outro site sobre direitos humanos muito til o da Universidade de Minnesota, http://www1.umn.edu/humanrts/ e a pgina do Human Rights Internet (Direitos Humanos na Internet) citada na seo anterior. Ambos do o aos textos de muitos instrumentos internacionais.

Se voc no tem o Internet, possvel obter cpias dos textos enviando uma solicitao por escrito s prprias organizaes. No entanto, talvez seja mais simples entrar em contato com ONGs maiores que j disponham desses textos. Alternativamente, muitos desses textos podem ser encontrados em uma biblioteca pblica ou universitria. Tambm possvel obter compilaes de textos sobre direitos humanos.

De qualquer modo, no deixe de verificar se o Estado em questo ratificou o tratado e se fez alguma reserva ao tratado.

Onde encontrar cpias de relatrios dos mecanismos internacionais descritos neste manual?

Uma vez mais, a maioria dos mecanismos coloca seus relatrios disposio na Internet. Os mecanismos baseados no EACDH tm uma pgina muito completa na Internet, com um banco de dados que contm a maioria dos documentos publicados, seno todos. A CoADHP ainda no dispe de pgina prpria na Internet, mas muitos de seus relatrios esto disponveis na pgina da Universidade de Minnesota. Tambm possvel escrever organizao, entrar em contato com outras ONGs ou procurar encontr-los em uma biblioteca.

Onde encontrar mais informao sobre como documentar a tortura?

O Protocolo de Istambul e o Manual de Investigao e Documentao Efetiva da Tortura e Outros Tratamentos e Punies Cruis, Desumanos ou Degradantes contm disposies muito pormenorizadas sobre a investigao jurdica da tortura e, em particular, sobre o exame mdico de vtimas da tortura. Recomenda-se que os profissionais mdicos que quiserem saber mais sobre esse assunto consultem o Protocolo. A publicao do Protocolo ser realizada com a ajuda do EACDH no ano 2000. Por enquanto, o documento est disponvel em Physicians for Human Rights (Mdicos pelos Direitos Humanos) e est publicado em sua pgina na Internet (Ver referncia na seo anterior).

O Protocolo de Minnesota e o Manual de Preveno e Investigao Efetiva de Execues Extrajudiciais, Arbitrrias e Sumrias tambm contm disposies muito pormenorizadas sobre autpsias e exames de cadveres, inclusive de pessoas falecidas em decorrncia de torturas. Esses documentos esto disponveis por meio do EACDH: (1991) UN Pub. Sales No. E.91.IV.1 (doc. ST/CSDHA/12).

Para informaes mais detalhadas sobre o direito internacional e a prtica relacionados tortura, ver Rodley, Nigel S., "The Treatment of Prisoners Under International Law", 2nd edition, Oxford Press (1999).

Para maiores informaes sobre como usar os mecanismos internacionais dos direitos humanos, ver Hannum, Hurst, "Guide to International Human Rights Practice", 3rd edition, Transnational Publishers, Ardsley, New York (1999).

3. APNDICE III FORMULRIOS DE SOLICITAO PADRO

Modelo de questionrio para apresentao de denncia de tortura

ao Relator Especial sobre Tortura

A informao sobre a tortura de uma pessoa deve ser encaminhada por escrito ao Relator Especial e enviada aos cuidados do Escritrio do Alto Comissariado para Direitos Humanos (Office of the High Commissioner for Human Rights, United Nations Office at Geneva, CH-1211 Genebra 10, Sua). O Relator Especial somente pode se ocupar daqueles casos particulares que contenham, no mnimo, as seguintes informaes:

a. Nome completo da vtima

b. Data do(s) incidente(s) de maus tratos (pelo menos o ms e o ano)

c. Lugar onde a pessoa foi detida (cidade, provncia etc.) e local onde se deram os maus tratos (se conhecido)
d. Indicao das foras ou outros agentes pblicos que praticaram os maus tratos

e. Descrio da forma de maus tratos usada e de qualquer leso sofrida como conseqncia

f. Identidade da pessoa ou organizao que apresenta o relato (nome e endereo; esses dados sero mantidos em carter confidencial)

Se necessrio, podem ser acrescentadas folhas adicionais. Devem ser apresentadas cpias da documentao de apoio, tais como laudos mdicos ou relatrios policiais, sempre que pertinentes. Somente devem ser enviadas cpias, e no os originais, desse tipo de documentao.

