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Justia com Controle Popular

O avano do neoliberalismo e o papel do Judicirio

A expanso do neoliberalismo nos pases ditos perifricos veio acompanhada de um impressionante retrocesso em termos de direitos conquistados pelos trabalhadores. E no poderia ser diferente. Em artigo publicado na revista Conscincia & Luta, Vito Giannotti observa que o sistema poltico e econmico ditado pelos interesses do capital despreza as questes ticas e tenta executar uma barbrie planejada. Trata-se, ressalta, de um projeto de poder baseado no culto s regras do mercado, na concentrao de riquezas, no lucro desmedido e na perda do sentimento de nacionalidade. a lgica neoliberal. a negao de duzentos anos de lutas da humanidade para afirmar os direitos das massas de milhes de trabalhadores.

Como, ento, evitar, pelas vias institucionais, a consumao do desastre? Em tese, o Estado estaria aparelhado para esse fim. O processo evolutivo que levou afirmao do Poder Judicirio como organismo estatal formalmente autnomo seria capaz de assegurar a preservao de direitos individuais e coletivos. MILTON M. LAMARGO, ao se debruar sobre o assunto, sintetiza: Quando um partido assume o poder, a histria registra que os vencedores tendem a defender os interesses da parte que os representa e que os conduziu ao poder. Quando essa postura autoritria se exacerba e se volta para anular OS interesses da outra parte, preciso que exista e que se possa recorrer a um poder autnomo, que no esteja comprometido Com O partido no poder. Esse mecanismo de defesa de que se valeriam os cidados se corporifica no Poder Judicirio.

Distante do povo 5hgj

Essa a parte terica. A realidade, porm, mostra que os rgos da Justia assumem uma distncia considervel do cotidiano do homem comum. Sob a influncia de conceitos ideolgicos que vem na aplicao do direito um mecanismo neutro, imune a impresses subjetivas dos seus operadores, a mquina judiciria a a funcionar em torno de um mundo prprio, em que despontam o rigor burocrtico e o culto exagerado lei. Essa concepo estabelece uma profunda desigualdade na distribuio da Justia, elaborando, a um s tempo, um direito para os oprimidos rgido, implacvel e eficiente Como instrumento de represso e um direito das elites, repleto de artifcios e sofisticados exerccios de interpretao que servem para manter uma paz social cujos benefcios so repartidos entre poucos.

Um projeto que pretende, em carter prioritrio, enxugar o Estado e multiplicar os lucros de grandes conglomerados financeiros no seria capaz, por certo, de conviver com um Poder Judicirio efetivamente autnomo. A existncia de mecanismos de proteo cidadania representa, para o receiturio neoliberal, uma ameaa aos programas de privatizao e ao processo de aniquilamento de direitos trabalhistas. No por acaso, o capital, encarado como deus da modernidade, no poupa esforos para compatibilizar a Justia s metas econmicas sustentadas pelos governos de ocasio. Nas consideraes de MILTON M. CAMARGO sobre o partido no poder, o papel do Executivo aparece bem delineado: Esse partido no poder, representado peio Executivo onipotente, vem, paulatinamente, instrumentalizando o ultimo reduto das garantias e dos valores fundamentais, insculpidos na Carta Magna, deixando os cidados-trabalhadores desalentados e desassistidos e o Poder Judicirio cada vez mais fragilizado.

A servio do Executivo 5m2d6z

Tem sido assim com a subverso e a consequente perda de eficcia dos princpios do direito do trabalho que, situando os trabalhadores como hipossuficientes sob o aspecto econmico, asseguram-lhes proteo jurdica especial. Essa mudana conceitual, aceita ivamente por tribunais superiores, no esconde o objetivo de preservar as margens de lucro, no raro escandalosas, dos grandes empreendimentos mercantis, ainda que mediante o sacrifcio do emprego de milhes de pessoas. E o neoliberalismo transportado para a atividade judicial do Estado, em defesa das foras hegemnicas, da competitividade desenfreada e da globalizao.

