Caderno 16:
Comando e
Gesto Investigao sobre Violaes de Direitos
Humanos
ndice do Captulo: 3327
Perguntas Chave para os Encarregados da
Aplicao da Lei
Introduo Definindo Violaes de Direitos
Humanos *
Introduo * Responsabilidade do
Estado Mecanismos Internacionais de
Denncia * Denncias entre
Estados * Comunicaes
Individuais Recursos Nacionais * Procedimentos Legais *
Mecanismos de Denncia *
Ombudsman Nacional * Comisses
Nacionais de Direitos Humanos Aplicao da Lei * Violaes de Direitos Humanos * O Dever de Investigar *
Responsabilidade * Vtimas Pontos de Destaque do Captulo Perguntas para Estudo * Conhecimento * Compreenso
* Aplicao
Perguntas-chave
para os Encarregados da Aplicao da Lei
* O que uma violao de direitos
humanos?
* Qual o papel e a responsabilidade
do Estado na proteo dos direitos humanos?
* No caso de violaes de direitos
humanos, quais so os procedimentos internacionais
de denncia?
* Pode o indivduo apresentar
uma denncia contra o Estado?
* Que recursos existem em nvel
nacional para violaes de direitos humanos?
* Qual o papel e a responsabilidade de um ombudsman nacional?
* Qual o papel e a responsabilidade
de uma comisso nacional de direitos humanos?
* O que acontece quando encarregados
da aplicao da lei violam direitos humanos?
* H um dever de investigar tais
violaes?
* Quem o responsvel final
pelas violaes de direitos humanos dos encarregados
da aplicao da lei?
* Quais so os direitos das vtimas
de violaes de direitos humanos?
Prximo ao fim deste
Manual, torna-se apropriado dar alguma ateno
ao problema de violaes de direitos humanos.
Este captulo tem conexes evidentes com os
trs primeiros, os quais definiram o arcabouo
jurdico, devendo, portanto, ser consultados
para maiores detalhes. Violaes de direitos
humanos merecem considerao mais extensa que
meramente do ponto de vista da aplicao da
lei. Devem ser colocadas adequadamente no contexto
tanto do direito internacional quanto da legislao
nacional e das exigncias neles contidos. Isso
tem sido enfatizado ao longo deste Manual, e
se tornar mais claro, no decorrer deste captulo,
que violaes de direitos humanos so grandes
ameaas para a paz, segurana e estabilidade
em um pas, visto que solapam a credibilidade
e a autoridade governamental. A aplicao da
lei, como um componente visvel da prtica do
Estado, desempenha um papel crucial na promoo
e proteo de direitos. Ao mesmo tempo, seus
encarregados so tambm potenciais violadores
dos direitos e liberdades individuais.
Introduo
Em princpio, existem
duas formas de tratar o problema das violaes
de direitos humanos. Do ponto de vista da vtima,
a Declarao dos Princpios Bsicos de Justia para Vtimas de Crime e
Abuso do Poder apresenta
duas definies para tais violaes. A primeira
caracteriza-as como uma
violao de leis criminais que vigoram dentro
dos Estados Membros, incluindo aquelas leis
que proscrevem criminalmente o abuso de poder.
O principal aspecto de tais violaes o dano
e sofrimento individual ou coletivo causado
s pessoas, incluindo dano fsico ou mental,
sofrimento emocional, prejuzo econmico ou
dano substancial de seus direitos fundamentais,
por meio de atos ou omisses que possam ser
imputadas ao Estado. A segunda definio concerne
queles atos
e omisses [imputveis ao Estado] que no constituem
ainda violaes de leis penais nacionais, mas
de normas internacionalmente reconhecidas relativas
a direitos humanos.
A palavra reconhecidas deve ser entendida para
se referir s normas contidas em tratados de
direitos humanos, normas que fazem parte do
direito costumeiro internacional ou normas que
fazem parte de princpios de direito reconhecidos
pelas naes civilizadas.
Responsabilidade
do Estado
Embora o problema da
responsabilidade do Estado tenha sido extensivamente
tratado nos primeiros trs captulos deste Manual,
para o assunto apresentado neste captulo
proveitoso repetir alguns dos pontos principais.
