Educando
para a Cidadania
Os
Direitos Humanos no Currculo Escolar 523e2t

EDUCAO FSICA E CIDADANIA
O professor de Educao Fsica
encontra pela frente muitos desafios em seu trabalho e no abrangente
campo de atuao por que a sua atuao profissional. Apesar de
acumular experincias, principalmente no incio de carreira, em
vrios setores (normalmente o privado), com clubes, academias, jardins
de infncia e firmas, entre outros, acaba definindo seu vnculo
profissional em um colgio de 1 ou 2 grau da rede estadual ou
municipal de ensino, ou ento na rede particular.
No setor da Educao bsica
(Educao Infantil, Fundamental e Mdia) que se encontram a
maioria das matrculas de crianas e adolescentes, vidos por
receberem os ensinamentos de seus mestres, concretizando, quem sabe, o
sonho de aprender a ler, escrever, falar, descobrir os sentimentos de
emoo, da paixo, da amizade, do medo, da tristeza, enfim, tudo o
que o dia-a-dia da escola pode lhe oferecer.
Os mestres, dentro desse espao
chamado escola, possuem uma parcela significativa da responsabilidade na
relao professor-aluno, que capaz de cristalizar a atuao do
professor e marcar na memria da infncia dias inesquecveis pelos
alunos ao longo do tempo.
Estaro os professores preparados para
executar tarefa humana to fundamental na sociedade brasileira atual?
Ou melhor, estar o curso superior, que os habilita atravs de suas
cadeiras, aptos a fornecer toda a gama necessria de ensinamentos,
tendo em vista a formao de professores inseridos no contexto atual?
Estaro as disciplinas inseridas neste contexto?
Queremos chamar a ateno para os
ajustes que se fazem necessrios aos currculos das Escolas Superiores
de Educao Fsica. Reconhecemos a importncia de estar contemplada
no currculo a histria da Educao Fsica, mas contestamos a
excessiva nfase dedicada a esse aspecto, que aborda,
preferencialmente, a Educao Fsica sob a tica militar e como
fator de Segurana nacional.
Sabemos que as foras militares muito
contriburam para a evoluo da Educao Fsica, atravs dos
ensinamentos e divulgao dos seus mtodos e da formao de um
nmero significativo de professores na Escola Superior de Educao
Fsica do Exrcito. Porm, preciso priorizar matrias
humansticas nos currculos das ESEFS, para que tornem o professor
apto a atender a demanda dos anseios dos alunos que freqentam,
principalmente, o 1 e o 2 graus.
um direito do acadmico de Educao
Fsica ter um curso superior que o habilite a trabalhar com uma
realidade social carente e que sua ao contemple aspectos
fundamentais do processo ensino-aprendizagem, tornando-o eficaz no
sentido de alcanar a segurana interdisciplinar, capazes de
sensibilizar o professor para as necessidades e a importncia dos
setores populares, dos moradores na periferia das cidades, nas vilas,
nos bairros, de forma que possam aprender a exercitar-se coletivamente,
em dinmica espontnea ou dirigida.
A excluso das camadas pobres da
populao do o prtica de esportes e tambm da iniciativa
privada, mesmo que de maneira assistencial, a programar atividades
coletivas de recreao, tais como: Rua de Lazer, Ginstica na Praia,
no Parque, na Praa, eio Ciclstico, Rsticas, etc.
Tambm os setores discriminados da
sociedade, como os idosos e os deficientes fsicos, j demonstraram,
tanto no mbito pessoal como no coletivo, a vontade de buscar no lazer
e esporte a reintegrao social necessria, que pode e deve ser
alcanada fora das instituies escolares.
O professor de Educao Fsica, nestas
ocasies, torna-se referncia para as pessoas diretamente envolvidas.
Ele precisar ser capaz de dirigir e motivar o pblico para usufruir
todo o direito de lazer, mesmo num perodo reduzido de tempo em final
de semana. Reciclar a prtica de Educao Fsica, colocando-a a
servio do campo social, o fato novo a que cursos e professores
devem estar atentos, buscando inclu-los nos seus programas.
Os operrios, inseridos no mercado de
trabalho formal nos vrios segmentos da indstria, do comrcio e
outros e que, sob a influncia da automao, am a ter uma vida
sedentria, com poucos movimentos naturais do corpo, como caminhar,
saltar, transportar, etc., no exercitam-se no local de trabalho r fora
dele por absoluta falta de oportunidade.