Um outro exemplo de submisso do Judicirio aos interesses do Executivo no pode ser esquecido: a greve nacional dos petroleiros, em 1995. Foi a primeira grande manifestao de protesto contra o governo de Fernando Henrique Cardoso. Violentamente atacada pelas foras dominantes, a paralisao terminou sem que o rgo empregador a Petrobras cumprisse um acordo firmado entre a categoria e o governo anterior, de Itamar Franco. Mas o Tribunal Superior do Trabalho (TST), ao apreciar recursos que contestavam os valores abusivos das multas impostas aos sindicatos envolvidos no conflito, decidiu punir os trabalhadores. Foi rigoroso na execuo da sentena que condenou aqueles que apenas lutavam pela eficcia dos termos de uma negociao legtima. Deu respaldo truculncia e ao abuso de poder. Aceitou uma tese em voga entre os liberais: em tempos de flexibilizao de direitos, a organizao sindical no tem razo de existir.

Neoliberalismo e democracia so conceitos que no combinam. Quando se fala em democratizao da Justia brasileira, a anlise envolve a prpria configurao do Estado. Um judicirio livre, autnomo) e soberano seria capaz de barrar os excessos praticados pelos grupos que pretendem deter o controle poltico da sociedade. Mas ali, no judicirio, que as elites tm encontrado, historicamente, um complemento do seu poder, uma fonte de legitimao das desigualdades sociais. E preciso, pois, modificar a estrutura de prestao jurisdicional, indispensvel para a democracia, aperfeio-la sem perder de vista a complexidade dos desafios que acompanham essa tarefa.

A influncia neoliberal na reforma do Judicirio.

A luta pelo controle social e popular

O que representa, afinal, o objetivo de democratizar a Justia? A resposta a essa indagao a pelo enfrentamento de um dilema clssico da democracia, consistente na busca do equilbrio entre os valores fundamentais da liberdade e da igualdade. No caso especfico das funes judiciais do Estado, a preocupao acrescida da necessidade de um controle popular em torno das atividades istrativas conferidas s cpulas dos tribunais, Cujos integrantes so titulares de mandatos de representao poltica, assim como acontece com membros dos Poderes Executivo e Legislativo, embora distintas as formas de investidura. Respeitar a independncia da magistratura e garantir o livre convencimento do juiz na definio das causas que lhe so apresentadas constituem requisitos para a preservao tica do Poder Judicirio, O que no se pode itir e a sociedade no quer mais que seja assim a utilizao do conceito de autonomia para isolar os agentes pblicos encarregados de julgar, tornando-os insensveis ao cotidiano daqueles que sero atingidos por suas decises.

O agravamento da excluso social no Pas e a fragilidade demonstrada pelo poder pblico na execuo das atividades jurisdicionais reforam a convico de que o setor precisa de modificaes profundas. Essa constatao, no entanto, vem acompanhada de uma controvrsia ideolgica. De um lado, os arautos do neoliberalismo apregoam uma reforma que reduz o Judicirio a condio de produtor e intrprete de teses jurdicas compatveis com os anseios econmicos e polticos da elite dominante. No por acaso, a nova estrutura judiciria votada pelo Congresso Nacional encontra pontos de convergncia com projetos originrios do Banco Mundial. Neles, so lanadas as bases para o funcionamento de uma Justia que preserve, acima da ordem constitucional, os interesses de grandes empreendedores internacionais.

Na outra ponta, esto as demandas dos trabalhadores e dos excludos de uma sociedade que tem no mercado o centro irradiador das decises de governo ou seja, dos milhes de cidados cujos direitos so agredidos cotidianamente pela violncia patrocinada pelos agentes do Estado. Esse grupo, para o qual o o a Justia encontra maiores obstculos, o verdadeiro destinatrio das transformaes que se mostram necessrias. A ele cabe lutar por urna fiscalizao verdadeiramente independente um controle popular ou social das atividades istrativas da magistratura. E exigir participao nas propostas oramentrias elaboradas anualmente pelos chefes do Poder. E influir na composio das cpulas dos tribunais, atravs do voto. E tornar eficazes os preceitos que deram origem aos Juizados Especiais no Pas.

Utopia? No h por que aguardar ivamente por uma resposta. Ou os trabalhadores se mobilizam para fazer do Judicirio um instrumento de efetiva proteo das suas conquistas histricas ou a barbrie neoliberal ser consumada.