O direito internacional
estabelece e regula as relaes entre Estados.
As mais importantes fontes de direito internacional
so constitudas pelo costume, pelo direito
dos tratados e pelos princpios de direito que
so reconhecidos pelas naes civilizadas. Para
o propsito do presente captulo, a considerao
do direito internacional ser limitada ao direito
internacional de direitos humanos, que cria
obrigaes legais para os Estados. Essas obrigaes
incluem a exigncia de adaptar (ou criar) legislao
nacional de acordo com as normas internacionais,
bem como a de reprimir prticas que estejam
em contraveno com aquelas normas. Esta ltima
exigncia em relao s prticas dos Estados
se estende a todas as entidades e pessoas agindo
como representantes do Estado, incluindo funcionrios
pblicos, tais como os encarregados da aplicao
da lei. A responsabilidade ltima pelos atos
dos funcionrios repousa no Estado. Esta disposio
no interfere com ou substitui os nveis existentes
de responsabilidade individual ou organizacional
em nvel nacional, constituindo, na verdade,
uma responsabilidade no plano internacional.
No mbito dos Estados, eles mesmos so responsveis
pelas prticas individuais de seus funcionrios,
bem como pelas aes (legislativa ou outras)
de seus rgos governamentais.
H vrias formas de
chamar os Estados a prestar contas, no plano
internacional, de suas decises e prticas (ou
da falta destas) em relao aos direitos humanos.
O procedimento exato pelo qual os Estados podem
ser considerados responsveis por violaes
de direitos humanos pode ser encontrado em todas
as fontes do direito, incluindo decises de
cortes internacionais ou regionais, resolues
da Assemblia Geral das Naes Unidas e, naturalmente,
nos prprios instrumentos especializados de
direitos humanos. Existem dois tipos de procedimentos
que sero examinados mais rigorosamente neste
captulo, com respeito, especificamente, investigao
de violaes de direitos humanos. So esses
o procedimento de denncias entre Estados e
o de comunicaes individuais concernentes a
violaes de direitos humanos.
Denncias
entre Estados
H somente trs instrumentos
especializados de direitos humanos que tm uma
disposio concernente s denncias interestatais.
So estes o Pacto
Internacional de Direitos Civis e Polticos
(PID),
a Conveno contra a Tortura (CCT) e a Conveno Internacional
para a Eliminao de Todas as Formas de Discriminao
Racial (CIEDR).
De acordo com o PID e a CCT, para submeter
tais denncias, os Estados devem declarar seu
reconhecimento da competncia, respectivamente,
do Comit de Direitos Humanos e do Comit contra
a Tortura para receber e considerar comunicaes,
de modo que um Estado Parte pode denunciar outro
Estado Parte de no estar cumprindo suas obrigaes
quanto ao Pacto ou a Conveno. O reconhecimento
da competncia do Comit sobre a Eliminao
da Discriminao Racial para lidar com as denncias
entre Estados obrigatrio para todos os Estados
Partes. Cada um desses instrumentos delimita
os procedimentos para a recepo e considerao
de denncias especficas e para sua resoluo.
O papel genrico de cada um dos supracitados Comits, no caso de denncias
entre Estados, o de mediao e conciliao
com o propsito de realizar um acordo amigvel
com base no respeito pelas obrigaes dispostas
no instrumento concernente.
Para uma denncia ser
itida, tanto o Estado que apresenta a denncia
como o Estado contra o qual a denncia feita
devem ter reconhecido a jurisdio dos respectivos
Comits (com exceo do Comit sobre a Eliminao
da Discriminao Racial, cujo reconhecimento
obrigatrio, conforme mencionado).
Comunicaes
Individuais
Os procedimentos de
denncias
individuais
existem somente sob os regimes do PID, da
CIEDR e a CCT. O procedimento (por meio do qual
indivduos podem denunciar violaes de obrigaes
de tratados cometidas por um Estado Parte)
opcional para os Estados Partes, i.e., em situaes
em que um Estado Parte no aceitou a competncia
de um Comit para receber e considerar comunicaes
individuais, tais comunicaes so inissveis.