Na integrao pedaggica escolar, o
professor deve utilizar as aulas de Educao Fsica como um momento
privilegiado de adaptao dos alunos escola. Mesmo nos perodos de
frias e recesso escolar, interrompe-se o andamento das relaes
correntes entre os alunos. muitos deles, ao retornarem, precisam de um
outro tempo de adaptao rotina escolar. Algumas so reprovadas ou
trocadas de turma e, por conseqncia, encontram outros grupos de
colegas, precisando criar ou refazer laos de amizade.
A realidade, infelizmente, por absoluta
falta de lucidez de governos que no investem em educao, submete as
escolas a sucessivas greves, ano aps ano, e de longa durao. Isto
faz com que as relaes interpessoais, que vinham sendo trabalhadas na
solidificao e abrangncia, sejam mais uma vez prejudicadas com o
afastamento dos alunos do seu convvio dirio. Ao trmino das
paralisaes necessria uma retomada de todo o processo.
Um pas de dimenses continentais como
o Brasil, mergulhado na mais profunda crise econmica de sua histria,
sem justia agrria ou urbana, em processo recessivo, com falta de
moradias, alto ndice de desemprego e arrocho salarial, ao desamparar
os aspectos sociais, atinge diretamente a estabilidade das famlias de
menor poder aquisitivo. Isto faz com que as pessoas, constantemente,
tenham que mudar de residncia, para bairros mais distantes, outras
cidades e at outros estados. A crise social tambm fator de
ruptura nas relaes entre as crianas e jovens, que deixam nas
escolas seus amigos e partem. Por fora das circunstncias, so
obrigados a fazer novas amizades, sem saber por quanto tempo, pois a
instabilidade econmica pode for-los novamente, a qualquer momento,
a uma mudana indesejada.
nas aulas de Educao Fsica que se
encontram os melhores momentos para proporcionar, de forma livre e
descontrada, a adaptao do aluno escola e comunidade. Na nova
escola ou nos perodos que reiniciam, necessria a integrao do
aluno nova turma de colegas.
Atividades fsicas que propiciam a
integrao so de fundamental importncia. Exerccios fsicos
coletivos so um triunfo que o professor deve trabalhar, em
contraposio ao individualismo, competio e ao egosmo. O
desporto coletivo, observado as regras, contribui para o hbito de
trabalhar em grupo. outra forma de envolver os alunos com a
cooperao e amizade.
A visita a outras escolas, praas ou
outros centros comunitrios para disputar uma partida de futebol,
vlei ou basquete, uma experincia desafiadora. Receber a equipe
adversria em sua casa, ou enfrentar a desvantagem de jogar fora
de casa, em local desconhecido, so desafios e experincias com
elevado estmulo socializante para o grupo.
O aprendizado, na prtica, das regras
esportivas, o respeito s mesmas e ao rbitro, a saudao equipe
adversria, o abrao fraterno ao final da disputa, so gestos
solidrios que o jovem atleta iniciante jamais esquecer. A justia
no esporte prevalece lei da fora.
No podemos desconsiderar a formao
pessoal que a prtica da Educao Fsica pode desenvolver. Os
hbitos higinicos, os cuidados com o corpo, o vesturio e a
aparncia, nas diversas faixas etrias, so vitais para a sade.
As atividades ao ar livre e o contato com
a natureza estimulam naturalmente o zelo pelas plantas e animais,
adquirindo o sentido ecolgico de preservar e ser solidrio.
O Educador precisa explicitar este
compromisso com a vida, no se atendo ao mero tecnicismo, mas
refletindo sobre esse contato espontneo com o meio natural. Por
exemplo: os eios, caminhadas, escaladas significam uma possibilidade
de desbravar o ambiente, descortinar novos horizontes, de perceb-los
harmoniosos ou no no contexto, comprometendo-se com sua preservao
e utilizao socialmente correta. Experincias como esta
proporcionaro situaes de aprendizado e solidariedade grupal.
A necessidade de adaptao, da
integrao e da formao pessoal contribui para que o aluno, de
forma lcida, assimile, interiorize e internalize as habilidades
mentais e fsicas do currculo, principalmente nas sries iniciais.
um direito do mesmo ter um professor de Educao Fsica,
habilitado em curso superior, voltado
e adaptado realidade social e educacional brasileira. O projeto
que cria uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educao Fsica (FDB)
prope, no seu artigo 36, a Educao Fsica como componente
curricular obrigatrio na educao bsica, integrada proposta
pedaggica da escola.