A amplitude das transformaes 51371y

Para que o Poder Judicirio adquira um carter democrtico, preciso que o Estado brasileiro e a dar prioridade ao bem-estar coletivo, definio de polticas sociais eficazes e recomposio tica dos instrumentos de poder. Trata-se de um processo histrico complexo, que depende, para se concretizar, da luta organizada dos trabalhadores. O que fazer, ento, para que a Justia, que encarna a face menos conhecida do aparato estatal, seja urna Justia democrtica, urna Justia do povo? Como estabelecer o controle social, popular, sobre o cotidiano dos tribunais?

No h como negar que a luta pela democratizao do Judicirio enfrenta obstculos. Um cicies advm da imploso das bases istrativas do Estado, inspirada na dou trina neo-liberal e na exaltao da moeda e do mercado. Outro elemento decorre da predominncia, nos cursos universitrios ligados rea do direito, de uma metodologia de ensino que se mantm prisioneira de concepes dogmticas e do culto lei e ao mito da neutralidade do Estado. Tambm aparecem fatores de ordem tcnica, representados pela ausncia de diplomas legais que responsabilizem, sob os aspectos civil, criminal e istrativo, magistrados que praticam atos abusivos ou contrrios ao interesse pblico. A inegvel complexidade que envolve o tema, porm, no pode servir de pretexto para conservar o Poder Judicirio tal como est, afastado da realidade do homem comum e sujeito a um descrdito popular cada vez maior. O que se entende por controle social, portanto, h de ser uma transformao ampla, no limitada criao de rgos de fiscalizao compostos por representantes da sociedade organizada, mas tambm capaz de aperfeioar os atuais sistemas disciplinares internos.

A fiscalizao existente 2u4m56

Os mecanismos de fiscalizao da Justia brasileira integrados ao ordenamento jurdico tm se revelado insuficientes para assegurar a melhoria dos servios e a eficcia do princpio Constitucional da moralidade istrativa. As caractersticas fundamentais do sistema em vigor so as seguintes:

Publicidade dos atos processuais um princpio formal do processo, que interessa as partes em litgio. Apesar da sua importncia, tem pouca repercusso como meio de controle social, uma vez que o seu conhecimento a uma minoria da populao.

rgos disciplinares Nos tribunais, o poder disciplinar, exercido por corregedorias de Justia, esto contaminadas pelo vrus do corporativismo. Para piorar, os colegiados existentes, compostos por juizes de tribunais superiores, tendem a limitar a sua atuao a casos que envolvem servidores e magistrados de primeiro grau de jurisdio. Aparece, a, um corporativismo dentro do corporativismo, acentuado, ainda, pela falta de dispositivos legais para a tipificao de crimes de responsabilidade praticados por membros das cpulas diretivas do Poder.

Tribunais de Contas A apreciao das finanas do Poder Judicirio por rgos auxiliares do Legislativo limitada a fatos consumados, no abrangendo a previso oramentria aprovada para o setor o que acontece, normalmente, em reunies istrativas secretas, das quais participa um nmero de magistrados. Trata-se de um controle meramente formal, que no ite nenhuma interferncia na definio das prioridades adotadas pelos tribunais.

O quinto constitucional A frmula, que prev a participao de julgadores advindos de quadros da advocacia e do Ministrio Pblico na composio dos rgos colegiados que atuam em grau superior de jurisdio, tem por objetivo firmar uma espcie de auto-controle dos tribunais, com a reunio de experincias profissionais diversificadas. Na prtica, os efeitos quase no aparecem. Alm de provocar conflitos internos, o o ao cargo de juiz conferido a advogados faz surgir uma carreira pblica anmala, iniciada sem o requisito do concurso de provas ou de provas e ttulos.

Democratizar o Judicirio 106ix

preciso criar alternativas de controle popular do Judicirio, bem como aperfeioar os mecanismos internos de fiscalizao. No se pode itir, por exemplo, que as corregedorias de Justia existam como oragos disciplinares capazes de atingir apenas servidores e juizes de grau inferior de jurisdio, enquanto o desempenho profissional e inistrativo de membros dos tribunais permanece sem nenhum tipo de avaliao.

A democratizao do Poder Judicirio depende, tambm, de planos de carreira que normalizem a sua estrutura funcional. O tema no novo, embora esteja relativamente esquecido, ocultado pela avalanche de direitos retirados dos trabalhadores do setor pblico, sob a influncia de doutrinas que pregam o enxugamento da mquina estatal. Nessa tarefa de reorganizao, os concursos pblicos, sujeitos a rgido controle social inclusive no que se refere realidade de provas para o ingresso na magistratura , assumem importncia destacada.