As comunicaes individuais submetidas de acordo
com esses instrumentos so endereadas ao Comit
concernente. De acordo com o PID, somente comunicaes
de indivduos
que alegam ser a vtima
da violao de disposies do Pacto sero consideradas
pelo Comit de Direitos Humanos. Para a CCT,
a proviso semelhante, embora a comunicao,
endereada ao Comit contra a Tortura, possa
tambm ser enviada em
nome
do indivduo que alega ser vtima de uma violao
da Conveno. O CIEDR somente ite que comunicaes
de indivduos ou grupos de indivduos que alegam
ser vtimas de violaes da CIEDR sejam recebidas
para considerao pelo Comit sobre a Eliminao
da Discriminao Racial.
Para a issibilidade
de peties individuais, os trs instrumentos
estipulam critrios especficos:
- a competncia
do Comit precisa ser reconhecida
(PID/PO, art. 1; CCT, 22.1; CIEDR, 14.1);
- esgotamento dos recursos internos (PID/PO, arts. 2 e 5.2(a); CCT, 22.5(b); CIEDR, 14.7);
- nenhuma comunicao annima, nenhum abuso (PID/PO, art. 3; CCT, 22.2; CIEDR, 14.6);
- compatibilidade (ratione temporis,
personae, loci, materiae) com as disposies do Pacto/da Conveno (PID/PO, art. 3; CCT, 22.2);
- no haver exame
em curso da matria sob outro procedimento internacional (PID/PO, art. 5.2 a);
- no haver exame
ado ou presente da matria sob outro procedimento
internacional (CCT, 22.5 a);
- substncia das
alegaes (caso prima
facie) (PID/PO I, art.
2; CCT, 22.1).
Quando uma
denncia considerada issvel, o Comit
prosseguir, levando-a ateno do Estado Parte
concernente. Dentro de seis meses, o Estado
que a recebeu dever submeter ao Comit esclarecimentos
por escrito ou declaraes elucidando a matria
e o recurso, se houver, que possa ter sido adotado
por aquele Estado. (PID/PO, artigo 4; CIEDR,
artigo 14.6(b), mas a trs meses; CCT,
artigo 22.3). As consideraes subseqentes
do Comit sero baseadas em informao julgada
confivel para este pelo peticionrio (ou
em seu nome,
CCT, artigo 22.1) e pelo Estado Parte concernente
(PID/PO, artigo 5.1; CCT, artigo 22.4; CIEDR,
artigo 14.7(a)). Em seguida a essas consideraes,
que so feitas em reunies confidenciais, o
Comit transmitir sua viso ao Estado Parte
concernente e ao indivduo (PID/PO, artigo
5.3 e 5.4; CCT, artigo 22.6 e 22.7; CIEDR, artigo
14.7(a) e (b), no h indicao de que reunies
deste Comit a esse respeito so confidenciais).
Todos os Comits devem apresentar um relatrio
anual de suas atividades, de acordo com o Protocolo
(PID) ou com a Conveno (CCT e CIEDR),
Comisso de Direitos Humanos.
 |
PID |
CIEDR |
CCT |
Nmero
Total de Estados Partes |
141 |
162 |
105 |
Nmero
de Estados que aceitaram o Procedimentos
de comunicaes individuais |
93
ratificaes
do I Protocolo Facultativo
|
26
declaraes
de acordo com o artigo 14
|
39
declaraes
de acordo com o artigo 22
|
Posio das ratificaes do PID,
CIEDR e CCT e aceitao de comunicaes individuais em dezembro de 1997.Fonte:
Diviso de Instrumentos Internacionais das Naes Unidas, Alto-Comissariado para
os Direitos Humanos, Genebra.
O procedimento, conforme
descrito acima, relaciona-se a violaes individuais
de direitos humanos. Naturalmente, possvel que
revelem de fato um aparente padro de violaes
de direitos especficos em um determinado pas ou
regio. Na eventualidade de tais violaes, indivduos
podem levar sua comunicao para a ateno da Secretaria
Geral das Naes Unidas, em conformidade com o chamado
procedimento 1503- uma referncia Resoluo 1503 (XLVIII) do Conselho Econmico e Social,
de 27 de maio de 1970. (Veja-se, dentro do tpico
pertinente, no captulo Direito
Internacional dos Direitos Humanos).