Porm, nossa disciplina pouco
explorada, apesar de possuir, embutida em seus mtodos, toda uma
criatividade natural e tangente integrao pedaggica com os
contedos e habilidades mentais desenvolvidos em outras disciplinas.
Citemos um exemplo, para ilustrar: na matemtica, no momento em que se
trabalha com o tema conjuntos, a Educao Fsica pode, atravs
de exerccios concretos, auxiliar na memorizao do contedo e
relacionar com os alunos o trabalho desenvolvido em sala de aula.
Sabemos, no entanto, que h,
historicamente, um certo preconceito para com a disciplina Educao
Fsica. No entender de muitos, essa seria uma atividade educativa
diferenciada do conjunto das demais disciplinas, especialmente no que
toca a formao intelectual dos alunos. trata-se como algo alheio ao
processo normal de ensino-aprendizagem.
A consagrao em leis dos direitos
pblicos, estendidos para toda a populao, s ter alguma
conseqncia se forem atendidas as necessidades bsicas em questo.
Na educao, tanto na escola pblica como na privada, o excessivo
nmero de alunos em sala de aula prejudica qualquer tipo de ensino que
pretenda ser de boa qualidade. comum nas aulas prticas de
Educao Fsica a juno de turmas para ocuparem o mesmo perodo
de aula, sobrecarregando ainda mais o trabalho de um nico professor.
Exemplo: juntar uma turma de 35 alunos, da 5 srie, com outra de 35
alunos de outra srie.
Outro agravante so as precrias
instalaes fsicas e o pouco espao disponvel para as aulas.
Normalmente, so reas sem coberturas, com calamento inadequado ou,
ento, reas totalmente fechadas e caladas, sem ventilao
suficiente e com falta de contato mnimo em relao ao ambiente
natural. A maioria dos estabelecimentos de ensino no oferecem as
mnimas condies, em se tratando de local adequado, prtica de
educao fsica. Isto estende-se ao material utilizado: bolas em
pouca quantidade e de baixa qualidade; comumente, uma s rede para
durar vrios anos; aparelhos para ginstica que raramente existem;
colches faltando na maioria das escolas; quadras (s vezes existem
at mais de uma) sem cercados apropriados e sem marcao; ginsios
de esportes mal iluminados e depredados; piscina... nem pensar, etc.
O uniforme, os materiais, os locais
motivam ou afastam as crianas do desenvolvimento de suas habilidades
fsicas na escola.
O excessivo nmero de alunos,
distribudos em uma rea com poucos metros quadrados, materiais
insuficientes e inadequados so elementos que ferem o direito
constitucional de pleno desenvolvimento da pessoa e no garantem o
padro de qualidade esperado do ensino. No custa relembrar que um
direito do aluno ter Escola Pblica de boa qualidade.
No ensino superior, a Educao Fsica
praticamente inexiste. Os alunos enfrentam todo tipo de contratempo para
poderem se manter nos estudos e concluir o curso. Problemas de moradia,
transporte, bolsa de estudo, biblioteca, horrios, turnos, vagas, etc.
constrangedor para a juventude brasileira! Para no nos alongarmos,
no vamos agora analisar os problemas por que am os alunos de 3
grau. As instituies de ensino superior pouco propiciam aos seus
alunos, no que se refere a atividades fsicas coletivas ou individuais
no Campus Universitrio. Todas as universidades deveriam ter ginsio
para a prtica de esportes, campos de futebol, pistas de atletismo,
parque aqutico, vestirios, enfim, toda a aparelhagem necessria
para propiciar momentos de descontrao e oportunidades de
aperfeioar a atividade esportiva preferida do aluno, assim como elevar
o nvel tcnico de qualquer esporte de competio.
Oportunizar prticas de esportes no
horrio escolar de 3 grau, em horrios extraclasse, beneficiaria os
acadmicos, proporcionando horas necessrias de lazer e
entretenimento, dando oportunidade, em se tratando de esportes para
jovens e adultos, de competirem com torneios e jogos universitrios.
direito do universitrio ter um campus esportivo ao seu alcance, para
ser utilizado em qualquer circunstncia.