Quanto aos possveis novos instrumentos de subordinao das atividades istrativas dos oragos judiciais OS Conselhos Estaduais e o Conselho Federal de Justia entre eles , convm, desde logo, evitar a repetio de experincias autoritrias do ado recente. Durante o regime militar que se instaurou no Pas em abril de 1964, a Constituio de 1967, em seu artigo 120, com redao dada pela Emenda Constitucional n. 6, de 13 de abril de 1977, instituiu o chamado Conselho Nacional da Magistratura. O colegiado, composto de ministros do Supremo Tribunal Federal, tinha jurisdio em todo o territrio do Pais, e materializava uma concepo centralizadora de poder, inspirada no Ato Institucional n. 5. Cabia ao Conselho Nacional da Magistratura, alm de conhecer reclamaes em face de membros de tribunais, a prerrogativa de avocar processos istrativos instaurados contra juizes de primeira instncia. A atual reforma submetida ao Congresso Nacional, a pretexto de instituir um controle externo do Judicirio, recria, ainda que sob uma feio mais democrtica, o antigo sistema que havia desaparecido sob a ordem constitucional vigente a partir de outubro de 1988 , prevendo a existncia de um rgo do qual faro parte magistrados e membros da advocacia, do Legislativo e do Ministrio Pblico os primeiros em larga maioria.

A participao popular

Numa Acepo mais abrangente de controle externo ou controle social, ou controle popular, como definem os trabalhadores do judicirio os Conselhos da Justia devero ter as seguintes caractersticas: a) composio majoritria de representantes da sociedade, indicados por organizaes populares, partidos polticos, parlamentares e sindicatos; b) competncia para apreciar reclamaes contra atos istrativos ou abusos de poder praticados por membros da magistraturas, funcionando como uma espcie de ouvidoria pblica, de carter mais poltico do que meramente tcnico; c) prerrogativa de indicar, em processo eleitoral aberto aos trabalhadores do Judicirio, representantes para atuar como fiscais populares no julgamento disciplinar de servidores e membros da magistratura e na aprovao das polticas de istrao interna dos tribunais; d) o amplo a informaes do interesse pblico; e e) legitimidade processual para representar contra membros do Poder Judicirio pela prtica de crimes de responsabilidade (atualmente, essa possibilidade restrita; a Lei n. 1079, de 10 de abril de 1950, que cuida da matria, trata dos rgos da Justia de maneira superficial, referindo-se, no artigo 39, apenas aos ministros do Supremo Tribunal Federal, o que refora a necessidade de aprovao de um diploma normativo que proteja a sociedade contra abusos de autoridades ou m conduta istrativa por parte de juzes de diferentes instncias).

Por ltimo, as finanas dos tribunais devero se submeter a planos oramentrios aprovados em reunies pblicas, acompanhadas por representantes da sociedade organizada, sob a forma de Oramento Participativo.

A estrutura dos tribunais superiores e a interferncia do Poder Executivo

Mesmo depois da entrada em vigor da Constituio de 1988, o Poder Judicirio no se livrou de uma forte dependncia do Executivo. Ainda hoje, os tribunais superiores so formados de acordo com critrios polticos. Sob o aspecto econmico, os rgos judiciais se mantm custa de verbas liberadas por reparties que cuidam das finanas do Estado. Praticamente nada lhes sobra de autonomia.

Na esfera estadual, as cpulas do setor continuam sendo eleitas por colgios de desembargadores, num processo , sem democracia, do qual no participa sequer a comunidade que atua no ramo do direito (funcionrios, juzes e advogados, alm de membros do Ministrio Pblico). Dentro dessa estrutura fechada, a istrao da Justia se coloca acima dos anseios coletivos, numa agresso aos princpios da moralidade, da impessoalidade e da publicidade, estampados no artigo 37 da Constituio Federal.