Das comunicaes recebidas, o Grupo de Trabalho
sobre Comunicaes (estabelecido pela Subcomisso
para a Preveno da Discriminao e a Proteo de
Minorias) selecionar, para considerao da Subcomisso,
aquelas comunicaes (incluindo as respostas, se
houver, dos governos a elas) que aparentam revelar
um consistente padro de graves e seguramente atestadas
violaes de direitos humanos e liberdades fundamentais.
Um diagrama mostrando esse procedimento dado a
seguir.
A exigncia de que os
recursos internos devam ter sido esgotados antes
que as comunicaes individuais possam tornar-se
issveis a um dos rgos de tratado mencionados
acima, torna necessrio considerar os vrios recursos
que existem em nvel nacional. O PID, em seu
artigo 2, de fato impe a obrigao aos Estados
Partes de assegurar que toda pessoa,
cujos direitos ou liberdades reconhecidos no presente
Pacto so violados, possa dispor de um recurso
efetivo, mesmo que a violao tenha sido cometida
por pessoas que agiam no exerccio de funes
pblicas. Existem
poucas excees exigncia de esgotamento dos
recursos internos. A primeira exceo assenta-se
no uso da expresso efetivo do artigo citado. Em situaes
onde no existem recursos, ou os recursos existentes
so insuficientes para solucionar adequadamente
a denncia, o esgotamento dos recursos internos
no requerido. Este , por exemplo, o caso quando
uma pessoa poderia reivindicar compensao por
sofrimento mas o recurso nacional no prov concesso
de compensao financeira. A segunda exceo ao
esgotamento dos recursos internos constituda
por situaes nas quais a aplicao dos recursos
injustificadamente prolongada.
Procedimentos
Legais
Tendo em vista o fato
de que violaes de direitos humanos so atos
ou omisses que constituem violao, de modo
idntico, do direito penal que vigora dentro
do territrio do Estado ou de normas internacionalmente
reconhecidas relativas aos direitos humanos,
os Estados esto sujeitos ao compromisso de
exercer controle judicial sobre tais atos ou
omisses, bem como proteger as vtimas destes.
Onde uma violao de direitos humanos tambm
uma violao do direito penal, as implicaes
para o controle judicial esto prescritas na
legislao nacional. Contudo, o direito penal
, em propsito e mbito, normalmente concernente
mais ao perpetrador que s vtimas do crime.
Aspectos de compensao e reparao para essas
vtimas freqentemente tornam-se objeto de processos
civis subseqentes.
Para as normas internacionalmente
reconhecidas de direitos humanos que no esto
ainda incorporadas legislao nacional, as
cortes e tribunais do Estado esto, no entanto,
sob a obrigao de tomar aquelas normas em considerao
na medida em que elas formam parte do direito
internacional costumeiro ou integrem algum tratado
do qual aquele Estado parte.
Mecanismos
de Denncias
Ao lado do processo
judicial penal ou civil, existem outras formas
para que indivduos (no plano nacional) tentem
obter um recurso efetivo para sua denncia.
Algumas vezes, a proviso para o estabelecimento
de um mecanismo de denncia no mbito nacional
feita em instrumentos internacionais de direitos
humanos, tais como a CIEDR (veja seu artigo 14.2).
Somente quando os recursos internos tiverem
sido esgotados, pode um indivduo submeter sua
queixa em nvel internacional para um dos rgos
de tratado concernentes. Para a efetiva promoo
e proteo dos direitos humanos em mbito nacional
existem dois tipos de instituies que tm sido
estabelecidas em muitos pases ao redor do mundo
e que merecem considerao mais minuciosa. Estas
so o ombudsman
nacional
e as comisses nacionais de direitos humanos.
Ombudsman Nacional [1]
O posto de ombudsman est, na atualidade, estabelecido
em um grande nmero de pases. O ombudsman (que pode ser um indivduo
ou um grupo de pessoas) geralmente apontado
pelo parlamento nacional. A principal finalidade
dessa instituio proteger os direitos de
indivduos que acreditam ser vtimas de atos
injustos por parte da istrao pblica
(na maioria dos exemplos, esta inclui atos de
encarregados da aplicao da lei). Dessa forma,
o ombudsman agir freqentemente como
um mediador imparcial entre o indivduo lesado
e o governo.
