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Educando para a Cidadania Os Direitos Humanos no Currculo Escolar 7b1i

GEOGRAFIA E CIDADANIA

Falar de Geografia em sua relao com a Cidadania , hoje, uma tarefa que se impe ao gegrafo, uma vez que a referida cincia ainda vem sendo considerada apenas como uma disciplina a mais nos currculos escolares, sendo sua funo o detalhamento dos fatos geogrficos, sua localizao e registro do modo como o homem convive com os mesmos. Vilipendiada no seu entendimento e amplitude, fruto da histria de homens no iguais, construram-se conceitos que a tornaram incapaz, por sua estrutura, de levar conscientizao crtica e poltica. Tornou-se assim, mais um assessrio, cujo carter impede que os homens se assumam como cidados e exeram plenamente esta condio.

No entanto, esse tratamento dado Geografia no gratuito e tem profundas razes histricas. Desde os tempos antigos de Grcia e Roma, onde ainda no se denominava Geografia nem Cincia, mas onde foi pela primeira vez sistematizada, vem servindo at os dias de hoje como instrumento do poder do Estado e das elites dominantes sobre os mais mortais.

A sistematizao do conhecimento geogrfico, a partir da descrio da terra, impunha-se uma necessidade nos tempos antigos, a fim de viabilizar as estratgias expancionistas em nvel militar e comercial. O saber, naquele momento, servia para este fim, alm de justificar a sociedade escravagista. Lembremos que s era considerado cidado aquele que, alm de ter nascido na cidade (da a origem do termo), era proprietrio de terras e de escravos. Como era preciso garantir tal sociedade dividida e como o expancionismo sugeria dominao, a Geografia servia concepo do saber que viesse a sustentar ideologicamente esta estrutura.

O discurso geogrfico, como muitos ainda hoje o concebem, foi popularizado como um inventrio sistemtico de fatos e lugares. A Geografia assume status de Cincia quando comeam a ser formulados alguns princpios metodolgicos que, em verdade, caracterizavam uma posio ideolgica de cada um de seus mentores.

Assim, criam-se diversos conceitos de g. todos, entretanto, estavam impregnados de um carter nacional, como observa Moreira (1981): ... o atual discurso geogrfico o produto final dos embates que dominam as relaes entre o imperialismo alemo e o Francs, no sculo XIX (O que Geografia, Primeiros os). As diferenas, obviamente, aparecem no plano do saber geogrfico. Temos, de um lado, a escola alem e o determinismo; de outro, a escola sa e o possibilismo. Mais adiante, vamos ter uma forma ainda mais ideolgica com a escola anglo-saxnica, j nesse sculo. Mesmo tendo concepes diferentes, todos tinham um interesse comum: a expanso colonial e a mundializao do capital, o prprio imperialismo. Vale, ento, um discurso linear e emprico, que refora o papel do Estado e das elites sem conhec-las como classes dominantes. Isso eqivale a dizer que o conhecimento geogrfico se estrutura em diferentes nveis, sendo, todavia, transmitido segundo o que determina a sociedade estratificada. um conhecimento que busca legitimar a sociedade desigual, por necessidade.

Assim, a insero da Geografia no mundo cientfico veio acompanhada ou a reboque de uma concepo autoritria das elites dominantes, que a usavam com a clara inteno de no desvelar as contradies sociais que os diferentes modos de produo proporcionavam.

Para tanto, a Geografia mantida com carter de sntese ou de descrio, realando a dicotomia entre o homem e o meio, a sua compartimentao em vrias geografias, que tm por base a Geografia Fsica. Caracteriza-se, deste modo, uma sociedade que est distante da natureza e esta parte da sociedade.

A reinveno deste pensar se d a partir da Segunda Guerra Mundial, pois h necessidade de atender-se s novas exigncias dos sistemas. Vale-se, ento, a Geografia, de uma falsa interdisciplinariedade, uma vez que incorpora justificativas cientificamente elaboradas por outras cincias, a fim de que ela prpria possa se justificar. Esta Nova Geografia, como foi chamada, de cunho neo-positivista, reforou o papel da Geografia alienada e alienante, na qual no h processo histrico e esto ocultas as relaes sociais travadas pelo homem num espao que ele prprio constri.