H, porm, desvios autoritrios de maior gravidade ainda. Um deles est na vulgarizao das sesses secretas de julgamento, onde so definidas polticas istrativas que interferem no funcionamento de uma parcela do servio pblico, geram despesas ou examinam a conduta profissional de autoridades que deveriam estar expostas a permanente fiscalizao popular. O artigo 93, inciso IX, da Carta Magna, impe como regra que todos os julgamentos dos rgos do Poder Judicirio sero pblicos. Em seguida, ite excees, desde que amparadas em leis especficas. Essa norma, fundamental para a democracia interna de um Poder do Estado, est sendo violada pelos tribunais brasileiros, que insistem em promover reunies secretas para tratar de assuntos corporativos da magistratura ou para aprovar medidas istrativas que interessam a toda a coletividade.

A necessidade de mudanas

As estruturas superiores do Poder Judicirio necessitam de verdadeira autonomia financeira, bem como do aperfeioamento dos mecanismos de controle das despesas que realizam. Alm do mais, imprescindvel, para aproximar a Justia da realidade social, a imediata reviso do processo de escolha das cpulas dos tribunais, de modo a serem eliminados os vcios de um modelo que concede a um grupo de autoridades nenhuma delas legitimada pelo voto popular ou vinculada a compromissos com o grupo social ao qual so destinadas as suas aes polticas e istrativas a prerrogativa de definir a chefia de um importante setor do Estado. A instituio de eleies diretas, com a participao de trabalhadores, juzes e advogados, reflete um desejo coletivo de democracia. Esse mesmo anseio repugna a existncia de julgamentos secretos que envolvem questes que dizem respeito a toda a sociedade e tratam do destino de verbas pblicas.

O problema da smula vinculada

Em sua essncia, as smulas, elaboradas a partir de incidentes de uniformizao de jurisprudncia, existem para retratar as teses jurdicas dominantes nos tribunais. O objetivo oferecer maior segurana aos agentes do direito, evitando que os vrios colegiados de uma mesma corte consolidem entendimentos conflitantes acerca de questes parecidas.

Embora plenamente integradas ao ordenamento jurdico brasileiro, as smulas no tm o carter de obrigatoriedade. A tradio jurdica nacional, ao contrrio, prestigia o livre convencimento dos juzes, aos quais reconhecida a possibilidade de divergir da orientao decorrente de julgamentos proferidos em grau superior de jurisdio.

O excesso de demandas apresentadas aos tribunais seja em face de regras de competncia originria, seja mediante a interposio de recursos tem dado margem procura de solues capazes de desafogar as prateleiras dos rgos encarregados de jurisdio. No Congresso Nacional, ganharam espao propostas que prevem a instituio da smula vnculante. Essa modalidade de uniformizao de jurisprudncia, caso aprovada, envolveria julgamentos reiterados sobre urna mesma matria com o voto de pelo menos 3/5 dos juizes do tribunal. Alm do mais, teria por objeto a validade, a interpretao e a eficcia de normas situadas dentro de um universo determinado, atacando, assim, a presumvel insegurana jurdica causada pela multiplicao de processos que tratam de um mesmo assunto.

A frmula encontrada para tornar mais gil a maquina judiciria parece encontrar razes no direito ingls e norte-americano, que adota uma tcnica de julgamento inspirada basicamente nos precedentes que envolvem a soluo de conflitos. De qualquer modo, mesmo cm tal sistema, denominado common law, os precedentes no retiram do julgador uma ampla liberdade de interpretao.

Por isso, a proposta de instituio da smula vinculante, pela via de alterao cio texto constitucional, merece ressalvas. Em primeiro lugar, porque na() esta assentada nos mesmos fatores histricos e culturais que servem de base para os pases que adotam o sistema jurdico da common Law. Em segundo, porque se circunscreve a dificuldades conjunturais enfrentadas ~ uma Justia sobrecarregada pelo prprio Estado, que, por descumprir sistematicamente normas inscritas na Constituio do Pas, aparece corno ru num grande nmero de aes. Por derradeiro, porque estabelece pressupostos de aplicao que inibem a sua eficcia, no conseguindo atingir a finalidade que justificaria a sua criao.

Preservar a atuao dos juzes 1wz62

O aspecto mais nocivo da smula vinculante, no entanto, est na supresso do poder criativo formalmente conferido magistratura. So os juizes de primeiro grau, que trabalham em contato direto com a comunidade, os que julgam sob a interferncia de fatores capazes de humanizar o processo. A eles deve ser dada a prerrogativa de submeter a interpretao da lei e da jurisprudncia ao universo social que os cerca, invertendo o processo formalista que se limita a adaptar mecanicamente as circunstncias do fato norma editada pelo Estado. Essa tcnica de interpretao menos frequente nas Instancias superiores. Os tribunais so estranhos ao cotidiano do cidado comum, que no dispe de informaes suficientes para compreender as intrincadas ramificaes burocrticas que regem o funcionamento do Judicirio.