Embora a instituio
do ombudsman no seja exatamente a mesma
em dois pases, todos seguem procedimentos semelhantes
no desempenho de suas obrigaes. O ombudsman recebe denncias da populao e as investigar, precavendo-se
de que estas recaiam dentro da competncia de
seu posto. No processo de investigao, o ombudsman geralmente tem o garantido
aos documentos de todas as autoridades pblicas
relevantes. Ele ou ela emitir, por conseguinte,
uma declarao com recomendaes baseada nas
descobertas de sua investigao. Essa declarao
dada pessoa que apresentou a denncia, assim
como ao funcionrio ou autoridade contra a qual
a denncia feita. Em geral, se a recomendao
no fizer efeito, o ombudsman
deve submet-la a um relator especfico do parlamento.
Embora todo cidado que acredite que seus direitos
vm sendo violados possa submeter uma denncia
ao ombudsman, muitos pases requerem que o denunciante primeiro esgote todos os recursos
jurdicos alternativos. Pode haver tambm prazos
impostos apresentao das denncias, e enquanto
a autoridade do ombudsman normalmente se
estende a todos os aspectos da istrao
pblica, alguns no tm poderes para considerar
denncias envolvendo presidentes, ministros
ou o judicirio. O o ao ombudsman tambm varia de pas para pas. Em muitos pases, os indivduos
devem apresentar uma denncia diretamente ao
escritrio do ombudsman. Em outros, as denncias devem ser submetidas por meio de um intermedirio,
tal como um membro do parlamento. As denncias
feitas ao ombudsman
so geralmente confidenciais, e a identidade
do denunciante no revelada sem o consentimento
da pessoa.
O ombudsman no est sempre
s denncias e pode ser capaz de iniciar uma
investigao por iniciativa prpria. Essas freqentemente
relacionam-se a problemas determinados pelo
ombudsman
como concernentes ao pblico em geral ou a problemas que afetam um grupo
de direitos e, portanto, provavelmente no esto
sujeitos a uma denncia individual.
Em muitas circunstncias,
os poderes do ombudsman
so bastante parecidos queles das comisses
de direitos humanos (a serem discutidas abaixo),
pois ambos podem receber e investigar denncias
individuais. Em princpio, nenhum tem o poder
de promulgar decises obrigatrias. Existem,
todavia, algumas diferenas de funes entre
os dois rgos, o que explica porque alguns
pases estabelecem e, simultaneamente, mantm
ambos os tipos de instituies.
Comisses Nacionais de Direitos Humanos [2]
Em muitos pases, comisses
especiais foram estabelecidas para assegurar
que as leis e regulamentos concernentes proteo
dos direitos humanos (em nvel nacional) sejam
efetivamente aplicadas. A maioria das comisses
funciona independentemente de outros rgos
do governo, embora seja comum que delas se exija
fazer relatrio ao parlamento regularmente.
As comisses de direitos humanos preocupam-se
principalmente com a proteo dos cidados contra
a discriminao e com a proteo dos direitos
civis e outros direitos humanos. As funes
precisas e os poderes de uma comisso em particular
sero definidos no ato legislativo ou no decreto
que a estabelece. Essas leis tambm trataro
de definir a jurisdio da comisso, especificando
o mbito da conduta discriminatria ou da violao
sobre o qual autorizada a investigar. Algumas
comisses preocupam-se com violaes alegadas
de quaisquer dos direitos reconhecidos na constituio.
Outras so capazes de considerar casos de discriminao
de uma ampla gama de reas, incluindo raa,
cor, religio, sexo, nacionalidade ou origem
tnica, deficincia, condio social, orientao
sexual, convices polticas e descendncia.
Uma das mais importantes
funes investidas por uma comisso de direitos
humanos receber e investigar denncias de
indivduos (e ocasionalmente de grupos) alegando
abuso aos direitos humanos cometidos na violao
de legislao em vigor. Tais denncias podem
bem incluir as que so feitas contra organizaes
de aplicao da lei ou seus funcionrios. A
fim de conduzir suas tarefas adequadamente,
a comisso normalmente ter a autoridade para
obter provas relacionadas matria sob investigao.