Em verdade, ainda se paga um tributo a esta compreenso distorcida e se peca ao construir-se um currculo escolar distante da realidade social. Fica evidente a incapacidade de um Geografia assim, em conduzir o homem a perceber-se como cidado. Sua forma escolar revela-se quando da elaborao de belos e bem estruturados programas que em realidade acentuam a sua tradio conteudista, na qual os fatos so estanques e desconexos, distantes uns dos outros.

So programas vazios e inconsistentes, que geram um ensino burocratizado, to feio das elites dominantes e de sua concepo de educao. O professor rea o conhecimento como algo dado e o aluno reproduz sem questionar, porque no h o que questionar, porque no provoca uma postura crtica, qualquer dvida, quem a resolve a Histria, a Sociologia ou a Filosofia (sic). Afinal, a Geografia cabe to somente a sntese.

Alis, no que diz respeito ao ensino da Geografia, reforando-se a idia acima, podemos tomar Lacoste (1977) e a sua observao (ou alerta) de que ... o discurso geogrfico pode ser considerado, principalmente em suas formas escolares, como o instrumento de uma obra de mistificao de longo alcance, cuja funo impedir o desenvolvimento de uma reflexo poltica sobre o espao e de mascarar es estratgias espaciais dos detentores do poder ( A Geografia serve, antes de mais nada, para fazer a guerra).

uma Geografia reduzida ao estudo da paisagem. Homens, rochas, climas, etc., tm um mesmo sentido geogrfico. Em suma, no h processo social, no h histria. Consequentemente, no h a perspectiva da cidadania.

Mas h uma Geografia capaz de burlar este entendimento propositalmente equivocado. O conhecimento geogrfico no algo que possa e deva ser facilmente manipulvel, porque seu objeto tem por base um processo social, que produz o espao geogrfico, fruto de uma relao de classes, historicamente dada. o espao geogrfico capaz de caminhar em direo a uma postura crtica e de permitir ao homem sentir-se como agente de transformao da sociedade e da liquidao total da situao de opresso em que vive. Ou seja, a Geografia no somente analisa as desigualdades sociais, mas tambm as contradies que levam a estas desigualdades e que esto expressas espacialmente.

Fugir s armadilhas preparadas pela Geografia tradicional um encaminhamento concreto para que o gegrafo possa trabalhar sua cincia numa perspectiva da cidadania. Porm, isso no basta.

O diagnstico do que no est funcionando no ensino da Geografia e do que no permite chegar-se a um entendimento do que o homem-cidado pode tornar-se mais um exerccio intelectual. Ora, j foi dito que a escola est numa razo inversamente proporcional realidade onde est colocada. Ento, diz-se que devem ser estruturados currculos adequados a esta realidade. Contudo, isto tambm no basta, uma vez que, alm de sempre podermos incorrer naquela tradio onde a matria privilegiada, esta, via currculo, pode transformar-se em mera formalidade para o professor e acabar, de qualquer forma, sendo de pouca utilidade para o aluno.

Quanto Geografia, um currculo no pode perder de vista o que acima expomos. Devemos, ento, ter clara noo da totalidade que est presente em todos nossos os. Isto porque o espao do nosso tempo o resultado de mediaes histricas do espao, enquanto categoria histrica, ao mesmo tempo que o nosso espao a a ser tambm uma mediao. Ento, preciso que se estabelea que uso se faz deste espao e quem usa o espao. No h como entender a Geografia e a questo da cidadania se no tivermos clara a relao acima.

O espao produzido pelo homem essencialmente um espao social, porque o homem, ao entrar em contato com a natureza, transforma-a e a si se transforma atravs do trabalho. A natureza deste trabalho social e, assim, o homem produz o seu espao social e nele se organiza espacial e socialmente. Mas, no sistema scio-econmico em que vivemos, o uso do espao revela as contradies inerentes ao modo de produo que o engendra. Fica evidente, uma vez que nele se separa o capital do trabalho. Estabelece-se esta contradio: o trabalhador dos meios de produo, que no lhe pertence, quem menos faz uso deste espao. Consequentemente, nele se aliena e no constri a sua cidadania.