I. Identidade da(s) pessoa(s) submetida(s) a maus tratos

A. Sobrenome:

B. Nome(s):

C. Sexo (masculino ou feminino):

D. Idade ou data de nascimento:

E. Nacionalidade:

F. Profisso:

G. Nmero do documento de identidade (se for o caso):

F. Atividades (sindical, poltica, religiosa, humanitria, solidria, imprensa etc.):

G. Endereo residencial e/ou de trabalho

II. Circunstncias em que ocorreram os maus tratos:

A. Data e lugar da priso e subseqente tortura

B. Identidade da(s) fora(s) que efetuaram a deteno inicial e/ou a tortura (polcia, servios de inteligncia, foras armadas, paramilitares, agentes carcerrios, outros)

C. Alguma pessoa (advogado, familiares ou amigos, por exemplo) foi autorizada a ver a vtima durante a deteno? Se foi, quanto tempo aps a priso?

D. Descreva os mtodos de maus tratos usados

E. Quais leses foram sofridas em decorrncia dos maus tratos?

F. Qual supostamente seria a razo dos maus tratos?

G. A vtima foi examinada por um mdico em algum momento durante ou aps o incidente? Se foi, quando? Esse exame mdico foi realizado por um mdico de uma priso ou do governo?

H. A vtima recebeu tratamento adequado das leses causadas pelos maus tratos?

I. O exame mdico foi realizado de modo que o mdico pudesse detectar provas de leses sofridas em decorrncia dos maus tratos? Foi emitido algum laudo ou atestado mdico? Se foi, o que revelaram os laudos?

J. Se a vtima morreu sob custdia, foi realizada autpsia ou um exame forense? Quais foram os resultados?

III. Ao reparadora

A vtima, seus familiares ou representantes buscaram algum recurso nacional (reclamaes contra as foras responsveis, o poder judicirio, rgos polticos, etc.)? Em caso afirmativo, quais foram os resultados?

IV. Informao sobre o autor da denncia apresentada:

A. Sobrenome

B. Nome(s)

C. Relao com a vtima

D. Organizao que representa, se for o caso

E. Endereo atual completo

Modelo de comunicado com base no Protocolo Opcional ao PID

Comunicado ao: Comit de Direitos Humanos, a/c OHCHR-UNOG, 1211 Genebra 10, Sua,

apresentado para considerao com base no Protocolo Opcional ao Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Polticos.

I. Informaes sobre o autor do comunicado

Sobrenome .... Nome(s)

Nacionalidade .... Profisso

Data e local de nascimento ....

Endereo atual

Endereo para troca de correspondncia confidencial (se diferente do endereo atual)

Apresenta o comunicado como:

(a) Vtima da violao ou violaes especificada(s) abaixo
(b) Representante nomeado/ advogado da suposta vtima(s)
(c) Outro

Se for assinalado o item (c), o autor deve especificar:

Em que qualidade ele est agindo em nome da(s) vtima(s) (por exemplo, parentesco ou outros vnculos pessoais com a suposta vtima(s):

(ii) Porque a(s) vtima(s) no pode(m) apresentar o comunicado ela(s) mesma(s)?:



No se permite que um terceiro sem qualquer vnculo com a vtima(s) apresente um comunicado em seu nome.

II. Informao sobre a suposta vtima(s)

(em caso de no ser o autor)

Sobrenome ... Nome(s)

Nacionalidade ... Profisso

Data e local de nascimento ...

Endereo ou paradeiro atual

III. Estado envolvido/artigos violados/recursos nacionais

Nome do Estado Parte (pas) do Pacto Internacional e do Protocolo Opcional contra o qual o comunicado dirigido:



Artigos do Pacto Internacional de Direitos Civis e Polticos supostamente violados:

Medidas tomadas pela vtima, ou em seu nome, para esgotar os recursos nacionais junto aos tribunais ou a outras autoridades pblicas; quando e com quais resultados (se possvel, incluir cpias das respectivas decises judiciais ou istrativas):

Se no foram esgotados os recursos nacionais, explicar por que:

IV. Outros procedimentos internacionais

A mesma matria foi apresentada para considerao a outro procedimento internacional de investigao ou soluo (por exemplo, a Comisso Interamericana de Direitos Humanos, a Conveno Europia de Direitos Humanos)? Em caso afirmativo, quando e quais foram os resultados?

.....