No h como conciliar o respeito aos princpios democrticos com a atribuio a instncias superiores do poder de regulamentar o direito a ser aplicado em todos os cantos de um pas de dimenso continental. A smula vinculante, por isso, representa uma concepo autoritria, que menospreza a realidade social e reduz a capacidade intelectual dos juzes.

Os juzes especiais e as dificuldades de consolidao do sistema 493nb

Em setembro de 1995, a entrada em vigor da Lei Federal n. 9099 fez com que a competncia dos antigos Juizados de Pequenas Causas, transformados em Juizados Especiais Cveis e Criminais, fosse ampliada. Anunciavam-se modificaes profundas na justia brasileira, com a simplificao dos procedimentos judiciais e a reduo dos custos com a propositura de aes.

Estava inaugurada, na viso dos responsveis pelo Poder Judicirio, uma nova fase na prestao da tutela jurisdicional. Os grandes beneficiados seriam os cidados excludos do modelo tradicional, onde as causas cveis esta() sujeitas a um processo complexo, caro e repleto de formalidades que retardam as manifestaes definitivas sobre os conflitos submetidos autoridade judicial.

Transcorridos mais de seis anos, os Juizados cumpriram em parte o seu papel. Ao mesmo tempo, no deixaram de ser contaminados pelos muitos vcios que atingem os servios pblicos no Brasil agravados com a intensificao de uma poltica de governo na qual o enxugamento do Estado encarado como prioridade. E tambm pelo carter formalista, fechado e conservador que marca a estrutura do Poder Judicirio brasileiro.

Os primeiros problemas 3o2626

O impacto inicial causado pela entrada em vigor da Lei n. 9099/95 provocou duas vises distintas e de certo modo antagnicas sobre o assunto. De um lado, representantes da istrao do Poder adotaram um discurso triunfalista, que proclamou a Consolidao da Justia dos pobres, da Justia do futuro, da Justia democrtica. Em oposio a essa analise tcnica, formal e simplista, multiplicaram-se reclamaes contra o abandono a que esto relegados os servios pblicos. Essa interpretao mais realista, carregada de uma expectativa pouco sintonizada com as intenes tericas do legislador, ganhou corpo entre o funcionalismo. Com salrios defasados pela inflao, sem planos de carreira e submetidos a uma sobrecarga de atividades, os trabalhadores enfrentaram dificuldades para cumprir as novas tarefas que lhes foram impostas. Para agravar ainda mais o problema, o Congresso Nacional aprovou uma lei que, sem considerar as deficincias estruturais do servio pblico brasileiro, amplia a competncia dos Juizados, estendendo o seu o a microempresas.

Mesmo diante de um quadro adverso, porm, a possibilidade real de aproximao com o pblico, de humanizao dos processos judiciais e de realizao efetiva do direito constituiu um fator de motivao para um grupo considervel de servidores. Os Juizados aram a apresentar resultados satisfatrios muito em decorrncia desse esprito de doao. De qualquer forma, ntido que falta ao sistema um carter mais profissional. Resta saber quais so as perspectivas diante de um Poder Judicirio repleto de imperfeies, trocas de favores, nepotismo e falta de transparncia istrativa. Sob esses aspectos, o futuro na() se revela promissor.

As maiores resistncias 1n3b3j

As resistncias s modificaes pretendidas pela Lei n~ 9099/95 vm dos diversos setores envolvidos com os servios judiciais. conferir:

Por parte da istrao - No mbito estadual, a regulamentao dada aos Juizados Especiais deixou a desejar, chegando, em alguns casos, a ser catastrfica. H registro de unidades da Federao em que o sistema foi disciplinado com base no surgimento de cargos em comisso, nomeados sem a exigncia de concursos de provas e ttulos, numa exibio explcita de clientelismo e mau uso do dinheiro pblico.

Por parte dos servidores Sem estrutura para o desempenho das suas atividades profissionais, setores do funcionalismo aram a rejeitar o mecanismo adotado pela Lei n. 9099/95, deixando de lado o aspecto social que as inovaes poderiam significar.