Neste sentido, cabe Geografia demonstrar as contradies e as formas de mediar os conflitos de casses na sociedade e seu espao. Concretamente, podemos exemplificar aqui uma situao: quando est proposto trabalhar-se a produo (ou demografia). Em uma perspectiva tradicional, no h o desvelamento necessrio das relaes sociais em um determinado arranjo espacial. Em primeiro lugar, porque h uma descaracterizao histrica do fenmeno demogrfico; e, em segundo lugar, porque h uma fragmentao da totalidade social quando o estudo fica compartimentado em crescimento, estrutura, distribuio e mobilidade da populao. Ora, isto uma demografia a-histrica e a-sociolgica. Privilegiam-se os dados estatsticos e seu mapeamento, apresentando-se uma realidade atravs de nmeros e demonstrando-se que os mesmos representam uma condio de vida da populao, mas no se vai alm disso. Surgem da idias do tipo: o nordestino migra para os grandes centros industriais devido seca, ou as populaes de pases perifricos terceiromundistas crescem mais do que a capacidade dos mesmos em geral riquezas e um mercado de trabalho que venha a sustent-las. No se questiona a razo desses acontecimentos, porque no o caso ou o objeto de estudo.

Ora, o conceito de populao muito vago. Devemos, ento, partir para o entendimento de quem compem a populao e de como ela expressa em classes sociais, fruto da diviso social do trabalho. Temos, assim, novos conceitos e no somente o de populao, que devero ser trabalhados igualmente. Resulta da que so necessrias algumas mediaes, o que permitir ter-se uma viso do todo. Ficar mais claro que as classes sociais existem na forma como a sociedade se apoia sobre determinados elementos que pressupe outros. Deste modo, podemos chegar a conceitos mais simples a serem construdos pelos prprios alunos, tendo a perspectiva de retornar ao primeiro conceito e ir adiante, agora com mais qualidade e conhecendo-se a totalidade (lembrando que o espao social o todo e no apenas uma sua frao).

Neste agir, torna-se possvel ao aluno perceber-se como parte integrante daquilo que est sendo estudado, uma vez que ele prprio objeto de estudo. Da, a possibilidade de ele poder pensar criticamente a realidade em que est envolvido, descobrindo-se nela e percebendo que esta realidade uma totalidade onde esto reveladas desigualdades e contradies. A questo da cidadania est intrnseca. Poderamos dar vrios outros exemplos. Entretanto, o desdobramento que se tem, qualquer que seja o contedo a ser trabalhado, deve permitir ao aluno a liberdade em que est vivendo. O aluno, que est construindo seu conhecimento, ver que cada vez mais surgiro novos fatos, no previstos em seu planejamento inicial do estudo. Isto implicar em um conflito, ou seja, o que sabia at ento no foi suficiente para entender a problemtica em seus diferentes nveis de profundidade e desdobramentos, levando-o a solicitar referncias ou explicitaes tericas que ajudem a superar o conflito cognitivo num nvel de abstrao mais complexo. Refora-se, assim, o papel do educador.

A Geografia, em uma perspectiva crtica, pode e deve permitir que o homem se torne o centro de busca e organizao do conhecimento. De donatrio deste, torna-se ativo construtor, o que significa uma alterao toda da relao epistemolgica. Esta alterao oportuniza a superao da condio de alienao que os sistemas scio-polticos trazem em seu bojo) da Geografia Crtica, que busca a transformao da sociedade. No trata-se de diferena sutil, mas de algo evidente para quem visualiza e tem como norte a construo da cidadania via processo de conhecimento. No existe conhecimento geogrfico que no tenha a construo da cidadania como fim.

Antonio Carlos Rizzo Neis
Educador no Curso Mau, em Porto Alegre, e Vice-presidente da

Associao dos Gegrafos do Brasil AGB.

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