Mesmo se usado s raramente, esse poder importante
para precaver-se contra a possibilidade de frustrao
pela falta de cooperao por parte da pessoa
ou do rgo contra o qual h uma denncia. Embora
existam diferenas considerveis nos procedimentos
seguidos pelas vrias comisses de direitos
humanos na investigao e resoluo das denncias,
muitas contam com a conciliao e/ou a arbitragem.
Se o processo de conciliao fracassa na resoluo
da contenda, a comisso pode ser capaz de recorrer
arbitragem pela qual emitir, aps uma audincia,
uma deciso.
A habilidade de uma
comisso para iniciar inquritos por conta prpria
uma medida importante da sua fora e provvel
eficcia.
Violaes de Direitos Humanos
Os encarregados da aplicao da lei agem publicamente sob
a autoridade direta do Estado que lhes confere
poderes especiais. As prticas e decises tomadas
pelos encarregados da aplicao da lei devem
conseqentemente ser vistas e aceitas como prticas
e decises do Estado pelas quais este responsve
e tem contas a prestar. As prticas de aplicao
da lei devem ser baseadas no respeito e obedincia
s leis do Estado. Contudo, a evidncia subseqente
revela o que deve ser considerado com um dtournement de pouvoir
(um incorreto uso de poderes legais ou autoridades)
ou abus de pouvoir (um abuso
do poder e/ou autoridade). Quando as prticas
de aplicao da lei violam os direitos e liberdades
dos cidados individuais, o fundamento real
para o estabelecimento e a aceitao da autoridade
do Estado indeterminada. Sempre que tais prticas
persistam sem conseqncias (judiciais) para
os responsveis, no meramente a credibilidade
do Estado com respeito s obrigaes internacionais
em direitos humanos que est em risco, mas tambm
o prprio conceito e qualidade dos direitos
e liberdades individuais.
O Dever de Investigar
De acordo com as leis nacionais, a responsabilidade pela preveno e
deteco do crime tem sido atribuda s organizaes
de aplicao da lei. Isso deve ser entendido
de forma a incluir a responsabilidade por investigar
crimes cometidos por funcionrios pblicos,
portanto, tambm pelos encarregados da aplicao
da lei. A indicao dessa responsabilidade pode
ser encontrada nos cdigos penais nacionais,
que, freqentemente, contm disposies acerca
de transgresses punveis cometidas por uma
pessoa agindo oficialmente. A penalidade que
pode ser imposta a tais ofensas leva em considerao
o fato de que o perpetrador agiu oficialmente
e as srias conseqncias que isto pode acarretar.
De forma semelhante, o dever de investigar violaes
de direitos humanos (em nvel nacional) est
contido em diversos instrumentos internacionais
relativos aos direitos humanos, tanto nos que
carregam um carter obrigatrio como nos demais.
Exemplos do dever de investigar podem ser encontrados
no artigo 12 da Conveno
contra a Tortura
(CCT); artigos 11, 19.2 e, implicitamente, nos
artigos 33 a 36 da Conveno sobre os Direitos da Criana (CDC); artigo 2 (d) em conexo com o artigo 4 (a), (b) e (c) da Conveno
Internacional sobre a Eliminao de Todas as
Formas de Discriminao Racial (CIEDR); artigo 8 do Cdigo de Conduta para os Encarregados da Aplicao da Lei (CCEAL);
artigo 22 dos Princpios
Bsicos sobre o Uso da Fora e de Armas de Fogo
(PBUFAF); e no artigo 9 dos Princpios
sobre a Preveno e Investigao Eficazes de
Execues Extrajudiciais, Arbitrrias e Sumrias.
Todas essas
investigaes devem ser conduzidas imediatamente, completamente e imparcialmente.
Estas trs especificaes so de igual e crucial
importncia para o resultado da investigao,
bem como para sua credibilidade. Deve ser entendido
que o critrio da imparcialidade pesar particularmente com intensidade para os observadores
externos de uma determinada investigao. O
ato de um indivduo encarregado da aplicao
da lei capaz de desacreditar a organizao
de aplicao da lei como um todo. Por esta razo,
no difcil entender que toda investigao
da aplicao da lei nas circunstncias de um
incidente envolvendo seus encarregados encontrar
ceticismo acerca de sua imparcialidade.