Por parte de advogados - Tambm a advocacia encontrou dificuldades em se adaptar ao carter informal dos Juizados Especiais. H uma forte tendncia do setor de enxergar, na simplificao dos processos, ameaa a interesses corporativos.

Por parte do sistema de cartrios Um processo clere, baseado na oralidade e na composio de conflitos, no atende s intenes do sistema cartrio vigente no Pas em particular quando se trata de servios entregues iniciativa Por parte da magistratura - A formao conservadora, legalista e dogmtica de significativa parcela da magistratura brasileira um entrave ao funcionamento dos Juizados Especiais.

O que fazer 5e513

A verdadeira democratizao do Poder Judicirio depende, como se procurou mostrar neste trabalho, de mudanas na estrutura poltica do Estado brasileiro. O modelo neo-liberal imposto aos pases em desenvolvimento no tem sido capaz de oferecer perspectivas esmagadora maioria da populao, servindo, ao contrrio, para perpetuar a hegemonia dos grupos que detm o controle do capital. Esse esquema de dominao inclui entre os seus objetivos o enfraquecimento institucional da Justia, de modo a transforma-la em instrumento de legitimao das desigualdades sociais e da supremacia dos interesses do mercado sobre as relaes humanas. Essa constatao pe em destaque questes importantes: a) o que pretendem os agentes do grande capital em relao ao Poder Judicirio?; b) como se dar a excluso sob a ordem patrocinada pelo Fundo Monetrio Internacional e pelo Banco Mundial?; e c) o que fazer para combat-la e defender direitos histricos adquiridos pelos trabalhadores?

Encontrar respostas para tais indagaes tarefa complexa, um desafio gigantesco para aqueles que lutam pela construo de uma sociedade justa e fraterna. Mas preciso seguir em frente, derrotar a barbrie. Nesse processo transformador, a funo jurisdicional do Estado necessariamente incorporar princpios democrticos, subordinando-se a um controle popular eficaz e permanente. Trata-se de um anseio que, para se tornar realidade, pressupe, num primeiro momento, a atuao conjunta de entidades como OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), associaes de magistrados, sindicatos, federaes, CUT (Central nica dos Trabalhadores), MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra) e outros movimentos sociais. Somente a presso exercida pela base da sociedade ser capaz de modificar o Judicirio, superando os traos reacionrios que insistem em fincar razes num setor cujo aperfeioamento fundamental para a democracia.

Propostas de luta 4v1y9

Os princpios de ao aprovados pela Coordenao Nacional dos Trabalhadores da Justia em encontros, seminrios e congressos consideram a necessidade de transformao do Estado brasileiro. So eles:

Contra o neoliberalismo 52n60

- Organizaes dos trabalhadores da cidade e do campo

- Fortalecimento das entidades de representao de interesses populares

- Rejeio poltica de destruio das estruturas pblicas e de submisso dos interesses nacionais ao capital e s regras do mercado

- Intensificao da luta em defesa do servio pblicos

- Intensificao da luta pela reforma agrria e urbana

Por uma justia democrtica 5v6t

- Organizao dos Juizados Especiais, com a garantia do seu funcionamento pleno em todas as regies do Pas, subordinado aos seguintes princpios: a) concursos pblicos para a isso de pessoal; b) elaborao de planos de carreira; c) ampliao de estrutura material e de recursos humanos

- Reviso do controle disciplinar exercido pelas corregedorias de Justia sobre as atividades da magistratura]reformulao do sistema legal que disciplina os crimes de responsabilidade e abuso de poder praticados por agentes do Estados

- Criao de mecanismos de controle social e popular do Poder Judicirio

- Reestruturao e democratizao dos tribunais, com eleies diretas para a definio dos cargos diretivos

- Rejeio da smula de efeito vinculante

- Reviso crtica das tcnicas de ensino e dos currculos adotados nos cursos universitrios da rea do distrito

- Efetivao da autonomia poltica, financeira e istrativa do Judicirio

- Rejeio das tentativas de terceirizao de servios pblicos e de privatizao de cartrios judiciais

- Extino das sesses secretas de julgamentos istrativos nos tribunais

- Adoo, pelos rgos do Poder Judicirio, do Oramento Participativo

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