Outra camada da juventude desprovida da
prtica da Educao Fsica so os alunos trabalhadores que
freqentam os cursos noturnos. A dispensa da prtica desta disciplina,
porque o aluno trabalha durante o dia, muito comum nos colgios. Os
problemas que afetam a falta de qualidade no ensino escolar no motivam
estes alunos a se organizarem e reivindicarem uma participao mais
efetiva em aulas de Educao Fsica noite, no prprio horrio de
aula, ou nos fins-de-semana. um contingente significativo de jovens e
adolescentes que perdem a oportunidade de ter os ensinamentos que estas
aulas podem proporcionar. Achamos ser prioridade, tanto para a
motivao como para a integrao, que exista um horrio noite
para a prtica opcional. direito do aluno trabalhador ter escola
pblico com funcionamento noturno e de qualidade.
Os problemas estruturais, que a maioria
da populao vive, transformam a realidade do dia-a-dia das pessoas
num sobreviver cruel e injusto. Apesar do altssimo ndice de
analfabetos no Brasil e de todas as lutas que os trabalhadores em
educao desenvolveram nos ltimos anos para exigir mais verbas para
a educao, ensino pblico gratuito e escola pblico de boa
qualidade, a educao tratada na base da demagogia. priorizada
nos discursos de campanha eleitoral e sucateada por partidos no poder,
descompromissados com o pleno desenvolvimento social.
A fome e a misria transmutam nossas
crianas desde as idades mais tenras. Como querer trabalhar o corpo, se
os alunos esto nas escolas apenas porque lhes garantida a merenda
escolar? Nenhuma poltica educacional produzir resultados se aplicada
a crianas para quem a sade e o alimento so negados. A
desnutrio est presente na escola. Os educadores de escolas
pblicas convivem com ela todos os dias. Por outro lado, a prpria
qualidade da nutrio questionada, tendo a o professor de
Educao Fsica a oportunidade de trabalhar em carter
interdisciplinar, por exemplo, com as Cincias Biolgicas na
conscientizao dos educandos sobre hbitos alimentares, composio
dos alimentos, da gua, das bebidas consumidas...
ESPORTE AMADOR: em 1992, tivemos mais uma
Olimpada Mundial, com sede no 1 mundo; Espanha, Europa.
decepcionante o resultado da participao dos pases sul-americanos,
apesar do Brasil, historicamente, ter equipes competentes em quase todos
os jogos, nos diversos esportes praticados. Fica a dvida: quem so os
brasileiros que podem praticar esportes de competio? Somente os
filhos da classe social mais abastada, que dispem de todos os recursos
fsicos, materiais e culturais, mantidos por investimentos do e no
setor privado, em detrimento da rea pblica. Os locais pblicos nos
quais se pode praticar esportes no oferecem condies de desenvolver
um trabalho tcnico de competio. Somente nos clubes privados, onde
poucos tem o, melhoram um pouco as condies.
A etilizao do esporte, principalmente
o amador, impede que as crianas o pratiquem com dedicao, na
especializao e na aquisio de experincia, competindo assim com
o mesmo nvel tcnico de outros pases.
A falta de oportunidade para praticar
esporte, realidade da maior parte da juventude brasileira, ajuda a
conduzi-la a um estado de vulnerabilidade e marginalidade. O o s
drogas e o ingresso precoce no mercado de trabalho como mo-de-obra
barata destino de milhes de adolescentes. A Educao Fsica tem
uma contribuio importante para evitar esta situao, mas
preciso que seus professores saibam refletir luz dos grandes
condicionantes scio-poltico-econmicos. No podemos esquecer que,
se a no expresso sadia do corpo impede a socializao do
indivduo, as polticas sociais restringindo a plena capacitao
motora, a prtica real do aborto desassistido, o alto ndice de
mortalidade infantil, a subnutrio, a calamitosa situao da
previdncia e a marginalizao do idoso desnudam a cruel realidade
brasileira e clamam pela ao de todos ns.
Ao nvel dos governos, faz-se
necessrio priorizar de fato a educao, com urgncia e sem
demagogia. Ao nosso nvel, de cidados-professores, encontrar o elo
entre o que fazemos e a formao da conscincia de nossos
cidados-alunos.
Joo Luiz Stein Steinback
Educador na Escola Estadual Canad em Viamo, no Colgio Anchieta
em Porto Alegre e Secretrio Geral do Sindicato dos Professores
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