V. Fatos da alegao

Descrio pormenorizada dos fatos da suposta violao ou violaes (inclusive respectivas datas). Acrescentar tantas pginas quantas forem necessrias para esta descrio.

do autor: Data:

4. APNDICE IV DIAGRAMAS DO CORPO

MULHER - FRENTE E COSTAS

HOMEM - FRENTE E COSTAS

Human Rights Centre, Universidade de Essex

SBN 1 874635 28 5

Publicado em fevereiro de 2000
Human Rights Centre
University of Essex
Wivenhoe Park
Colchester CO4 3SQ
Reino Unido

Tel: 00 44 1206 872558
Fax: 00 44 1206 873428
Email: [email protected]
URL: http://www2.essex.ac.uk/human_rights_centre/


The Human Rights Centre

Todos os direitos reservados. Esta obra somente pode ser reproduzida para fins no-comerciais e com referncia expressa ao Human Rights Centre, Universidade de Essex.

PRINCIPAIS COLABORADORES

Autora e Pesquisadora:

Sra. Camille Giffard Diretora de Pesquisa, Universidade de Essex

Diretores do Projeto:

Professor Sir Nigel Rodley, KBE Relator Especial da ONU sobre tortura e professor de Direito, Universidade de Essex

Professor Geoff Gilbert Professor de Direito, Universidade de Essex

Junta Editorial:

Dra. Silvia Casale Membro do Comit Europeu para a Preveno da Tortura

Professor Malcolm Evans Professor de Direito da Universidade de Bristol

Professora Franoise Hampson Membro da Subcomisso da ONU para a Promoo e Proteo dos Direitos Humanos e Professora de Direito, Universidade de Essex

Professor Geoff Gilbert

Professor Sir Nigel Rodley

Apoio istrativo e Secretaria:

Sra. Anne Slowgrove

Sra. Heidi Wiggam

Sra. Anna Massara (reunio de trabalho)

AGRADECIMENTOS

A autora e os diretores do projeto gostariam, antes de mais nada, de agradecer Dra. Silvia Casale, ao Prof. Malcolm Evans e Profa. Franoise Hampson por seu sensato assessoramento e por sua incansvel dedicao, boa vontade e profissionalismo ao longo de todo este empreendimento. Tambm estendem seus agradecimentos s muitas instituies, organizaes e indivduos que contriburam nas diversas etapas do processo. Sua resposta sempre foi sempre entusistica e serviu de grande apoio, alm de contribuir para o bom andamento do projeto. Agradecimentos especiais tambm ao Ministrio das Relaes Exteriores e Commonwealth do Reino Unido, sem cuja colaborao e interesse inicial este projeto nunca teria se concretizado. Agradecimentos tambm a todos aqueles que participaram da reunio de trabalho realizada de 1 a 3 de setembro de 1999, na Universidade de Essex, que ajudaram a transformar uma verso preliminar em um manual que, esperamos, poder cumprir melhor sua finalidade.

Entre aqueles que prestaram valorosas contribuies incluem-se: Barbara Bernath, Dr. Joe Beynon, Mylne Bidault, Said Boumedouha, Craig Brett, Aissio Bruni, Christina Cerna, Daniela De Vito, Carla Edelenbos, Caroline Ford, Dr. Duncan Forrest, Yuval Ginbar, Sara Guillet, Rogier Huizenda, Maria Francisca Ize-Charrin, Cecilia Jimnez, Mark Kelly, Johanna MacVeigh, Nathalie Man, Dr. Andrew Mawson, Fiona McKay, Cecilia Moller, Rod Morgan, Ahmed Motala, Patrick Mller, Dr. Michael Peel, Borislav Petranov, Carmen Rosa Rueda Castan, Eleanor Solo, Eric Sottas, Trevor Stevens, Morris Tidball, Rick Towle, Agnes Van Steijn, Olga Villarrubia e Jim Welsh.

Instituies e organizaes consultadas:

Anistia Internacional, Associao para a Preveno da Tortura, Secretaria do Comit Europeu para a Preveno da Tortura, Registro do Tribunal Europeu dos Direitos Humanos, Federao Internacional dos Direitos Humanos, Secretaria Executiva da Comisso Interamericana de Direitos Humanos, Instituto Interamericano de Direitos Humanos, Comit Internacional da Cruz Vermelha, Fundao Mdica para as Vtimas da Tortura, Organizao Mundial contra a Tortura, REDRESS, Save the Children, Escritrio do Alto Comissariado das Naes Unidas para Direitos Humanos e Escritrio do Alto Comissariado das Naes Unidas para Refugiados.

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