Livros
Direitos Humanos
Direitos
Humanos e6j36
Direitos
Humanos em Moambique
Josu
Bila
Parte
I – Artigos
Captulo
I
Moambique contemporneo
e Direitos Humanos
Moambique:
Mltiplos desafios-obstculos
na implementao de direitos
humanos35
Moambique
, actualmente, atravessado por
mltiplos desafios-obstculos
na implementao de direitos
humanos. Aqui, alista-se, apenas, quatro
desafios-obstculos: (I) eroso
moral dos seus dirigentes; (II) justicializar
ou implementar direitos humanos; (III)
promoo da igualdade e
(IV) racismo partidrio-governamental.
Abaixo, a discusso do assunto*.
I.
Eroso moral dos dirigentes de
Moambique
Entre os problemas que reduzem e, nalgumas
vezes, obstaculizam o processo normal
de proteger, garantir e defender direitos
humanos encontra-se a eroso moral
de dirigentes do Estado. E o Estado moambicano
vive a eroso moral de seus dirigentes
que so uma base humana nevrlgica
para a materializao dos
direitos humanos, tendo em conta a sua
posico de autoridade.
Curiosamente,
depois da Independncia Nacional,
em 1975, os dirigentes de Moambique,
com sinais intensos de patriotismo, moveram
prticas e discursos pblicos
a incentivar a disciplina e o trabalho
para o desenvolvimento, como forma de
combater a falta de direco,
burocratismo, rotina, incompetncia,
negligncia, desperdcio,
esbanjamento, corrupo
e suborno, que eram, j nessa altura,
resultados de eroso do sistema
moral de direco poltica
do Pas.
Hoje,
sem esforo espiritual e material,
percebe-se que os dirigentes de Moambique
no conseguiram combater a falta
de direo, burocratismo,
rotina, incompetncia, negligncia,
desperdcio, esbanjamento, corrupo
e suborno no sistema de istrao
pblica; pelo contrrio,
so fortes, mas no os nicos,
incentivadores dessas ms condutas,
desencoranjando-se o avano pleno
dos direitos humanos.
Numa
situao de desrespeito
pelas normas morais e legais, com implicaes
na proteo, garantia e
defesa de direitos humanos, como acontece
no nosso caso, os dirigentes do Estado
so submissos e corteses aos poderosos,
criando, entre si, alianas parasitrias
e impeditivas ao desenvolvimento do pas;
insensveis e desonestos com os
excludos; e cruis e arbitrrios
queles que desafiam os males supramencionados,
inspirando-me em scar Vilhena,
professor de Direito na Universidade de
So Paulo.
Neste
tipo de situaes, h
que repetir o bvio: que os dirigentes
respeitem, risca, a Constituio
da Repblica de Moambique
e outros documentos sobre direitos humanos
e funcionamento do Estado, por serem uma
base normativa para que se avance na satisfao
das necessidades bsicas dos cidados.
E os dirigentes do Estado, quando respeitam
os direitos humanos, fazem-no por sua
obrigao e no por
caridade ou bondade religiosa, como, em
algumas ocasies, sinalizam.
II.
Justicializar ou implementar direitos
humanos
O caso-tragdia de Mahlazine, Maputo-cidade,
resultado das exploses de material
blico, depositado em paiol, a
22 de Maro de 2007, que vitimou
mortalmente cerca de 100 pessoas e 500
feridos, para alm de ter destrudo
centenas de casas de habitao
e demais infra-estruturas, suscitou a
proposio de duas estratgias
de repr os danos. A primeira tem
que ver com a indemnizao,
via tribunal; a segunda, via entendimento
e dilogo entre o governo e as
vtimas. Toma-se este caso apenas
como exemplo, para a construo
de racioccio.
O
Governo, reagindo imediatamente, prometia
que iria proceder reconstruo
de casas, cobriria despesas e assistiria
socialmente s vtimas,
evitando o termo indemnizao,
em cujo sentido reside a reparao
jurdico-legal. Por outro, a sociedade
civil organizada defendia sublinhadamente
que as vtimas fossem indemnizadas
pelo Estado, ao mesmo tempo que a mesma
(sociedade civil) denunciava aquilo que
chamava de falta de clareza sobre as possveis
frmulas de repor os danos morais
e materiais.
Seja
como for, parte-se de um ponto de partida:
No caso das vtimas das exploses
de Paiol e, simultaneamente, nas circunstncias
actuais de Moambique, ser
a justicializao (exigir
direitos no tribunal) a melhor frmula
de defender direitos dos cidados?
De
que forma o Governo moambicano
poderia indemnizar vtimas, dentro
de princpios de direitos humanos,
perante a sua apelidada debilidade econmica
e financeira, sem que fosse obrigado pelo
tribunal?
Em
tempos actuais, a justicializao
relevante para elevar o sentido
de direitos humanos e para credibilizar
o sistema judicirio junto dos
cidados, podendo despertar e obrigar
o executivo a traar polticas
promotoras de justia social. A
justicializao tambm
amplia o conhecimento e a auto-estima
social daqueles cujos direitos tenham
sido violados por algum, grupo
ou Estado, principalmente, quando o julgamento
for justo e diligente.
Porm,
a justicializao de casos
inimiga da fraqussima
expanso de tribunais e da quase
inexistente qualidade/quantidade de seu
pessoal para atendimento, dentro de prazos
previamente estabelecidos por lei; do
incumprimento e desonestidade do poder
executivo perante as decises dos
tribunais; da baixa cultura tico-governamental;
para alm da fraqussima
habilidade de os cidados recorrerem
aos tribunais.