Responsabilidade
Os encarregados da aplicao da lei devem ser considerados responsveis
pelos seus atos individuais, incluindo aqueles
que so ilegais e/ou arbitrrios. Um encarregado
da aplicao da lei no pode facilmente invocar
ordens superiores quando deve ter sido claro
a este encarregado que a ordem em questo era
manifestamente ilegal e havia uma razovel oportunidade
de recusar-se a segui-la. Mesmo em situaes
onde ordens superiores ilegais poderiam ser
invocadas como justificativa da ao do encarregado,
no est subseqentemente isento de qualquer
responsabilidade pessoal pelo ato contestado;
a responsabilidade pelo ato nocivo (ou omisso)
simplesmente estendida para incluir o encarregado
superior. Nem mesmo circunstncias excepcionais,
como estados de emergncia, situaes de conflito
armado ou ameaa deste, podem ser invocadas
como uma justificativa para prticas ilegais
ou arbitrrias de aplicao da lei. Em qualquer
circunstncia, os encarregados superiores podem
e devem ser considerados responsveis se estavam
cientes do fato que funcionrios sob seu comando
estiveram recorrendo a prticas ilegais e/ou
arbitrrias no cumprimento de seus deveres e
no tomaram todas as medidas em seu poder para
prevenir, suprimir ou comunicar tais prticas.
O estabelecimento e a continuidade da superviso
e reviso eficazes de procedimentos uma necessidade
para garantir a prestao de contas individual
dos encarregados da aplicao da lei. Em relao
a isso, o captulo sobre Superviso
e Reviso de Procedimentos
pode ser consultado, especialmente os pargrafos
sob o ttulo Responsabilidade Final.
Vtimas
Embora a situao de todas as vtimas de crime e abuso de
poder seja uma matria afeta aos encarregados
da aplicao da lei, as vtimas de violaes
de direitos humanos merecem ateno particular
devido ao fato real de que a violao em questo
foi cometida
pelo Estado, por intermdio de um de seus funcionrios
pblicos ou outra pessoa agindo oficialmente.
Esse fato no muda, de forma alguma, o direito
da vtima ao tratamento com compaixo e respeito, nem o de ar os
mecanismos de justia e receber reparao. Deve ser entendido que semelhante violao de direitos de um indivduo,
quando cometido por – ou com a aquiescncia
de – um funcionrio do Estado, pode seriamente
prejudicar o relacionamento entre os cidados
e o Estado. A efetuao da aplicao da lei,
nos termos do atual estado de lei e ordem, depende
da existncia de boas relaes com o pblico.
Quando os encarregados da aplicao da lei lanam
mo de prticas que vo contra direitos e liberdades
individuais, o relacionamento real entre a organizao
como um todo e a comunidade posto em risco.
Crdito e confiana so dois pr-requisitos
para uma comunicao e cooperao frutferas
entre a comunidade e uma organizao de aplicao
da lei. Quando crdito e confiana diminuem
por causa de aparente comportamento ilegal ou
arbitrrio de encarregados da aplicao da lei,
a qualidade da cooperao e comunicao ir
declinar tambm. Cuidado especial deve ser tomado
quanto s vtimas de tais violaes, pois incidentes
isolados tm um efeito desastroso na imagem
e atuao inteira da organizao de aplicao
da lei.
* Violaes
de direitos humanos podem ser definidas como
violaes tanto de leis criminais nacionais
quanto de padres internacionalmente reconhecidos
acerca de direitos humanos que ainda no foram
incorporados legislao nacional.
* No estrito sentido
legal, uma violao de direitos humanos ocorre
somente quando o ato ou omisso imputvel
ao Estado.
* Em nvel internacional,
os Estados podem ser responsabilizados por suas
prticas mediante os procedimentos de denncias
entre Estados ou de comunicaes individuais.
* Denncias individuais
dirigidas a um dos rgos de superviso de tratado
podem ser levadas em considerao somente quando
o Estado concernente aceitou a jurisdio daquele
rgo para receber e considerar tais comunicaes.
* Denncias entre Estados so possveis somente de acordo com o PID,
a CIEDR e a CCT e apenas quando os Estados interessados
declararam sua aceitao dos respectivos Comits
para essa finalidade. No caso do CIEDR, a aceitao
da possibilidade de denncia entre Estados
obrigatria no momento da adeso.
* Comunicaes individuais
concernentes a violaes de direitos humanos
podem tambm ser dirigidas Secretaria Geral
das Naes Unidas, podendo ser colocadas para
considerao de acordo com o procedimento
1503,
quando tais comunicaes podem revelar um padro
consistente e seguramente atestado de graves
violaes de direitos humanos e liberdades fundamentais.
Esse procedimento no dependente do consentimento
do Estado.
* O esgotamento dos
recursos internos um pr-requisito para a
issibilidade de comunicaes individuais
pelos rgos de tratado.
* Outros critrios de issibilidade incluem reconhecimento da competncia
do comit; clara identificao do peticionrio;
compatibilidade com as disposies da conveno
concernente; nenhum exame em curso (ou ado,
no caso da CCT) por outro procedimento internacional;
e substncia das alegaes.
* Os recursos nacionais
incluem processo legal, seja penal ou civil,
mecanismos de arbitragem e conciliao e um
ombudsman nacional ou comisso nacional de direitos humanos.
* Violaes de direitos
humanos cometidas por encarregados da aplicao
da lei so danosos integridade de toda a organizao
de aplicao da lei. Sua existncia no pode
ser renegada. Sua ocorrncia deve ser prevenida,
e, nos casos onde isto no foi possvel, devem
ser investigadas prontamente, completamente
e imparcialmente.
* As organizaes de
aplicao da lei tm um dever, com base na legislao
nacional e nas obrigaes contradas pelo Estado
por meio de ato internacional, de investigar
violaes de direitos humanos.
* Os indivduos encarregados
da aplicao da lei devem ser feitos responsveis
por suas aes. Isto requer superviso interna
e reviso de procedimentos. No caso de violaes
de direitos humanos, medidas disciplinares adequadas
e/ou processo legal devem ser iniciados.
* Devida ateno deve
ser dada s necessidades especiais das vtimas
de violaes de direitos humanos, especialmente
vtimas de violaes cometidas por encarregados
da aplicao da lei.
Questes para Estudo
Conhecimento/Compreenso
1. Como voc definiria uma violao
de direitos humanos ?
2. Qual a importncia da responsabilidade
do Estado a respeito de violaes de direitos
humanos?
3. Podem aes terroristas ser
interpretadas como violao de direitos humanos?
4. Tm os encarregados da aplicao
da lei o dever de investigar violaes de direitos
humanos?
5. Quais procedimentos de denncia
individual existem em nvel internacional?
6. Qual o critrio de seleo para o procedimento 1503?
7. Qual a diferena entre o procedimento
1503 e as comunicaes
individuais dirigidas a um dos rgos de tratado?
8. Por que deve ser dada ateno
especial s vtimas de violaes de direitos humanos
cometidas por encarregados da aplicao da lei?
9. Por que devem os peticionrios
primeiro esgotar os recursos internos antes que
sua denncia seja issvel para considerao
por um dos rgos de tratado?
10. Qual a diferena entre
um ombudsman
nacional e uma comisso nacional de direitos humanos?
Aplicao
Foi solicitado a voc por seu
chefe que redija um conjunto de regras para
um procedimento interno de cidados que desejam
denunciar prticas de aplicao da lei ou o
comportamento de indivduos encarregados da
aplicao da lei.
1. Redija recomendaes para
a composio do conselho corregedor a ser estabelecida.
2. Formule critrios de issibilidade
de denncias, se houver.
3. Desenvolva recomendaes
para a resoluo de controvrsias e denncias.
4. Indique o(s) meio(s) pelo(s)
qual(is) a existncia desse procedimento pode
ser melhor conhecida pelo pblico.
1. Os contedos desta seo foram retirados do
Informativo no. 19 das Naes Unidas, Instituies Nacionais para a Promoo
e a Proteo dos Direitos Humanos, pp. 8 e 9. 2. Supra, nota 9, pp 6 e 7.
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