Na
verdade, h crena de que
o governo moambicano, perante
os factores do pargrafo anterior,
agiu em conformidade com os princpios
de direitos humanos, por ter sabido repr
os danos, ainda que, bem vistas as coisas,
os morais no sejam ressarcveis
por bens materiais e/ou financeiros.
Mais:
o governo mostrou, e deve mostrar sempre,
que a vontade poltica e compromisso
tico para com os direitos das
pessoas so a fora motriz
para a materializao de
direitos humanos, pois, por mais que hajam
recursos finaceiros e econmicos,
a falta daqueles compromete programas
de justia social. Sem vontade
poltica e compromisso tico-governamental
no poderia ter mobilizado esforos
internos para a reposio
de danos: sade mental e fsica,
reconstruo de casas habitacionais
e demais infra-estruturas. Por isso que
se cr, ainda, que o Governo, sem
entrar em conflitos com os cidados,
pode respeitar direitos humanos, via implementao,
evitando que eles sejam justicializados;
alis, os cidados, a maioria,
tm fraqussima habilidade
de recorrer aos tribunais, estes que em
quantidade e qualidade no se desdobram
satisfatoriamente aos cerca de 20 milhes
de moambicanos.
Ora,
aqui fica um desafio: o governo, mesmo
os vindouros, deve implementar os direitos
humanos, mesmo que antes no tenha
prejudicado os seus cidados, contrariamente
ao que aconteceu com as exploses
do paiol de Mahlazine, frutos de negligncia
e ms condies de
armanezamento de material blico.
Paralelamente a isso, deve melhorar o
sistema de istrao
da justia e o conhecimento de
direitos por parte dos cidados
moambicanos.
III.
Promoo da igualdade
A igualdade, na perspectiva de direitos
humanos, sinnimo de direito
ao respeito e ao reconhecimento da condio
humana de todos. As leis dos Estados e
do Sistema Internacional, particularmente,
que tm um vnculo com os
direitos humanos, estampam o valor de
igualdade, como um direito inegocivel.
Entretanto,
entre o direito humano igualdade
selada em leis e a prtica, h
um caminho por percorrer, caminho esse
possvel na medida em que houver
vontade e compromisso tico para
com os que, por se encontrarem numa situao
desigual, precisam de um tratamento humano.
Alguns autores e activistas de direitos
humanos so unnimes em itir
que as pessoas no so iguais,
por nascerem j amarradas em seus
contextos hierarquizados, discriminatrios
e de privilgio, razo pela
qual, para que sejam iguais, precisarem
de leis e polticas pblicas
de elevao e valorizao
de sua dignidade humana, a qual independe
da etnia, status, local de nascimento
ou outro atributo social.
Por
assim dizer, Moambique, enquanto
pas novo, forte candidato
a materializar a igualdade, desde que
haja um compromisso tico e vontade
de seus governantes e vrios actores
que interferem nas polticas e
aces do Estado. Afirma-se
Moambique que forte candidato
a promoo e materializao
da igualdade, por ter tido polticas
sociais de desenvolvimento, no ado
e presente, que so, hoje, visveis.
Pode-se exemplificar a ideia de colocar
as pessoas nas escolas, independentemente
das condies que esse estabelecimento
de ensino possui ou possuisse. Este tipo
de polticas sociais para o desenvolvimento
so promotoras de igualdade ou
incluso sociais. Mas,
preciso melhorar a efectivao
de direitos e necessidades bsicas
(educao, sade,
alimentao, emprego, transportes,
energia, infra-estruturas...) para os
cidados. Para tal, h que
cumprir as regras de funcionamento do
Estado de Direito Democrtico,
bem como seguir planos nacionais e internacionais
de direitos humanos e desenvolvimento.
IV.
“Racismo partidrio-governamental”
Uma das estratgias, por mais invisveis
que sejam os seus resultados de promoo
de direitos humanos, a incluso
poltica de cidados na
governao, istrao
e judicirio de um pas,
independentemente do partido poltico,
religio, sexo, etnia. Moambique,
por exemplo, falha na incluso
de cidados de outros partidos
polticos (Renamo, particularmente,
com maior musculutura poltica
nacional) na governao,
istrao e judicirio,
salvo em rgos em que s
a (fora da) lei fora a
que isso acontea: Conselho de
Estado, Conselho Constitucional, Assembleia
da Repblica e mais. O resto de
rgos, dependentes de nomeao,
“cheiram” a dirigentes do
partido Frelimo: Governo e rgos
centrais do Estado, governadores, es
distritais, empresas pblicas e
universidades pblicas. Isso no
nada mais e nada menos que “racismo
partidrio-governamental”,
na medida em que se exclui o Outro pela
pertena a determinado partido
poltico . Defino racismo partidrio-governamental
como toda a aco de distino,
excluso, restrio
ou preferncia baseada na pertena
de um partido poltico, cujo interesse
primrio anular e restringir
o exerccio de Poder governamental,
judicirio e legislativo do Outro,
em igualdade de circunstncias,
independentemente de existncia
ou no de legislao
para a incluso de outros partidos
na istrao dos destinos
de um pas.
O
racismo partidrio-governamental
moambicano um dos fortes
indicadores de dfice de exerccio
de direitos humanos, no que a
lgica de direitos humanos apele,
nica e to somente, ao
exerccio de Poder ao alto nvel;
mas o dfice de exerccio
de direitos humanos, resultante do racismo
partidrio-governamental, compromete,
bastas vezes, a participao
conjunta nas decises e destinos
do pas, com vista a materializao
de direitos humanos - que pela sua lgica
tica no se coadunam com
a excluso. Alis, direitos
humanos incluso e no
excluso.
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Nota:
35
- Jornal ZAMBEZE, 20 de Maro de
2008, pags 30 e 31, nr.287, Ano VI. Maputo-Moambique
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